Rita Siza, in Público
Comissão mobiliza 500 milhões de euros para incentivar o sector da defesa a investir no aumento da capacidade industrial. Breton fala numa “mudança de paradigma” para uma nova “economia de guerra”.
Um milhão de munições: esse é o montante do arsenal de artilharia, obuses e mísseis que os Estados-membros prometeram entregar ao Exército da Ucrânia, até ao fim deste ano, e é, desde esta quarta-feira, a nova meta para a capacidade de produção anual da indústria de defesa e armamento da União Europeia.
“O nosso desafio é produzir mais para responder aos desafios de segurança e manter os nossos esforços para fornecer o material pedido pela Ucrânia”, afirmou o comissário europeu do Mercado Interno, Thierry Breton, cuja proposta para acelerar o fabrico de munições (designada em inglês com o acrónimo ASAP, de “Act in Support of Ammunition Production”) foi aprovada pelo colégio de comissários.
O projecto de Breton prevê a mobilização de 500 milhões de euros do Fundo Europeu de Defesa, na forma de subsídios, para que as empresas possam avançar rapidamente com uma reconversão do seu modelo produtivo e cadeias de aprovisionamento, e “mudar de paradigma” para uma nova “economia de guerra”.
Este dinheiro servirá para promover o investimento na “modernização e expansão das linhas [de produção] existentes, na criação de novas linhas e até de novas fábricas”, e ainda no recondicionamento de antigas munições de tipo soviético para as normas da NATO, explicou o comissário.
A Comissão fixou um modelo de co-financiamento para os projectos candidatos a estas verbas, em que 40% do investimento é assegurado pelo orçamento comunitário e 60% são garantidos pelos Estados-membros ou as empresas. Para facilitar o acesso ao financiamento, a Comissão vai autorizar que a comparticipação nacional possa resultar da reprogramação de fundos da Coesão, ou dos Planos de Recuperação e Resiliência dos Estados-membros.
“Podemos e devemos revitalizar a base industrial para responder às necessidades de um conflito de alta intensidade”, referiu o comissário francês, que fez um périplo pelas várias unidades europeias que se dedicam ao fabrico de munições em onze países da UE (até ao fim desta semana, passará ainda pela Alemanha e Espanha) e concluiu que é possível atingir a meta dos mil milhões de projécteis por ano.
“Pela primeira vez, temos uma visão clara e global do conjunto das nossas capacidades e das nossas necessidades, e do que é preciso fazer para acelerar e aumentar a produção destas munições”, disse Thierry Breton, sem avançar qual o ponto de partida para atingir a meta de um milhão de munições.
Esta proposta, que agora cumprirá o processo legislativo no Conselho da UE e Parlamento Europeu, corresponde ao “terceiro pilar” do plano desenhador Bruxelas para acelerar o apoio militar à Ucrânia — plano esse que os líderes europeus aprovaram na sua última cimeira de Março.
O primeiro pilar tem a ver com a entrega imediata das munições disponíveis nas reservas dos Estados-membros, que poderão reclamar um reembolso de 60% do custo dessas doações ao Exército ucraniano. De um envelope total de mil milhões de euros, já estarão comprometidos 600 milhões de euros para pagamentos de material enviado para a Ucrânia durante o mês de Abril.
O segundo pilar prevê a compra conjunta de munições, para os países poderem continuar a assegurar as entregas à Ucrânia ao mesmo tempo que restabelecem os seus stocks nacionais. Para tal, existe um financiamento de mil milhões de euros, através do mesmo Mecanismo Europeu de Apoio à Paz, um fundo externo ao quadro financeiro plurianual e que depois da invasão da Ucrânia pela Rússia já “cobriu” com 4,6 mil milhões de euros as contribuições militares dos Estados-membros.
Este plano para aumentar a capacidade industrial e a boa gestão das cadeias de aprovisionamento, que constitui o terceiro pilar, “garante que a UE está em condições de cumprir os novos contratos” de compra conjunta de munições, que se estima começarão a ser assinados pelos Estados-membros ainda durante o mês de Maio. Pelas contas de Bruxelas, com a entrada em vigor do ASAP, serão acrescentados outros mil milhões de euros no fortalecimento das capacidades da UE para “defender os seus interesses e valores e ajudar a manter a paz no continente”.