Por Bárbara Wong, in Jornal Público
Famílias carenciadas seriam as mais prejudicadas se o sistema vigorasse em Portugal, revela estudo feito com base na experiência espanhola
Se Portugal lançasse um sistema de empréstimo de manuais escolares, essa medida não seria boa nem para o Estado nem para as famílias mais carenciadas, revela um estudo feito pelo Observatório dos Recursos Educativos (ORE).
Adalberto Dias de Carvalho, do ORE, investigou a realidade espanhola, onde, a partir de 2000, foram criadas políticas de ajuda às famílias através de dois sistemas: ou pelo empréstimo dos livros escolares aos alunos, tendo estes de devolvê-los no final do ano lectivo; ou através do apoio directo, atribuindo um cheque no valor dos livros a adquirir pelas famílias. Com base num estudo levado a cabo pela Universidade de Santiago de Compostela, Dias de Carvalho faz a transposição para a realidade portuguesa.
Assim, se o Estado português suportasse o custo dos manuais escolares do 1.º ao 9.º ano, esse custo seria de 104 milhões de euros, logo no primeiro ano, caso o modelo de empréstimo fosse generalizado a todos os anos de escolaridade. O custo seria menor se fosse criada uma bolsa de empréstimo de manuais escolares só para os alunos que mais precisam, nota o investigador do ORE, uma entidade autónoma e independente apoiada pela Porto Editora.
Além desta despesa, é preciso contabilizar os custos de reposição dos manuais que não forem devolvidos. O Ministério da Educação (ME) pode impor uma caução que, segundo a experiência espanhola, é de difícil cobrança, sobretudo junto dos alunos mais pobres.
Há ainda um custo acrescido, o da reposição obrigatória, ou seja, dos livros dos 1.º e 2.º anos de escolaridade e do ensino de línguas estrangeiras que estão desenhados para serem preenchidos pelos estudantes e que não podem, por isso, ser reutilizados no ano seguinte.
A somar aos 104 milhões estão os preços dos manuais em ano de adopção. Dias de Carvalho (na foto ao lado) acrescenta ainda os custos logísticos para criar um projecto destes. São precisos recursos humanos nas escolas e o ME deverá criar uma equipa de trabalho para "conceber, gerir e executar a complexidade dos respectivos processos de apoio logístico", para não falar dos custos administrativos como as comunicações, material de escritório, notas de encomenda, etc.
Os alunos mais pobres serão os mais prejudicados por uma medida como a do empréstimo dos livros escolares, revela o estudo. Em Espanha, a experiência demonstrou que são eles os que mais danificam ou perdem os livros. Portanto, são sujeitos ao pagamento de cauções, ao passo que os alunos de meios mais favorecidos beneficiam do empréstimo e não pagam nada.
O empréstimo dos manuais pode levar ao "agravamento da discriminação negativa dos alunos mais carenciados", porque se distinguem dos outros pelo uso de livros já utilizados, enquanto os outros continuarão a adquirir livros novos. Em muitas casas, os manuais escolares são mesmo o único bem cultural disponível, acrescenta o investigador.