1.4.07

Obrigação de cortar o défice sacrificou investimento

Sérgio Aníbal, in Jornal Público

O investimento público em Portugal tem estado, desde a adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia, muito dependente do ritmo de execução dos fundos estruturais, mas tem registado, nos últimos anos, uma tendência forte de descida que colocou o seu peso na economia nos valores mais baixos de sempre.

De acordo com o último registo do défice e da dívida apresentado por Portugal em Bruxelas, o investimento público representou, em 2006, 2,3 por cento do PIB. Este é o valor mais baixo desde pelo menos 1977, o primeiro ano para o qual foi possível obter dados comparáveis.

A descida para este valor é consequência de uma tendência de corte no investimento que os sucessivos governos desde 2002 decidiram implementar, com o objectivo principal de garantir o cumprimento do objectivo do défice. Em 2001, o investimento representava 3,9 por cento do PIB, um valor que até é mais alto do que a média registada em Portugal desde 1986 e ficava acima da grande maioria dos países da União Europeia. No entanto, com a entrada de Portugal em situação de défice excessivo precisamente durante esse ano, a contenção orçamental virou-se para onde é mais fácil e rápido cortar: o investimento. Muito importante nesta tendência foi também a imposição às autarquias de limites ao endividamento a partir de 2003. O poder local é a fonte de uma parte significativa do investimento público português. Em anos de eleições autárquicas - como 1993, 1997 e 2001 -, foram atingidos picos no peso do investimento público na economia.

Mas agora, com restrições bastante mais fortes ao recurso ao crédito bancário e com as transferências provenientes do Orçamento do Estado estagnadas, as câmaras municipais não tiveram, durante os últimos anos, outra alternativa do que cortar no investimento, já que a contenção da despesa corrente - tal como acontece na administração central - é bastante mais difícil de concretizar.

É, assim, bastante claro que a evolução do investimento público depois de, nas últimas décadas, ter evoluído ao ritmo da execução dos fundos comunitários e dos ciclos eleitorais, tem estado, desde 2002, refém das obrigações nacionais de cumprimento das regras orçamentais portuguesas. E, por isso, com a passagem em apenas quatro anos de um nível de investimento de 3,9 por cento para 2,3 por cento, Portugal passou a registar um valor inferior à média da zona euro e muito abaixo dos países do alargamento que passaram também a beneficiar da ajuda dos fundos comunitários.

O corte de 0,5 pontos percentuais do PIB registado neste indicador durante o ano passado apenas encontra paralelo nos anos de 1983 e 1984. Também nessa altura, Portugal viu-se forçado a colocar as suas finanças públicas em ordem. Grande parte do incentivo veio, mais uma vez, do estrangeiro, dessa vez não da União Europeia, mas do Fundo Monetário Internacional, que fazia depender os seus financiamento de uma política orçamental bastante restritiva.