in SIC
Nasceu em 1971, em Lisboa. A telefonia esteve presente desde sempre, e desde pequeno que sabia que queria “dar na rádio”. Também quis ser jogador do Benfica, mas só teve espaço para cumprir um sonho. Desde 1996 que acorda às 5h30 da manhã e há 18 anos que é diretor da Rádio Comercial. Numa conversa com Bernardo Ferrão, fala abertamente sobre os desafios da rádio, das “falências trágicas da democracia portuguesa” e admite que não confia nos políticos - “o que está a acontecer entre Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa é risível”. Ouça aqui mais um episódio do Geração 70
Nasceu a 17 de fevereiro de 1971, em Lisboa. Da infância lembra as brincadeiras na rua e o rádio que estava em casa dos pais, em Oeiras - “era a coisa mais importante”, recorda numa das fotografias que trouxe para o podcast.
“A rádio sempre esteve presente”. Em criança, ouvia rádio “horas a fio” e conta que usava o gravador de cassetes do pai para fazer emissões, apresentar músicas e até cantar.
O pai era empregado bancário do antigo BES, viveu nos Estados Unidos, “nunca soube porque foi nem porque voltou”. A mãe trabalhava num escritório.
Queria ser jogador do Benfica e dar na rádio, um dos sonhos foi cumprido. É diretor da Rádio Comercial há 18 anos e líder de audiências.
Acorda desde 1996 às 5h30 da manhã e vive num misto a que chama “coisa esquizofrénica”: ser diretor dele próprio. Continua a fazer as manhãs da Comercial porque “ainda faço falta e porque gosto realmente de fazer rádio”.
Não entrou na Licenciatura em Comunicação Social e a reboque do boom das rádios piratas enviou o primeiro currículo para a Correio da Manhã Rádio. Tinha pouco para apresentar: “era uma página em branco, com a minha morada. Tive sorte”.
O primeiro emprego foi “de sonho”, conta com ironia. Fazia madrugadas na rádio e talvez tenha sido por isso que nunca concluiu o curso de Relações Internacionais.
A infância na rua contrasta com os dias de hoje, “as crianças têm pavor de se aborrecer”. "É um mundo tão distante, quando falo dele aos meus filhos acham que estou a falar da era de Eça de Queirós.”
No país dos anos 70/80, na própria casa, era tudo a preto e branco, “ou eras fascista ou comunista”. Recorda como era evidente o “choque” entre a avó e o pai, que além de serem sogra e genro, o pai tinha um busto de Sá Carneiro e a avó - a avó Dulce - era militante do partido comunista.
Ainda o levou à Festa do Avante, tinha nove anos. Mas depois de uma viagem a Moscovo, a avó Dulce regressou “desiludida” e “traída” - “a partir daí adotou o autocolante que dizia ‘Soares é fixe’”.
Os tempos mudaram e a rádio também, andou à deriva, recuperou e prepara-se para um “novo futuro”: cada vez mais digital.
Pedro Ribeiro é o novo convidado do podcast Geração 70. Numa conversa com Bernardo Ferrão fala sobre a mudança geracional dos jornalistas e reflete sobre uma sociedade assente na cultura da imagem - “falta uma paixão no jornalismo”. Desconfiado da política e dos políticos, aponta, sem papas na língua, as falhas e oportunidades do país e dos governos para “acertar o passo”: o que ficou por fazer, o dinheiro que se “desperdiçou” e as “falências trágicas da democracia portuguesa”.
31.8.23
s portugueses estão a ler mais e isso deve-se aos jovens: são eles quem mais compra livros em Portugal
Tiago Serra Cunha Jornalista, in Expresso
Menos de dois terços dos portugueses compraram livros no último ano, indica um novo estudo, mas os números estão a subir, principalmente por conta dos jovens, que continuam a impulsionar o setor. Apesar dos indicadores positivos, Portugal mantém-se como o país que menos lê na Europa — ainda assim, os dados permitem “esperança no futuro”, acredita a APEL
Há mais livros a ser comprados em Portugal e os jovens estão a ser os principais responsáveis pelo facto. São melhorias face à tendência negativa apresentada pelos últimos dados sobre o setor, revelam os números de um novo estudo promovido pela Associação Portuguesa de Editores e Livreiros (APEL) e realizado pela GfK. Os dados sobre o “Mercado do Livro e Hábitos de Compra em Portugal”, foram divulgados esta quinta-feira na abertura do Book 2.0, descrito como o maior evento de discussão do futuro dos livros em Portugal e na Europa.
Os números divulgados pela APEL indicam que 62% dos inquiridos compraram livros no último ano — o que corresponde a menos de dois terços dos portugueses. Destes, 70% afirmaram que compraram o mesmo total ou mais livros do que no ano anterior, revelando uma ligeira mudança de hábitos dos portugueses em relação à literatura nos últimos anos: o Inquérito às Práticas Culturais, realizado em 2020 pelo Instituto de Ciências Sociais, indicava que 61% dos portugueses não tinham lido qualquer livro nesse último ano.
Comparando os dados atuais com aqueles pré-pandemia, 68% dos compradores afirmam ter comprado o mesmo número (40%) ou até mais livros (28%).
Os jovens são quem está a impulsionar o setor. Os inquiridos entre os 15 e os 34 anos dizem continuar a ter o hábito de comprar livros, sendo quem mais comprou no último ano (28% do total). Em 2022, as compras pela camada mais jovem subiram 44% face ao período pré-pandemia.
Números que comprovam os dados já avançados pelo Expresso, também da GfK, que indicavam que o mercado livreiro atingiu em 2022 o maior volume de faturação desde que os dados começaram a ser auditados, há 15 anos — e foi mesmo o que mais cresceu na Europa no ano passado — graças às camadas mais jovens, quem mais lê no país.
As comunidades de leitores que foram surgindo em redes como o Instagram ou o TikTok foram alavancando o setor. “Talvez se chegue agora aos livros de forma diferente, por exemplo através das redes sociais, mas a verdade é que a compra, leitura e partilha de livros é agora muito comum entre os jovens, o que é extremamente positivo para o futuro da leitura”, diz o presidente da APEL, Pedro Sobral, sobre esta tendência, citado em comunicado.
Para impulsionar estes números, estão a ser pensadas iniciativas como o cheque-livro, plano de consolidação dos hábitos de leitura desenvolvido pelo ministério da Cultura em conjunto com a APEL.
O Governo quer para pôr os mais novos a ler, ao dar a cada jovem que tenha 18 anos feitos em 2023 a “experiência” de “escolher e comprar” pelo menos um livro (o valor final está ainda por revelar). Há também múltiplos projetos a serem levados a cabo por leitores e criadores de conteúdo na internet, de forma a divulgar o que se publica em Portugal.
O ROMANCE DOMINA UM MERCADO ONDE O LIVRO FÍSICO CONTINUA A REINAR
O romance continua a ser o género literário preferido de quem compra livros (69%), seguindo-se o romance histórico (52%). Os livros infantojuvenis continuam a alimentar 50% das compras efetuadas — este segmento foi o que mais vendeu e, dos 15 livros de ficção de maior sucesso em 2022, 10 são populares entre adolescentes e jovens adultos, tinha noticiado o Expresso.
Os livros físicos continuam a dominar, apesar da prevalência das redes sociais para a sua recomendação. Este é o formato privilegiado por quem compra livros, correspondendo a 99% das compras efetuadas, sobretudo, também, em livrarias e lojas físicas (88%). O digital, no entanto, ganha algum terreno: 8% dos leitores compram livros digitais; 39% compram livros - físicos ou digitais - em lojas online.
CLASSES MAIS BAIXAS CONTINUAM COM BAIXO ACESSO A LIVROS
Os números não são todos positivos. Segundo mostram os dados da GfK, as maiores quebras de compra de livros registadas no último ano registaram-se no Porto (-14%), no Litoral (-10%) e no Interior (-10%). 26% destas quebras verificam-se nas classes sociais mais baixas (classes C e D).
Por outro lado, é nos lares com um status social mais elevado (classes A e B) que são comprados mais livros (42%).
O presidente da APEL refere mesmo, em comunicado, que Portugal mantém-se, apesar de todos os indicadores positivos, o “país com os índices de leitura mais baixos da Europa”. No entanto, Pedro Sobral deposita esperança nos indicadores em subida: “estes números trazem-nos esperança no futuro, fazem-nos acreditar que é possível mudar hábitos para as gerações futuras”, diz, referindo que “o aumento da leitura deve ser transversal a todo o país, independentemente da classe económica ou da região do país, por isso democratizar o acesso ao livro deve ser um imperativo nacional”.
MERCADO VALEU 175 MILHÕES EM 2022
No ano passado, o mercado livreiro português valeu cerca de 175 milhões de euros, com um total de 21.115 livros lançados. É dominado por quatro grupos de livrarias em rede, que detêm 80 lojas, “nove retalhistas multiproduto, correspondentes a 1.200 pontos de venda; oito grupos de grande distribuição, com 1.800 pontos de venda, e quatro livrarias únicas”.
O estudo sobre o “Mercado do Livro e Hábitos de Compra em Portugal” foi realizado pela GfK entre os dias 18 de julho e 10 de agosto de 2023 e conta com uma amostra constituída por 1001 pessoas.
Menos de dois terços dos portugueses compraram livros no último ano, indica um novo estudo, mas os números estão a subir, principalmente por conta dos jovens, que continuam a impulsionar o setor. Apesar dos indicadores positivos, Portugal mantém-se como o país que menos lê na Europa — ainda assim, os dados permitem “esperança no futuro”, acredita a APEL
Há mais livros a ser comprados em Portugal e os jovens estão a ser os principais responsáveis pelo facto. São melhorias face à tendência negativa apresentada pelos últimos dados sobre o setor, revelam os números de um novo estudo promovido pela Associação Portuguesa de Editores e Livreiros (APEL) e realizado pela GfK. Os dados sobre o “Mercado do Livro e Hábitos de Compra em Portugal”, foram divulgados esta quinta-feira na abertura do Book 2.0, descrito como o maior evento de discussão do futuro dos livros em Portugal e na Europa.
Os números divulgados pela APEL indicam que 62% dos inquiridos compraram livros no último ano — o que corresponde a menos de dois terços dos portugueses. Destes, 70% afirmaram que compraram o mesmo total ou mais livros do que no ano anterior, revelando uma ligeira mudança de hábitos dos portugueses em relação à literatura nos últimos anos: o Inquérito às Práticas Culturais, realizado em 2020 pelo Instituto de Ciências Sociais, indicava que 61% dos portugueses não tinham lido qualquer livro nesse último ano.
Comparando os dados atuais com aqueles pré-pandemia, 68% dos compradores afirmam ter comprado o mesmo número (40%) ou até mais livros (28%).
Os jovens são quem está a impulsionar o setor. Os inquiridos entre os 15 e os 34 anos dizem continuar a ter o hábito de comprar livros, sendo quem mais comprou no último ano (28% do total). Em 2022, as compras pela camada mais jovem subiram 44% face ao período pré-pandemia.
Números que comprovam os dados já avançados pelo Expresso, também da GfK, que indicavam que o mercado livreiro atingiu em 2022 o maior volume de faturação desde que os dados começaram a ser auditados, há 15 anos — e foi mesmo o que mais cresceu na Europa no ano passado — graças às camadas mais jovens, quem mais lê no país.
As comunidades de leitores que foram surgindo em redes como o Instagram ou o TikTok foram alavancando o setor. “Talvez se chegue agora aos livros de forma diferente, por exemplo através das redes sociais, mas a verdade é que a compra, leitura e partilha de livros é agora muito comum entre os jovens, o que é extremamente positivo para o futuro da leitura”, diz o presidente da APEL, Pedro Sobral, sobre esta tendência, citado em comunicado.
Para impulsionar estes números, estão a ser pensadas iniciativas como o cheque-livro, plano de consolidação dos hábitos de leitura desenvolvido pelo ministério da Cultura em conjunto com a APEL.
O Governo quer para pôr os mais novos a ler, ao dar a cada jovem que tenha 18 anos feitos em 2023 a “experiência” de “escolher e comprar” pelo menos um livro (o valor final está ainda por revelar). Há também múltiplos projetos a serem levados a cabo por leitores e criadores de conteúdo na internet, de forma a divulgar o que se publica em Portugal.
O ROMANCE DOMINA UM MERCADO ONDE O LIVRO FÍSICO CONTINUA A REINAR
O romance continua a ser o género literário preferido de quem compra livros (69%), seguindo-se o romance histórico (52%). Os livros infantojuvenis continuam a alimentar 50% das compras efetuadas — este segmento foi o que mais vendeu e, dos 15 livros de ficção de maior sucesso em 2022, 10 são populares entre adolescentes e jovens adultos, tinha noticiado o Expresso.
Os livros físicos continuam a dominar, apesar da prevalência das redes sociais para a sua recomendação. Este é o formato privilegiado por quem compra livros, correspondendo a 99% das compras efetuadas, sobretudo, também, em livrarias e lojas físicas (88%). O digital, no entanto, ganha algum terreno: 8% dos leitores compram livros digitais; 39% compram livros - físicos ou digitais - em lojas online.
CLASSES MAIS BAIXAS CONTINUAM COM BAIXO ACESSO A LIVROS
Os números não são todos positivos. Segundo mostram os dados da GfK, as maiores quebras de compra de livros registadas no último ano registaram-se no Porto (-14%), no Litoral (-10%) e no Interior (-10%). 26% destas quebras verificam-se nas classes sociais mais baixas (classes C e D).
Por outro lado, é nos lares com um status social mais elevado (classes A e B) que são comprados mais livros (42%).
O presidente da APEL refere mesmo, em comunicado, que Portugal mantém-se, apesar de todos os indicadores positivos, o “país com os índices de leitura mais baixos da Europa”. No entanto, Pedro Sobral deposita esperança nos indicadores em subida: “estes números trazem-nos esperança no futuro, fazem-nos acreditar que é possível mudar hábitos para as gerações futuras”, diz, referindo que “o aumento da leitura deve ser transversal a todo o país, independentemente da classe económica ou da região do país, por isso democratizar o acesso ao livro deve ser um imperativo nacional”.
MERCADO VALEU 175 MILHÕES EM 2022
No ano passado, o mercado livreiro português valeu cerca de 175 milhões de euros, com um total de 21.115 livros lançados. É dominado por quatro grupos de livrarias em rede, que detêm 80 lojas, “nove retalhistas multiproduto, correspondentes a 1.200 pontos de venda; oito grupos de grande distribuição, com 1.800 pontos de venda, e quatro livrarias únicas”.
O estudo sobre o “Mercado do Livro e Hábitos de Compra em Portugal” foi realizado pela GfK entre os dias 18 de julho e 10 de agosto de 2023 e conta com uma amostra constituída por 1001 pessoas.
O que se sabe sobre a população negra em Portugal?
Rodrigo Tavares, opinião, in Expresso
Na comunicação social praticamente não há colunistas, comentadores ou analistas negros
Portugal não contabiliza a sua população negra com o argumento de que a representação quantitativa étnico-racial poderá legitimar a segregação dessa comunidade e servir de ferramenta de reforço do racismo. Não está isolado. Contrariando recomendações de organismos internacionais, França, Alemanha, Espanha e outros países europeus usam argumentos idênticos.
Um número mais expressivo de países discorda. No Reino Unido os autodeclarados negros representam 4% da população. Na Irlanda 1,5%. No Canadá, 4,3%. No Brasil, 56%. São dados recolhidos em censos. Em 1870, no Senado, o imperador do Brasil D. Pedro II dirigiu-se aos “augustos e digníssimos senhores representantes da nação” para solicitar a “decretação de meios para levar-se a efeito o recenseamento de toda a população do Império”. O primeiro Censo, de 1872, apontou que 58% dos brasileiros autodeclararam-se como “pretos ou pardos”, 38% como brancos e 4% como indígenas.
Em 2018, o governo português criou um grupo de trabalho com especialistas que recomendou a recolha de dados étnico-raciais nos Censos de 2021. Os integrantes sugeriram que fosse dada a oportunidade aos portugueses de responderam se têm origem ou se sentem que pertencem a um grupo descrito como “Negro/Português negro/Afro-descendente/De origem africana.”
Na altura, uma sondagem apontava que 80% dos portugueses estariam a favor da pergunta e que 90% considerava que há discriminação em Portugal. Mas o Instituto Nacional de Estatística barrou a pergunta nos Censos de 2021. Ao jornal brasileiro O Globo, o INE afirmou que anulou a questão “por considerar que a recolha desta informação não é passível de ser efetuada com os níveis de qualidade desejados nesta operação”. Porque não?
A posição do INE alimenta dois problemas. Sem estatísticas, a caneta do Estado fica sem tinta para subscrever políticas públicas, adotar uma intervenção social específica ou fomentar mecanismos potenciadores de igualdade social. Poderíamos ter Rendimento Social de Inserção sem saber quantas pessoas são afetadas pela pobreza? Subsídio de desemprego sem sabermos qual o número de trabalhadores que perderam o emprego? Bolsas de mérito escolar sem sabermos quem são os alunos mais talentosos?
Além disso, ao não dimensionar a população negra para evitar a sua segregação, a mão zeladora do Estado acaba por reforçar a visão de que os negros representam uma comunidade frágil que necessita de proteção. Tenta-se evitar uma segregação ativa por intermédio de uma segregação passiva.
Aliás, três problemas. Reforça-se também a ideia de os portugueses são culturalmente europeus e fenotipicamente brancos, havendo menos espaço sociológico de pertença para todos os que não se identificam com uma tipologia caucasiana de sociedade. Por isso, a militância dos movimentos negros de vários países reivindica que os censos contemplem questões étnico-raciais. Foi assim, com sucesso, nos censos da Argentina de 2021.
À má decisão do INE em 2021 seguiu-se uma boa decisão em 2023. O Instituto decidiu realizar um “Inquérito às Condições, Origens e Trajetórias da População Residente”. A sondagem cobrirá cerca de 35 mil habitações e abordará, entre outras questões, a origem étnico-racial das pessoas que residem em Portugal. A recolha da informação decorreu entre janeiro e maio de 2023 e os resultados serão apresentados em breve. Ainda que seja uma amostra pequena, é um primeiro passo relevante.
No Brasil, o sistema nacional de quotas (de 2012, com a adoção da Lei 12.711), o fortalecimento de leis antiraciais e a intensificação do debate público sobre estas questões, estimulado por centenas de intelectuais e entidades do terceiro setor, têm produzido resultados positivos. A percentagem de alunos “pretos e pardos” matriculados em universidades públicas e privadas atingiu os 48% em 2022. Nos meios de comunicação e principalmente na televisão, a palete social parece estar devidamente representada, do ponto de vista quantitativo e qualitativo, com vários negros a ocuparem espaços de poder, desde protagonistas em novelas, destaque em publicidade ou âncoras dos principais telejornais. Ataques racistas são amplificados e condenados veementemente na imprensa. É o resultado de mais de um século de ativismo negro no país, onde se destacaram líderes como Abdias Nascimento (1914-2011), Lélia Gonzalez (1935-1994), Hamilton Cardoso (1953-1999) ou Sueli Carneiro (1950-).
“O racismo continua a ser estrutural no Brasil, mas o país já está falando mais a respeito do assunto. Esperamos que países como Portugal possam também desenvolver estatísticas e medidas de enfrentamento ao racismo estrutural,” afirmou à coluna a brasileira Luana Génot, fundadora e diretora executiva do Instituto Identidades do Brasil que apoia empresas que queiram adotar ações afirmativas de inclusão de negros e indígenas.
Um estudo recente no Brasil indicou que mulheres e negros na política reduzem a corrupção e aumentam projetos de inclusão. Por exemplo, em cidades comandadas por presidentes de câmara negros, aumento o número de alunos que se candidatam ao ensino superior.
Em Portugal, o debate público, também nesta área, é menos vigoroso do que no Brasil. Apesar de iniciativas como o Afrolink, projetos como o Afrolis, revistas como a Buala, o trabalho académico de muitos investigadores negros como Cristina Roldão, Iolanda Évora ou Inocência da Mata, ou um ativismo negro nas redes sociais que infelizmente ainda não chega ao grande público, a sociedade portuguesa ainda olha para a falta de representatividade étnico-racial com economia de meios e de interesse. A professora Inocência da Mata tem vindo a alertar há anos para a falta de negros na academia portuguesa.
Quando existe, o debate é realizado dentro do ecossistema institucionalizado dos partidos ou feito com batimentos cardíacos acelerados. Sem se sentirem devidamente representados em Portugal, muitos negros procuram referências além-fronteiras. A ativista política americana Angela Davis esgotou o Tivoli BBVA em Lisboa o ano passado. A filósofa brasileira Djamila Ribeiro foi ovacionada como uma celebridade na Fundação Gulbenkian há poucos meses.
Na imprensa portuguesa, praticamente não há colunistas negros. As exceções, no Público, são duas pessoas que escrevem, principalmente, sobre questões étnico-raciais e justiça social. Mas o que pensam os negros portugueses sobre finanças públicas, política externa europeia, ou qualquer outro tema que não singularize a sua origem étnica?
No Brasil, como colunista da Folha de S.Paulo, participei o ano passado na campanha #ciêncianaseleições, uma iniciativa do Instituto Serrapilheira que incentivou os colunistas do jornal a promoverem a ciência brasileira, cedendo o espaço da suas coluna a um investigador ou entrevistando algum académico. Eu entrevistei um especialista em aço verde. Em 2015, o mesmo jornal apoiou a campanha #AgoraÉqueSãoElas, com colunistas homens a cederam os seus espaços a mulheres.
A imprensa portuguesa deveria fazer o mesmo com artigos de autores negros. Eu, e certamente muitos outros colunistas, estaríamos disponíveis para ceder o espaço e os honorários das colunas de opinião e análise.
Na comunicação social praticamente não há colunistas, comentadores ou analistas negros
Portugal não contabiliza a sua população negra com o argumento de que a representação quantitativa étnico-racial poderá legitimar a segregação dessa comunidade e servir de ferramenta de reforço do racismo. Não está isolado. Contrariando recomendações de organismos internacionais, França, Alemanha, Espanha e outros países europeus usam argumentos idênticos.
Um número mais expressivo de países discorda. No Reino Unido os autodeclarados negros representam 4% da população. Na Irlanda 1,5%. No Canadá, 4,3%. No Brasil, 56%. São dados recolhidos em censos. Em 1870, no Senado, o imperador do Brasil D. Pedro II dirigiu-se aos “augustos e digníssimos senhores representantes da nação” para solicitar a “decretação de meios para levar-se a efeito o recenseamento de toda a população do Império”. O primeiro Censo, de 1872, apontou que 58% dos brasileiros autodeclararam-se como “pretos ou pardos”, 38% como brancos e 4% como indígenas.
Em 2018, o governo português criou um grupo de trabalho com especialistas que recomendou a recolha de dados étnico-raciais nos Censos de 2021. Os integrantes sugeriram que fosse dada a oportunidade aos portugueses de responderam se têm origem ou se sentem que pertencem a um grupo descrito como “Negro/Português negro/Afro-descendente/De origem africana.”
Na altura, uma sondagem apontava que 80% dos portugueses estariam a favor da pergunta e que 90% considerava que há discriminação em Portugal. Mas o Instituto Nacional de Estatística barrou a pergunta nos Censos de 2021. Ao jornal brasileiro O Globo, o INE afirmou que anulou a questão “por considerar que a recolha desta informação não é passível de ser efetuada com os níveis de qualidade desejados nesta operação”. Porque não?
A posição do INE alimenta dois problemas. Sem estatísticas, a caneta do Estado fica sem tinta para subscrever políticas públicas, adotar uma intervenção social específica ou fomentar mecanismos potenciadores de igualdade social. Poderíamos ter Rendimento Social de Inserção sem saber quantas pessoas são afetadas pela pobreza? Subsídio de desemprego sem sabermos qual o número de trabalhadores que perderam o emprego? Bolsas de mérito escolar sem sabermos quem são os alunos mais talentosos?
Além disso, ao não dimensionar a população negra para evitar a sua segregação, a mão zeladora do Estado acaba por reforçar a visão de que os negros representam uma comunidade frágil que necessita de proteção. Tenta-se evitar uma segregação ativa por intermédio de uma segregação passiva.
Aliás, três problemas. Reforça-se também a ideia de os portugueses são culturalmente europeus e fenotipicamente brancos, havendo menos espaço sociológico de pertença para todos os que não se identificam com uma tipologia caucasiana de sociedade. Por isso, a militância dos movimentos negros de vários países reivindica que os censos contemplem questões étnico-raciais. Foi assim, com sucesso, nos censos da Argentina de 2021.
À má decisão do INE em 2021 seguiu-se uma boa decisão em 2023. O Instituto decidiu realizar um “Inquérito às Condições, Origens e Trajetórias da População Residente”. A sondagem cobrirá cerca de 35 mil habitações e abordará, entre outras questões, a origem étnico-racial das pessoas que residem em Portugal. A recolha da informação decorreu entre janeiro e maio de 2023 e os resultados serão apresentados em breve. Ainda que seja uma amostra pequena, é um primeiro passo relevante.
No Brasil, o sistema nacional de quotas (de 2012, com a adoção da Lei 12.711), o fortalecimento de leis antiraciais e a intensificação do debate público sobre estas questões, estimulado por centenas de intelectuais e entidades do terceiro setor, têm produzido resultados positivos. A percentagem de alunos “pretos e pardos” matriculados em universidades públicas e privadas atingiu os 48% em 2022. Nos meios de comunicação e principalmente na televisão, a palete social parece estar devidamente representada, do ponto de vista quantitativo e qualitativo, com vários negros a ocuparem espaços de poder, desde protagonistas em novelas, destaque em publicidade ou âncoras dos principais telejornais. Ataques racistas são amplificados e condenados veementemente na imprensa. É o resultado de mais de um século de ativismo negro no país, onde se destacaram líderes como Abdias Nascimento (1914-2011), Lélia Gonzalez (1935-1994), Hamilton Cardoso (1953-1999) ou Sueli Carneiro (1950-).
“O racismo continua a ser estrutural no Brasil, mas o país já está falando mais a respeito do assunto. Esperamos que países como Portugal possam também desenvolver estatísticas e medidas de enfrentamento ao racismo estrutural,” afirmou à coluna a brasileira Luana Génot, fundadora e diretora executiva do Instituto Identidades do Brasil que apoia empresas que queiram adotar ações afirmativas de inclusão de negros e indígenas.
Um estudo recente no Brasil indicou que mulheres e negros na política reduzem a corrupção e aumentam projetos de inclusão. Por exemplo, em cidades comandadas por presidentes de câmara negros, aumento o número de alunos que se candidatam ao ensino superior.
Em Portugal, o debate público, também nesta área, é menos vigoroso do que no Brasil. Apesar de iniciativas como o Afrolink, projetos como o Afrolis, revistas como a Buala, o trabalho académico de muitos investigadores negros como Cristina Roldão, Iolanda Évora ou Inocência da Mata, ou um ativismo negro nas redes sociais que infelizmente ainda não chega ao grande público, a sociedade portuguesa ainda olha para a falta de representatividade étnico-racial com economia de meios e de interesse. A professora Inocência da Mata tem vindo a alertar há anos para a falta de negros na academia portuguesa.
Quando existe, o debate é realizado dentro do ecossistema institucionalizado dos partidos ou feito com batimentos cardíacos acelerados. Sem se sentirem devidamente representados em Portugal, muitos negros procuram referências além-fronteiras. A ativista política americana Angela Davis esgotou o Tivoli BBVA em Lisboa o ano passado. A filósofa brasileira Djamila Ribeiro foi ovacionada como uma celebridade na Fundação Gulbenkian há poucos meses.
Na imprensa portuguesa, praticamente não há colunistas negros. As exceções, no Público, são duas pessoas que escrevem, principalmente, sobre questões étnico-raciais e justiça social. Mas o que pensam os negros portugueses sobre finanças públicas, política externa europeia, ou qualquer outro tema que não singularize a sua origem étnica?
No Brasil, como colunista da Folha de S.Paulo, participei o ano passado na campanha #ciêncianaseleições, uma iniciativa do Instituto Serrapilheira que incentivou os colunistas do jornal a promoverem a ciência brasileira, cedendo o espaço da suas coluna a um investigador ou entrevistando algum académico. Eu entrevistei um especialista em aço verde. Em 2015, o mesmo jornal apoiou a campanha #AgoraÉqueSãoElas, com colunistas homens a cederam os seus espaços a mulheres.
A imprensa portuguesa deveria fazer o mesmo com artigos de autores negros. Eu, e certamente muitos outros colunistas, estaríamos disponíveis para ceder o espaço e os honorários das colunas de opinião e análise.
Mais de 30 mil pessoas já beneficiaram das novas licenças parentais
Isabel Patrício, in ECO
As novas licenças parentais, previstas no âmbito da Agenda do Trabalho Digno, já chegaram a mais de 30 mil pessoas, segundo o Ministério do Trabalho.
Mais de 30 mil pessoas já beneficiaram das novas licenças de parentalidade, que dão mais tempo aos pais e aumentam o valor do subsídio atribuído, quando há partilha entre os progenitores. O número foi avançado esta quinta-feira pelo Ministério do Trabalho.
“Mais de 30 mil pessoas já foram abrangidas pelas novas licenças de parentalidade previstas na Agenda do Trabalho Digno“, informou o gabinete de Ana Mendes Godinho, referindo-se às novas regras que entraram em vigor em maio.
Em maior detalhe, das 30 mil pessoas que já beneficiaram das alterações em causa, 307 foram abrangidas pelo subsídio parental inicial, que passou de 83% para 90% da remuneração, quando ambos os progenitores gozem de, pelo menos, 60 dias em exclusivo com o filho.
Por outro lado, cerca de oito mil pais já beneficiaram da licença parental alargada, com um aumento do respetivo subsídio. “Estes pais passaram a receber 30% da remuneração (era 25%), nos três meses de acréscimo à licença inicial, passando este valor para 40% no caso de partilha da licença (três meses cada)”, explica o Governo.
Mas a mudança que mais impacto teve foi o pagamento a 100% da remuneração nos 28 dias obrigatórios e sete facultativos do subsídio parental inicial exclusivo do pai: 25.432 pessoas já beneficiaram desta medida.
Estas mudanças nas licenças parentais fazem parte da chamada Agenda do Trabalho Digno, um pacote de alterações à lei laboral que entraram em vigor a 1 de maio. Um dos objetivos destas novas licenças é incentivar a igual participação na parentalidade entre elas e eles.
Notícia atualizada às 16h09
As novas licenças parentais, previstas no âmbito da Agenda do Trabalho Digno, já chegaram a mais de 30 mil pessoas, segundo o Ministério do Trabalho.
Mais de 30 mil pessoas já beneficiaram das novas licenças de parentalidade, que dão mais tempo aos pais e aumentam o valor do subsídio atribuído, quando há partilha entre os progenitores. O número foi avançado esta quinta-feira pelo Ministério do Trabalho.
“Mais de 30 mil pessoas já foram abrangidas pelas novas licenças de parentalidade previstas na Agenda do Trabalho Digno“, informou o gabinete de Ana Mendes Godinho, referindo-se às novas regras que entraram em vigor em maio.
Em maior detalhe, das 30 mil pessoas que já beneficiaram das alterações em causa, 307 foram abrangidas pelo subsídio parental inicial, que passou de 83% para 90% da remuneração, quando ambos os progenitores gozem de, pelo menos, 60 dias em exclusivo com o filho.
Por outro lado, cerca de oito mil pais já beneficiaram da licença parental alargada, com um aumento do respetivo subsídio. “Estes pais passaram a receber 30% da remuneração (era 25%), nos três meses de acréscimo à licença inicial, passando este valor para 40% no caso de partilha da licença (três meses cada)”, explica o Governo.
Mas a mudança que mais impacto teve foi o pagamento a 100% da remuneração nos 28 dias obrigatórios e sete facultativos do subsídio parental inicial exclusivo do pai: 25.432 pessoas já beneficiaram desta medida.
Estas mudanças nas licenças parentais fazem parte da chamada Agenda do Trabalho Digno, um pacote de alterações à lei laboral que entraram em vigor a 1 de maio. Um dos objetivos destas novas licenças é incentivar a igual participação na parentalidade entre elas e eles.
Notícia atualizada às 16h09
“A que preço é que os pobres vão comer a sopa?” Inflação volta a aumentar em agosto para os 3,7%
in CNN
A inflação voltou a subir em agosto para os 3,7%, muito por causa dos combustíveis. A complicar as contas das famílias, a alimentação também sobe 6,5%.
A inflação voltou a subir em agosto para os 3,7%, muito por causa dos combustíveis. A complicar as contas das famílias, a alimentação também sobe 6,5%.
Zona euro com 6,4% de taxa de desemprego em julho
Ivone Gravato, in Lusa
Bruxelas, 31 ago 2023 (Lusa) – A taxa de desemprego na zona euro foi, em julho, de 6,4% e na União Europeia (UE) de 5,9%, segundo dados hoje divulgados pelo Eurostat.
De acordo com o serviço estatístico europeu, a taxa de desemprego abrandou face à de julho de 2022 em ambas as zonas – 6,7% nos países do euro e 6,1% no conjunto dos 27 Estados-membros – mantendo-se estável na comparação em cadeia.
O Eurostat estima que, em julho, havia 12.928 milhões de desempregados na UE, dos quais, 10.944 milhões na zona euro.
IG // ALU
Lusa/fim
Bruxelas, 31 ago 2023 (Lusa) – A taxa de desemprego na zona euro foi, em julho, de 6,4% e na União Europeia (UE) de 5,9%, segundo dados hoje divulgados pelo Eurostat.
De acordo com o serviço estatístico europeu, a taxa de desemprego abrandou face à de julho de 2022 em ambas as zonas – 6,7% nos países do euro e 6,1% no conjunto dos 27 Estados-membros – mantendo-se estável na comparação em cadeia.
O Eurostat estima que, em julho, havia 12.928 milhões de desempregados na UE, dos quais, 10.944 milhões na zona euro.
IG // ALU
Lusa/fim
Centenas de professores obrigados a apresentar-se em escolas onde não vão ficar
Clara Viana, in Público
Serão quase 600 os professores que vão percorrer centenas de quilómetros para se apresentarem em escolas onde não darão aulas. Ministério diz que é a forma de garantir o vencimento de Setembro.
Por imposição legal, centenas de docentes do ensino básico e secundário vão iniciar, nesta sexta-feira, a sua “nova” vida como professores do quadro do mesmo modo de quando eram contratados – a calcorrear o país. É o que vai acontecer, por exemplo, a Anaísa Mateus, professora de Matemática: vai percorrer cerca de 320 quilómetros, de Vila Nova de Gaia, onde reside, até Queluz, no concelho de Sintra, porque tem de se apresentar aí numa escola onde não irá dar aulas neste ano lectivo que está prestes a começar.
Outros estarão a fazer o dobro do caminho, do norte até ao Algarve, para cumprir a mesma obrigação. Sendo que nos próximos dias, se não mesmo nesta sexta-feira, farão o caminho de regresso para voltarem a apresentar-se noutra escola, onde ficarão colocados até ao final do ano lectivo.
Para a classe docente, o ano escolar começa já nesta sexta-feira, 1 de Setembro. Determina a legislação que rege os concursos de professores que os docentes de carreira ainda sem colocação ou serviço atribuído terão de se apresentar, no primeiro dia útil de Setembro, “no último agrupamento de escolas onde exerceram funções para aguardar nova colocação”.
Em respostas ao PÚBLICO, o Ministério da Educação destaca que “esta regra, que está fixada há muitos anos em todos os diplomas de concursos de docentes, salvaguarda o processamento de vencimento no mês de Setembro”.
Muitos dos que estarão em peregrinação, nesta sexta-feira, são professores que entraram agora na carreira ao abrigo do novo mecanismo de “vinculação dinâmica”, mas que não obtiveram colocação numa escola no concurso de mobilidade interna, destinado aos professores do quadro e cujos resultados foram conhecidos na semana passada.
"Um absurdo"
Neste concurso não foram colocados cerca de 30% (1637) dos 5606 que entraram no quadro por aquela via. Todos os que ainda não têm lugar numa escola estão vinculados em regiões a norte de Lisboa. Entre estes, segundo cálculos publicados no blogue de Arlindo Ferreira, especialista em estatísticas da educação, contam-se 590 que, em 2022/2023, deram aulas em escolas a centenas de quilómetros de casa e onde terão de marcar presença nesta sexta-feira.
“É um desperdício de tempo e dinheiro. Até pode acontecer que esteja a ir para Lisboa já sabendo que fui colocada noutra escola, perto de casa. É um absurdo”, comenta Anaísa Mateus, que no ano lectivo passado deu aulas no Agrupamento de Escolas Queluz-Belas, mas que, entretanto, ficou vinculada ao QZP 1 (Norte litoral).
É o que se passa com todos os docentes da vinculação dinâmica: mesmo os que ainda não têm lugar numa escola, estão já vinculados a um dos dez Quadros de Zona Pedagógica existentes. E será na região onde se vincularam que esperam vir a ser colocados, o que pode já acontecer nos dois concursos nacionais (reservas de recrutamento) marcados para os dias 1 e 8 de Setembro.
Apesar de já estarem no quadro, esta é mesmo a única garantia que têm: neste ano lectivo ficarão no QZP onde se vincularam. Já no próximo, como determina a nova legislação dos concursos aprovada neste ano, terão de concorrer a todo o país.
Anaísa Mateus, de 35 anos, sabe ao que foi: “Vou estar um ano mais perto de casa [Vila Nova de Gaia], mas não tenho nenhuma expectativa de depois voltar a ser colocada no Norte. Já me mentalizei que vai ser assim por muitos anos porque a grande falta de professores faz-se sentir a sul, sobretudo na região de Lisboa”.
Foi a perspectiva desta migração que levou a que ficassem por preencher cerca de 30% das 8233 vagas abertas para a vinculação dinâmica. Isto quer dizer que 2627 professores com os requisitos para entrar no quadro preferiram continuar a contrato e poder escolher assim escolas mais perto de casa.
E o que a levou então Anabela a concorrer à vinculação dinâmica? “Antes já tinha de concorrer a todo o país, por isso não tinha nada a perder. Pelo menos já não sou professora contratada, basicamente é isso.”
Serão quase 600 os professores que vão percorrer centenas de quilómetros para se apresentarem em escolas onde não darão aulas. Ministério diz que é a forma de garantir o vencimento de Setembro.
Por imposição legal, centenas de docentes do ensino básico e secundário vão iniciar, nesta sexta-feira, a sua “nova” vida como professores do quadro do mesmo modo de quando eram contratados – a calcorrear o país. É o que vai acontecer, por exemplo, a Anaísa Mateus, professora de Matemática: vai percorrer cerca de 320 quilómetros, de Vila Nova de Gaia, onde reside, até Queluz, no concelho de Sintra, porque tem de se apresentar aí numa escola onde não irá dar aulas neste ano lectivo que está prestes a começar.
Outros estarão a fazer o dobro do caminho, do norte até ao Algarve, para cumprir a mesma obrigação. Sendo que nos próximos dias, se não mesmo nesta sexta-feira, farão o caminho de regresso para voltarem a apresentar-se noutra escola, onde ficarão colocados até ao final do ano lectivo.
Para a classe docente, o ano escolar começa já nesta sexta-feira, 1 de Setembro. Determina a legislação que rege os concursos de professores que os docentes de carreira ainda sem colocação ou serviço atribuído terão de se apresentar, no primeiro dia útil de Setembro, “no último agrupamento de escolas onde exerceram funções para aguardar nova colocação”.
Em respostas ao PÚBLICO, o Ministério da Educação destaca que “esta regra, que está fixada há muitos anos em todos os diplomas de concursos de docentes, salvaguarda o processamento de vencimento no mês de Setembro”.
Muitos dos que estarão em peregrinação, nesta sexta-feira, são professores que entraram agora na carreira ao abrigo do novo mecanismo de “vinculação dinâmica”, mas que não obtiveram colocação numa escola no concurso de mobilidade interna, destinado aos professores do quadro e cujos resultados foram conhecidos na semana passada.
"Um absurdo"
Neste concurso não foram colocados cerca de 30% (1637) dos 5606 que entraram no quadro por aquela via. Todos os que ainda não têm lugar numa escola estão vinculados em regiões a norte de Lisboa. Entre estes, segundo cálculos publicados no blogue de Arlindo Ferreira, especialista em estatísticas da educação, contam-se 590 que, em 2022/2023, deram aulas em escolas a centenas de quilómetros de casa e onde terão de marcar presença nesta sexta-feira.
“É um desperdício de tempo e dinheiro. Até pode acontecer que esteja a ir para Lisboa já sabendo que fui colocada noutra escola, perto de casa. É um absurdo”, comenta Anaísa Mateus, que no ano lectivo passado deu aulas no Agrupamento de Escolas Queluz-Belas, mas que, entretanto, ficou vinculada ao QZP 1 (Norte litoral).
É o que se passa com todos os docentes da vinculação dinâmica: mesmo os que ainda não têm lugar numa escola, estão já vinculados a um dos dez Quadros de Zona Pedagógica existentes. E será na região onde se vincularam que esperam vir a ser colocados, o que pode já acontecer nos dois concursos nacionais (reservas de recrutamento) marcados para os dias 1 e 8 de Setembro.
Apesar de já estarem no quadro, esta é mesmo a única garantia que têm: neste ano lectivo ficarão no QZP onde se vincularam. Já no próximo, como determina a nova legislação dos concursos aprovada neste ano, terão de concorrer a todo o país.
Anaísa Mateus, de 35 anos, sabe ao que foi: “Vou estar um ano mais perto de casa [Vila Nova de Gaia], mas não tenho nenhuma expectativa de depois voltar a ser colocada no Norte. Já me mentalizei que vai ser assim por muitos anos porque a grande falta de professores faz-se sentir a sul, sobretudo na região de Lisboa”.
Foi a perspectiva desta migração que levou a que ficassem por preencher cerca de 30% das 8233 vagas abertas para a vinculação dinâmica. Isto quer dizer que 2627 professores com os requisitos para entrar no quadro preferiram continuar a contrato e poder escolher assim escolas mais perto de casa.
E o que a levou então Anabela a concorrer à vinculação dinâmica? “Antes já tinha de concorrer a todo o país, por isso não tinha nada a perder. Pelo menos já não sou professora contratada, basicamente é isso.”
[artigo disponível na íntegra só para assinantes]
No próximo ano voltam a existir 2400 lugares para o internato médico. Governo já fixou vagas
Patrícia Carvalho, in Público
Acesso à formação geral do internato médico é feito por concurso único.
O Governo volta a fixar em 2400 o número de vagas para o internato geral médico disponíveis no próximo ano. A decisão foi publicada esta quinta-feira em Diário da República, num despacho conjunto da Presidência do Conselho de Ministros, do Ministério das Finanças e das secretarias de Estado da Saúde e da Administração Pública.
Em comunicado, o Ministério da Saúde refere que a formação geral do internato médico em causa começa em Janeiro, “nos hospitais e centros de saúde de todo o país”. Depois deste ano de formação geral, os médicos podem escolher a área de especialização que pretendem, e que implicará o cumprimento de um novo internato, já diferenciado, e que pode durar entre quatro a seis anos.
No ano passado também tinha sido fixado o número de 2400 vagas para a formação geral do internato médico. Para poderem ocupar uma destas vagas, os médicos em formação terão de se candidatar, aquando da abertura de um concurso único que será aberto pela Administração Central do Sistema de Saúde.
O ministério dirigido por Manuel Pizarro refere, no comunicado agora divulgado, que a abertura destas vagas assegura “a prossecução de um adequado planeamento de recursos humanos para responder às necessidades presentes e futuras do sistema público de saúde com segurança e previsibilidade, com o objectivo de garantir que o SNS [Serviço Nacional de Saúde] conta com o número de médicos adequado para responder com qualidade e em proximidade às pessoas”.
O SNS tem enfrentado diversos problemas e, este ano, pela primeira vez, os médicos internos realizaram uma greve em nome próprio, ao longo de dois dias, que, segundo o Sindicato Independente dos Médicos, teve uma adesão acima dos 85%.
No próximo ano voltam a existir 2400 lugares para o internato médico. Governo já fixou vagaAlém da baixa remuneração oferecida e das horas extraordinárias em excesso, vários médicos internos ouvidos pelo PÚBLICO diziam temer pela qualidade da sua formação, pela incapacidade do SNS em reter os especialistas que os devem orientar.
Este ano, o número de alunos colocados em Medicina, na 1.ª fase de candidaturas ao ensino superior, foi o maior de sempre, fixando-se em 1595, mais 56 do que no ano anterior.
O Governo volta a fixar em 2400 o número de vagas para o internato geral médico disponíveis no próximo ano. A decisão foi publicada esta quinta-feira em Diário da República, num despacho conjunto da Presidência do Conselho de Ministros, do Ministério das Finanças e das secretarias de Estado da Saúde e da Administração Pública.
Em comunicado, o Ministério da Saúde refere que a formação geral do internato médico em causa começa em Janeiro, “nos hospitais e centros de saúde de todo o país”. Depois deste ano de formação geral, os médicos podem escolher a área de especialização que pretendem, e que implicará o cumprimento de um novo internato, já diferenciado, e que pode durar entre quatro a seis anos.
No ano passado também tinha sido fixado o número de 2400 vagas para a formação geral do internato médico. Para poderem ocupar uma destas vagas, os médicos em formação terão de se candidatar, aquando da abertura de um concurso único que será aberto pela Administração Central do Sistema de Saúde.
O ministério dirigido por Manuel Pizarro refere, no comunicado agora divulgado, que a abertura destas vagas assegura “a prossecução de um adequado planeamento de recursos humanos para responder às necessidades presentes e futuras do sistema público de saúde com segurança e previsibilidade, com o objectivo de garantir que o SNS [Serviço Nacional de Saúde] conta com o número de médicos adequado para responder com qualidade e em proximidade às pessoas”.
O SNS tem enfrentado diversos problemas e, este ano, pela primeira vez, os médicos internos realizaram uma greve em nome próprio, ao longo de dois dias, que, segundo o Sindicato Independente dos Médicos, teve uma adesão acima dos 85%.
No próximo ano voltam a existir 2400 lugares para o internato médico. Governo já fixou vagaAlém da baixa remuneração oferecida e das horas extraordinárias em excesso, vários médicos internos ouvidos pelo PÚBLICO diziam temer pela qualidade da sua formação, pela incapacidade do SNS em reter os especialistas que os devem orientar.
Este ano, o número de alunos colocados em Medicina, na 1.ª fase de candidaturas ao ensino superior, foi o maior de sempre, fixando-se em 1595, mais 56 do que no ano anterior.
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Preço do material escolar aumentou 14% face ao ano passado
Por Lusa, in Observador
O preço médio de um conjunto de materiais escolares essenciais registou um aumento de 14% face ao período homólogo de 2022. Confap relembra que a inflação atingiu todos os setores económicos.
O preço do material escolar voltou a aumentar este ano e um cabaz de oito artigos essenciais para os alunos custa agora mais 14% do que em 2022, segundo uma plataforma de comparação de preços.
A conclusão divulgada esta quinta-feira é da plataforma KuantoKusta, que analisou o preço médio de um conjunto de itens escolares, que incluem lápis, esferográficas, cadernos, mochilas, estojos, compassos, calculadoras científicas e pen-drives.
O custo médio do cabaz para um aluno do 2.º ciclo atingiu 122,58 euros a 27 de agosto deste ano, um acréscimo de 15,22 euros em relação ao mesmo período de 2022, quando o custo era de 107,36 euros”, refere a plataforma em comunicado.
De acordo com a análise do KuantoKusta, comprar novo material escolar para os alunos está este ano 14,2% mais caro do que em 2022, registando-se um aumento de cerca de 33% face a 2021.
Entre os vários artigos que compõem o cabaz, a maior diferença é no preço das esferográficas, cerca de 57,9% mais caras, destacando-se também os compassos (mais 19,8%), os estojos (mais 18,5%) e as calculadoras científicas (18,4%).
Do lado das famílias, o aumento dos preços é sentido “a todos os níveis” e o material escolar não é exceção, explicou a presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap) à agência Lusa.
“Há muitos materiais que são de facto indispensáveis e têm de ser as famílias a arcar com esses custos”, referiu, recordando que, apesar de algumas autarquias apoiarem os alunos mais carenciados com a disponibilização de alguns desses materiais, “todas as famílias deveriam ter a mesma oportunidade”.
De acordo com o KuantoKusta, uma forma de tentar minimizar esses custos pode passar por comparar os preços mais baixos para cada artigo, um exercício que pode permitir poupar até 21 euros.
O período de regresso às aulas é marcado por campanhas e promoções, sendo sempre importante acompanhar a evolução dos preços e aproveitar as oportunidades de poupança que vão surgindo”, explica Ana Rego, da equipa de marketing da plataforma.
A estratégia já é adotada pelas famílias, que muitas vezes recorrem às promoções feitas por altura do regresso às aulas pelas grandes superfícies. Mas, nesse caso, lamenta a presidente da Confap, as despesas não são dedutíveis em sede de IRS.
Nem sequer há a possibilidade de reembolso. Devia, pelo menos, haver uma estratégia para que fosse assegurado algum retorno financeiro no IRS, o que, nesses casos, não acontece”, defendeu.
Para algumas famílias, à despesa habitual com o restante material escolar, acresce, este ano, a despesa com a compra de manuais escolares novos, por terem sido informadas pelas escolas de que os alunos que chegam agora ao 4.º ano iriam perder o direito ao voucher que permite ter novos manuais gratuitos porque os livros entregues estavam escritos ou riscados.
Apesar de o Ministério da Educação ter entretanto decidido abrir um período excecional para correções na atribuição dos vouchers, muitos pais já tinham comprado os livros para o próximo ano, explicou a dirigente da Confap.
O preço médio de um conjunto de materiais escolares essenciais registou um aumento de 14% face ao período homólogo de 2022. Confap relembra que a inflação atingiu todos os setores económicos.
O preço do material escolar voltou a aumentar este ano e um cabaz de oito artigos essenciais para os alunos custa agora mais 14% do que em 2022, segundo uma plataforma de comparação de preços.
A conclusão divulgada esta quinta-feira é da plataforma KuantoKusta, que analisou o preço médio de um conjunto de itens escolares, que incluem lápis, esferográficas, cadernos, mochilas, estojos, compassos, calculadoras científicas e pen-drives.
O custo médio do cabaz para um aluno do 2.º ciclo atingiu 122,58 euros a 27 de agosto deste ano, um acréscimo de 15,22 euros em relação ao mesmo período de 2022, quando o custo era de 107,36 euros”, refere a plataforma em comunicado.
De acordo com a análise do KuantoKusta, comprar novo material escolar para os alunos está este ano 14,2% mais caro do que em 2022, registando-se um aumento de cerca de 33% face a 2021.
Entre os vários artigos que compõem o cabaz, a maior diferença é no preço das esferográficas, cerca de 57,9% mais caras, destacando-se também os compassos (mais 19,8%), os estojos (mais 18,5%) e as calculadoras científicas (18,4%).
Do lado das famílias, o aumento dos preços é sentido “a todos os níveis” e o material escolar não é exceção, explicou a presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap) à agência Lusa.
“Há muitos materiais que são de facto indispensáveis e têm de ser as famílias a arcar com esses custos”, referiu, recordando que, apesar de algumas autarquias apoiarem os alunos mais carenciados com a disponibilização de alguns desses materiais, “todas as famílias deveriam ter a mesma oportunidade”.
De acordo com o KuantoKusta, uma forma de tentar minimizar esses custos pode passar por comparar os preços mais baixos para cada artigo, um exercício que pode permitir poupar até 21 euros.
O período de regresso às aulas é marcado por campanhas e promoções, sendo sempre importante acompanhar a evolução dos preços e aproveitar as oportunidades de poupança que vão surgindo”, explica Ana Rego, da equipa de marketing da plataforma.
A estratégia já é adotada pelas famílias, que muitas vezes recorrem às promoções feitas por altura do regresso às aulas pelas grandes superfícies. Mas, nesse caso, lamenta a presidente da Confap, as despesas não são dedutíveis em sede de IRS.
Nem sequer há a possibilidade de reembolso. Devia, pelo menos, haver uma estratégia para que fosse assegurado algum retorno financeiro no IRS, o que, nesses casos, não acontece”, defendeu.
Para algumas famílias, à despesa habitual com o restante material escolar, acresce, este ano, a despesa com a compra de manuais escolares novos, por terem sido informadas pelas escolas de que os alunos que chegam agora ao 4.º ano iriam perder o direito ao voucher que permite ter novos manuais gratuitos porque os livros entregues estavam escritos ou riscados.
Apesar de o Ministério da Educação ter entretanto decidido abrir um período excecional para correções na atribuição dos vouchers, muitos pais já tinham comprado os livros para o próximo ano, explicou a dirigente da Confap.
Queijo, carapau e massas foram os produtos “IVA zero” que mais subiram na última semana
Joana Morais Fonseca, in ECO
Na última semana, o cabaz monitorizado pela Deco de produtos "IVA zero" ficou 22 cêntimos mais barato. Queijo, carapau, massas e arroz agulha foram os produtos que mais subiram de preço.
O preço do cabaz de bens essenciais de um conjunto de produtos alimentares abrangidos pelo “IVA zero” voltou a ficar ligeiramente mais barato na última semana, tendo registado uma descida de 22 cêntimos, passando a custar 127,75 euros, segundo os cálculos da Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor (Deco).
Em causa está a monitorização de 41 dos 46 alimentos — que inclui o peru, frango, carapau, pescada, cebola, batata, cenoura, banana, maçã, laranja, arroz, esparguete, açúcar, leite, queijo ou manteiga –, que desde 18 de abril passaram a estar isentos de IVA, na sequência do acordo tripartido entre Governo, distribuição e produção.
Se a 23 de agosto o cabaz “IVA zero” monitorizado pela Deco custava 127,97 euros, esta quarta-feira custava 127,75 euros. Contas feitas, trata-se de uma redução de apenas 22 cêntimos (-0,17%). De notar que, no que toca ao mês de agosto, semanalmente o preço deste cabaz tem oscilado entre subidas e descidas. Esta quinta-feira, o INE adiantou que a taxa de inflação terá acelerado para 3,7% em agosto, após nove meses a abrandar, à boleia dos preços dos combustíveis.
Já se a comparação for feita com o dia anterior ao arranque da medida, 17 de abril, a diferença é mais expressiva: nesse período o cabaz monitorizado pela Deco ficou cerca de 11 euros mais barato, o que se traduz numa quebra de cerca de 8%.
Queijo, carapau, massa e arroz tiveram as maiores subidas
Na última semana, o queijo curado fatiado embalado foi o produto que mais subiu de preço, tendo registado um aumento de 9% (mais 20 cêntimos) face à semana anterior. Seguiu-se o carapau (+8%), as massas espirais e o arroz agulha (ambos +5%), a cenoura (+4%), o esparguete, a cebola, a carne de novilho para cozer e a maça gala (todos +3%) e a carne de lombo de porco sem osso (+2%).
Já no que respeita às categorias de produtos, os congelados foram a categoria de produto que mais beneficiou com a entrada em vigor desta medida, dado que uma cesta deste produto recuou 17,32% (menos 62 cêntimos), passando a custar 2,97 euros. Segue-se o peixe, que baixou 12,57% (menos 4,38 euros), para 30,49 euros; a mercearia cujo preço recuou 8,18% (menos 1,82 euros), passando a custar 20,47 euros; os laticínios, que baixaram 7,58% (menos 1,07 euros) para 13,03 euros; a carne, que desceu 5,50% (menos 2,25 euros) para 38,64 euros; e, por fim, as frutas e legumes, cuja cesta recuou 3,81% (menos 88 cêntimos), passando a custar 22,15 euros.
Paralelamente, a Deco faz ainda a monitorização ao habitual cabaz de bens essenciais, que engloba 63 produtos e que inclui alguns produtos também abrangidos pelo “IVA zero”. Na última semana, este cabaz estabilizou, tendo ficado apenas um cêntimo mais barato e passado a custar 211,93 euros. Já se a comparação for feita com o início deste ano ficou cerca de seis euros mais barato (-2,77%).
Na última semana, o cabaz monitorizado pela Deco de produtos "IVA zero" ficou 22 cêntimos mais barato. Queijo, carapau, massas e arroz agulha foram os produtos que mais subiram de preço.
O preço do cabaz de bens essenciais de um conjunto de produtos alimentares abrangidos pelo “IVA zero” voltou a ficar ligeiramente mais barato na última semana, tendo registado uma descida de 22 cêntimos, passando a custar 127,75 euros, segundo os cálculos da Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor (Deco).
Em causa está a monitorização de 41 dos 46 alimentos — que inclui o peru, frango, carapau, pescada, cebola, batata, cenoura, banana, maçã, laranja, arroz, esparguete, açúcar, leite, queijo ou manteiga –, que desde 18 de abril passaram a estar isentos de IVA, na sequência do acordo tripartido entre Governo, distribuição e produção.
Se a 23 de agosto o cabaz “IVA zero” monitorizado pela Deco custava 127,97 euros, esta quarta-feira custava 127,75 euros. Contas feitas, trata-se de uma redução de apenas 22 cêntimos (-0,17%). De notar que, no que toca ao mês de agosto, semanalmente o preço deste cabaz tem oscilado entre subidas e descidas. Esta quinta-feira, o INE adiantou que a taxa de inflação terá acelerado para 3,7% em agosto, após nove meses a abrandar, à boleia dos preços dos combustíveis.
Já se a comparação for feita com o dia anterior ao arranque da medida, 17 de abril, a diferença é mais expressiva: nesse período o cabaz monitorizado pela Deco ficou cerca de 11 euros mais barato, o que se traduz numa quebra de cerca de 8%.
Queijo, carapau, massa e arroz tiveram as maiores subidas
Na última semana, o queijo curado fatiado embalado foi o produto que mais subiu de preço, tendo registado um aumento de 9% (mais 20 cêntimos) face à semana anterior. Seguiu-se o carapau (+8%), as massas espirais e o arroz agulha (ambos +5%), a cenoura (+4%), o esparguete, a cebola, a carne de novilho para cozer e a maça gala (todos +3%) e a carne de lombo de porco sem osso (+2%).
Já no que respeita às categorias de produtos, os congelados foram a categoria de produto que mais beneficiou com a entrada em vigor desta medida, dado que uma cesta deste produto recuou 17,32% (menos 62 cêntimos), passando a custar 2,97 euros. Segue-se o peixe, que baixou 12,57% (menos 4,38 euros), para 30,49 euros; a mercearia cujo preço recuou 8,18% (menos 1,82 euros), passando a custar 20,47 euros; os laticínios, que baixaram 7,58% (menos 1,07 euros) para 13,03 euros; a carne, que desceu 5,50% (menos 2,25 euros) para 38,64 euros; e, por fim, as frutas e legumes, cuja cesta recuou 3,81% (menos 88 cêntimos), passando a custar 22,15 euros.
Paralelamente, a Deco faz ainda a monitorização ao habitual cabaz de bens essenciais, que engloba 63 produtos e que inclui alguns produtos também abrangidos pelo “IVA zero”. Na última semana, este cabaz estabilizou, tendo ficado apenas um cêntimo mais barato e passado a custar 211,93 euros. Já se a comparação for feita com o início deste ano ficou cerca de seis euros mais barato (-2,77%).
Marcelo manifesta-se contra racismo e xenofobia para assinalar data internacional
Por Lusa, in SIC
Para o Presidente da República não é aceitável "a visão que infelizmente alguns ainda têm sobre origens ou cores de pele".
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, assinalou esta quinta-feira o Dia Internacional das Pessoas Afrodescendentes, rejeitando a visão que "infelizmente alguns ainda têm sobre origens ou cores de pele" e manifestando-se contra o racismo e a xenofobia.
Numa nota publicada no sítio da Presidência da República para assinalar este dia, Marcelo Rebelo de Sousa afirmou que "todos os dias devem ser dias das pessoas de todas as descendências, sem discriminações de qualquer tipo".
"Todos os dias é tempo de afirmar a igualdade de oportunidades e o direito e a obrigação de um tratamento digno de todos", enfatizou.
Para o Presidente da República não é aceitável "a visão que infelizmente alguns ainda têm sobre origens ou cores de pele".
"Basta de tais divisões, todos merecem o respeito de todos, todos somos cidadãos com os mesmos direitos e os mesmos deveres", apelou.
Assim, no Dia Internacional das Pessoas Afrodescendentes, o chefe de Estado "vem uma vez mais lembrar estes princípios essenciais" da sociedade "contra o racismo e a xenofobia, pelo acesso de todos a uma vida melhor".
O Dia Internacional dos Afrodescendentes celebra-se anualmente a 31 de agosto, e foi proclamado por resolução da Assembleia Geral da ONU, em junho de 2020.
Para o Presidente da República não é aceitável "a visão que infelizmente alguns ainda têm sobre origens ou cores de pele".
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, assinalou esta quinta-feira o Dia Internacional das Pessoas Afrodescendentes, rejeitando a visão que "infelizmente alguns ainda têm sobre origens ou cores de pele" e manifestando-se contra o racismo e a xenofobia.
Numa nota publicada no sítio da Presidência da República para assinalar este dia, Marcelo Rebelo de Sousa afirmou que "todos os dias devem ser dias das pessoas de todas as descendências, sem discriminações de qualquer tipo".
"Todos os dias é tempo de afirmar a igualdade de oportunidades e o direito e a obrigação de um tratamento digno de todos", enfatizou.
Para o Presidente da República não é aceitável "a visão que infelizmente alguns ainda têm sobre origens ou cores de pele".
"Basta de tais divisões, todos merecem o respeito de todos, todos somos cidadãos com os mesmos direitos e os mesmos deveres", apelou.
Assim, no Dia Internacional das Pessoas Afrodescendentes, o chefe de Estado "vem uma vez mais lembrar estes princípios essenciais" da sociedade "contra o racismo e a xenofobia, pelo acesso de todos a uma vida melhor".
O Dia Internacional dos Afrodescendentes celebra-se anualmente a 31 de agosto, e foi proclamado por resolução da Assembleia Geral da ONU, em junho de 2020.
PRR: Governo não vai recorrer a mais empréstimos da ‘bazuca’ europeia
Joana Nunes Mateus jornalista, in Expresso
Prazo para pedir mais dinheiro no âmbito do Mecanismo de Recuperação e Resiliência terminava esta quinta-feira. Governo decidiu trabalhar num novo mecanismo de apoio a investimentos estratégicos fora do PRR pois há grandes projetos nas áreas dos microchips, da indústria verde ou da mobilidade sustentável que vão além de 2026
O Governo decidiu não recorrer a mais empréstimos do Mecanismo de Recuperação e Resiliência, a tal “bazuca” europeia que financia os Planos de Recuperação e Resiliência (PRR) dos Estados-Membros da União Europeia a executar entre 2021 e 2026.
A decisão foi avançada ao Expresso pela ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva, que tutela a pasta dos fundos europeus.
O prazo para os Estados-Membros solicitarem os últimos empréstimos termina esta quinta-feira, dia 31 de agosto de 2023.
Dos 14,2 mil milhões de euros disponibilizados a Portugal a título de empréstimo, o Governo começou por mobilizar 2,7 mil milhões de euros em 2021 e depois mais 3,2 mil milhões de euros na reprogramação do PRR de maio de 2023. Restavam, portanto, cerca de 8,3 mil milhões de euros por mobilizar a título de empréstimo. Dinheiro que pesa no endividamento público, pois, ao contrário das subvenções a fundo perdido, deve ser pago de volta.
Nos últimos meses, o Governo manteve em aberto a possibilidade de utilizar o remanescente dos empréstimos na criação de um mecanismo de atração do investimento para o país, um instrumento de apoio ao investimento estratégico empresarial, promotor das transições verde e digital, capaz de captar investimento estrangeiro transformador para a economia portuguesa.
Mas face à avaliação das manifestações de interesse conhecidas de investimento estratégico para o país, ao seu estado de maturidade e calendários de implementação, e o calendário de execução do PRR até 2026, o Governo decidiu que não haverá acréscimo aos investimentos e reformas já em negociação com a Comissão Europeia.
O calendário foi o que pesou na decisão. Em causa estão grandes intenções de investimento dificilmente concretizáveis no âmbito do PRR, cujo prazo de execução termina em menos de três anos. “Estamos em setembro de 2023 e dificilmente estes projetos podem estar concluídos até ao primeiro semestre de 2026. Não queremos criar pressão sobre projetos que não são compatíveis com o calendário do PRR”, justificou a ministra da Presidência.
Tal não invalida que o Governo crie um mecanismo contratual de investimentos estratégicos para estes projetos que ultrapassam o horizonte temporal do PRR, explorando o atual quadro de auxílios de Estado integrado no plano industrial do Pacto Ecológico da União Europeia.
Este continua a ser trabalhado pelas áreas governativas da Economia e dos Negócios Estrangeiros e visa responder às manifestações de interesse de áreas como os microchips, indústria verde e mobilidade sustentável, etc.
“Poderemos recorrer a outros fundos, não necessariamente nacionais, mesmo no quadro do Portugal 2030 e de outros instrumentos de apoio europeus”, explicou Mariana Vieira da Silva.
Este mecanismo contratual de investimentos estratégicos em que o Governo está agora a trabalhar fora do PRR acrescerá a medidas de incentivo com efeito estruturante já em vigor como é o caso das Agendas Mobilizadoras do PRR e o novo sistema de incentivos financeiros a grandes projetos de investimento.
Em maio, o Governo apresentou à Comissão Europeia um projeto de reprogramação do PRR que já eleva o envelope a aplicar até 2026 de 16,6 mil milhões para 22,2 mil milhões de euros.
Em causa está um aumento de 5,6 mil milhões de euros face ao envelope inicialmente previsto em 2021. Desse valor adicional, cerca de 2,4 mil milhões de euros correspondem a subvenções e 3,2 mil milhões de euros dizem respeito a empréstimos cujo objetivo é dar resposta ao incremento de custos provocado pela atual conjuntura económica e aumentar a ambição de medidas já em curso, nomeadamente no que diz respeito ao reforço do Programa das Agendas Mobilizadoras do PRR.
Com esta reprogramação, o PRR passa de um total de 115 para 156 medidas, de 31 para 43 reformas e de 83 para 113 investimentos. Tal obriga ao cumprimento de um total de 501 metas até ao primeiro semestre de 2026.
O Governo decidiu não recorrer a mais empréstimos do Mecanismo de Recuperação e Resiliência, a tal “bazuca” europeia que financia os Planos de Recuperação e Resiliência (PRR) dos Estados-Membros da União Europeia a executar entre 2021 e 2026.
A decisão foi avançada ao Expresso pela ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva, que tutela a pasta dos fundos europeus.
O prazo para os Estados-Membros solicitarem os últimos empréstimos termina esta quinta-feira, dia 31 de agosto de 2023.
Dos 14,2 mil milhões de euros disponibilizados a Portugal a título de empréstimo, o Governo começou por mobilizar 2,7 mil milhões de euros em 2021 e depois mais 3,2 mil milhões de euros na reprogramação do PRR de maio de 2023. Restavam, portanto, cerca de 8,3 mil milhões de euros por mobilizar a título de empréstimo. Dinheiro que pesa no endividamento público, pois, ao contrário das subvenções a fundo perdido, deve ser pago de volta.
Nos últimos meses, o Governo manteve em aberto a possibilidade de utilizar o remanescente dos empréstimos na criação de um mecanismo de atração do investimento para o país, um instrumento de apoio ao investimento estratégico empresarial, promotor das transições verde e digital, capaz de captar investimento estrangeiro transformador para a economia portuguesa.
Mas face à avaliação das manifestações de interesse conhecidas de investimento estratégico para o país, ao seu estado de maturidade e calendários de implementação, e o calendário de execução do PRR até 2026, o Governo decidiu que não haverá acréscimo aos investimentos e reformas já em negociação com a Comissão Europeia.
O calendário foi o que pesou na decisão. Em causa estão grandes intenções de investimento dificilmente concretizáveis no âmbito do PRR, cujo prazo de execução termina em menos de três anos. “Estamos em setembro de 2023 e dificilmente estes projetos podem estar concluídos até ao primeiro semestre de 2026. Não queremos criar pressão sobre projetos que não são compatíveis com o calendário do PRR”, justificou a ministra da Presidência.
Tal não invalida que o Governo crie um mecanismo contratual de investimentos estratégicos para estes projetos que ultrapassam o horizonte temporal do PRR, explorando o atual quadro de auxílios de Estado integrado no plano industrial do Pacto Ecológico da União Europeia.
Este continua a ser trabalhado pelas áreas governativas da Economia e dos Negócios Estrangeiros e visa responder às manifestações de interesse de áreas como os microchips, indústria verde e mobilidade sustentável, etc.
“Poderemos recorrer a outros fundos, não necessariamente nacionais, mesmo no quadro do Portugal 2030 e de outros instrumentos de apoio europeus”, explicou Mariana Vieira da Silva.
Este mecanismo contratual de investimentos estratégicos em que o Governo está agora a trabalhar fora do PRR acrescerá a medidas de incentivo com efeito estruturante já em vigor como é o caso das Agendas Mobilizadoras do PRR e o novo sistema de incentivos financeiros a grandes projetos de investimento.
Em maio, o Governo apresentou à Comissão Europeia um projeto de reprogramação do PRR que já eleva o envelope a aplicar até 2026 de 16,6 mil milhões para 22,2 mil milhões de euros.
Em causa está um aumento de 5,6 mil milhões de euros face ao envelope inicialmente previsto em 2021. Desse valor adicional, cerca de 2,4 mil milhões de euros correspondem a subvenções e 3,2 mil milhões de euros dizem respeito a empréstimos cujo objetivo é dar resposta ao incremento de custos provocado pela atual conjuntura económica e aumentar a ambição de medidas já em curso, nomeadamente no que diz respeito ao reforço do Programa das Agendas Mobilizadoras do PRR.
Com esta reprogramação, o PRR passa de um total de 115 para 156 medidas, de 31 para 43 reformas e de 83 para 113 investimentos. Tal obriga ao cumprimento de um total de 501 metas até ao primeiro semestre de 2026.
Bruno tem dois empregos e não é caso único. São cada vez mais os jovens que acumulam trabalhos
Isabel Patrício, in ECO
Depois de um dia de trabalho a conduzir ambulâncias, Bruno trabalha ainda num bar para conseguir fazer face às suas despesas mensais. Número de jovens com dois empregos está a aumentar.
Sobrava-lhe cada vez mais mês ao fim do seu salário. A expressão é brasileira, mas ilustra bem a situação para a qual foi atirado Bruno com o aumento do custo de vida. “Houve alturas em que não tinha dinheiro para comer a meio do mês”, conta. E foi assim que este jovem decidiu ter mais do que um trabalho: além de conduzir ambulâncias numa unidade hospitalar de referência em Lisboa, passou a trabalhar também num bar para conseguir dar respostas a todas as suas despesas.
Bruno, 27 anos, não é, contudo, caso único. Num ano apenas, o número de profissionais da chamada geração millennial (nascidos entre 1982 e 1994) com dois empregos passou de cerca de dois em cada dez para em torno de três em cada dez. E entre os profissionais da geração Z (nascidos entre 1995 e 2004), esse aumento foi ainda mais pronunciado, mostra um estudo recente da consultora Deloitte.
Os baixos salários e o disparo dos preços da habitação são identificados pelos economistas ouvidos pelo ECO como duas das possíveis causas dessa evolução do universo de jovens que, para honrar os seus compromissos financeiros, acumulam ocupações profissionais.
Mas voltemos a Bruno. Com o 12.º ano feito num curso profissional de Técnico de Arquitetura, nunca conseguiu trabalhar na sua área. Ainda assim, o emprego que encontrou permitiu-lhe começar a morar sozinho “sem qualquer apoio”. Até que a “subida brutal da inflação” fez o caso mudar de figura. “Ia ao supermercado e tinha de abdicar de alimentos para poder conseguir pagar as outras contas e dívidas”, relata. Passou a fazer, por vezes, mais horas no centro hospitalar onde trabalha, mas nem isso foi suficiente. E teve mesmo de arranjar mais um emprego.
“É bastante difícil conciliar [os empregos]”, confessa. “Chegamos ao ponto de abdicar da nossa vida e de fazer o que gostamos”, assinala este jovem.
Por exemplo, há oito anos que era bombeiro voluntário no ativo, mas teve de passar à reserva, uma vez que, com a “sobrecarga dos empregos”, já não tinha tempo para essa atividade. “Tenho vontade de ter apenas uma ocupação, mas para isso é preciso que valorizem o meu trabalho, repondo a minha carreira de auxiliar de ação médica, aumentando o meu salário sem que isso aumente também as minhas horas de trabalho, e que ajustem o custo de vida, porque está insuportável”, apela Bruno.
E assegura que conhece “bastante jovens” na mesma situação em que se encontra, havendo mesmo, diz, quem, depois do horário laboral, faça ainda serviço de estafeta nas plataformas de entregas, como a Glovo, para “ganhar uns trocos por dia”.
Inflação fez emagrecer salários
Por efeito, também, do conflito em curso no leste europeu, a inflação atingiu em 2022 o nível mais elevado desde 1992: 7,8%. E apesar de terem aumentado em termos absolutos, os salários não conseguiram acompanhar essa evolução: em termos reais, caíram, pois, 4%, emagrecendo o poder de compra dos portugueses. Isto num país que, mesmo antes desta crise, já estava a braços com baixos vencimentos.
Não espanta, assim, que o número de jovens que acumulam empregos para honrar os seus compromissos financeiros, à semelhança de Bruno, tenha crescido significativamente. No estudo “Gen Z and Millennial Survey 2023”, da consultora Deloitte, é indicado que o número de profissionais em Portugal que têm, pelo menos, dois empregos aumentou de 23% para 31%, no caso dos millennials, e de 32% para 44%, entre a geração Z, apenas num ano. E quase metade dos inquiridos apontam como razão para essa acumulação de ocupações a necessidade de ter uma fonte de rendimento adicional para garantir o cumprimento dos seus compromissos financeiros.
“A subida do custo de vida obrigou a procurar rendimentos extras. E a inflação é sentida, em termos médios, de forma diferente pelos jovens do que pelos demais indivíduos, por causa da habitação”, sublinha João Cerejeira, economista e professor da Universidade do Minho.
Também Pedro Braz Teixeira, diretor do gabinete de estudos do Fórum para a Competitividade, vê o disparo do custo de vida, com grande destaque para a habitação, como uma das explicações para a tendência em questão. “Os jovens que têm ambição de ter casa própria são obrigados a trabalhar bastante mais”, assinala.
Precisamos de baixar drasticamente o preço da habitação para toda a gente. Neste momento, é uma loucura.
Pedro Braz Teixeira
Fórum para a Competitividade
Para ambos os economistas, as medidas preparadas pelo Governo no pacote Mais Habitação em nada contribuem para a resolução desta crise do mercado habitacional. “Até podem ter o efeito inverso”, alerta João Cerejeira. “Precisamos de baixar drasticamente o preço da habitação para toda a gente. Neste momento, é uma loucura. O pacote Mais Habitação não vai resolver problema nenhum. Sabemos que todos os anos o problema vai agravar-se, porque não há construção”, salienta Pedro Braz Teixeira.
Além da habitação e da subida dos preços, este último especialista identifica os baixos salários como razão para o crescimento do número de jovens com vários trabalhos.
Mas realça que podem estar em causa também, nalguns casos, outros motivos. O inquérito da Deloitte mostra que, “apesar de a principal razão ser económica, muitos jovens fazem-no [acumulam empregos], porque desejam prosseguir uma paixão ou passatempo além do seu trabalho principal”. “Esta juventude, em vez de ficar num emprego chato, prefere ter um emprego que é para ganhar dinheiro e outro para alimentar uma paixão, na vida profissional”, sugere Braz Teixeira.
Já João Cerejeira atira que o mercado de trabalho tem hoje à disposição mais oportunidades de trabalho, depois do período complicado da pandemia, o que pode também justificar o aumento da procura de trabalho.
Motivos à parte, o diretor do gabinete de estudos do Fórum para a Competitividade reconhece que pode até haver um “lado relativamente positivo” nesta evolução, na medida em que mais horas trabalhadas significam mais rendimentos e, por conseguinte, mais contribuições para a Segurança Social e mais Produto Interno Bruto (PIB).
“Mas acho, no conjunto, negativo, se aquilo que motiva estes jovens é o facto de não conseguirem ter uma vida digna com apenas um salário”, garante, avisando que há risco de diminuição da natalidade, de agravamento dos problemas de saúde mental (como esgotamentos) e até de imigração.
Soluções, precisam-se
Neste cenário, como pode, afinal, Portugal criar condições para que os jovens escapem à “obrigação” de ter dois empregos em prol da sua sobrevivência? As sugestões são diversas.
Bruno, por exemplo, defende que é preciso que o Governo tenha “noção de que os lucros exorbitantes das grandes empresas” são devidos ao “trabalho e esforço redobrado” dos trabalhadores. “Por isso é que o Governo tem de tomar medidas, para fazer uma justa distribuição da riqueza, que é produzida por nós, trabalhadores”, entende.
O que fazer para aumentar os salários? Melhorar a produtividade das empresas. Depois, há também um conjunto de políticas de apoio, como isenções fiscais e políticas de redistribuição.
João Cerejeira
Universidade do Minho
Já João Cerejeira declara que é preciso melhorar a produtividade das empresas para aumentar os salários, bem como aplicar políticas de apoio, como isenções fiscais e outras políticas de redistribuição de riqueza. O abono de família, por exemplo, deixa de ser aplicado a famílias “com níveis de rendimento relativamente baixos” e isso poderia ser revisto, indica o professor.
Já Pedro Braz Teixeira frisa que é preciso, por um lado, aumentar o potencial da economia e, por outro, “atuar de forma decisiva na habitação, aumentando muitíssimo a construção, acima dos 60 mil fogos por ano”.
Enquanto essas propostas não saem da gaveta, Bruno, como tantos outros jovens, vão gastando as suas horas sobretudo no trabalho, para fazer com que, quiçá, sobre salário ao fim do mês. Hoje começou a trabalhar às 8h00. Só terminará quando o relógio bater as 20h00.
Para este estudo, a Deloitte ouviu 22.856 jovens. Destes, 400 residem em Portugal.
Isabel Patrício
Editora do Trabalho by ECO
Depois de um dia de trabalho a conduzir ambulâncias, Bruno trabalha ainda num bar para conseguir fazer face às suas despesas mensais. Número de jovens com dois empregos está a aumentar.
Sobrava-lhe cada vez mais mês ao fim do seu salário. A expressão é brasileira, mas ilustra bem a situação para a qual foi atirado Bruno com o aumento do custo de vida. “Houve alturas em que não tinha dinheiro para comer a meio do mês”, conta. E foi assim que este jovem decidiu ter mais do que um trabalho: além de conduzir ambulâncias numa unidade hospitalar de referência em Lisboa, passou a trabalhar também num bar para conseguir dar respostas a todas as suas despesas.
Bruno, 27 anos, não é, contudo, caso único. Num ano apenas, o número de profissionais da chamada geração millennial (nascidos entre 1982 e 1994) com dois empregos passou de cerca de dois em cada dez para em torno de três em cada dez. E entre os profissionais da geração Z (nascidos entre 1995 e 2004), esse aumento foi ainda mais pronunciado, mostra um estudo recente da consultora Deloitte.
Os baixos salários e o disparo dos preços da habitação são identificados pelos economistas ouvidos pelo ECO como duas das possíveis causas dessa evolução do universo de jovens que, para honrar os seus compromissos financeiros, acumulam ocupações profissionais.
Mas voltemos a Bruno. Com o 12.º ano feito num curso profissional de Técnico de Arquitetura, nunca conseguiu trabalhar na sua área. Ainda assim, o emprego que encontrou permitiu-lhe começar a morar sozinho “sem qualquer apoio”. Até que a “subida brutal da inflação” fez o caso mudar de figura. “Ia ao supermercado e tinha de abdicar de alimentos para poder conseguir pagar as outras contas e dívidas”, relata. Passou a fazer, por vezes, mais horas no centro hospitalar onde trabalha, mas nem isso foi suficiente. E teve mesmo de arranjar mais um emprego.
“É bastante difícil conciliar [os empregos]”, confessa. “Chegamos ao ponto de abdicar da nossa vida e de fazer o que gostamos”, assinala este jovem.
Por exemplo, há oito anos que era bombeiro voluntário no ativo, mas teve de passar à reserva, uma vez que, com a “sobrecarga dos empregos”, já não tinha tempo para essa atividade. “Tenho vontade de ter apenas uma ocupação, mas para isso é preciso que valorizem o meu trabalho, repondo a minha carreira de auxiliar de ação médica, aumentando o meu salário sem que isso aumente também as minhas horas de trabalho, e que ajustem o custo de vida, porque está insuportável”, apela Bruno.
E assegura que conhece “bastante jovens” na mesma situação em que se encontra, havendo mesmo, diz, quem, depois do horário laboral, faça ainda serviço de estafeta nas plataformas de entregas, como a Glovo, para “ganhar uns trocos por dia”.
Inflação fez emagrecer salários
Por efeito, também, do conflito em curso no leste europeu, a inflação atingiu em 2022 o nível mais elevado desde 1992: 7,8%. E apesar de terem aumentado em termos absolutos, os salários não conseguiram acompanhar essa evolução: em termos reais, caíram, pois, 4%, emagrecendo o poder de compra dos portugueses. Isto num país que, mesmo antes desta crise, já estava a braços com baixos vencimentos.
Não espanta, assim, que o número de jovens que acumulam empregos para honrar os seus compromissos financeiros, à semelhança de Bruno, tenha crescido significativamente. No estudo “Gen Z and Millennial Survey 2023”, da consultora Deloitte, é indicado que o número de profissionais em Portugal que têm, pelo menos, dois empregos aumentou de 23% para 31%, no caso dos millennials, e de 32% para 44%, entre a geração Z, apenas num ano. E quase metade dos inquiridos apontam como razão para essa acumulação de ocupações a necessidade de ter uma fonte de rendimento adicional para garantir o cumprimento dos seus compromissos financeiros.
“A subida do custo de vida obrigou a procurar rendimentos extras. E a inflação é sentida, em termos médios, de forma diferente pelos jovens do que pelos demais indivíduos, por causa da habitação”, sublinha João Cerejeira, economista e professor da Universidade do Minho.
Também Pedro Braz Teixeira, diretor do gabinete de estudos do Fórum para a Competitividade, vê o disparo do custo de vida, com grande destaque para a habitação, como uma das explicações para a tendência em questão. “Os jovens que têm ambição de ter casa própria são obrigados a trabalhar bastante mais”, assinala.
Precisamos de baixar drasticamente o preço da habitação para toda a gente. Neste momento, é uma loucura.
Pedro Braz Teixeira
Fórum para a Competitividade
Para ambos os economistas, as medidas preparadas pelo Governo no pacote Mais Habitação em nada contribuem para a resolução desta crise do mercado habitacional. “Até podem ter o efeito inverso”, alerta João Cerejeira. “Precisamos de baixar drasticamente o preço da habitação para toda a gente. Neste momento, é uma loucura. O pacote Mais Habitação não vai resolver problema nenhum. Sabemos que todos os anos o problema vai agravar-se, porque não há construção”, salienta Pedro Braz Teixeira.
Além da habitação e da subida dos preços, este último especialista identifica os baixos salários como razão para o crescimento do número de jovens com vários trabalhos.
Mas realça que podem estar em causa também, nalguns casos, outros motivos. O inquérito da Deloitte mostra que, “apesar de a principal razão ser económica, muitos jovens fazem-no [acumulam empregos], porque desejam prosseguir uma paixão ou passatempo além do seu trabalho principal”. “Esta juventude, em vez de ficar num emprego chato, prefere ter um emprego que é para ganhar dinheiro e outro para alimentar uma paixão, na vida profissional”, sugere Braz Teixeira.
Já João Cerejeira atira que o mercado de trabalho tem hoje à disposição mais oportunidades de trabalho, depois do período complicado da pandemia, o que pode também justificar o aumento da procura de trabalho.
Motivos à parte, o diretor do gabinete de estudos do Fórum para a Competitividade reconhece que pode até haver um “lado relativamente positivo” nesta evolução, na medida em que mais horas trabalhadas significam mais rendimentos e, por conseguinte, mais contribuições para a Segurança Social e mais Produto Interno Bruto (PIB).
“Mas acho, no conjunto, negativo, se aquilo que motiva estes jovens é o facto de não conseguirem ter uma vida digna com apenas um salário”, garante, avisando que há risco de diminuição da natalidade, de agravamento dos problemas de saúde mental (como esgotamentos) e até de imigração.
Soluções, precisam-se
Neste cenário, como pode, afinal, Portugal criar condições para que os jovens escapem à “obrigação” de ter dois empregos em prol da sua sobrevivência? As sugestões são diversas.
Bruno, por exemplo, defende que é preciso que o Governo tenha “noção de que os lucros exorbitantes das grandes empresas” são devidos ao “trabalho e esforço redobrado” dos trabalhadores. “Por isso é que o Governo tem de tomar medidas, para fazer uma justa distribuição da riqueza, que é produzida por nós, trabalhadores”, entende.
O que fazer para aumentar os salários? Melhorar a produtividade das empresas. Depois, há também um conjunto de políticas de apoio, como isenções fiscais e políticas de redistribuição.
João Cerejeira
Universidade do Minho
Já João Cerejeira declara que é preciso melhorar a produtividade das empresas para aumentar os salários, bem como aplicar políticas de apoio, como isenções fiscais e outras políticas de redistribuição de riqueza. O abono de família, por exemplo, deixa de ser aplicado a famílias “com níveis de rendimento relativamente baixos” e isso poderia ser revisto, indica o professor.
Já Pedro Braz Teixeira frisa que é preciso, por um lado, aumentar o potencial da economia e, por outro, “atuar de forma decisiva na habitação, aumentando muitíssimo a construção, acima dos 60 mil fogos por ano”.
Enquanto essas propostas não saem da gaveta, Bruno, como tantos outros jovens, vão gastando as suas horas sobretudo no trabalho, para fazer com que, quiçá, sobre salário ao fim do mês. Hoje começou a trabalhar às 8h00. Só terminará quando o relógio bater as 20h00.
Para este estudo, a Deloitte ouviu 22.856 jovens. Destes, 400 residem em Portugal.
Isabel Patrício
Editora do Trabalho by ECO
Conta de serviços mínimos bancários? Há novidades (veja aqui o que muda)
Beatriz Vasconcelos, in Notícias ao Minuto
Contas 'low-cost' passam a ter mais transferências incluídas e, além disso, as instituições bancárias devem afixar informação sobre estas contas no "balcões e locais de atendimento ao público".
O Banco de Portugal (BdP) atualizou, na quarta-feira, a informação a divulgar sobre os novos serviços incluídos na conta de serviços mínimos bancários. Na prática, as contas 'low-cost' passam a ter mais transferências incluídas e, além disso, as instituições bancárias devem afixar informação sobre estas contas no "balcões e locais de atendimento ao público".
O que muda?
A partir de 27 de agosto de 2023, a conta de serviços mínimos bancários passou a incluir a possibilidade de realização de 48 transferências interbancárias (nacionais e na União Europeia) por ano, a realizar através de homebanking ou das aplicações próprias das instituições.
Em comunicado, o BdP explica que a "informação relativa aos novos serviços incluídos na conta de serviços mínimos bancários deve ser divulgada através do cartaz que as instituições afixam nos seus balcões e locais de atendimento ao público, bem como do documento informativo sobre a conversão de conta de depósito à ordem em conta de serviços mínimos bancários que as instituições disponibilizam aos clientes no primeiro extrato emitido em cada ano civil".
Que serviços incluem os serviços mínimos bancários?
De acordo com o BdP, "os serviços mínimos bancários devem ser prestados por todas as instituições de crédito autorizadas a receber depósitos do público, ou seja, bancos, caixas económicas, caixa central e caixas de crédito agrícola mútuo e que disponibilizem ao público os serviços incluídos nos serviços mínimos bancários".
Contas 'low-cost' passam a ter mais transferências incluídas e, além disso, as instituições bancárias devem afixar informação sobre estas contas no "balcões e locais de atendimento ao público".
O Banco de Portugal (BdP) atualizou, na quarta-feira, a informação a divulgar sobre os novos serviços incluídos na conta de serviços mínimos bancários. Na prática, as contas 'low-cost' passam a ter mais transferências incluídas e, além disso, as instituições bancárias devem afixar informação sobre estas contas no "balcões e locais de atendimento ao público".
O que muda?
A partir de 27 de agosto de 2023, a conta de serviços mínimos bancários passou a incluir a possibilidade de realização de 48 transferências interbancárias (nacionais e na União Europeia) por ano, a realizar através de homebanking ou das aplicações próprias das instituições.
Em comunicado, o BdP explica que a "informação relativa aos novos serviços incluídos na conta de serviços mínimos bancários deve ser divulgada através do cartaz que as instituições afixam nos seus balcões e locais de atendimento ao público, bem como do documento informativo sobre a conversão de conta de depósito à ordem em conta de serviços mínimos bancários que as instituições disponibilizam aos clientes no primeiro extrato emitido em cada ano civil".
Que serviços incluem os serviços mínimos bancários?
Abertura e manutenção de uma conta de depósito à ordem — a conta de serviços mínimos bancários;
Disponibilização de cartão de débito para movimentação da conta, não podendo este ter caraterísticas específicas mais restritivas do que os outros cartões de débito disponibilizados fora do regime;
Acesso à movimentação da conta de serviços mínimos bancários através de caixas automáticos na União Europeia, serviço de homebanking e balcões da instituição de crédito;
Realização de depósitos, levantamentos, pagamentos de bens e serviços e débitos diretos;
Realização de transferências intrabancárias (isto é, transferências para contas abertas na mesma instituição de crédito), sem restrição quanto ao número de operações que podem ser realizadas;
Realização de transferências interbancárias (isto é, transferências para contas abertas noutras instituições) através de caixas automáticos, sem restrição quanto ao número de operações que podem ser realizadas, e de homebanking ou de aplicações próprias das instituições, caso em que existe um máximo, por cada ano civil, de 48 transferências interbancárias nacionais e na União Europeia;
Realização, por cada mês, de cinco transferências através de aplicações de pagamento operadas por terceiros de montante igual ou inferior a 30 euros por operação. Estas transferências acrescem às 25 transferências realizadas no mesmo mês, até ao limite de 30 euros por operação e de 150 euros transferidos através da aplicação no mesmo mês, sem a cobrança de comissões adicionais, permitidas a todos os clientes.
Disponibilização de cartão de débito para movimentação da conta, não podendo este ter caraterísticas específicas mais restritivas do que os outros cartões de débito disponibilizados fora do regime;
Acesso à movimentação da conta de serviços mínimos bancários através de caixas automáticos na União Europeia, serviço de homebanking e balcões da instituição de crédito;
Realização de depósitos, levantamentos, pagamentos de bens e serviços e débitos diretos;
Realização de transferências intrabancárias (isto é, transferências para contas abertas na mesma instituição de crédito), sem restrição quanto ao número de operações que podem ser realizadas;
Realização de transferências interbancárias (isto é, transferências para contas abertas noutras instituições) através de caixas automáticos, sem restrição quanto ao número de operações que podem ser realizadas, e de homebanking ou de aplicações próprias das instituições, caso em que existe um máximo, por cada ano civil, de 48 transferências interbancárias nacionais e na União Europeia;
Realização, por cada mês, de cinco transferências através de aplicações de pagamento operadas por terceiros de montante igual ou inferior a 30 euros por operação. Estas transferências acrescem às 25 transferências realizadas no mesmo mês, até ao limite de 30 euros por operação e de 150 euros transferidos através da aplicação no mesmo mês, sem a cobrança de comissões adicionais, permitidas a todos os clientes.
De acordo com o BdP, "os serviços mínimos bancários devem ser prestados por todas as instituições de crédito autorizadas a receber depósitos do público, ou seja, bancos, caixas económicas, caixa central e caixas de crédito agrícola mútuo e que disponibilizem ao público os serviços incluídos nos serviços mínimos bancários".
Taxa de inflação acelera para 3,7% em agosto à boleia dos combustíveis
in Notícias ao Minuto
A taxa de variação homóloga do Índice de Preços no Consumidor (IPC) ou taxa de inflação terá aumentado para 3,7% em agosto de 2023, superior em 0,6 pontos percentuais (p.p.) à observada no mês anterior, divulgou o INE, esta quinta-feira.
"Esta aceleração é essencialmente explicada pelo aumento de preços registado nos combustíveis", explica o INE, em comunicado.
O indicador de inflação subjacente - índice total excluindo produtos alimentares não transformados e energéticos - terá registado uma variação de 4,5% (4,7% no mês precedente).
A variação do índice relativo aos produtos energéticos ter-se-á fixado em -6,5% (-14,9% no mês precedente), enquanto a do índice referente aos produtos alimentares não transformados terá diminuído para 6,5% (6,8% em julho).
Comparativamente com o mês anterior, a variação do IPC terá sido 0,3% (-0,4% em julho e -0,3% em agosto de 2022).
Estima-se uma variação média nos últimos doze meses de 6,8% (7,3% no mês anterior).
O Índice Harmonizado de Preços no Consumidor (IHPC) português terá registado uma variação homóloga de 5,3% (4,3% no mês precedente).
Os dados definitivos referentes ao IPC do mês de agosto de 2023 serão publicados no próximo dia 12 de setembro.
[Notícia atualizada às 09h31]
A taxa de variação homóloga do Índice de Preços no Consumidor (IPC) ou taxa de inflação terá aumentado para 3,7% em agosto de 2023, superior em 0,6 pontos percentuais (p.p.) à observada no mês anterior, divulgou o INE, esta quinta-feira.
"Esta aceleração é essencialmente explicada pelo aumento de preços registado nos combustíveis", explica o INE, em comunicado.
O indicador de inflação subjacente - índice total excluindo produtos alimentares não transformados e energéticos - terá registado uma variação de 4,5% (4,7% no mês precedente).
A variação do índice relativo aos produtos energéticos ter-se-á fixado em -6,5% (-14,9% no mês precedente), enquanto a do índice referente aos produtos alimentares não transformados terá diminuído para 6,5% (6,8% em julho).
Comparativamente com o mês anterior, a variação do IPC terá sido 0,3% (-0,4% em julho e -0,3% em agosto de 2022).
Estima-se uma variação média nos últimos doze meses de 6,8% (7,3% no mês anterior).
O Índice Harmonizado de Preços no Consumidor (IHPC) português terá registado uma variação homóloga de 5,3% (4,3% no mês precedente).
Os dados definitivos referentes ao IPC do mês de agosto de 2023 serão publicados no próximo dia 12 de setembro.
[Notícia atualizada às 09h31]
Rendas mais caras em 2024. Podem subir 6,94% (se Governo não travar)
Beatriz Vasconcelos, in Notícias ao Minuto
De acordo com as regras em vigor, os valores das rendas estão sujeitos a atualizações anuais, que se aplicam de forma automática em função da inflação média dos últimos 12 meses registada em agosto, exceto habitação.
valor das rendas poderá aumentar 6,94% em 2024, após o Governo ter travado a subida nos 2% este ano, segundo os números da inflação dos últimos 12 meses até agosto, divulgados esta quinta-feira pelo Instituto Nacional de Estatística (INE).
De acordo com os dados do INE, nos últimos 12 meses até agosto a variação média do índice de preços, excluindo a habitação, foi de 6,94%, valor que serve de base ao coeficiente utilizado para a atualização anual das rendas para o próximo ano, ao abrigo do Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU).
No início deste ano, recorde-se, o elevado contexto de inflação levou o Governo criar uma lei para limitar em 2% o aumento das rendas em 2023, suspendendo o mecanismo que permite que a atualização seja feita tendo em conta a inflação média sem habitação conhecida em agosto.
Por lei, os valores das rendas estão em geral sujeitos a atualizações anuais que se aplicam de forma automática em função da inflação. O NRAU estipula que o INE é que tem a responsabilidade de apurar o coeficiente de atualização de rendas, tendo este de constar de um aviso a publicar em Diário da República até 30 de outubro de cada ano para se tornar efetivo.
Só após a publicação em Diário da República é que os proprietários poderão anunciar aos inquilinos o aumento da renda, sendo que a subida só poderá efetivamente ocorrer 30 dias depois deste aviso.
De acordo com a lei do arrendamento, a primeira atualização pode ser exigida um ano após a vigência do contrato, e as seguintes um ano depois da atualização prévia, tendo o senhorio de comunicar por escrito, com uma antecedência mínima de 30 dias, o coeficiente de atualização e a nova renda que resulta deste cálculo.
Caso não o pretendam, os senhorios não são obrigados a aplicar esta atualização.
As rendas anteriores a 1990, contudo, foram atualizadas a partir de novembro de 2012, segundo o NRAU, que permite aumentar as rendas mais antigas através de um processo de negociação entre senhorio e inquilino. Caso tenham sido objeto deste mecanismo de atualização extraordinária, ficam isentos de nova subida.
[Notícia atualizada às 09h37]
De acordo com as regras em vigor, os valores das rendas estão sujeitos a atualizações anuais, que se aplicam de forma automática em função da inflação média dos últimos 12 meses registada em agosto, exceto habitação.
valor das rendas poderá aumentar 6,94% em 2024, após o Governo ter travado a subida nos 2% este ano, segundo os números da inflação dos últimos 12 meses até agosto, divulgados esta quinta-feira pelo Instituto Nacional de Estatística (INE).
De acordo com os dados do INE, nos últimos 12 meses até agosto a variação média do índice de preços, excluindo a habitação, foi de 6,94%, valor que serve de base ao coeficiente utilizado para a atualização anual das rendas para o próximo ano, ao abrigo do Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU).
No início deste ano, recorde-se, o elevado contexto de inflação levou o Governo criar uma lei para limitar em 2% o aumento das rendas em 2023, suspendendo o mecanismo que permite que a atualização seja feita tendo em conta a inflação média sem habitação conhecida em agosto.
Por lei, os valores das rendas estão em geral sujeitos a atualizações anuais que se aplicam de forma automática em função da inflação. O NRAU estipula que o INE é que tem a responsabilidade de apurar o coeficiente de atualização de rendas, tendo este de constar de um aviso a publicar em Diário da República até 30 de outubro de cada ano para se tornar efetivo.
Só após a publicação em Diário da República é que os proprietários poderão anunciar aos inquilinos o aumento da renda, sendo que a subida só poderá efetivamente ocorrer 30 dias depois deste aviso.
De acordo com a lei do arrendamento, a primeira atualização pode ser exigida um ano após a vigência do contrato, e as seguintes um ano depois da atualização prévia, tendo o senhorio de comunicar por escrito, com uma antecedência mínima de 30 dias, o coeficiente de atualização e a nova renda que resulta deste cálculo.
Caso não o pretendam, os senhorios não são obrigados a aplicar esta atualização.
As rendas anteriores a 1990, contudo, foram atualizadas a partir de novembro de 2012, segundo o NRAU, que permite aumentar as rendas mais antigas através de um processo de negociação entre senhorio e inquilino. Caso tenham sido objeto deste mecanismo de atualização extraordinária, ficam isentos de nova subida.
[Notícia atualizada às 09h37]
Famílias ainda sem acesso garantido a creches gratuitas
Abílio T. Ribeiro, in JN
Na véspera de muitos pais regressarem ao trabalho e do início do ano letivo, ainda há creches privadas que não têm aprovados os pedidos para integrar o programa Creche Feliz, impossibilitando as famílias de requererem a frequência gratuita. A situação é dramática no Porto e em Aveiro, onde ainda não foi aprovado qualquer processo dos estabelecimentos particulares para integrar o programa. Nestes distritos, também não foi dada resposta aos pedidos para aumentar a capacidade das creches, numa altura em que 200 estabelecimentos privados de todo o país já manifestaram o interesse em criar mais salas. As vagas estão praticamente preenchidas no setor social.
Luísa Lopes: “Falamos das quotas de género; e as quotas de idade?”
Teresa Firmino, in Público online
É neurocientista no Instituto de Medicina Molecular de Lisboa. A neurobiologia do envelhecimento é a área que Luísa Lopes investiga há mais de 20 anos. O café tem sido um dos alvos dos seus estudos.
Sabia que há cinco sítios bem identificados em todo o mundo, em continentes diferentes, onde as pessoas vivem saudáveis mais de 100 anos? Sabia que a solidão faz mal à saúde, em particular à saúde do cérebro? E que a cafeína protege do declínio cognitivo? Não, este não é apenas mais um estudo de nutrição pouco fundamentado: as provas do efeito benéfico da cafeína acumulam-se. Disto tudo e ainda do que cada um de nós pode fazer em prol da saúde, do idadismo (a discriminação pela idade), de quotas para quem é mais velho e até da região de Portugal que mais gosta nos fala Luísa Lopes, neurocientista do Instituto de Medicina Molecular (IMM) da Universidade de Lisboa. “Não temos grande respeito pela idade no nosso país”, lamenta a cientista nascida há 48 anos no Bombarral.
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O que são as unidades locais de saúde e o que vai mudar em 2024?
Alexandra Campos, in Público online
A partir 2024, vão ser criadas 31 novas unidades locais de saúde, que se juntam às oito que já existem. Modelo tem sido criticado, mas Direcção Executiva diz que é uma das maiores reformas do SNS.
O que é uma unidade local de saúde?
É um modelo de organização que integra os centros hospitalares, os hospitais e os agrupamentos de centros de saúde de uma área geográfica. Não é um modelo novo. A primeira ULS foi criada já no século passado, em 1999, em Matosinhos. Depois disso, surgiram mais sete – Norte Alentejano (em 2007), Guarda, Baixo Alentejo e Alto Minho (as três em 2008), Castelo Branco (em 2010), Nordeste (em 2011) e Litoral Alentejano (em 2012). Em conjunto, estas servem cerca de um milhão de pessoas.
A partir de Janeiro de 2024, a Direcção Executiva do SNS diz que há condições para serem criadas mais 31 ULS, juntando todos os hospitais e centros hospitalares do país e cobrindo a quase totalidade da população do continente. No total, o país passará a ter 39 ULS, que são entidades públicas empresariais. Mas a forma de financiamento desta nova vaga de ULS será diferente da actual. De fora ficam apenas os três institutos de oncologia (IPO de Lisboa, Porto e Coimbra) e o Hospital de Cascais, o único gerido em parceria público-privada.
O que vai mudar para as pessoas?
A Direcção Executiva do Serviço Nacional de Saúde garante que este novo modelo de “ULS 2.0” vai permitir melhorar o acesso e diminuir a burocracia, facilitando o percurso dos utentes e dos doentes dentro do SNS. Acredita também que irá melhorar a eficiência e potenciar economias de escala, dado que as ULS podem evitar redundâncias e repetições de actos clínicos, especifica a entidade liderada por Fernando Araújo. Ao Jornal de Notícias, o director executivo disse que as ULS vão ter circuitos para doentes crónicos. E deu um exemplo: no caso de um diabético, está definido um percurso dentro da unidade, que evitará que o doente seja "empurrado de um lado para o outro" para aceder a consultas, fazer exames e receber a medicação.
O que vai acontecer aos trabalhadores?
Todos os trabalhares dos hospitais e centros de saúde vão transitar para as ULS , independentemente do seu regime de contrato de trabalho, mesmo que estejam com licença sem vencimento, sem perda de benefícios e direitos. O director executivo do SNS assevera que o novo modelo será vantajoso para os trabalhadores, uma vez que vai facilitar a mobilidade dos profissionais, processos que actualmente são muito arrastados e complicados.
Como vão ser financiadas?
A forma de financiamento vai mudar, passando a ser feita com uma ferramenta de estratificação pelo risco que inclui muito mais variáveis do que a actual. O secretário de Estado da Saúde explicou, em entrevista ao PÚBLICO, que este instrumento de estratificação pelo risco vai permitir identificar subgrupos de pessoas com necessidades semelhantes — saudáveis, doentes crónicos, casos complexos — e que as ULS serão financiadas em função disso, em vez de serem financiadas apenas pela quantidade de actos que prestam, como acontece actualmente nos hospitais.
O número de dirigentes vai aumentar ou diminuir?
Os conselhos de administração das ULS podem incluir até seis vogais executivos, mais um do que está previsto no Estatuto do SNS, que vai ter que ser alterado neste ponto. Segundo o anteprojecto de decreto-lei, além do presidente da ULS, o conselho de administração terá dois directores clínicos, um enfermeiro-director, um vogal proposto pelo Ministério das Finanças e um vogal proposto pela comunidade intermunicipal ou pela área metropolitana, consoante a localização das ULS. Fernando Araújo calcula que, a partir de Janeiro de 2024, o número de dirigentes não deverá aumentar nem diminuir e antevê que “grande parte” dos actuais gestores dos centros hospitalares e ACES continuarão na liderança das ULS.
As ULS são consensuais?
Não. A generalização das ULS é classificada pela Direcção Executiva como uma das maiores reformas organizativas do SNS desde a sua criação. Mas o modelo tem sido criticado pela Ordem dos Médicos e pelos dirigentes das estruturas sindicais que representam os clínicos e ainda pela associação nacional das unidades de saúde familiar, entre outros, que têm contestado a forma como o processo tem decorrido e consideram que vai secundarizar os cuidados de saúde primários. Lembram ainda que os estudos efectuados até à data, nomeadamente um estudo levado a cabo pela Entidade Reguladora da Saúde (ERS) em 2015, não provaram que tenha havido um aumento da eficiência das oito ULS que já existem. A ERS concluiu, por exemplo, que não houve uma redução das hospitalizações desnecessárias e que os tempos máximos de resposta garantida não foram cumpridos. A Direcção Executiva disse ao Observador que este estudo tem "falhas técnicas" e referiu uma dissertação de mestrado feita por um investigador da área da saúde pública, Ricardo Alves, que diz ter encontrado "ganhos de percepção de integração de cuidados por parte dos colaboradores das ULS".
Veja qual será a sua unidade local de saúde
- Unidade Local de Saúde do Alto Ave - Hospital da Senhora da Oliveira Guimarães com o Agrupamento de Centros de Saúde (ACES) do Alto Ave – Guimarães/Vizela/Terras de Basto e o Centro de Saúde de Celorico de Basto
- ULS de Barcelos/Esposende - Hospital de Santa Maria Maior-Barcelos com o ACES do Cávado III – Barcelos/Esposende
- ULS de Braga - Hospital de Braga com os ACES do Cávado I-Braga e do Cávado II-Gerês/Cabreira
- ULS da Póvoa de Varzim/Vila do Conde - Centro Hospitalar Póvoa de Varzim/Vila do Conde com o ACES do Grande Porto IV-Póvoa de Varzim/Vila do Conde
- ULS do Médio Ave - Centro Hospitalar do Médio Ave com os ACES do Grande Porto I- Santo Tirso/Trofa e do Ave -Famalicão
- ULS de Vila Nova de Gaia/Espinho - Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/Espinho com os ACES do Grande Porto VII – Gaia e do Grande Porto VIII – Espinho/Gaia
- ULS de Trás-os-Montes e Alto Douro - Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro com ACES de Trás-os-Montes – Alto Tâmega e Barroso, do Douro I – Marão e Douro Norte e do Douro II – Douro Sul
- ULS de Entre Douro e Vouga - Centro Hospitalar de Entre o Douro e Voug< com os ACES de Entre Douro e Vouga I – Feira e Arouca e de Entre Douro e Vouga II – Aveiro Norte
- ULS de São João - Centro Hospitalar Universitário de São João com os ACES do Grande Porto III – Maia/Valongo e do Grande Porto VI – Porto Oriental
- ULS de Santo António - Centro Hospitalar Universitário de Santo António com os ACES do Grande Porto II – Gondomar e do Grande Porto V – Porto Ocidental
- ULS do Baixo Mondego - Hospital Distrital da Figueira da Foz com os Centros de Saúde da Figueira da Foz, de Soure e de Montemor-o-Velho
- ULS da Cova da Beira - Centro Hospitalar Universitário da Cova da Beira com o ACES da Cova da Beira
- ULS de Dão-Lafões - Centro Hospitalar Tondela-Viseu, com o ACES de Dão-Lafões
- ULS da Região de Leiria - Centro Hospitalar de Leiria com o ACES do Pinhal Litoral, o Centro de Saúde de Ourém e os Centros de Saúde de Alcobaça e da Nazaré
- ULS de Coimbra - Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, Hospital Arcebispo João Crisóstomo – Cantanhede e o Centro de Medicina de Reabilitação da Região Centro – Rovisco Pais, com o ACES do Pinhal Interior Norte e os Centros de Saúde de Cantanhede, de Celas, de Eiras, de Fernão Magalhães, de Norton de Matos, de Santa Clara, de São Martinho do Bispo, de Condeixa-a-Nova, da Mealhada, de Mira, de Mortágua e de Penacova
- ULS da Região de Aveiro - Centro Hospitalar do Baixo Vouga e do Hospital Dr. Francisco Zagalo – Ovar com o ACES do Baixo Vouga
- ULS de Amadora/Sintra - Hospital Professor Doutor Fernando Fonseca com os ACES da Amadora e Sintra
- ULS de Almada-Seixal - Hospital Garcia de Orta com o ACES Almada-Seixal
- ULS da Lezíria - Hospital Distrital de Santarém com o ACES Lezíria
- ULS do Estuário do Tejo - Hospital de Vila Franca de Xira, com o ACES Estuário do Tejo
- ULS de Loures-Odivelas - Hospital de Loures com o ACES Loures-Odivelas
- ULS de Lisboa Norte - Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte, com o ACES Lisboa Norte e o Centro de Saúde de Mafra
- ULS de Lisboa Central - Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central, Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa e Instituto de Oftalmologia Dr. Gama Pinto com ACES de Lisboa Central
- ULS do Oeste - Centro Hospitalar do Oeste com com ACES Oeste Sul, com excepção do Centro de Saúde de Mafra, e os Centros de Saúde do Bombarral, das Caldas da Rainha, de Óbidos e de Peniche
- ULS do Médio Tejo - Centro Hospitalar do Médio Tejo com os Centros de Saúde de Abrantes, de Alcanena, de Constância, do Entroncamento, de Fátima, de Ferreira do Zêzere, de Mação, do Sardoal, de Torres Novas, de Tomar e de Vila Nova da Barquinha e o Centro de Saúde de Vila de Rei
- ULS da Arrábida - Centro Hospitalar de Setúbal com o ACES da Arrábida
- ULS de Lisboa Ocidental - Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental com os ACES Lisboa Ocidental e Oeiras e Cascais
- ULS do Arco Ribeirinho - Centro Hospitalar Barreiro-Montijo, com o ACES Arco Ribeirinh
- ULS do Alto Alentejo - Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano com o Laboratório de Saúde Pública do Alentejo
- ULS do Alentejo Central - Hospital do Espírito Santo de Évora com o ACES do Alentejo Central
- ULS do Algarve - Centro Hospitalar Universitário do Algarve com os ACES Algarve I – Central, do Algarve II – Barlavento e do Algarve III – Sotavento
- ULS do Tâmega e Sousa - Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa com os ACES do Tâmega I – Baixo Tâmega, com excepção do Centro de Saúde de Celorico de Basto, do Tâmega II – Vale do Sousa Norte e do Tâmega III – Vale do Sousa Sul
Oito Unidades Locais de Saúde que já existem - Matosinhos (1999), Norte Alentejano (2007), Guarda (2008), Baixo Alentejo (2008), Alto Minho (2008), Castelo Branco (2010), Nordeste (2011) e Litoral Alentejano (2012)
A partir 2024, vão ser criadas 31 novas unidades locais de saúde, que se juntam às oito que já existem. Modelo tem sido criticado, mas Direcção Executiva diz que é uma das maiores reformas do SNS.
O que é uma unidade local de saúde?
É um modelo de organização que integra os centros hospitalares, os hospitais e os agrupamentos de centros de saúde de uma área geográfica. Não é um modelo novo. A primeira ULS foi criada já no século passado, em 1999, em Matosinhos. Depois disso, surgiram mais sete – Norte Alentejano (em 2007), Guarda, Baixo Alentejo e Alto Minho (as três em 2008), Castelo Branco (em 2010), Nordeste (em 2011) e Litoral Alentejano (em 2012). Em conjunto, estas servem cerca de um milhão de pessoas.
A partir de Janeiro de 2024, a Direcção Executiva do SNS diz que há condições para serem criadas mais 31 ULS, juntando todos os hospitais e centros hospitalares do país e cobrindo a quase totalidade da população do continente. No total, o país passará a ter 39 ULS, que são entidades públicas empresariais. Mas a forma de financiamento desta nova vaga de ULS será diferente da actual. De fora ficam apenas os três institutos de oncologia (IPO de Lisboa, Porto e Coimbra) e o Hospital de Cascais, o único gerido em parceria público-privada.
O que vai mudar para as pessoas?
A Direcção Executiva do Serviço Nacional de Saúde garante que este novo modelo de “ULS 2.0” vai permitir melhorar o acesso e diminuir a burocracia, facilitando o percurso dos utentes e dos doentes dentro do SNS. Acredita também que irá melhorar a eficiência e potenciar economias de escala, dado que as ULS podem evitar redundâncias e repetições de actos clínicos, especifica a entidade liderada por Fernando Araújo. Ao Jornal de Notícias, o director executivo disse que as ULS vão ter circuitos para doentes crónicos. E deu um exemplo: no caso de um diabético, está definido um percurso dentro da unidade, que evitará que o doente seja "empurrado de um lado para o outro" para aceder a consultas, fazer exames e receber a medicação.
O que vai acontecer aos trabalhadores?
Todos os trabalhares dos hospitais e centros de saúde vão transitar para as ULS , independentemente do seu regime de contrato de trabalho, mesmo que estejam com licença sem vencimento, sem perda de benefícios e direitos. O director executivo do SNS assevera que o novo modelo será vantajoso para os trabalhadores, uma vez que vai facilitar a mobilidade dos profissionais, processos que actualmente são muito arrastados e complicados.
Como vão ser financiadas?
A forma de financiamento vai mudar, passando a ser feita com uma ferramenta de estratificação pelo risco que inclui muito mais variáveis do que a actual. O secretário de Estado da Saúde explicou, em entrevista ao PÚBLICO, que este instrumento de estratificação pelo risco vai permitir identificar subgrupos de pessoas com necessidades semelhantes — saudáveis, doentes crónicos, casos complexos — e que as ULS serão financiadas em função disso, em vez de serem financiadas apenas pela quantidade de actos que prestam, como acontece actualmente nos hospitais.
O número de dirigentes vai aumentar ou diminuir?
Os conselhos de administração das ULS podem incluir até seis vogais executivos, mais um do que está previsto no Estatuto do SNS, que vai ter que ser alterado neste ponto. Segundo o anteprojecto de decreto-lei, além do presidente da ULS, o conselho de administração terá dois directores clínicos, um enfermeiro-director, um vogal proposto pelo Ministério das Finanças e um vogal proposto pela comunidade intermunicipal ou pela área metropolitana, consoante a localização das ULS. Fernando Araújo calcula que, a partir de Janeiro de 2024, o número de dirigentes não deverá aumentar nem diminuir e antevê que “grande parte” dos actuais gestores dos centros hospitalares e ACES continuarão na liderança das ULS.
As ULS são consensuais?
Não. A generalização das ULS é classificada pela Direcção Executiva como uma das maiores reformas organizativas do SNS desde a sua criação. Mas o modelo tem sido criticado pela Ordem dos Médicos e pelos dirigentes das estruturas sindicais que representam os clínicos e ainda pela associação nacional das unidades de saúde familiar, entre outros, que têm contestado a forma como o processo tem decorrido e consideram que vai secundarizar os cuidados de saúde primários. Lembram ainda que os estudos efectuados até à data, nomeadamente um estudo levado a cabo pela Entidade Reguladora da Saúde (ERS) em 2015, não provaram que tenha havido um aumento da eficiência das oito ULS que já existem. A ERS concluiu, por exemplo, que não houve uma redução das hospitalizações desnecessárias e que os tempos máximos de resposta garantida não foram cumpridos. A Direcção Executiva disse ao Observador que este estudo tem "falhas técnicas" e referiu uma dissertação de mestrado feita por um investigador da área da saúde pública, Ricardo Alves, que diz ter encontrado "ganhos de percepção de integração de cuidados por parte dos colaboradores das ULS".
Veja qual será a sua unidade local de saúde
- Unidade Local de Saúde do Alto Ave - Hospital da Senhora da Oliveira Guimarães com o Agrupamento de Centros de Saúde (ACES) do Alto Ave – Guimarães/Vizela/Terras de Basto e o Centro de Saúde de Celorico de Basto
- ULS de Barcelos/Esposende - Hospital de Santa Maria Maior-Barcelos com o ACES do Cávado III – Barcelos/Esposende
- ULS de Braga - Hospital de Braga com os ACES do Cávado I-Braga e do Cávado II-Gerês/Cabreira
- ULS da Póvoa de Varzim/Vila do Conde - Centro Hospitalar Póvoa de Varzim/Vila do Conde com o ACES do Grande Porto IV-Póvoa de Varzim/Vila do Conde
- ULS do Médio Ave - Centro Hospitalar do Médio Ave com os ACES do Grande Porto I- Santo Tirso/Trofa e do Ave -Famalicão
- ULS de Vila Nova de Gaia/Espinho - Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/Espinho com os ACES do Grande Porto VII – Gaia e do Grande Porto VIII – Espinho/Gaia
- ULS de Trás-os-Montes e Alto Douro - Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro com ACES de Trás-os-Montes – Alto Tâmega e Barroso, do Douro I – Marão e Douro Norte e do Douro II – Douro Sul
- ULS de Entre Douro e Vouga - Centro Hospitalar de Entre o Douro e Voug< com os ACES de Entre Douro e Vouga I – Feira e Arouca e de Entre Douro e Vouga II – Aveiro Norte
- ULS de São João - Centro Hospitalar Universitário de São João com os ACES do Grande Porto III – Maia/Valongo e do Grande Porto VI – Porto Oriental
- ULS de Santo António - Centro Hospitalar Universitário de Santo António com os ACES do Grande Porto II – Gondomar e do Grande Porto V – Porto Ocidental
- ULS do Baixo Mondego - Hospital Distrital da Figueira da Foz com os Centros de Saúde da Figueira da Foz, de Soure e de Montemor-o-Velho
- ULS da Cova da Beira - Centro Hospitalar Universitário da Cova da Beira com o ACES da Cova da Beira
- ULS de Dão-Lafões - Centro Hospitalar Tondela-Viseu, com o ACES de Dão-Lafões
- ULS da Região de Leiria - Centro Hospitalar de Leiria com o ACES do Pinhal Litoral, o Centro de Saúde de Ourém e os Centros de Saúde de Alcobaça e da Nazaré
- ULS de Coimbra - Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, Hospital Arcebispo João Crisóstomo – Cantanhede e o Centro de Medicina de Reabilitação da Região Centro – Rovisco Pais, com o ACES do Pinhal Interior Norte e os Centros de Saúde de Cantanhede, de Celas, de Eiras, de Fernão Magalhães, de Norton de Matos, de Santa Clara, de São Martinho do Bispo, de Condeixa-a-Nova, da Mealhada, de Mira, de Mortágua e de Penacova
- ULS da Região de Aveiro - Centro Hospitalar do Baixo Vouga e do Hospital Dr. Francisco Zagalo – Ovar com o ACES do Baixo Vouga
- ULS de Amadora/Sintra - Hospital Professor Doutor Fernando Fonseca com os ACES da Amadora e Sintra
- ULS de Almada-Seixal - Hospital Garcia de Orta com o ACES Almada-Seixal
- ULS da Lezíria - Hospital Distrital de Santarém com o ACES Lezíria
- ULS do Estuário do Tejo - Hospital de Vila Franca de Xira, com o ACES Estuário do Tejo
- ULS de Loures-Odivelas - Hospital de Loures com o ACES Loures-Odivelas
- ULS de Lisboa Norte - Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte, com o ACES Lisboa Norte e o Centro de Saúde de Mafra
- ULS de Lisboa Central - Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central, Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa e Instituto de Oftalmologia Dr. Gama Pinto com ACES de Lisboa Central
- ULS do Oeste - Centro Hospitalar do Oeste com com ACES Oeste Sul, com excepção do Centro de Saúde de Mafra, e os Centros de Saúde do Bombarral, das Caldas da Rainha, de Óbidos e de Peniche
- ULS do Médio Tejo - Centro Hospitalar do Médio Tejo com os Centros de Saúde de Abrantes, de Alcanena, de Constância, do Entroncamento, de Fátima, de Ferreira do Zêzere, de Mação, do Sardoal, de Torres Novas, de Tomar e de Vila Nova da Barquinha e o Centro de Saúde de Vila de Rei
- ULS da Arrábida - Centro Hospitalar de Setúbal com o ACES da Arrábida
- ULS de Lisboa Ocidental - Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental com os ACES Lisboa Ocidental e Oeiras e Cascais
- ULS do Arco Ribeirinho - Centro Hospitalar Barreiro-Montijo, com o ACES Arco Ribeirinh
- ULS do Alto Alentejo - Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano com o Laboratório de Saúde Pública do Alentejo
- ULS do Alentejo Central - Hospital do Espírito Santo de Évora com o ACES do Alentejo Central
- ULS do Algarve - Centro Hospitalar Universitário do Algarve com os ACES Algarve I – Central, do Algarve II – Barlavento e do Algarve III – Sotavento
- ULS do Tâmega e Sousa - Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa com os ACES do Tâmega I – Baixo Tâmega, com excepção do Centro de Saúde de Celorico de Basto, do Tâmega II – Vale do Sousa Norte e do Tâmega III – Vale do Sousa Sul
Oito Unidades Locais de Saúde que já existem - Matosinhos (1999), Norte Alentejano (2007), Guarda (2008), Baixo Alentejo (2008), Alto Minho (2008), Castelo Branco (2010), Nordeste (2011) e Litoral Alentejano (2012)
30.8.23
Inflação da maior economia europeia continua acima dos 6%
in Público
Alemanha deverá finalizar este mês com uma inflação de 6,1%, mantendo a pressão sobre a decisão que o Banco Central Europeu (BCE) terá de tomar em Setembro sobre os juros.
A taxa anual de inflação na Alemanha deverá fechar o mês de Agosto em 6,1%, previu esta quarta-feira o organismo estatístico oficial do país, o Destatis.
A confirmar-se, é um um alívio face ao Índice de Preços no Consumidor (IPC) registado em Julho, que terminou com uma taxa de 6,2%, e face a Junho (6,4%). A inflação subjacente, que exclui os preços dos alimentos não processados e a energia, foi de 5,5%, igual a Julho. Em Junho, foi de 5,8%.
No comunicado divulgado agora, o Destatis explica que “em Agosto de 2023, os preços dos produtos alimentares continuaram a registar um crescimento acima da média (+9,0%) em comparação com o mesmo mês do ano anterior”. Os preços da energia também subiram 8,3% no mesmo período face ao mês homólogo, mas o instituto alemão afirma que há que contabilizar na comparação o efeito de base: em Agosto de 2022, recorda, o governo federal da Alemanha implementou o terceiro plano de apoio à economia e aos consumidores.
Em termos comparáveis com o resto dos Estados-membros da União Europeia, a maior economia da região registou um Índice Harmonizado de Preços no Consumidor (IHPC), de 6,4% (mais 0,4% face a Julho), aliviando dos 6,5% registados em Julho. O Financial Times adianta que os economistas consultados pelo jornal previam uma descida maior, para 6,2%.
Espanha também publicou hoje a primeira estimativa de inflação para Agosto, de 2,6%, prevendo que o IHPC seja de 2,4%. Portugal tem prevista a sua divulgação para esta quinta-feira, último dia do mês.
Alemanha deverá finalizar este mês com uma inflação de 6,1%, mantendo a pressão sobre a decisão que o Banco Central Europeu (BCE) terá de tomar em Setembro sobre os juros.
A taxa anual de inflação na Alemanha deverá fechar o mês de Agosto em 6,1%, previu esta quarta-feira o organismo estatístico oficial do país, o Destatis.
A confirmar-se, é um um alívio face ao Índice de Preços no Consumidor (IPC) registado em Julho, que terminou com uma taxa de 6,2%, e face a Junho (6,4%). A inflação subjacente, que exclui os preços dos alimentos não processados e a energia, foi de 5,5%, igual a Julho. Em Junho, foi de 5,8%.
Em termos comparáveis com o resto dos Estados-membros da União Europeia, a maior economia da região registou um Índice Harmonizado de Preços no Consumidor (IHPC), de 6,4% (mais 0,4% face a Julho), aliviando dos 6,5% registados em Julho. O Financial Times adianta que os economistas consultados pelo jornal previam uma descida maior, para 6,2%.
Espanha também publicou hoje a primeira estimativa de inflação para Agosto, de 2,6%, prevendo que o IHPC seja de 2,4%. Portugal tem prevista a sua divulgação para esta quinta-feira, último dia do mês.
[artigo disponível na íntegra apenas para assinantes]
Da cidade para o campo. Quando vida, arte e luta pelo planeta se fundem
Ana Cristina Pereira (texto), Paulo Pimenta (fotografia) e Tiago Bernardo Lopes (fotografia e Vídeo ), in Público
Sara Rodrigues e Rodrigo B. Camacho tanto são capazes de transformar um chão de cimento num jardim agroflorestal como de fazer uma interpretação sonora das relações entre microorganismos.
Chamaram-lhe Landra. Landra era o nome que no Noroeste Ibérico se dava à bolota. Landra é um projecto artístico. Landra é o seu pedaço de terra, em Riodouro, a freguesia mais montanhosa de Cabeceiras de Basto, perto da fronteira do Minho com Trás-os-Montes.
Naquele lugar, os artistas interdisciplinares Sara Rodrigues (n. 1990) e Rodrigo B. Camacho (n. 1990) exploram as relações entre os seres humanos e os ecossistemas. Investigam como as várias formas de vida são moldadas pelo poder. Procuram alternativas.
Quando chegaram, em Julho de 2020, a vegetação cobria grande parte das paredes da casa feita de pedra e madeira. Bosta de vaca e de cavalo sobrepunha-se no soalho. As frechas no telhado, nas portas e nas janelas deixavam entrar chuva, vento, frio.
Era como se tivessem entrado numa máquina do tempo e recuado séculos. Não havia água canalizada, luz eléctrica, móveis, quaisquer infra-estruturas próprias de uma cozinha ou de uma casa de banho.
Montaram uma tenda de lona no exterior, debaixo de um castanheiro (o que depressa se revelou desacertado). Sempre que queriam aliviar-se, faziam um buraco perto de outra árvore. Tapavam-no logo a seguir.
“A Sara levantava-se de madrugada para cortar silvas”, ri-se Rodrigo. “Estava viciadíssima.” Queria descobrir as formas das paredes. E o estado do soalho. Tratou de raspar a bosta, de a amontoar.
Uma horta em Londres
Conheceram-se na biblioteca da Goldsmiths, na Universidade de Londres, especializada nas áreas culturais e sociais. Ela já ali estudara Música e estava a estudar Belas-Artes. Ele tinha estudado Música no Instituto Politécnico do Porto e estava a estudar Composição.
Ao fazer um mestrado com uma forte componente de ecologia crítica, Sara mergulhou no debate ecológico-ambiental. “As alterações climáticas, a degradação das condições de vida e dos ecossistemas, tudo isso era muito forte.”
Aquelas preocupações infiltraram-se no seu trabalho artístico, que é audiovisual, performativo e de instalação. “Também trabalhava com som, mas à base de informação e crítica. Não ia no sentido de construir algo positivo no mundo. Ia no de mostrar o que estava mal.”
Rodrigo acompanhava as pesquisas que Sara fazia online. Também lia, reflectia, discutia. E também ia assumindo abordagens cada vez mais ecológicas nos projectos que ia desenvolvendo, cruzando artes visuais e performativas com música experimental.
Havia uma horta comunitária na Goldsmiths. Cada um tinha um metro quadrado para fazer as suas experiências. Aquilo permitiu-lhe passar da teoria à prática, da abstracção à realidade concreta.
“Foi a primeira vez que semeei qualquer coisa. Quando vi os primeiros tomates, fiquei superentusiasmada”, conta Sara. Rodrigo, esse, já se pusera a fazer experiências em quintais de casas onde vivera.
Partilhavam um estúdio num 12.º andar. Davam aulas particulares de Piano. Co-fundaram, em 2014, o colectivo New Maker Ensemble, na fronteira entre a performance, a música contemporânea e a investigação antropológica.
Perceberam-se como parte de um problema global. Se antes os agricultores usavam enxadas, arados, adubos orgânicos e o seu labor já tinha impacto no planeta, que dizer dos dias de hoje, em que muitos recorrem a maquinaria pesada e a produtos agro-químicos? O que estavam eles a fazer, a trabalhar para pagar contas num dos maiores centros financeiros do mundo, dependentes de uma infindável cadeia de intermediários para se alimentarem?
Começaram a imaginar formas mais positivas de estar no mundo, de o pensar e de agir sobre ele. Aproximando-se dos 30 anos, tomaram a decisão. Iam mudar de vida. E para isso iam mudar de sítio. “Queríamos ir morar para o campo, ter acesso directo a terra, cultivar os nossos alimentos”, torna ela. E praticar uma arte implicada num dos maiores desafios do seu tempo.
Fizeram um curso de Permacultura para “aprender a trabalhar com e não contra a natureza”. E outro sobre plantas espontâneas comestíveis. E procuraram um sítio à venda, no interior de Portugal, que sabiam estar despovoado e envelhecido.
Tinham um terreno em Trás-os-Montes, que Sara herdara do pai, um médico que se tornara antiquário, mas faltava-lhe água e sobrava-lhe vizinhança utilizadora de produtos agro-químicos. Com a ajuda da mãe, antiquária, compraram aquele carvalhal no Alto Minho.
As suas vidas fundiram-se com a sua arte. “O que queremos é que tudo na nossa vida seja arte”, resume Sara. Esta vida-arte tem uma componente de intervenção pública e é uma forma de luta. Sem estardalhaço. “A arte é um tipo particular de activismo lento: um mundo hipotético”, como disse a curadora Joana P. R. Neves, a propósito da exposição colectiva Our Ancestors Bloom Overground, de que o duo Landra faz parte, patente até 23 de Setembro na Patrick Heide Contemporary Art, em Londres.
Subverter a linha do tempo
Nunca tinham vivido no mundo rural. Sara crescera no Porto, numa família fascinada com antiguidades. E Rodrigo no Funchal, numa família empenhada na recolha e preservação da música tradicional.
Saindo do primeiro confinamento decretado para prevenir a propagação de covid-19, ali estavam, debaixo de um castanheiro, numa pequena tenda – sem electricidade, sem água corrente, sem gás.
Ao fim de um ano, ouvindo Sara, sobressaía a subversão da linha do tempo. “No princípio, nem tínhamos fogo. Temos estado a melhorar as nossas condições de vida. É mesmo engraçado.”
Quando passaram a usar a casa, não dispensaram logo a tenda. A lona ajudava a manter a temperatura. Depois, trouxeram uma cama e compraram uma salamandra. Já podiam ficar mais tempo seguido. Podiam aquecer-se, cozinhar, lavar-se com paninhos quentes.
Rodrigo recomenda o banho de paninhos quentes. “É um prazer muito grande. Principalmente quando se faz destilação de eucaliptos ou de casca de laranja. Fica-se entre o mais fino e a pobreza mais extrema. Viver as duas coisas num é o que a gente faz aqui ao tomar banho de paninhos à frente do fogo para não ficar com frio, mas com óleos essenciais que ajudam a dormir bem.”
Investidos num estilo de vida sustentável, não desistiram de alguns dos grandes atributos do mundo contemporâneo. Não dispensam telemóveis, computadores, câmaras. A sua arte, aliás, passa por aí.
Tinham um minipainel solar que servia para carregar o telefone. Para carregar os computadores, tinham de subir o caminho de terra e de seguir pela estrada de alcatrão até ao café mais próximo. Compraram dois painéis solares e baterias de 12 volts, de níquel-ferro, não-poluente (sem chumbo). “Duram uma vida inteira”, enfatiza Rodrigo. “O líquido que sai pode ir para as batatas.”
Rodrigo até andou a estudar Electricidade para montar os painéis solares. Vão fazendo tudo o que podem com as próprias mãos. Só não dispensaram um carpinteiro para consertar o telhado, substituir janelas e portas.
Sete hectares
Numa instalação audiovisual que apresentaram no Sismógrafo, no Porto, em Novembro de 2020, explicavam que, pelos cálculos do Banco Mundial, “um hectare seria a área que cada habitante de Portugal teria em 2100, caso o território fosse dividido igualmente pela população”. Quiseram “viver esse hectare com o corpo”.
Na Landra, dispõem de sete hectares de agro-floresta, um sistema de plantio sustentável que faz a recuperação vegetal e do solo. E fazem uso dos seus conhecimentos sobre permacultura e plantas espontâneas comestíveis.
Fizeram sementeiras: abóboras, pepinelas, beringelas, pimentas… Plantaram pezinhos de araçá, nespereira, pereira, limoeiro... Volvidos três anos de estada intermitente, a experiência mostra-lhes que nem precisam de fazer agricultura. “Nem no pico do Inverno escasseiam plantas para nos alimentarmos”, resume Rodrigo. “Conseguimos ter mais espécies comestíveis do que qualquer exploração agrícola intensiva.”
Na Primavera, apanharam laranja, azeda, alface-brava, serralha, cereja-brava, trevo-dos-prados, orégão-selvagem e outras plantas comestíveis. Agora, que é Verão, têm, amora-silvestre, erva-moira, pimenta-de-água, figos… Quando vier o Outono, beldroega, bolota, nozes, castanhas. No Inverno, urtiga, alfavaca, canabrás, dente-de-leão.
Sem frigorífico, estudaram formas de conservar alimentos para o Inverno. Começaram a trazer frascos para a Landra e a fazer fermentações. Entretanto, soltaram uma leitoa grávida na propriedade. E ponderam trazer algumas galinhas para crescer ao ar livre.
Soberania alimentar
Passam muito tempo a estudar e a experimentar. A questão de partida continua a ser importante na sua vida-arte-activismo: “Como é que o que comemos hoje se impõe sobre a paisagem que virá?”
Aprenderam, por exemplo, a fermentar bolota e a fazer farinha, a curar azeitona-galega, a preparar xarope de rosa-canina, um imunoestimulante com propriedades antioxidantes e anti-inflamatórias.
Atreveram-se a fazer café de bolota, cerveja de bolota, infusão de bolota, pão de bolota. “Isso é a nossa aposta”, afiança Sara. Como na zona ninguém liga a tal produto, agora associado à pobreza, destinado à criação de porcos, chegando à época, é só apanhar.
Vão vendo como mesmo no mundo rural as sociedades dependem “de objectos e de processos industriais, que não controlam”. E discutindo como esse tipo de organização produz desequilíbrios nas vidas humanas e desestabiliza os ecossistemas. E mostrando como as bolotas remetem para outra forma de vida.
São frutos de plantas perenes, com vidas longas, as bolotas. Sara e Rodrigo vêem nelas uma “cultura de autonomia, soberania e auto-suficiência” que desejam reactivar. Pode substituir o arroz, a batata, o trigo.
No trabalho artístico intitulado Esquecimento Premeditado, um vídeo e performance que integrou a exposição colectiva Debaixo das Cidades, a Revolução, no Espaço Mira, no Porto, em 2022, mostram a preparação da infusão de bolota.
Extensões da Landra
As condições de vida, na Landra, continuam rudimentares. Sara e Rodrigo continuam a puxar água de uma nascente, com uma mangueira. Já têm alguns móveis, mas o carpinteiro tarda em colocar novas portas e janelas. Ainda lhes falta casa de banho, retrete. E, no entanto, sentem-se leves consigo e inquietos com o mundo.
A sua preocupação com o ambiente nota-se nos mais diversos gestos dos seus quotidianos. Lavam a roupa com cinza, fazem limpeza com vinagre diluído em água, escovam os dentes com bicarbonato de sódio. Fazem compostagem, usando o método Bokashi (uma vez feita a fermentação anaeróbia dos resíduos orgânicos dentro do compostor, misturam os resíduos fermentados com a terra).
Já teriam mais conforto se não passassem tanto tempo fora, a desenvolver projectos artísticos. Mesmo sem eles, a vida na Landra vai tomando o seu próprio curso. “Temos muitas coisas plantadas que vão crescendos sozinhas”, sublinha Sara. “E é importante haver esta continuação noutros sítios, dar visibilidade a potencialidades. É nisto que acreditamos. É abrir a porta a públicos, a pessoas que podem estar interessadas nas mesmas questões.”
Ao que lhe é dado ver, há hoje “muitas pessoas que sentem um chamamento”. São acometidas por uma “falta de entusiasmo com o que estão a fazer, com o modo de vida contemporâneo”, mas muitas vezes “não sabem bem por onde começar ou sentem falta de segurança ou mesmo medo do desconhecido”. “Queremos dar estes exemplos, mostrar que é possível e entusiasmante. A possibilidade de criar mais vida é bonita, dá alegria.”
Exemplar dessa extensão é o projecto Cultura Emergente, na Bienal de Arte Contemporânea da Maia, em 2021/2022. Pegaram num jardim compactado e negligenciado, junto ao Fórum da Maia. Analisaram aquele solo e o de um jardim de uma casa abandonada ali perto. Semeando e transplantando, regeneraram o espaço. Para que se mantenha vivo, colocaram painéis que nomeiam as espécies presentes e criaram um grupo de cuidadores informais.
Em Agosto de 2022, iniciaram outro projecto com uma filosofia idêntica: A Fundo na Paisagem — Como transformar um pátio de cimento num jardim agro-florestal. No pátio do Centro Católico Operário do Porto, levantaram laje, picaram cimento e alcatrão. Foram buscar material orgânico aos jardins do Palácio de Cristal. Semearam, transplantaram. Num espaço de dois metros por 28, criaram um pedaço de agro-floresta. Entretanto, peneiraram toneladas de cascalho. E transformaram-no em bancos corridos.
Ouvir a natureza
Já este ano, servindo-se de um banco de imagens microscópicas oriundas de análises que fizeram a diversos solos, procuraram “traduzir em som as relações invisíveis e inaudíveis entre os microorganismos da terra e todas as camadas tróficas que deles dependem”. Não é que ouçam o que mais ninguém ouve. O processo passa por interpretar o mundo. Atribuem “timbres, registos, qualidades frásicas e outras características estéticas” a microorganismos.
“Temos interesse em descrever o processo de sucessão ecológica, segundo o qual, cada interveniente – de simples bactérias, aos seus predadores, a fungos e até artrópodes – acabe por produzir resultados imensamente complexos ao nível do todo”, escreveram a propósito d' A Grande Sucessão, projecto que iniciaram numa residência, no Picote, em Miranda do Douro, e aprofundaram noutra, no Celeiro AIR, na serra da Arrábida, em Setúbal.
Usaram essa abordagem numa exposição que apresentaram este ano na Capela da Boa Viagem, no Funchal, intitulada A Desconsagração do Império. Desta vez, criaram uma pilha de compostagem de produtos associados à história económica da Madeira. Na exposição, antigas imagens fotográficas de trabalho alternavam com novas imagens microscópicas feitas ao solo florestal e de cultivo de cana-de-açúcar, vinha e trigo. A peça de som cruzava tradicionais cantigas de trabalho com “uma tradução sónica da evolução bioquímica do processo de compostagem.”
Continuam a ler, a experimentar, a partilhar. “Ainda estamos a ver como vamos moldar a Landra; se vamos abrir para mais pessoas viverem cá, para um modo mais comunitário”, diz ela. “E nós não somos solitários”, achega ele. “Amigos que estão a tentar fazer essa transição [do mundo urbano para o rural] podem ser nossos vizinhos. Faz sentido criar ocupação consciente de um território, por exemplo, à volta de uma linha de água.”
Sara Rodrigues e Rodrigo B. Camacho tanto são capazes de transformar um chão de cimento num jardim agroflorestal como de fazer uma interpretação sonora das relações entre microorganismos.
Chamaram-lhe Landra. Landra era o nome que no Noroeste Ibérico se dava à bolota. Landra é um projecto artístico. Landra é o seu pedaço de terra, em Riodouro, a freguesia mais montanhosa de Cabeceiras de Basto, perto da fronteira do Minho com Trás-os-Montes.
Naquele lugar, os artistas interdisciplinares Sara Rodrigues (n. 1990) e Rodrigo B. Camacho (n. 1990) exploram as relações entre os seres humanos e os ecossistemas. Investigam como as várias formas de vida são moldadas pelo poder. Procuram alternativas.
Quando chegaram, em Julho de 2020, a vegetação cobria grande parte das paredes da casa feita de pedra e madeira. Bosta de vaca e de cavalo sobrepunha-se no soalho. As frechas no telhado, nas portas e nas janelas deixavam entrar chuva, vento, frio.
Era como se tivessem entrado numa máquina do tempo e recuado séculos. Não havia água canalizada, luz eléctrica, móveis, quaisquer infra-estruturas próprias de uma cozinha ou de uma casa de banho.
Montaram uma tenda de lona no exterior, debaixo de um castanheiro (o que depressa se revelou desacertado). Sempre que queriam aliviar-se, faziam um buraco perto de outra árvore. Tapavam-no logo a seguir.
“A Sara levantava-se de madrugada para cortar silvas”, ri-se Rodrigo. “Estava viciadíssima.” Queria descobrir as formas das paredes. E o estado do soalho. Tratou de raspar a bosta, de a amontoar.
Uma horta em Londres
Conheceram-se na biblioteca da Goldsmiths, na Universidade de Londres, especializada nas áreas culturais e sociais. Ela já ali estudara Música e estava a estudar Belas-Artes. Ele tinha estudado Música no Instituto Politécnico do Porto e estava a estudar Composição.
Ao fazer um mestrado com uma forte componente de ecologia crítica, Sara mergulhou no debate ecológico-ambiental. “As alterações climáticas, a degradação das condições de vida e dos ecossistemas, tudo isso era muito forte.”
Aquelas preocupações infiltraram-se no seu trabalho artístico, que é audiovisual, performativo e de instalação. “Também trabalhava com som, mas à base de informação e crítica. Não ia no sentido de construir algo positivo no mundo. Ia no de mostrar o que estava mal.”
Rodrigo acompanhava as pesquisas que Sara fazia online. Também lia, reflectia, discutia. E também ia assumindo abordagens cada vez mais ecológicas nos projectos que ia desenvolvendo, cruzando artes visuais e performativas com música experimental.
Havia uma horta comunitária na Goldsmiths. Cada um tinha um metro quadrado para fazer as suas experiências. Aquilo permitiu-lhe passar da teoria à prática, da abstracção à realidade concreta.
“Foi a primeira vez que semeei qualquer coisa. Quando vi os primeiros tomates, fiquei superentusiasmada”, conta Sara. Rodrigo, esse, já se pusera a fazer experiências em quintais de casas onde vivera.
Partilhavam um estúdio num 12.º andar. Davam aulas particulares de Piano. Co-fundaram, em 2014, o colectivo New Maker Ensemble, na fronteira entre a performance, a música contemporânea e a investigação antropológica.
Perceberam-se como parte de um problema global. Se antes os agricultores usavam enxadas, arados, adubos orgânicos e o seu labor já tinha impacto no planeta, que dizer dos dias de hoje, em que muitos recorrem a maquinaria pesada e a produtos agro-químicos? O que estavam eles a fazer, a trabalhar para pagar contas num dos maiores centros financeiros do mundo, dependentes de uma infindável cadeia de intermediários para se alimentarem?
Começaram a imaginar formas mais positivas de estar no mundo, de o pensar e de agir sobre ele. Aproximando-se dos 30 anos, tomaram a decisão. Iam mudar de vida. E para isso iam mudar de sítio. “Queríamos ir morar para o campo, ter acesso directo a terra, cultivar os nossos alimentos”, torna ela. E praticar uma arte implicada num dos maiores desafios do seu tempo.
Fizeram um curso de Permacultura para “aprender a trabalhar com e não contra a natureza”. E outro sobre plantas espontâneas comestíveis. E procuraram um sítio à venda, no interior de Portugal, que sabiam estar despovoado e envelhecido.
Tinham um terreno em Trás-os-Montes, que Sara herdara do pai, um médico que se tornara antiquário, mas faltava-lhe água e sobrava-lhe vizinhança utilizadora de produtos agro-químicos. Com a ajuda da mãe, antiquária, compraram aquele carvalhal no Alto Minho.
As suas vidas fundiram-se com a sua arte. “O que queremos é que tudo na nossa vida seja arte”, resume Sara. Esta vida-arte tem uma componente de intervenção pública e é uma forma de luta. Sem estardalhaço. “A arte é um tipo particular de activismo lento: um mundo hipotético”, como disse a curadora Joana P. R. Neves, a propósito da exposição colectiva Our Ancestors Bloom Overground, de que o duo Landra faz parte, patente até 23 de Setembro na Patrick Heide Contemporary Art, em Londres.
Subverter a linha do tempo
Nunca tinham vivido no mundo rural. Sara crescera no Porto, numa família fascinada com antiguidades. E Rodrigo no Funchal, numa família empenhada na recolha e preservação da música tradicional.
Saindo do primeiro confinamento decretado para prevenir a propagação de covid-19, ali estavam, debaixo de um castanheiro, numa pequena tenda – sem electricidade, sem água corrente, sem gás.
Ao fim de um ano, ouvindo Sara, sobressaía a subversão da linha do tempo. “No princípio, nem tínhamos fogo. Temos estado a melhorar as nossas condições de vida. É mesmo engraçado.”
Quando passaram a usar a casa, não dispensaram logo a tenda. A lona ajudava a manter a temperatura. Depois, trouxeram uma cama e compraram uma salamandra. Já podiam ficar mais tempo seguido. Podiam aquecer-se, cozinhar, lavar-se com paninhos quentes.
Rodrigo recomenda o banho de paninhos quentes. “É um prazer muito grande. Principalmente quando se faz destilação de eucaliptos ou de casca de laranja. Fica-se entre o mais fino e a pobreza mais extrema. Viver as duas coisas num é o que a gente faz aqui ao tomar banho de paninhos à frente do fogo para não ficar com frio, mas com óleos essenciais que ajudam a dormir bem.”
Investidos num estilo de vida sustentável, não desistiram de alguns dos grandes atributos do mundo contemporâneo. Não dispensam telemóveis, computadores, câmaras. A sua arte, aliás, passa por aí.
Tinham um minipainel solar que servia para carregar o telefone. Para carregar os computadores, tinham de subir o caminho de terra e de seguir pela estrada de alcatrão até ao café mais próximo. Compraram dois painéis solares e baterias de 12 volts, de níquel-ferro, não-poluente (sem chumbo). “Duram uma vida inteira”, enfatiza Rodrigo. “O líquido que sai pode ir para as batatas.”
Rodrigo até andou a estudar Electricidade para montar os painéis solares. Vão fazendo tudo o que podem com as próprias mãos. Só não dispensaram um carpinteiro para consertar o telhado, substituir janelas e portas.
Sete hectares
Numa instalação audiovisual que apresentaram no Sismógrafo, no Porto, em Novembro de 2020, explicavam que, pelos cálculos do Banco Mundial, “um hectare seria a área que cada habitante de Portugal teria em 2100, caso o território fosse dividido igualmente pela população”. Quiseram “viver esse hectare com o corpo”.
Na Landra, dispõem de sete hectares de agro-floresta, um sistema de plantio sustentável que faz a recuperação vegetal e do solo. E fazem uso dos seus conhecimentos sobre permacultura e plantas espontâneas comestíveis.
Fizeram sementeiras: abóboras, pepinelas, beringelas, pimentas… Plantaram pezinhos de araçá, nespereira, pereira, limoeiro... Volvidos três anos de estada intermitente, a experiência mostra-lhes que nem precisam de fazer agricultura. “Nem no pico do Inverno escasseiam plantas para nos alimentarmos”, resume Rodrigo. “Conseguimos ter mais espécies comestíveis do que qualquer exploração agrícola intensiva.”
Na Primavera, apanharam laranja, azeda, alface-brava, serralha, cereja-brava, trevo-dos-prados, orégão-selvagem e outras plantas comestíveis. Agora, que é Verão, têm, amora-silvestre, erva-moira, pimenta-de-água, figos… Quando vier o Outono, beldroega, bolota, nozes, castanhas. No Inverno, urtiga, alfavaca, canabrás, dente-de-leão.
Sem frigorífico, estudaram formas de conservar alimentos para o Inverno. Começaram a trazer frascos para a Landra e a fazer fermentações. Entretanto, soltaram uma leitoa grávida na propriedade. E ponderam trazer algumas galinhas para crescer ao ar livre.
Soberania alimentar
Passam muito tempo a estudar e a experimentar. A questão de partida continua a ser importante na sua vida-arte-activismo: “Como é que o que comemos hoje se impõe sobre a paisagem que virá?”
Aprenderam, por exemplo, a fermentar bolota e a fazer farinha, a curar azeitona-galega, a preparar xarope de rosa-canina, um imunoestimulante com propriedades antioxidantes e anti-inflamatórias.
Atreveram-se a fazer café de bolota, cerveja de bolota, infusão de bolota, pão de bolota. “Isso é a nossa aposta”, afiança Sara. Como na zona ninguém liga a tal produto, agora associado à pobreza, destinado à criação de porcos, chegando à época, é só apanhar.
Vão vendo como mesmo no mundo rural as sociedades dependem “de objectos e de processos industriais, que não controlam”. E discutindo como esse tipo de organização produz desequilíbrios nas vidas humanas e desestabiliza os ecossistemas. E mostrando como as bolotas remetem para outra forma de vida.
São frutos de plantas perenes, com vidas longas, as bolotas. Sara e Rodrigo vêem nelas uma “cultura de autonomia, soberania e auto-suficiência” que desejam reactivar. Pode substituir o arroz, a batata, o trigo.
No trabalho artístico intitulado Esquecimento Premeditado, um vídeo e performance que integrou a exposição colectiva Debaixo das Cidades, a Revolução, no Espaço Mira, no Porto, em 2022, mostram a preparação da infusão de bolota.
Extensões da Landra
As condições de vida, na Landra, continuam rudimentares. Sara e Rodrigo continuam a puxar água de uma nascente, com uma mangueira. Já têm alguns móveis, mas o carpinteiro tarda em colocar novas portas e janelas. Ainda lhes falta casa de banho, retrete. E, no entanto, sentem-se leves consigo e inquietos com o mundo.
A sua preocupação com o ambiente nota-se nos mais diversos gestos dos seus quotidianos. Lavam a roupa com cinza, fazem limpeza com vinagre diluído em água, escovam os dentes com bicarbonato de sódio. Fazem compostagem, usando o método Bokashi (uma vez feita a fermentação anaeróbia dos resíduos orgânicos dentro do compostor, misturam os resíduos fermentados com a terra).
Já teriam mais conforto se não passassem tanto tempo fora, a desenvolver projectos artísticos. Mesmo sem eles, a vida na Landra vai tomando o seu próprio curso. “Temos muitas coisas plantadas que vão crescendos sozinhas”, sublinha Sara. “E é importante haver esta continuação noutros sítios, dar visibilidade a potencialidades. É nisto que acreditamos. É abrir a porta a públicos, a pessoas que podem estar interessadas nas mesmas questões.”
Ao que lhe é dado ver, há hoje “muitas pessoas que sentem um chamamento”. São acometidas por uma “falta de entusiasmo com o que estão a fazer, com o modo de vida contemporâneo”, mas muitas vezes “não sabem bem por onde começar ou sentem falta de segurança ou mesmo medo do desconhecido”. “Queremos dar estes exemplos, mostrar que é possível e entusiasmante. A possibilidade de criar mais vida é bonita, dá alegria.”
Exemplar dessa extensão é o projecto Cultura Emergente, na Bienal de Arte Contemporânea da Maia, em 2021/2022. Pegaram num jardim compactado e negligenciado, junto ao Fórum da Maia. Analisaram aquele solo e o de um jardim de uma casa abandonada ali perto. Semeando e transplantando, regeneraram o espaço. Para que se mantenha vivo, colocaram painéis que nomeiam as espécies presentes e criaram um grupo de cuidadores informais.
Em Agosto de 2022, iniciaram outro projecto com uma filosofia idêntica: A Fundo na Paisagem — Como transformar um pátio de cimento num jardim agro-florestal. No pátio do Centro Católico Operário do Porto, levantaram laje, picaram cimento e alcatrão. Foram buscar material orgânico aos jardins do Palácio de Cristal. Semearam, transplantaram. Num espaço de dois metros por 28, criaram um pedaço de agro-floresta. Entretanto, peneiraram toneladas de cascalho. E transformaram-no em bancos corridos.
Ouvir a natureza
Já este ano, servindo-se de um banco de imagens microscópicas oriundas de análises que fizeram a diversos solos, procuraram “traduzir em som as relações invisíveis e inaudíveis entre os microorganismos da terra e todas as camadas tróficas que deles dependem”. Não é que ouçam o que mais ninguém ouve. O processo passa por interpretar o mundo. Atribuem “timbres, registos, qualidades frásicas e outras características estéticas” a microorganismos.
“Temos interesse em descrever o processo de sucessão ecológica, segundo o qual, cada interveniente – de simples bactérias, aos seus predadores, a fungos e até artrópodes – acabe por produzir resultados imensamente complexos ao nível do todo”, escreveram a propósito d' A Grande Sucessão, projecto que iniciaram numa residência, no Picote, em Miranda do Douro, e aprofundaram noutra, no Celeiro AIR, na serra da Arrábida, em Setúbal.
Usaram essa abordagem numa exposição que apresentaram este ano na Capela da Boa Viagem, no Funchal, intitulada A Desconsagração do Império. Desta vez, criaram uma pilha de compostagem de produtos associados à história económica da Madeira. Na exposição, antigas imagens fotográficas de trabalho alternavam com novas imagens microscópicas feitas ao solo florestal e de cultivo de cana-de-açúcar, vinha e trigo. A peça de som cruzava tradicionais cantigas de trabalho com “uma tradução sónica da evolução bioquímica do processo de compostagem.”
Continuam a ler, a experimentar, a partilhar. “Ainda estamos a ver como vamos moldar a Landra; se vamos abrir para mais pessoas viverem cá, para um modo mais comunitário”, diz ela. “E nós não somos solitários”, achega ele. “Amigos que estão a tentar fazer essa transição [do mundo urbano para o rural] podem ser nossos vizinhos. Faz sentido criar ocupação consciente de um território, por exemplo, à volta de uma linha de água.”
“Há margem para um aumento real de 20% de salários, mas os trabalhadores não estão a ser capazes de o exigir: isto fazia-se com sindicatos”
Bernardo Mendonça Jornalista e Joana Ascensão Jornalista, in Expresso
Paulo Pedroso, professor e ex-ministro do Trabalho e da Solidariedade de António Guterres, faz um retrato sobre os grandes desafios do futuro do mercado de trabalho. Para o sociólogo, as gerações mais novas estão a ser “vítimas da armadilha ideológica do individualismo e da meritocracia” e a “votar com os pés” saindo do país para melhores condições. O político considera que, face ao quadro europeu, e com esta ‘fuga de cérebros’, Portugal está a sofrer uma ‘transmontanização’ e corre o risco de viver o que os países de leste passaram há mais de 50 anos, com população “sobrequalificada e frustrada”
De férias no Algarve, o antigo ministro de Guterres resume um dos principais problemas que está a atrasar a economia do país: os salários pouco competitivos para o mercado europeu estão a levar a que os jovens mais qualificados continuem a sair do país, levando a inovação consigo. Para este político, é preciso voltar a apostar na Indústria e não apenas no turismo ou senão Portugal torna-se “a Tailândia da Europa”
Como se sabe os jovens em Portugal são dos mais precários, dos mais mal pagos, e dos que mais tarde se conseguem emancipar. Caminhamos para onde?
Sobre a situação atual dos jovens, para mim há uma questão de fundo que é o facto de todo o nosso sistema e políticas de mercado de trabalho ter sido concebido para uma realidade educativa completamente diferente. Antigamente 80% dos jovens não chegavam ao ensino superior, hoje 80% dos jovens tem essa formação.
De facto, é o que um estudo recente da Gulbenkian indica, após uma análise sobre a equidade entre gerações, ao dar conta que para os mais jovens no mercado de trabalho os seus níveis de escolaridade valem cada vez menos prémios e bons salários.
Quando os dados dão conta que diminuiu o prémio para quem chegou ao ensino superior, tem de se ter consciência que antigamente esse tal prémio era para pouca gente. E quando a entrada no ensino superior se tornar a regra do mercado de trabalho, quase que temos de deixar de falar de prémio, mas sim da sanção de quem não chegou ao ensino superior. Noutros países o prémio para um jovem que tem ensino superior já é mais baixo há muito tempo. Nós só estamos a fazer esta transição agora.
Recordamos que o ordenado médio de um jovem até aos 30 anos em Portugal anda pelos €1.054 brutos. Atrás de nós só a Grécia. Ou seja, os ordenados da maior parte dos jovens dos outros países da UE são bem mais altos, mesmo para quem não tem ensino superior.
Essa questão que levantam é outra, que é saber se o nível salarial português é adequado. E esses dados que referem dos salários com paridade de poder de compra liga-se com o facto de Portugal ter um peso dos salários baixo no rendimento do país, tão baixo que no início desta legislatura o governo se comprometeu a repô-lo na média europeia. Tudo converge para uma questão: O problema essencial dos jovens portugueses não é quando comparado com o passado, mas é quando comparado com as expectativas…
Esta é uma geração que viu as expectativas goradas. Que realidade antecipa?
Penso que há aqui um efeito inevitável. À medida que as qualificações destes jovens sobem, por causa da livre circulação de pessoas, há uma espécie de criação de um mercado de trabalho europeu. Portanto, os jovens já não funcionam necessariamente [apenas] no mercado de trabalho nacional. E isso faz parte do projeto europeu. O nosso país é que tem um problema: o facto dos jovens que funcionam nesta lógica de mercado europeu irem procurar salários mais altos, como há 50 anos os de Bragança procuraram ir para Lisboa.
Os países europeus que oferecem melhores condições competem pelos nossos jovens mais qualificados…
Temos trabalhadores qualificados a competir no mercado de trabalho aberto europeu e o nosso país não é competitivo. Esse é o problema, que não é só nosso. Se repararem, a subida do PIB per capita na Roménia acontece em parte pelo crescimento económico, mas também porque 20% da população saiu. A perspetiva que tenho é que se nada for feito, devemos preparar-nos para uma situação em que o nosso atraso económico e salarial implique a saída de força de trabalho qualificada e a entrada de força de trabalho pouco qualificada, agravando o atraso na economia.
O nosso país tem um problema: o facto dos jovens que funcionam nesta lógica de mercado europeu irem procurar salários mais altos, como há 50 anos os de Bragança procuraram ir para Lisboa.
Por onde se deve começar a resolver este problema?
Por todos os lados. Chamo a atenção para o facto de os nossos salários serem mais baixos do que a nossa situação económica permite. O facto de o peso dos salários no total de rendimento em Portugal ser de cerca de 40% do PIB, e a média da UE andar nos 45% ou 46%, aponta para que há uma margem de progressão dos salários que não tem sequer a ver com o governo. Tem a ver com as dinâmicas de empregadores e trabalhadores.
O que quer dizer com isso?
É muito simples. Ou os trabalhadores individuais conseguem melhores condições no seu contrato individual de trabalho, exigindo um salário mais alto, ou a chamada contratação coletiva, com fixação dos salários por categoria profissional entre sindicatos e patrões, tem de ser mais eficaz a exigir essa subida. Há margem económica para isso.
Quer dizer que os patrões em Portugal não estão a pagar os salários que poderiam?
Dito de outra forma, os trabalhadores não estão a ser capazes de exigir os salários que o nível económico permite. Historicamente isto fazia-se com [a luta dos] sindicatos. E isto é agora assim, apesar da enorme valorização do salário mínimo. Para se ter uma ideia, quando estive no governo há mais de 20 anos o salário mínimo cobria 7% da população, hoje cobre 20%. Portanto, se por um lado o governo está a procurar valorizar o salário mínimo, as empresas não estão a ir além desse mínimo. Daí ter sido importante o acordo que o governo, os patrões e os sindicatos fizeram no último ano, que prevê um aumento de 20% dos salários até o fim da legislatura. Agora, se vão subir não sabemos. E se a inflação for de 30% a subida será ainda de 20%?
Nós não estamos a reforçar o nosso poder na biotecnologia, mas sim na agricultura e no turismo. E isso desacelera o nosso potencial de inovação. É aquilo a que poderíamos chamar, sem ofensa, a “transmontanização” de Portugal.
Se nada mudar, e a fuga de cérebros aumentar, como prevê, qual a fatura para o país?
A existência de uma mão de obra disponível pouco qualificada reforça [apenas] a competitividade dos setores intensivos em força de trabalho. Ou seja, nós não estamos a reforçar o nosso poder na biotecnologia, mas sim na agricultura e no turismo. E isso desacelera o nosso potencial de inovação. É aquilo a que poderíamos chamar, sem ofensa, a “transmontanização” de Portugal. Ou seja, aconteceria a Portugal, no contexto europeu, um pouco o mesmo que aconteceu em Trás-os-Montes no contexto nacional há meio século, que é a existência de um equilíbrio de baixa qualidade, em que as pessoas que ficam [na terra] são as menos competitivas e menos qualificadas e o tecido que aí se desenvolve é o menos moderno e inovador. O que gera um ciclo de declínio. No caso de Trás-os-Montes este ciclo só se interrompeu quando se redescobriu a agricultura, o vinho em particular, e mais tarde o viniturismo. No caso português o perigo que estamos a atravessar é dizer-se que ‘a economia portuguesa não dá para mais’. Volto ao ponto inicial, ora se os salários atuais podem ser mais altos, mesmo com esta situação económica, isto ajudaria a reter talento. Porque o diferencial de salários é um fator relevante na saída do país.
Que aumento de salários o país poderia suportar e faria a diferença?
O que me parece é que se chegarmos à média dos salários na União Europeia, parece-me uma meta adequada. E isso implicaria um aumento de salários em termos reais que vai até aos 20%, já com a inflação incorporada. Há uma margem que nos permite chegar aí.
Seria um aumento considerável, só os jovens passariam dos atuais €1.054 para os €1634, que é a média dos salários da UE para os trabalhadores até aos 30 anos. Então não concorda que ‘vivemos acima das nossas possibilidades’…
Esse foi o mantra da última década. A ideia de que eram os salários que prejudicavam a nossa competitividade. Mas é uma ideia ultrapassada. Se vocês falarem com o Fernando Alexandre, do PSD, que está a fazer um estudo para o Conselho Económico e Social sobre qualidade do emprego, outro dos problemas é que temos um stock de capital baixo por posto de trabalho, ou seja, há pouco dinheiro investido no posto de trabalho de cada trabalhador. Isto acarreta um perigo estrutural, que é deixarmos de ter condições para aumentar a produtividade, porque ela não depende do esforço e da dedicação do trabalhador. Do ponto de vista económico, esta é a grande questão. Nós precisamos de aumentar o capital por posto de trabalho para depois poder aumentar a produtividade e, mais tarde, os salários.
Aumentar os salários só depois do aumento da produtividade?
Uma das coisas que diferencia as pessoas mais à esquerda das mais à direita é que as mais à direita dizem que temos de resolver o sistema por esta ordem. Eu considero que já temos potencial para subir os salários. Essa coisa do ‘vivemos acima das nossas possibilidades’ teve consequências. A última década foi de baixíssimo investimento produtivo, quer dos privados, quer do Estado, o que degradou a nossa situação. Nós não conseguimos romper esta barreira e ter salários mais altos e postos de trabalho à altura da nova geração se não tivermos esse investimento. Ou corremos o risco de passar pelo mesmo que os países de leste há 50, 60 ou 70 anos: a melhoria dos níveis de educação não foi acompanhada por aumento da capacidade produtiva. E, de repente, tiveram uma população sobrequalificada e frustrada.
Hoje o sistema está construído sob a ideologia do mérito individual, do quadro de honra. Ou seja, do ‘eu contra todos’. Não há a mínima noção de que os mecanismos para o sucesso são coletivos e não são o resultado de desempenhos individuais. Os jovens estão particularmente desarmados.
Há uma teoria de que o desinvestimento dos sindicatos nas últimas décadas pode não ter sido inocente.
Bom, é uma tendência geral, com poucas exceções. Esta nova geração é vítima da armadilha ideológica do individualismo e da meritocracia. Cada um tenta fazer o seu percurso sozinho. O Robert Reich, que foi ministro do Trabalho do Clinton, fala muito de esta geração ter a ilusão do mercado de trabalho dos basquetebolistas. Cada um de nós tenta triunfar, mas os salários só vão por aí acima para uma pessoa ou duas. As restantes declinam. Esse enfraquecimento dos sindicatos é parte disso. O comportamento desta geração no mercado de trabalho é apostar na dinâmica individual e não na coletiva. É um dado internacional com poucas exceções. Uma delas são os países escandinavos.
Não se terá aprendido assim na escola?
Eu penso que tudo começa com o sistema educativo. Hoje o sistema está construído sob a ideologia do mérito individual, do quadro de honra. Ou seja, do ‘eu contra todos’. Não há a mínima noção de que os mecanismos para o sucesso são coletivos e não são o resultado de desempenhos individuais. Os jovens estão particularmente desarmados. Mas eu também não queria ser simpático com os sindicatos neste ponto porque acho que também não se aproximam [dos jovens]. Para dar um exemplo, em Portugal um trabalhador de uma plataforma não se pode sindicalizar porque é considerado trabalhador por conta própria.
Os rostos dos sindicatos não têm os jovens na agenda principal?
Em termos gerais, sim. Sobretudo não têm os jovens mais qualificados que aparecem como quadros e que nunca foram uma prioridade sindical, excepto em sindicatos de algumas profissões específicas, como os médicos, os enfermeiros ou os professores. Esses sindicatos relacionam-se com um patrão muito especial chamado Estado. Em grande parte, o problema de que estamos a falar é dos sindicatos e dos jovens que trabalham no setor privado.
São esses o elo mais fraco?
São, porque sempre foram vistos como os que se safavam sozinhos. Havia uma presunção de partida de que um jovem que triunfa no Ensino Superior era um vencedor. Tenho uma filha que é jovem engenheira e que está fora do país, na Suécia. Quando falo com ela sobre as amigas, verifico que algumas das colegas com melhores notas ficaram em Portugal. Ora, essas são as que têm piores salários e não sabem negociá-los.
E qual é a visão da sua filha?
Ela está inscrita num sindicato de engenheiros. Ela não assina um contrato de trabalho sem perguntar ao sindicato o que é que aquilo quer dizer. Em Portugal, os sindicatos concentraram-se em proteger as pessoas de salários mais baixos de níveis absurdos de exploração.
O que quer dizer quando afirma que os jovens estão desarmados?
Não estão só desarmados. Usando uma expressão que a esquerda antigamente gostava: estão em risco de alienação.
Porquê?
Porque estão convencidos de que têm um poder que já não têm. Há uma falta de consciência.
Falamos de uma geração alienada?
Há esse risco numa dimensão, que é a mesma que o Guy Standing usa no livro 'O Precariado'. É uma geração que, no fundo, sente que o produto do seu esforço não vem para si. A situação mudou e o quadro institucional não o repercute. Claro que nós vemos organizações pontuais, como foi a Associação dos Precários Inflexíveis, a luta dos bolseiros. Na minha opinião, é necessário fazer isto em toda a sociedade.
Os jovens estão a votar com os pés. Dizem: neste contexto, vamos embora.
Esse despertar de uma geração ainda está por acontecer?
Não tenho nota de que tal tenha acontecido fora destas bolhas. Em parte porque esta realidade é muito recente. O crescimento da chegada ao Ensino Superior começou há duas décadas. Foi só há cerca de uma década que o jovem mediano em Portugal passou a ser o jovem com Ensino Superior. Mas se formos ver, as políticas de emprego para jovens licenciados resumem-se aos estágios profissionais. Tudo está montado para os problemas dos jovens pouco qualificados de há 40 anos. Haverá grandes mudanças institucionais em breve. E esta percepção alienante de que o jovem licenciado é um vencedor, que tem um lugar garantido na sociedade, e depois descobre que não tem, vai provocar um choque.
Deu-se conta de alguma reação a esse choque?
Sim. Nós podemos não gostar dela, mas a ação consequente tem sido sair do país. Os jovens estão a votar com os pés. Dizem: neste contexto, vamos embora.
Que grandes mudanças espera ver?
Vamos ter primeiro um agravamento das saídas quando a situação do mercado de trabalho europeu melhorar. Neste momento há dois fatores que nos travam: a saída do Reino Unido da União Europeia, que era um destino bastante forte, e a situação do mercado de trabalho na Alemanha. Mas, num curto tempo, nós vamos ter uma aceleração enorme das saídas. É a minha convicção. E as empresas, vendo-se com dificuldades em recrutar, vão ajustar a estratégia. Estou convencido de que vai haver um aumento salarial pressionado pela subida da emigração. É um clássico.
Estou convicto de que o aumento dos salários dos jovens em três a cinco anos é uma inevitabilidade.
Daqui a quanto tempo vai acontecer?
Acho que já começou a acontecer, mas quando sairmos desta situação de inflação e de desaceleração económica, entre 3 e 5 anos, a tendência vai radicalizar-se. Portanto, estou convicto de que o aumento dos salários dos jovens em três a cinco anos é uma inevitabilidade, por força das dificuldades de contratação. Uma grande incógnita é o que o país vai fazer do ponto de vista da atração de investimento. Sem investimento, batemos na parede: as empresas deixam de ter produtividade suficiente para garantir esses salários. É o grande desafio dos próximos cinco anos. De alguma forma, podemos dizer que é um desafio que se anda a repetir de cinco em cinco anos desde que entrámos para a União Europeia. [risos] Mas agora temos o PRR e o PT2030 como oportunidade. Resta saber se este afluxo sem precedente de recursos ao país se vai esvaziar em construção civil, em obra, ou se vai ter um efeito reprodutivo. Se o tiver, pode permitir um novo fôlego económico. Neste momento não há sinais disso, infelizmente. O que nós vemos é que o turismo continua a ser o motor do crescimento económico. Mas se vocês acreditarem – e eu não peço que acreditem – naquilo que diz o primeiro ministro e o ministro da Economia, eles estão completamente convencidos de que vão ter sucesso nessa mudança.
Qual é a sua opinião?
Não vejo ainda isso a acontecer. Mas ainda temos dois anos. A alteração substancial da composição da nossa força de trabalho - de que António Costa falou no discurso do Estado da Nação - eu ainda não a vejo. Mas esse seria o resultado lógico deste período de grande investimento. Eu sou cético. Não digo que não seja possível, digo que ainda não há indicadores. Como somos uma economia muito aberta, quando isso acontecer vamos ver nas exportações outros setores que não o turismo e o que nos sobra do automóvel.
O turismo é uma saída fácil para um país com sol e temperaturas amenas?
Se quiséssemos ser a Tailândia, estava perfeito.
Já temos tuk-tuks…
[risos] Há duas formas de ser [um destino] turístico: ou como França, ou como a Tailândia. Para sermos como França, precisamos de uma reindustrialização. É isso que está nas agendas modernizadoras. Se acontecer, o país muda estruturalmente. Até agora, o crescimento do emprego nos últimos tempos voltou a assentar no turismo e nos trabalhadores menos qualificados.
Com as devidas aspas, precisaríamos de uma nova “revolução industrial”?
Com muitas aspas. Seguramente uma transformação industrial. Se quiserem olhar comparativamente, temos de pensar o que é que vai ser o motor para este ciclo da economia portuguesa, como foi o têxtil e a metalomecânica ligeira nos anos 60 e 70 do século passado e como foi o ‘cluster’ do automóvel nos anos 90 e 2000.
Não será o turismo?
Seria péssimo.
Paulo Pedroso, professor e ex-ministro do Trabalho e da Solidariedade de António Guterres, faz um retrato sobre os grandes desafios do futuro do mercado de trabalho. Para o sociólogo, as gerações mais novas estão a ser “vítimas da armadilha ideológica do individualismo e da meritocracia” e a “votar com os pés” saindo do país para melhores condições. O político considera que, face ao quadro europeu, e com esta ‘fuga de cérebros’, Portugal está a sofrer uma ‘transmontanização’ e corre o risco de viver o que os países de leste passaram há mais de 50 anos, com população “sobrequalificada e frustrada”
De férias no Algarve, o antigo ministro de Guterres resume um dos principais problemas que está a atrasar a economia do país: os salários pouco competitivos para o mercado europeu estão a levar a que os jovens mais qualificados continuem a sair do país, levando a inovação consigo. Para este político, é preciso voltar a apostar na Indústria e não apenas no turismo ou senão Portugal torna-se “a Tailândia da Europa”
Como se sabe os jovens em Portugal são dos mais precários, dos mais mal pagos, e dos que mais tarde se conseguem emancipar. Caminhamos para onde?
Sobre a situação atual dos jovens, para mim há uma questão de fundo que é o facto de todo o nosso sistema e políticas de mercado de trabalho ter sido concebido para uma realidade educativa completamente diferente. Antigamente 80% dos jovens não chegavam ao ensino superior, hoje 80% dos jovens tem essa formação.
De facto, é o que um estudo recente da Gulbenkian indica, após uma análise sobre a equidade entre gerações, ao dar conta que para os mais jovens no mercado de trabalho os seus níveis de escolaridade valem cada vez menos prémios e bons salários.
Quando os dados dão conta que diminuiu o prémio para quem chegou ao ensino superior, tem de se ter consciência que antigamente esse tal prémio era para pouca gente. E quando a entrada no ensino superior se tornar a regra do mercado de trabalho, quase que temos de deixar de falar de prémio, mas sim da sanção de quem não chegou ao ensino superior. Noutros países o prémio para um jovem que tem ensino superior já é mais baixo há muito tempo. Nós só estamos a fazer esta transição agora.
Recordamos que o ordenado médio de um jovem até aos 30 anos em Portugal anda pelos €1.054 brutos. Atrás de nós só a Grécia. Ou seja, os ordenados da maior parte dos jovens dos outros países da UE são bem mais altos, mesmo para quem não tem ensino superior.
Essa questão que levantam é outra, que é saber se o nível salarial português é adequado. E esses dados que referem dos salários com paridade de poder de compra liga-se com o facto de Portugal ter um peso dos salários baixo no rendimento do país, tão baixo que no início desta legislatura o governo se comprometeu a repô-lo na média europeia. Tudo converge para uma questão: O problema essencial dos jovens portugueses não é quando comparado com o passado, mas é quando comparado com as expectativas…
Esta é uma geração que viu as expectativas goradas. Que realidade antecipa?
Penso que há aqui um efeito inevitável. À medida que as qualificações destes jovens sobem, por causa da livre circulação de pessoas, há uma espécie de criação de um mercado de trabalho europeu. Portanto, os jovens já não funcionam necessariamente [apenas] no mercado de trabalho nacional. E isso faz parte do projeto europeu. O nosso país é que tem um problema: o facto dos jovens que funcionam nesta lógica de mercado europeu irem procurar salários mais altos, como há 50 anos os de Bragança procuraram ir para Lisboa.
Os países europeus que oferecem melhores condições competem pelos nossos jovens mais qualificados…
Temos trabalhadores qualificados a competir no mercado de trabalho aberto europeu e o nosso país não é competitivo. Esse é o problema, que não é só nosso. Se repararem, a subida do PIB per capita na Roménia acontece em parte pelo crescimento económico, mas também porque 20% da população saiu. A perspetiva que tenho é que se nada for feito, devemos preparar-nos para uma situação em que o nosso atraso económico e salarial implique a saída de força de trabalho qualificada e a entrada de força de trabalho pouco qualificada, agravando o atraso na economia.
O nosso país tem um problema: o facto dos jovens que funcionam nesta lógica de mercado europeu irem procurar salários mais altos, como há 50 anos os de Bragança procuraram ir para Lisboa.
Por onde se deve começar a resolver este problema?
Por todos os lados. Chamo a atenção para o facto de os nossos salários serem mais baixos do que a nossa situação económica permite. O facto de o peso dos salários no total de rendimento em Portugal ser de cerca de 40% do PIB, e a média da UE andar nos 45% ou 46%, aponta para que há uma margem de progressão dos salários que não tem sequer a ver com o governo. Tem a ver com as dinâmicas de empregadores e trabalhadores.
O que quer dizer com isso?
É muito simples. Ou os trabalhadores individuais conseguem melhores condições no seu contrato individual de trabalho, exigindo um salário mais alto, ou a chamada contratação coletiva, com fixação dos salários por categoria profissional entre sindicatos e patrões, tem de ser mais eficaz a exigir essa subida. Há margem económica para isso.
Quer dizer que os patrões em Portugal não estão a pagar os salários que poderiam?
Dito de outra forma, os trabalhadores não estão a ser capazes de exigir os salários que o nível económico permite. Historicamente isto fazia-se com [a luta dos] sindicatos. E isto é agora assim, apesar da enorme valorização do salário mínimo. Para se ter uma ideia, quando estive no governo há mais de 20 anos o salário mínimo cobria 7% da população, hoje cobre 20%. Portanto, se por um lado o governo está a procurar valorizar o salário mínimo, as empresas não estão a ir além desse mínimo. Daí ter sido importante o acordo que o governo, os patrões e os sindicatos fizeram no último ano, que prevê um aumento de 20% dos salários até o fim da legislatura. Agora, se vão subir não sabemos. E se a inflação for de 30% a subida será ainda de 20%?
Nós não estamos a reforçar o nosso poder na biotecnologia, mas sim na agricultura e no turismo. E isso desacelera o nosso potencial de inovação. É aquilo a que poderíamos chamar, sem ofensa, a “transmontanização” de Portugal.
Se nada mudar, e a fuga de cérebros aumentar, como prevê, qual a fatura para o país?
A existência de uma mão de obra disponível pouco qualificada reforça [apenas] a competitividade dos setores intensivos em força de trabalho. Ou seja, nós não estamos a reforçar o nosso poder na biotecnologia, mas sim na agricultura e no turismo. E isso desacelera o nosso potencial de inovação. É aquilo a que poderíamos chamar, sem ofensa, a “transmontanização” de Portugal. Ou seja, aconteceria a Portugal, no contexto europeu, um pouco o mesmo que aconteceu em Trás-os-Montes no contexto nacional há meio século, que é a existência de um equilíbrio de baixa qualidade, em que as pessoas que ficam [na terra] são as menos competitivas e menos qualificadas e o tecido que aí se desenvolve é o menos moderno e inovador. O que gera um ciclo de declínio. No caso de Trás-os-Montes este ciclo só se interrompeu quando se redescobriu a agricultura, o vinho em particular, e mais tarde o viniturismo. No caso português o perigo que estamos a atravessar é dizer-se que ‘a economia portuguesa não dá para mais’. Volto ao ponto inicial, ora se os salários atuais podem ser mais altos, mesmo com esta situação económica, isto ajudaria a reter talento. Porque o diferencial de salários é um fator relevante na saída do país.
Que aumento de salários o país poderia suportar e faria a diferença?
O que me parece é que se chegarmos à média dos salários na União Europeia, parece-me uma meta adequada. E isso implicaria um aumento de salários em termos reais que vai até aos 20%, já com a inflação incorporada. Há uma margem que nos permite chegar aí.
Seria um aumento considerável, só os jovens passariam dos atuais €1.054 para os €1634, que é a média dos salários da UE para os trabalhadores até aos 30 anos. Então não concorda que ‘vivemos acima das nossas possibilidades’…
Esse foi o mantra da última década. A ideia de que eram os salários que prejudicavam a nossa competitividade. Mas é uma ideia ultrapassada. Se vocês falarem com o Fernando Alexandre, do PSD, que está a fazer um estudo para o Conselho Económico e Social sobre qualidade do emprego, outro dos problemas é que temos um stock de capital baixo por posto de trabalho, ou seja, há pouco dinheiro investido no posto de trabalho de cada trabalhador. Isto acarreta um perigo estrutural, que é deixarmos de ter condições para aumentar a produtividade, porque ela não depende do esforço e da dedicação do trabalhador. Do ponto de vista económico, esta é a grande questão. Nós precisamos de aumentar o capital por posto de trabalho para depois poder aumentar a produtividade e, mais tarde, os salários.
Aumentar os salários só depois do aumento da produtividade?
Uma das coisas que diferencia as pessoas mais à esquerda das mais à direita é que as mais à direita dizem que temos de resolver o sistema por esta ordem. Eu considero que já temos potencial para subir os salários. Essa coisa do ‘vivemos acima das nossas possibilidades’ teve consequências. A última década foi de baixíssimo investimento produtivo, quer dos privados, quer do Estado, o que degradou a nossa situação. Nós não conseguimos romper esta barreira e ter salários mais altos e postos de trabalho à altura da nova geração se não tivermos esse investimento. Ou corremos o risco de passar pelo mesmo que os países de leste há 50, 60 ou 70 anos: a melhoria dos níveis de educação não foi acompanhada por aumento da capacidade produtiva. E, de repente, tiveram uma população sobrequalificada e frustrada.
Hoje o sistema está construído sob a ideologia do mérito individual, do quadro de honra. Ou seja, do ‘eu contra todos’. Não há a mínima noção de que os mecanismos para o sucesso são coletivos e não são o resultado de desempenhos individuais. Os jovens estão particularmente desarmados.
Há uma teoria de que o desinvestimento dos sindicatos nas últimas décadas pode não ter sido inocente.
Bom, é uma tendência geral, com poucas exceções. Esta nova geração é vítima da armadilha ideológica do individualismo e da meritocracia. Cada um tenta fazer o seu percurso sozinho. O Robert Reich, que foi ministro do Trabalho do Clinton, fala muito de esta geração ter a ilusão do mercado de trabalho dos basquetebolistas. Cada um de nós tenta triunfar, mas os salários só vão por aí acima para uma pessoa ou duas. As restantes declinam. Esse enfraquecimento dos sindicatos é parte disso. O comportamento desta geração no mercado de trabalho é apostar na dinâmica individual e não na coletiva. É um dado internacional com poucas exceções. Uma delas são os países escandinavos.
Não se terá aprendido assim na escola?
Eu penso que tudo começa com o sistema educativo. Hoje o sistema está construído sob a ideologia do mérito individual, do quadro de honra. Ou seja, do ‘eu contra todos’. Não há a mínima noção de que os mecanismos para o sucesso são coletivos e não são o resultado de desempenhos individuais. Os jovens estão particularmente desarmados. Mas eu também não queria ser simpático com os sindicatos neste ponto porque acho que também não se aproximam [dos jovens]. Para dar um exemplo, em Portugal um trabalhador de uma plataforma não se pode sindicalizar porque é considerado trabalhador por conta própria.
Os rostos dos sindicatos não têm os jovens na agenda principal?
Em termos gerais, sim. Sobretudo não têm os jovens mais qualificados que aparecem como quadros e que nunca foram uma prioridade sindical, excepto em sindicatos de algumas profissões específicas, como os médicos, os enfermeiros ou os professores. Esses sindicatos relacionam-se com um patrão muito especial chamado Estado. Em grande parte, o problema de que estamos a falar é dos sindicatos e dos jovens que trabalham no setor privado.
São esses o elo mais fraco?
São, porque sempre foram vistos como os que se safavam sozinhos. Havia uma presunção de partida de que um jovem que triunfa no Ensino Superior era um vencedor. Tenho uma filha que é jovem engenheira e que está fora do país, na Suécia. Quando falo com ela sobre as amigas, verifico que algumas das colegas com melhores notas ficaram em Portugal. Ora, essas são as que têm piores salários e não sabem negociá-los.
E qual é a visão da sua filha?
Ela está inscrita num sindicato de engenheiros. Ela não assina um contrato de trabalho sem perguntar ao sindicato o que é que aquilo quer dizer. Em Portugal, os sindicatos concentraram-se em proteger as pessoas de salários mais baixos de níveis absurdos de exploração.
O que quer dizer quando afirma que os jovens estão desarmados?
Não estão só desarmados. Usando uma expressão que a esquerda antigamente gostava: estão em risco de alienação.
Porquê?
Porque estão convencidos de que têm um poder que já não têm. Há uma falta de consciência.
Falamos de uma geração alienada?
Há esse risco numa dimensão, que é a mesma que o Guy Standing usa no livro 'O Precariado'. É uma geração que, no fundo, sente que o produto do seu esforço não vem para si. A situação mudou e o quadro institucional não o repercute. Claro que nós vemos organizações pontuais, como foi a Associação dos Precários Inflexíveis, a luta dos bolseiros. Na minha opinião, é necessário fazer isto em toda a sociedade.
Os jovens estão a votar com os pés. Dizem: neste contexto, vamos embora.
Esse despertar de uma geração ainda está por acontecer?
Não tenho nota de que tal tenha acontecido fora destas bolhas. Em parte porque esta realidade é muito recente. O crescimento da chegada ao Ensino Superior começou há duas décadas. Foi só há cerca de uma década que o jovem mediano em Portugal passou a ser o jovem com Ensino Superior. Mas se formos ver, as políticas de emprego para jovens licenciados resumem-se aos estágios profissionais. Tudo está montado para os problemas dos jovens pouco qualificados de há 40 anos. Haverá grandes mudanças institucionais em breve. E esta percepção alienante de que o jovem licenciado é um vencedor, que tem um lugar garantido na sociedade, e depois descobre que não tem, vai provocar um choque.
Deu-se conta de alguma reação a esse choque?
Sim. Nós podemos não gostar dela, mas a ação consequente tem sido sair do país. Os jovens estão a votar com os pés. Dizem: neste contexto, vamos embora.
Que grandes mudanças espera ver?
Vamos ter primeiro um agravamento das saídas quando a situação do mercado de trabalho europeu melhorar. Neste momento há dois fatores que nos travam: a saída do Reino Unido da União Europeia, que era um destino bastante forte, e a situação do mercado de trabalho na Alemanha. Mas, num curto tempo, nós vamos ter uma aceleração enorme das saídas. É a minha convicção. E as empresas, vendo-se com dificuldades em recrutar, vão ajustar a estratégia. Estou convencido de que vai haver um aumento salarial pressionado pela subida da emigração. É um clássico.
Estou convicto de que o aumento dos salários dos jovens em três a cinco anos é uma inevitabilidade.
Daqui a quanto tempo vai acontecer?
Acho que já começou a acontecer, mas quando sairmos desta situação de inflação e de desaceleração económica, entre 3 e 5 anos, a tendência vai radicalizar-se. Portanto, estou convicto de que o aumento dos salários dos jovens em três a cinco anos é uma inevitabilidade, por força das dificuldades de contratação. Uma grande incógnita é o que o país vai fazer do ponto de vista da atração de investimento. Sem investimento, batemos na parede: as empresas deixam de ter produtividade suficiente para garantir esses salários. É o grande desafio dos próximos cinco anos. De alguma forma, podemos dizer que é um desafio que se anda a repetir de cinco em cinco anos desde que entrámos para a União Europeia. [risos] Mas agora temos o PRR e o PT2030 como oportunidade. Resta saber se este afluxo sem precedente de recursos ao país se vai esvaziar em construção civil, em obra, ou se vai ter um efeito reprodutivo. Se o tiver, pode permitir um novo fôlego económico. Neste momento não há sinais disso, infelizmente. O que nós vemos é que o turismo continua a ser o motor do crescimento económico. Mas se vocês acreditarem – e eu não peço que acreditem – naquilo que diz o primeiro ministro e o ministro da Economia, eles estão completamente convencidos de que vão ter sucesso nessa mudança.
Qual é a sua opinião?
Não vejo ainda isso a acontecer. Mas ainda temos dois anos. A alteração substancial da composição da nossa força de trabalho - de que António Costa falou no discurso do Estado da Nação - eu ainda não a vejo. Mas esse seria o resultado lógico deste período de grande investimento. Eu sou cético. Não digo que não seja possível, digo que ainda não há indicadores. Como somos uma economia muito aberta, quando isso acontecer vamos ver nas exportações outros setores que não o turismo e o que nos sobra do automóvel.
O turismo é uma saída fácil para um país com sol e temperaturas amenas?
Se quiséssemos ser a Tailândia, estava perfeito.
Já temos tuk-tuks…
[risos] Há duas formas de ser [um destino] turístico: ou como França, ou como a Tailândia. Para sermos como França, precisamos de uma reindustrialização. É isso que está nas agendas modernizadoras. Se acontecer, o país muda estruturalmente. Até agora, o crescimento do emprego nos últimos tempos voltou a assentar no turismo e nos trabalhadores menos qualificados.
Com as devidas aspas, precisaríamos de uma nova “revolução industrial”?
Com muitas aspas. Seguramente uma transformação industrial. Se quiserem olhar comparativamente, temos de pensar o que é que vai ser o motor para este ciclo da economia portuguesa, como foi o têxtil e a metalomecânica ligeira nos anos 60 e 70 do século passado e como foi o ‘cluster’ do automóvel nos anos 90 e 2000.
Não será o turismo?
Seria péssimo.
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