5.12.19

“Não vale a pena criar políticas que não casam com o território”

Luísa Pinto, in Público on-line

Por enquanto só oito municípios entregaram as Estratégias Locais de Habitação que lhes vão permitir candidatarem-se a financiamentos no âmbito do 1º Direito. E ainda não foi lançada nenhuma empreitada no âmbito do Fundo Nacional de Reabilitação do Edificado.

O Programa de Arrendamento Acessível (PAA) é apenas um instrumento entre quase duas dezenas de iniciativas que compõem a Nova Geração de Políticas de Habitação (NGPH). Mas um ano e meio depois de este pacote ter sido apresentado, há ainda poucos resultados a avançar. Mas tanto entre investigadores e activistas do direito à habitação, como entre autarcas, começam a surgir cada vez mais vozes no espaço público a avisar que o mercado não se irá reequilibrar para dar resposta às necessidades que são cada vez mais evidentes.

Numa altura em que o património público abrange apenas cerca de 2% do parque habitacional – se não considerarmos os juros bonificados que continuam a ser pagos pelo Orçamento de Estado nos apoios dados ao crédito à habitação há cerca de duas décadas – as câmaras municipais estão cada vez mais preocupadas com a forma como vão conseguir cumprir as necessidades da população. E num encontro realizado com as empresas municipais de habitação do Norte, onde estiveram representados vários municípios do litoral e do interior, foi perceptível que já poucos acreditam que vai ser possível cumprir a promessa do primeiro-ministro: resolver todas as carências habitacionais da população por altura dos 50 anos do 25 de Abril.

Até porque, no levantamento que agora está a ser feito pelas autarquias, para ser vertida na obrigatória Estratégia Local de Habitação (só depois de uma estratégia aprovada é que podem ser submetidas candidaturas ao programa 1º Direito, para apoiar os municípios na construção de novos fogos ou na recuperação dos existentes), conclui-se que as necessidades vão superar os 27 mil casos de carência que foram identificados no levantamento nacional que precedeu a apresentação da NGPH. As preocupações dos municípios e das empresas municipais vão mais longe – para além das estratégias locais de habitação, precisam de aprovar uma Carta Municipal de Habitação, de acordo com a Lei de Bases de Habitação que foi criada. É uma forma de, admitem os autarcas ouvidos pelo PÚBLICO, articular as necessidades de habitação com a revisão dos Planos Directores Municipais.

De acordo com as informações recolhidas pelo PÚBLICO, até agora só há oito municípios com Estratégias Locais de Habitação aprovadas e entregues no IHRU-Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana. Mas ainda não são conhecidas candidaturas nem financiamentos aprovados. “Não vale a pena criar instrumentos e políticas conceptualmente intocáveis, mas que depois não casam com o território. Só se tirarmos o território do território e o colocarmos num laboratório”, ironiza Eduardo Luciano, vereador com os pelouros de habitação e de urbanismo da Câmara de Évora. O vereador diz que, desde 1997, todos os edifícios reabilitados no centro histórico se destinaram ao turismo e ao alojamento local e que, apesar de a pressão estar no centro, ela é radial. Lembrando que as rendas praticadas em Évora já estão acima da media nacional, e que o território está envelhecido e despovoado, diz que só um bom programa nacional poderá ter eficácia. “Se não houver discriminação positiva nestes territórios, e a descentralização for apenas transferência de obrigações, sem autonomia de decisão e com envelopes financeiros abaixo das necessidades, não iremos a lado nenhum”, termina.

Relativamente ao esforço nacional anunciado pelo Governo para reabilitar património devoluto e colocá-lo no mercado com uma parte destinada ao mercado de arrendamento acessível - através de Fundo Nacional de Reabilitação do Edificado (FNRE), que haverá de receber verbas do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (FEFSS) – também nada saiu do papel e as primeiras empreitadas estão por lançar.

De acordo com o gabinete do Ministro da Habitação, estão constituídos três subfundos, três autorizados e seis em preparação. Assim, há 12 processos em curso e em diferentes fases de maturidade. Os subfundos criados estão “já na fase de licenciamento e de preparação do processo das empreitadas” e, no caso dos três autorizados, “a sociedade gestora do FNRE encontra-se a trabalhar de perto com as Câmara Municipais para apresentação dos Pedidos de Informação Prévia necessários à constituição dos subfundos”. É nos subfundos ainda em preparação que estão incluídos os 29 imóveis apresentados pelo ministro Pedro Nuno Santos quando aprovou o plano de reabilitação de património público para arrendamento acessível.
Mais rápidas que as iniciativas do Governo poderão ser as que já foram apresentadas pelas câmaras de Lisboa e Porto, que tencionam apresentar programas autónomos, e com projectos diferenciados, como os que estão em curso na Feira Popular (Lisboa) ou no Monte Pedral (Porto).