por Rita Carvalho, in Diário de Notícias
Para levar para casa um bebé, há casais que esperam mais de cinco anos. Mas as crianças mais velhas, com problemas de saúde e irmãos têm o problema inverso. Há quem nunca seja adoptado.
Rui já tem quase seis anos. Mas desde os dois que está referenciado para adopção e há mais de três que consta da lista nacional onde se cruzam crianças candidatas e potenciais pais. Um problema grave de saúde tem-no impedido de encontrar uma família e parece condená-lo a crescer na instituição onde chegou ainda bebé.
Tal como Rui, há 235 crianças há mais de três anos à procura de uma família. Constam da lista de adopção criada em 2006, mas por terem problemas de saúde, idade mais avançada ou vários irmãos não há casais interessados em acolhê-los.
Nos bebés, o desencontro é no sentido inverso, pois há muitas pessoas a querer adoptar, mas o processo pode demorar mais de cinco anos, porque há poucos menores até aos três anos em situação de adaptabilidade.
A maioria das 9563 crianças e jovens que, em 2009, integravam a rede de acolhimento do Estado (lares, famílias de acolhimento ou instituições) tinham sido retiradas à família por estarem em risco e já ultrapassavam os 12 anos. Por isso, para 26%, o futuro não passava por uma nova família mas pela autonomia, trabalhada ao longo do tempo. Segundo o Instituto de Segurança Social, 24% dos menores tinham a expectativa de voltar para casa e aguardavam que a família conseguisse reorganizar-se para regressarem em segurança.
Só quando todas as possibilidades junto da família estão esgotadas, nomeadamente o acolhimento por uma tia ou avó, é que a adopção é considerada. Por isso, entre as crianças institucionalizadas, só 10% são encaminhadas para adopção. E à medida que a idade sobe agrava-se o desencontro.
"Quanto mais aumenta a idade e os problemas de saúde mais aumenta o tempo de espera", explica Isabel Pastor, coordenadora nacional do Serviço de Adopção. "Mas ninguém fica dez anos à espera de família. Se não for possível encontrá-la num tempo razoável, há que pensar noutro futuro", diz.
O projecto de vida é traçado com os técnicos da instituição onde a criança está e validado pelos tribunais e comissões de protecção de crianças e jovens. E há cada vez mais respostas legais para além da adopção plena, em que se cortam os laços com a família biológica. O apadrinhamento civil é uma delas (ver caixa ao lado).
Para Dulce Rocha, presidente do Instituto de Apoio à Criança, o importante é tirar a criança da instituição, aproveitando as alternativas que a lei prevê. "Os técnicos estão cada vez mais sensibilizados para encontrar soluções. Mas assim que a criança entra na instituição devia haver logo um projecto para sair. A estada devia ser temporária e não definitiva, como, infelizmente, ainda acontece."
Quando a saída não é possível, como acontece com crianças mais velhas, há que proporcionar-lhes um ambiente familiar, mesmo que não seja através de uma família adoptiva e definitiva, defende Dulce Rocha. "Durante a semana estão na escola mas ao fim-de-semana deviam passar momentos de lazer com uma família, alguém que lhes dê referências e seja um apoio para a vida. Estes contactos regulares são essenciais para diversificar as relações da criança."
Os dados desde 2006 revelam ainda outra conclusão preocupante: 158 crianças nunca chegaram a ser adoptadas. Algumas por terem atingido, entretanto, os 15 anos, outras porque a demora ditou a revisão do seu futuro.
Para os jovens, o treino para a autonomia de vida é cada vez mais uma saída. A Segurança Social e a Casa Pia dispõem até de programas em que estes partilham apartamentos, estudam ou trabalham, e são acompanhados pelos técnicos nesta transição para a vida activa. A adopção internacional tem sido também uma resposta para algumas crianças de 13 e 14 anos.