Marisa Rodrigues, in Jornal de Notícias
Maltratados e afastados da sociedade. Assim viviam muitos dos menores entregues a famílias de acolhimento alemãs. O isolamento fazia parte das "medidas de protecção" que lhe eram aplicadas. Uma clara violação dos direitos da criança.
Os relatos do sofrimento a que estavam sujeitos são chocantes. Um jovem com passado marcado pela dependência de álcool ou de drogas não tinha em Portugal, na maioria das vezes, um acompanhamento adequado. Enfrentavam aquilo a que técnicos chamam de "desmame a frio". Sem medicação, a ansiedade tornava-os violentos.
"Para controlá-los, as famílias, quase todas sem formação, trancavam-nos em quartos ou anexos", denuncia, ao JN, uma ex-funcionária de uma das instituições responsáveis pela introdução dos jovens em Portugal.
Um dos casos mais graves e que consta de relatórios a que o JN teve acesso é o de um menino de 12 anos. Os "pais" tinham por hábito amarrá-lo a uma árvore no quintal. Deixavam-lhe um bacio e um colchão.
Outra das situações detectadas no âmbito da investigação portuguesa, que ainda decorre, foi enriquecimento das famílias (que não trabalhavam) à custa do dinheiro que recebiam por cada menor - cerca de 3 mil euros.
Com receio de perder os subsídios, não participavam às instituições as dificuldades em lidar com os crianças e optavam por trancá-las. Por outro lado, o contrato que assinavam com as instituições obrigava as famílias a assumir a responsabilidade dos actos cometidos pelos menores e impedi-as de contactar umas com as outras.
Aos jovens mais problemáticos, aplicavam-lhes o isolamento social. Isolados do exterior, não é, por isso, de estranhar que vizinhos de muitas delas nunca as tenham visto na rua, tal como o JN pôde comprovar.