25.7.23

Acabei o secundário, e agora? Incerteza dos alunos aumenta e muitos sentem-se “ansiosos” e “perdidos"

in Expresso

Todos os anos milhares de alunos fazem os exames nacionais ao concluir o ensino secundário e são confrontados com decisões a tomar: “Continuo os meus estudos ou entro no mercado de trabalho? E se continuar os estudos, que curso sigo?”

A incerteza e o receio dominam as mentes de muitos dos que deixam agora para trás o Ensino Secundário e, perante decisões que parecem definitivas, falha a convicção de que foram feitas as escolhas certas. O Expresso reuniu testemunhos de estudantes, mas também de quem os pode apoiar neste momento de escolha.

A CORRER CONTRA O RELÓGIO

Concluído o 12.º ano, Francisco Pedro, de 17 anos, sente que o tempo de tomar uma decisão está cada vez mais próximo. Terminados os exames, já está na altura de começar a pensar no próximo passo da sua vida e tal como muitos jovens, está com receio. “Como quase todos os adolescentes, estou com medo. Senti-me um pouco pressionado ao ter de fazer uma escolha tão cedo. Estou a acabar o 12º ano e pensei “É só isto?”, passou num fechar de olhos”.


Apesar de ter uma ideia do quer fazer no futuro, ainda se sente inseguro e questiona-se se está a tomar a “decisão certa”. Admite que o dinheiro é um fator importante na sua decisão. “O dinheiro é um grande problema atualmente, porque queremos estar financeiramente estáveis, mas ser felizes com um trabalho que gostemos e não desprezamos. Eu tento ignorar esse medo, mas sem dúvida influencia as minhas escolhas".

O mesmo acontece com Maria Beatriz Silva de 18 anos. Estudante na Escola Secundária de Carcavelos, Beatriz tem uma página no Instagram em que partilha conteúdo sobre os seus estudos. Apesar da dedicação à escola, admite que tem medo de escolher a opção errada e arrepender-se. “Para mim, é extremamente difícil escolher agora uma licenciatura. O tempo está a esgotar-se e tomar uma decisão desta dimensão é um processo intenso para o nosso cérebro. Por muito que pense que posso sempre mudar o meu caminho ao longo da vida, sei que esta decisão vai ter consequências. Não sei se estou pronta para tal impacto.”


Com as candidaturas para o ensino superior a aproximar-se, a ansiedade tem vindo a aumentar cada vez mais, tal como as suas inquietações. “Será que vai dar certo? Será que vou gostar do curso? Tenho medo de não me encaixar e voltar a repetir um ano. Será que me vou arrepender da minha decisão? Preocupo-me com as saídas profissionais e as oportunidades que podem ou não advir da licenciatura.”

Lúcia Neves, Psicóloga Educacional, explica que este fenómeno é muito comum entre os jovens. “Diria que é normal não saber o que fazer. O impacto emocional vai depender muito do suporte da família e da escola na tomada de decisão. A ansiedade dos adultos e a falta de uma perspetiva positiva de futuro tendem a dificultar e às vezes barrar o processo de autonomização dos jovens. É fundamental dar espaço, deixar o caminho livre... para poder "não acertar à primeira"”.

“SENTI-ME MUITO INFELIZ E PERDIDA”


Foi, em parte, esta falta de espaço que levou Beatriz Castilho de 23 anos, licenciada em Comunicação, a seguir o caminho que lhe era indicado pela família.


De ciências para engenharia, e de engenharia para comunicação, Beatriz sempre soube que o cinema era a sua paixão. No entanto, quando chegou a altura de se candidatar à licenciatura escolheu a opção que agradava mais os pais.

Quando concluiu o secundário aos 18 anos, viu que tinha cerca de um mês para se candidatar à universidade. Foi com isto em mente que escolheu o curso que, na altura, fazia mais sentido, Engenharia Informática. “Tenho alguns membros da família que também se licenciaram em Engenharia Informática e foi assim que fiz uma escolha sem realmente precisar de escolher – na minha cabeça, só aquilo é que fazia sentido”.


Embora não fosse algo que lhe agradasse, a falta de tempo e as expetativas da família falaram mais alto que os seus desejos. “A minha preocupação foram sempre os meus pais, foram muito vocais de como queriam que eu seguisse algo “confiável” e, na minha cabeça, se eu seguisse o rumo que eles criaram para mim, nada poderia correr mal”.


Mas não foi bem assim. Ao começar o curso, não demorou muito para se aperceber que o percurso que escolheu não era um que lhe trazia felicidade. A mudança de ambiente entre o secundário e o ensino superior foi um “choque” para Beatriz que viu que, independentemente dos seus esforços, a vontade de ficar no curso diminuía a cada dia. “Passei por um período onde passava todos os dias a tentar convencer-me a mim própria que ia tudo correr bem, mas, quando me tentava imaginar, num futuro próximo, a exercer a profissão, ia tudo por água abaixo. Senti-me muito infeliz e perdida.”


Carla Moreira, Psicóloga Educacional e Especialista em Orientação Vocacional e Desenvolvimento da Carreira, explica que quando um jovem sente que tomou a decisão errada, pode acentuar os “sentimentos de incapacidade, incompetência, de fracasso e de medo pelo futuro”. Isto pode contribuir para uma maior dessatisfação para com as escolhas feitas, e para “um baixo autoconceito”.


Depois de um ano menos positivo, Beatriz viu que era altura de tentar algo novo e confrontar os pais. “Não foi uma aceitação fácil, mas não posso dizer que foi impossível. Os meus pais sabiam que a decisão estava tomada e agora era seguir em frente.”


Em 2020, entrou no curso de Ciências da Comunicação da Universidade do Algarve, e agora a chegar ao fim da licenciatura, prepara-se para seguir os seus sonhos na área das artes visuais.

COMO É QUE OS PODEMOS AJUDAR?

Perante esta situação, não é difícil de imaginar como o desgaste emocional do processo de exames e candidaturas à universidade afeta os estudantes. Em conversa com Psicólogas Educacionais, o Expresso procurou saber as melhores maneiras de ajudar os jovens que se encontram nesta situação.

Escola e Professores


Sendo que a maior parte dos estudantes passa mais de metade do seu tempo na escola, quando em dúvida em relação ao futuro, muitos procuram apoio perto dos professores ou orientadores profissionais.

Carla Moreira sublinha que um método essencial seria o relacionamento entre os conteúdos académicos e profissionais. Isto pode ser feito nas salas de aula, através do desenvolvimento de atividades que promovam o conhecimento acerca das profissões como “entrevistas a profissionais e trabalhos sobre uma área ou profissão à escolha”, tal como “discutir em sala de aula profissões ou ofícios que os alunos gostariam de conhecer mais aprofundadamente”.


Psicólogos Educacionais


Um passo importante para os psicólogos educacionais, seria ajudar os jovens a conhecerem-se mais a si próprios e ao mundo das profissões. Carla Moreira afirma que é essencial ir ajudando os alunos neste processo ao longo do seu percurso académico “o quanto antes”, sem deixar as conversar para os momentos finais como a conclusão do 9.º ou do 12.º anos.

A psicóloga Lúcia Neves acrescenta que, “visitas de estudo a locais de emprego, presença em dias abertos de faculdades ou escolas superiores, são algumas estratégias que podem ser dinamizadas pelo psicólogo escolar ou por agentes da comunidade”

Acima de tudo, as psicólogas aconselham a família a envolver-se neste processo e aprender mais sobre o que pode fazer para ajudar os jovens.









Família

Ninguém conhece os jovens melhor que a sua família, e em muitas ocasiões, os familiares acabam por ter um contributo importante na decisão do futuro dos seus filhos. Carla Moreira salienta a importância de os pais darem espaço aos filhos para entenderem melhor quem eles são e mostrar apoio na “construção de uma identidade vocacional”, ao invés de imporem as suas escolhas. É importante que “não tomarem decisões por eles, mas sim que os ajudem a decidir”.


Uma maneira de estimular este crescimento vocacional é ouvir os jovens e encorajar a autonomia deles. “Conhecer os gostos dos filhos e promover um maior conhecimento nessas áreas, assim como incentivar a cooperação e o trabalho em equipa”.


A psicóloga acrescenta que “aceitar que podemos sempre reorientar as nossas decisões vocacionais, tal como qualquer outra dimensão da nossa vida”, é um pensamento que pode aliviar este peso nos jovens.










Texto de Catarina Vitória Lopes, editado por Ricardo Marques e Pedro Miguel Coelho