“As políticas públicas precisam de quebrar estereótipos de género relacionadas com a prestação de cuidados, apoiando mais as licenças paternas”, recomenda OCDE.
Quase todos os países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) atribuem algum tipo de licença parental. A licença exclusiva do pai é comum, mas pouco usada. Portugal está entre os países com mais longo período exclusivo do segundo progenitor pago a 100%.
A igualdade de género foi declarada uma prioridade da OCDE, que na manhã desta terça-feira lança um relatório intitulado Joining forces for gender equality – what is holding us back, no qual chama a atenção para a persistência de um fosso em várias esferas da vida pública e privada. “Embora as raparigas e as mulheres tenham percursos escolares mais prolongados, os homens têm mais probabilidade de estar empregados, de ganhar mais, de ocupar mais lugares de liderança.”
Os países foram, em 2021, questionados sobre o que priorizam em matéria de combate à desigualdade entre homens e mulheres. E 33 governos indicaram a violência contra as mulheres, 25 a disparidade salarial, 18 a sub-representação das mulheres na política e nos negócios e 15 os estereótipos de género.
Os resultados desse inquérito também mostram que há visões tradicionais que prevalecem, apesar de todas as mudanças. Ainda é forte a oposição à ideia de “pai como principal cuidador” (28%) e a concordância com a ideia de que “a vida familiar sofre quando uma mulher trabalha a tempo inteiro” (34%) ou que é inaceitável uma mulher ganhar mais do que o marido (25%).
“As políticas públicas precisam de quebrar estereótipos de género relacionadas com a prestação de cuidados, apoiando mais as licenças paternas e assegurando que as mães têm acesso a licenças (bem) remuneradas e com protecção do emprego, ao mesmo tempo que evitam desencorajar o seu regresso ao mercado de trabalho”, lê-se no documento. A sobrecarga relacionada com o trabalho não pago está na base da desigualdade.
A parentalidade não é um exclusivo dos casais heterossexuais. A licença está disponível para casais do mesmo sexo em 25 países da OCDE. Alguns até se esforçaram por criar licenças parentais, isto é, por usar uma linguagem mais neutra – é o caso de Bélgica, França, Islândia, Portugal, Espanha e Suécia.
Nessa busca de igualdade, há um imperativo físico. Como lembram os autores do extenso relatório, que se desdobra em 33 capítulos, por razões de saúde e segurança, quando em causa estão famílias biológicas, a licença de maternidade é inevitável, pelo menos a seguir ao parto. Já a licença de paternidade é opcional.
Licença parental inicial de 120 dias pagos a 100%
Na OCDE, as licenças de maternidade pagas têm uma duração média de 18,5 semanas, oscilando entre 43 previstas na Grécia a zero nos Estados Unidos (alguns Estados garantem direito a licença remunerada e/ou auxílio à renda).
Em Portugal, há uma licença parental inicial de 120 dias pagos a 100% – ou 150 pagos a 80%. Nesse contexto, a mãe tem até 30 dias (4,2 semanas) facultativos antes do parto e 42 dias (6 semanas) obrigatórios após o parto. É costume ficar com o resto da licença, mas não tem de ser assim.
Entre 2013 e 2022, Áustria, Bélgica, Colômbia, República Checa, França, Grécia, Itália, Coreia, Luxemburgo, Países Baixos, Portugal, Espanha e Suíça “introduziram ou ampliaram o direito à licença de paternidade remunerada”. Já “Canadá, Dinamarca, Estónia, a Finlândia, a Islândia, a Holanda, Coreia e Noruega introduziram licenças intransferíveis para os pais ou aumentaram os incentivos para a partilha de licença” que pode ser usufruída por ambos. Entretanto, já houve novas reformas em vários países.
As mudanças são mais evidentes nos Estados-membros da União Europeia, onde foi estabelecido um mínimo de quatro meses de licença parental remunerada (dois forçosamente da mãe) e uma licença obrigatória mínima de dez dias para o pai. No relatório surge, a título de exemplo, a Áustria, que criou uma licença de paternidade de um mês, e os Países Baixos, que introduziram uma de cinco semanas. Itália alargou de quatro para dez dias; a França de 11 dias para 25; a República Checa, de uma semana para duas; a Grécia, de dois dias para duas semanas; a Espanha, de quatro semanas para 16.
Na OCDE, em Abril de 2022, a "licença de paternidade remunerada com substituição total do rendimento para o trabalhador médio" durava, em média, 1,4 semanas. Quatro países só concediam uma semana e nove nem uma. A maioria contemplava duas a três semanas. Espanha liderava (16). Portugal vinha a seguir. Em Portugal, os pais tinham direito a 20 dias úteis (que passaram agora a ser 28 dias corridos ou interpolados) gozadas nas seis semanas a seguir ao nascimento do bebé, em simultâneo com a mãe, e outros 30 dias facultativos, exclusivos, como se explicará abaixo. Quando em causa estão licenças que cobrem menos de 100% do rendimento, emergem outros países.
Conforme se pode ler no relatório, “para incentivar o aumento da utilização da licença parental pelos homens, alguns países reservaram períodos intransferíveis de licença”. Tais práticas são usuais nos países escandinavos, como Suécia, país pioneiro a estabelecer a quota do pai, onde cada progenitor pode tirar até 240 dias, 90 dos quais não transferíveis.
Outros países, como Áustria, Canadá e Alemanha, introduziram bónus. Quer isto dizer que “oferecem semanas adicionais se ambos os pais usarem uma parte da licença”. Esse é também o caso de Portugal: se uma família deseja maximizar a licença, o pai tem de assumir as responsabilidades pelo bebé em exclusivo durante 30 dias. Nesse caso, a licença parental inicial paga a 100% sobe para 150 dias (120+30). Se for paga a 83% sobe para 180 (150+30). Com a nova alteração legal aprovada já este ano, a cobertura dos 180 dias sobe de 83% para 90% se o homem participar mais (120+60).
Na senda de encorajar os homens a avançar neste domínio, há países que começam a conceder o mesmo tempo de licença aos dois progenitores. Na Islândia, são três meses do pai, três da mãe e três partilháveis. A Noruega tem uma quota igual de 15 semanas para cada um, tendo reduzido o tempo partilhável para 16 semanas.
O relatório não deixa de explicar a importância de tais medidas. As licenças de paternidade podem beneficiar as taxas de emprego das mães. Também podem levar os pais a envolver-se mais no trabalho doméstico e de prestação de cuidados. Ao mesmo tempo, pode tornar a sua relação com as crianças mais próxima. Tudo indica que também aumenta o grau de satisfação com a vida deles e delas.
Para prolongar o acompanhamento, muitos países atribuem licenças parentais alargadas, com uma remuneração inferior. Em Portugal, por exemplo, essa pode ser gozada por qualquer progenitor e dura três meses, tendo o subsídio pago pela Segurança Social agora passado de 25% para 30% do salário bruto.

