12.1.09

Desemprego vai chegar aos mais qualificados

Alexandra Figueira, Lucília Tiago, in Jornal de Notícias

Automóvel, que emprega pessoas mais especializadas, já começou a suspender contratos


O desemprego deverá continuar a atingir sobretudo pessoas pouco qualificadas, mas é de esperar uma subida junto de trabalhadores com qualificação intermédia, patente já nas suspensões de trabalho no sector automóvel e de componentes.

Este ano e o próximo serão "muito difíceis", antevê Mário Costa, presidente da Select Vedior, de recursos humanos e trabalho temporário. "A maioria das empresas já está a preparar-se para mais desemprego", refere, sublinhando que se terão que adaptar às novas condições do mercado. "Pelo caminho ficarão empregos e empresas", diz.

Muitos desses empregos perdidos são ocupados por pessoas mais qualificadas. Se, até agora, o desemprego atingiu principalmente o emprego indiferenciado, Mário Costa admite que, em 2009, possa assistir-se também a uma redução do mais qualificado. "As empresas vão reajustar os quadros e esse reajustamento será transversal", referiu.

Também Aurora Teixeira, professora na Faculdade de Economia do Porto, admite um desemprego qualificado superior. "As pessoas mais especializadas não são imunes à crise" e o sector financeiro, que tem sido ajudado pelo Estado, pode vir a contribuir para o desemprego, admite.

Mas, nos números globais, serão de novo os menos qualificados e mais vulneráveis a sofrer o impacto da crise. "O desemprego vai atingir com mais força quem já estava em risco de perder o trabalho", resumiu fonte da UGT. Em concreto, trabalhadores de indústrias de mão-de-obra intensiva - como o têxtil, vestuário e calçado - com mais de 50 anos, ou jovem, ou imigrante, e baixo nível de qualificação.

Estes sectores empregam muita gente (quando fecham, os despedimentos atingem mais pessoas) e estão abertos à concorrência internacional e dependentes das exportações, que vão descer substancialmente durante o ano.

Pela força do número de trabalhadores do calçado, têxtil e vestuário (115 mil, perto de 5% da mão-de-obra), qualquer crise que os atinja terá "um impacto enorme", disse Aurora Teixeira.

Com o acentuar da crise haverá, não apenas um aumento do desemprego, mas também da degradação das condições de trabalho. E as primeiras vítimas serão, referiu Francisco Louçã, os precários, que verão o rendimento baixar. "A tradução que se fazia por 100 euros, vai ser feita por 80", precisa.

Ainda assim, Amândio da Fonseca, do grupo Egor, também de recursos humanos e trabalho temporário, admite que, após o agudizar da crise, em que os precários são os primeiros a perder o emprego, a sua empresa veja o negócio crescer. E até sente um ligeiro aumento da procura das pessoas na Grande Lisboa, para trabalhar nos serviços.

Na Egor no Porto, a história é outra. "No Norte, trabalhamos mais com a indústria e estamos um pouco abaixo das expectativas; na região Centro é que sentimos uma descida maior", disse.

Um responsável de uma empresa de trabalho temporário, que não se quis identificar, acredita que a actividade da sua empresa irá subir. Mas isso, explica, deve-se ao facto de "trabalhar" com organismos estatais que, perante o congelamento de admissões, recorrem mais ao trabalho temporário e ao "outsorcing".

Bens de primeira necessidade vão ultrapassar melhor a crise

Bens de primeira necessidade, como a alimentação, e não transaccionáveis, ou seja, que não estão sujeitos à concorrência internacional, como o comércio ou os serviços de proximidade: são estes os sectores que poderão aspirar a ultrapassar a crise sem sofrer muito com o desemprego, adiantou Eugénio Rosa, do gabinete de estudos da CGTP. E também a construção civil, mas só se o Estado avançar rapidamente com obras rápidas, como o programa de reabilitação de escolas, e não com os grandes projectos do TGV ou novo aeroporto de Lisboa. Também Mário Costa acredita que a crise não será igual para todos. Ou seja, os "bons comerciais, os bons técnicos, principalmente os de informática, e o pessoal da área da saúde vão aguentar melhor" esta conjuntura adversa.