Idálio Revez, in Público
Alguns dos jovens serão provenientes de um bairro problemático. Há quem se apresse a sentenciar a prisão imediata dos jovens e quem lembre que é também importante “integrar”.As recentes agressões a um imigrante nepalês, numa das ruas de Olhão, deixaram os moradores daquela cidade apreensivos e com receio de novos episódios. “Quando vou para a pesca, pelas 5h ou 6h da manhã, tenho algum receio de andar na rua”, admite Fernando Alves. O mesmo sentimento marca as conversas que tem com os seus conterrâneos. A seu lado, sentado num banco de jardim da Avenida da República, está um seu velho camarada de faina, reformado. “Deviam ir todos presos”, sentencia o homem, que recusa identificar-se. Como ele, há mais habitantes que apelam à necessidade de “mais acção policial” e admitem também o receio.
As agressões aconteceram mais à frente, a meio da Rua Vasco da Gama, na noite de 25 de Janeiro. É precisamente nessa artéria que vive o presidente da Câmara de Olhão, António Pina. “Retirá-los [os jovens agressores] da comunidade brevemente era importante, até para a segurança deles. A população olhanense não aceita aquilo”, disse já no sábado à SIC. A PSP promete, para esta segunda-feira, “mais informação” sobre a investigação a este grupo de jovens que, num mês, já terá agredido 15 imigrantes em oito situações semelhantes.
Mas nem todos os olhanenses se apressam a clamar apenas pela prisão dos suspeitos. “É mais fácil mandar prender ou institucionalizar do que integrar”, diz António Terramoto, preocupado com o que vai ouvindo e com o perigo de se cair “no extremismo”. “Não posso deixar de condenar o acto praticado”, sublinha.
A meio da tarde deste domingo, José Ponte levava o cão a passear pela trela. “Moro na rua ali ao lado. Não consigo perceber como é que ninguém viu, para chamar a polícia.” Alguns dos jovens do grupo, entre os 16 e os 19 anos, são conhecidos por se passearem pela cidade - não estudam, nem trabalham. Muitos deles residem no Bairro dos Índios, uma zona referenciada pelas autoridades como problemática.
António Terramoto chama precisamente à atenção para as condições económicas e habitacionais da população. “Estão na origem de muitos problemas sociais na cidade”, sustenta. Letícia Gonçalves, de 93 anos e encostada a um cajado, retribui ao cumprimento de “Boa tarde”, com um sorriso. Ouve mal. “Não tenho dinheiro para comprar aparelho de ouvir, recebo 500 euros de reforma e vivem comigo dois filhos doentes”. Já o antigo jogado de futebol Fernando Alves, actualmente mariscador, queixa-se da dureza da faina: “Temos de andar com água pela cintura”. Da dureza do trabalho, salta para o contraste com que observa alguns grupos de jovens “sem futuro”.
Do outro lado da vida, um grupo de taxistas fala da notícia do dia: “Deu na televisão que a polícia já sabe quem eles são. Também não deve ser difícil”, comenta Manuel Serafim, ex-emigrante em França: “Trabalhava na agricultura, conheci as dificuldades de quem está fora do seu país”, diz, solidarizando-se com a vítima, de 26 anos, residente há três meses em Portugal. Ao regressar a casa no seu primeiro dia de trabalho foi atacado por um grupo de “sete ou nove” jovens, que num vídeo difundido nas redes sociais, aparecem encapuzados.
O motorista mais antigo da praxa de táxis, prossegue o discurso das dificuldades: “Estou aqui desde 8h, passa das 3h da tarde, só fiz um serviço. Fui levar uma senhora ao bairro do Gaiato.” Entretanto, não resiste a comentar as notícias sobre o último caso de violência. “Só vem dar má fama, prejudica a imagem da terra”, critica.
Já o pescador Fernando Alves deixa um alerta enquanto se despede. “Se vai ao Bairro dos Índios, tenha cuidado”. A zona habitacional, situada do lado norte da EN 125, apresenta nas paredes dos prédios, grafitados, sinais de que o elevador social não está a passar por ali. Numa das ruas adjacentes, está sentado à porta de casa, um homem, de 56 anos. Quando se ergue, nota-se que coxeia. “Cai de cima de um andaime, fiquei inválido para trabalhar na construção civil”. Sobre os jovens vizinhos, alegadamente envolvidos nas agressões lamenta o sucedido mas é parco nas palavras. “Cada um faz a sua vida”, diz deixando depois apenas uma nota de receio sobre o bairro: “Às vezes, quando estou deitado, ouço uns tiros de caçadeira, coisas dessas…”. Não quer problemas e pede para não ser identificado.