Subidas dos salários, do emprego e da recuperação de dívidas estão a conduzir a crescimentos recorde no valor dos descontos para a Segurança Social. Sustentabilidade do sistema sai reforçada e ampara a teoria do Governo de que há dinheiro para pagar os dois aumentos de pensões que estão programados
Os descontos de trabalhadores e empresas para a Segurança Social mantiveram no início do ano a sua escalada de crescimento. Entre janeiro e março, chegaram aos cofres do orçamento da Segurança Social 5,79 mil milhões de euros em contribuições e quotizações, mais 13,5% do que um ano antes. O aumento é atribuído ao momento favorável que o mercado de trabalho atravessa, e ao crescimento dos salários médios, que, segundo números avançados no boletim de execução orçamental, estarão a subir em torno de 11%.
Embora as despesas também estejam a subir, nomeadamente com pensões, subsídio de doença, abonos de família e prestações de parentalidade, no cômputo geral, o saldo do orçamento da Segurança Social está a reforçar-se.
De acordo com os números da execução orçamental de março, divulgados no final da passada semana, nos três primeiros meses do ano as receitas efetivas do sistema de Segurança Social ascenderam a 8,68 mil milhões de euros. São mais 6,1% do que nos mesmos meses de 2022 (o chamado período homólogo) e fica a dever-se sobretudo às contribuições sociais, que aumentam 13,5% face ao ano passado.
Embora a taxa de desemprego tenha subido nos últimos meses (passou de 6,7% da população ativa em dezembro para os 6,9% em março deste ano), o nível de emprego também está a subir, tal como a população ativa (o número de pessoas disponíveis para trabalhar). Esta será uma das explicações para o aumento dos descontos para a Segurança Social.
Outra explicação está na subida dos salários. O salário mínimo voltou a aumentar em janeiro deste ano, fixando-se agora nos 760 euros brutos por mês. São mais 7,8% do que há um ano, e, embora esta subida praticamente não tenha efeito nas receitas de IRS, tem tradução direta nos descontos para a Segurança Social. Outra explicação ainda estará na tendência de subida dos salários médios em Portugal.
Ana Mendes Godinho, ministra da Segurança Social, já tinha avançado que em janeiro os salários médios declarados avançaram 8% e, agora, no boletim de execução orçamental da Segurança Social, acrescenta mais dados. “Em fevereiro, registou-se um crescimento homólogo de 3,7% no número de trabalhadores por conta de outrem e de 11,1% no valor das remunerações declaradas”. Ou seja, tanto o emprego como os salários médios continuaram a subir.
A cobrança de contribuições em atraso deu outro empurrão, diz a Direção Geral do Orçamento, que aponta para mais 17,8 milhões de euros face a 2022, embora sem entrar em detalhes.
As despesas também estão a subir, embora de forma menos pronunciada. De acordo com o boletim, a despesa efetiva fixou-se nos 7,09 mil milhões de euros, mais 1,5% (ou 105,5 milhões de euros) face ao ano passado. As pensões, que consomem boa parte da despesa (representam 60% do total) estão a crescer 7% devido ao efeito conjugado da subida da prestação social (a esmagadora maioria teve um aumento de 4,8% em janeiro) e do número de beneficiários.
Segundo o Gabinete de Estatísticas e Planeamento (GEP), o número de pensões tem vindo a crescer tanto em termos mensais como face ao ano passado, com exceção das reformas de invalidez, que são bem menos representativas.
Os subsídios de desemprego e de doença são mais duas prestações sociais com expressão orçamental, mas estão a evoluir em sentido contrário. Entre janeiro e março, a Segurança Social desembolsou 354 milhões de euros em subsídios de desemprego, menos de metade do valor que a chegou a ser suportado no pico mais alto da crise financeira, em 2013.
Na doença, contudo, o sentido é inverso. Foram gastos 250,7 milhões de euros, um valor sem precedentes nos primeiros trimestres dos anos anteriores e que não encontram explicações nos boletins de execução orçamental da Direção Geral do Orçamento nem do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social. Uma parte da subida pode ser justificada pela subida de 8,4% nas prestações sociais em janeiro, devido ao aumento do indexante de apoios sociais (IAS), que faz subir o valor mínimo do subsídio.
Feitas as contas à entrada e saída de dinheiro, em março a Segurança Social tinha um saldo global positivo de 1,58 mil milhões de euros, mais 394,9 milhões de euros face a 2022.
São números que ajudam o Governo a sustentar a tese de que os dois próximos aumentos nas pensões - o adicional em julho e a subida em janeiro de 2024, pelas regras habituais - são acomodáveis, não debilitando a sustentabilidade do sistema previdencial.