Fernando de Sousa, Bruxelas, in Diário de Notícias
Os programas de coesão da União Europeia, no período de 2000 a 2006, contribuíram para um aumento de 2% do Produto Interno Bruto (PIB) em Portugal. Esta conclusão está contida no Quarto Relatório da Comissão Europeia sobre a Coesão Económica e Social, uma política comunitária que pretende reduzir as disparidades de desenvolvimento entre as diferentes regiões da UE.
No entanto, o mesmo relatório salienta que o PIB português se colocava, em 2005, apenas a 74% da média da UE, depois de, até 1999, o crescimento se situar acima daquele limite. O documento salienta que este nível de crescimento, em 2005, coloca Portugal abaixo dos registados em dois dos novos Estados-membros da UE, a República Checa e a Eslovénia.
Ao procurar explicar esta situação, a comissária europeia da Política Regional, Danuta Hubner, mostrou-se convicta de que "durante décadas, em Portugal, desde a Revo- lução, não houve sucesso suficiente no investimento na educação", tendo-se preferido o desenvolvimento de infraestruturas, igualmente necessárias. A comissária salientou, ainda, que "recentemente, Portugal avançou para um crescimento baseado na produtividade, na inovação, e numa educação mais desenvolvida".
Segundo aquele documento, as regiões portuguesas e gregas destacam-se entre as com menor proporção de empregos nos sectores de alta tecnologia.
O relatório indica ainda que, entre 2000 e 2005, o desemprego aumentou quase 4% em Portugal. Em 2004, o documento sublinha que, em Portugal, tal como na Irlanda, Grécia e Espanha, 20% da população corria o risco de se colocar abaixo do limite de pobreza, definida com base num rendimento disponível abaixo de 60% da média nacional.
A produtividade portuguesa, no período de 1995 a 2005, é também apresentada com um crescimento abaixo da média da UE, considerada com 27 Estados-membros. Entretanto, este indicador mostra-se consideravelmente mais elevado entre os novos Estados-membros, com uma média superior à europeia, o que pode significar uma concorrência potencial quanto à capacidade económica.
Mais um aviso aos têxteis
A Comissão Europeia recomendou mais uma vez aos produtores portugueses de têxteis que modernizem a sua actividade para melhor responderem à grande exposição deste sector à concorrência das economias emergentes na Ásia.
O relatório, ontem divulgado em Bruxelas, destaca que, no Norte de Portugal, cerca de 13% da mão-de-obra trabalha no sector têxtil, a concentração mais elevada de toda a União Europeia. Este sector é incluído na lista dos que se encontram em posição mais vulnerável perante a globalização, por se tratarem de indústrias "para as quais os países em desenvolvimento avançaram em larga escala e onde os custos baixos são um factor primário de concorrência, pelo menos no que se refere a bens de produção em massa".
O próprio relatório confirma a vulnerabilidade desta exposição, ao constatar que, no Norte de Portugal, o emprego assinalou um declínio nos últimos anos "à medida que a concorrência dos produtores de baixo custo na China e noutras partes da Ásia Oriental se intensificou, especialmente depois do fim do Acordo Multifibras, em 2005".
Segundo o estudo da Comissão, "o desafio com que os produtores portugueses se deparam é fazer passar a sua base de concorrência dos custos baixos para a qualidade, estilo e resposta rápida às mudanças da procura." A título de exemplo, a Comissão menciona a conversão registada, com sucesso, por parte dos produtores do sector têxtil no Norte e Centro da Itália. O relatório considera, no entanto, que uma tal alteração "exige uma grande mudança de métodos de trabalho e na organização da produção.
31.5.07
Viver quase derrotado no bairroagonizante da Quinta da Vitória
Luís Garcia, in Jornal de Notícias
Moram ainda 326 famílias num bairro onde à miséria se acrescentam os conflitos sociais
Aos habitantes do Bairro da Quinta da Vitória, na Portela, concelho de Loures, já lhes custa a acreditar que possam viver numa casa com condições, onde não haja ratos nem medo de levar uma bala perdida. Por isso, é com desconfiança que olham para o protocolo que a Câmara Municipal de Loures e a Sogiporto, empresa proprietária daqueles terrenos, assinam hoje.
Segundo os termos do acordo, a Sogiporto compromete-se a demolir as barracas da Quinta da Vitória, realojando ou indemnizando as 236 famílias do bairro. Ao todo, calcula-se que o bairro de barracas, existente há mais de 25 anos, conte com perto de 800 habitantes, um número já bastante inferior aos quatro mil contados nos censos de 2001.
Elvira Costa, 37 anos, vive na Quinta da Vitória há 15 anos. A família foi crescendo mas a casa não ela, três filhos, um dos quais com deficiência profunda, e ainda um neto partilham uma pequena barraca. "Estou cansada de viver na miséria, no meio dos ratos", diz a imigrante são-tomense. "Só queria uma casa para viver com os meus filhos", conclui.
Desilusão, angústia, revolta e medo. É disto que falam as palavras de Elvira Costa, mas também o seu rosto. "Há muita confusão entre os vizinhos, uns esfaqueiam os outros, há tiros. Às vezes tenho medo", diz.
Já Ramicilla Velgi parece ter-se habituado a viver na miséria. Os 27 anos passados numa barraca de madeira, sem luz nem água canalizada, parecem anestesiá-lo, deixando-lhe um leve sorriso que nunca tira, nem quando diz que a sua vida é "muito díficil".
Nascido em Goa, chegou a Portugal há 27 anos e trabalhou na agricultura e na construção civil. Agora, aos 73 anos e sendo "velho de mais para trabalhar", sonha com "um quarto pequeno" para partilhar com o filho. "Não quero dinheiro, quero casa porque não posso pagar uma renda, água e luz", diz.
Moram ainda 326 famílias num bairro onde à miséria se acrescentam os conflitos sociais
Aos habitantes do Bairro da Quinta da Vitória, na Portela, concelho de Loures, já lhes custa a acreditar que possam viver numa casa com condições, onde não haja ratos nem medo de levar uma bala perdida. Por isso, é com desconfiança que olham para o protocolo que a Câmara Municipal de Loures e a Sogiporto, empresa proprietária daqueles terrenos, assinam hoje.
Segundo os termos do acordo, a Sogiporto compromete-se a demolir as barracas da Quinta da Vitória, realojando ou indemnizando as 236 famílias do bairro. Ao todo, calcula-se que o bairro de barracas, existente há mais de 25 anos, conte com perto de 800 habitantes, um número já bastante inferior aos quatro mil contados nos censos de 2001.
Elvira Costa, 37 anos, vive na Quinta da Vitória há 15 anos. A família foi crescendo mas a casa não ela, três filhos, um dos quais com deficiência profunda, e ainda um neto partilham uma pequena barraca. "Estou cansada de viver na miséria, no meio dos ratos", diz a imigrante são-tomense. "Só queria uma casa para viver com os meus filhos", conclui.
Desilusão, angústia, revolta e medo. É disto que falam as palavras de Elvira Costa, mas também o seu rosto. "Há muita confusão entre os vizinhos, uns esfaqueiam os outros, há tiros. Às vezes tenho medo", diz.
Já Ramicilla Velgi parece ter-se habituado a viver na miséria. Os 27 anos passados numa barraca de madeira, sem luz nem água canalizada, parecem anestesiá-lo, deixando-lhe um leve sorriso que nunca tira, nem quando diz que a sua vida é "muito díficil".
Nascido em Goa, chegou a Portugal há 27 anos e trabalhou na agricultura e na construção civil. Agora, aos 73 anos e sendo "velho de mais para trabalhar", sonha com "um quarto pequeno" para partilhar com o filho. "Não quero dinheiro, quero casa porque não posso pagar uma renda, água e luz", diz.
Portugal é o nono país mais seguro do mundo num ranking da Economist
José Bento Amaro, in Jornal Público
Estudo da revista britânica incidiu sobre 121 países, concluindo que as mais de 391 mil participações criminais registadas em território nacional em 2006 são quase irrisórias
Portugal foi considerado, no ano passado, o nono país mais pacífico do mundo. Um estudo da revista britânica The Economist, denominado Global Peace Index, refere que a criminalidade registada em território nacional, mesmo tendo mais de 391 mil participações criminais num só ano, é das mais irrisórias num universo de 121 países alvo de análise.
A tendência registada em Portugal é seguida por diversos outros países europeus. De facto, o estudo, que compreende 24 factores de critérios de avaliação (crime organizado, verbas destinadas às Forças Armadas, rendimentos dos cidadãos ou nível de educação, entre outros), indica que entre os dez países mais seguros do mundo sete são da Europa.
O primeiro lugar da lista mundial é ocupado pela Noruega, numa tabela, ordenada classificativamente, onde também se incluem a Nova Zelândia, a Dinamarca, a Irlanda, o Japão, a Finlândia, a Suécia, o Canadá, Portugal e a Áustria.
Em Portugal, mais de 50 por cento da criminalidade que anualmente é participada às diversas entidades policiais e judiciais reporta-se, quase só, a delitos punidos com penas me-
nores. A ofensa à integridade física simples, a ameaça e coacção, os maus tratos do cônjuge, os furtos de e em veículos, os furtos em instalações comerciais e industriais, a condução sobre o efeito de álcool e
a condução sem habilitação (falta de carta) são dominantes no sistema judicial nacional.
Os números nacionais relativos a 2006 reflectem, ainda assim, um acréscimo da criminalidade participada na ordem dos dois por cento (mais 7832 casos do que em relação a 2005).
A criminalidade violenta grave em Portugal cifrou-se apenas em 5,5 por cento do total registado. E, desta, cerca de 80 por cento (5378 casos, segundo enuncia o Relatório de Segurança Interna de 2006), refere-se a roubos por esticão praticados na via pública. Este crime (juridicamente considerado como roubo, porque implica violência) é, de resto, o de maior incidência nacional. Diz respeito a pessoas que, transitando na via pública, acabam por ficar sem os seus pertences levados por ocupantes de veículos motorizados ou até por pessoas apeadas.
194 homicídios
Entre os crimes de violência grave contabilizaram-se, no ano transacto, em Portugal, 194 casos de homicídio voluntário consumado, 673 relativos à ofensa à integridade física de forma grave, 341 de violação e 556 relativos a raptos, sequestros e tomada de reféns.
Os grandes centros urbanos do litoral foram os locais onde a criminalidade grave teve maior incidência. Lisboa, Porto, Setúbal, Faro, Braga e Aveiro contabilizaram cerca de 70 por cento do total deste tipo de delitos.
O estudo da Economist, cuja elaboração contou com apoio de personalidades já distinguidas com o Prémio Nobel da Paz, como por exemplo Dalai Lama, Desmond Tutu ou Jimmy Carter, refere ainda as nações mais perigosas. No topo da lista negra encontra-se o Iraque, país que tem vindo a ser assolado por dezenas de mortes diárias em consequência de uma guerra externa e acções terroristas internas. O Sudão, onde grassam a fome e os conflitos armados internos, ocupa o segundo lugar. Seguem-se Israel, Rússia, Nigéria, Colômbia, Paquistão, Líbano e Costa do Marfim.
Angola, antiga colónia portuguesa, que para além de 13 anos de guerrilha contra o Estado português teve ainda que suportar uma guerra civil que só terminou em Fevereiro de 2002, com a morte do líder da UNITA, Jonas Savimbi, é considerado, no mesmo relatório, como o décimo país mais perigoso do mundo.
Nos dez países mais violentos, excluindo os que não se encontram em guerra, a Rússia, onde predominam as máfias, a Nigéria e a Colômbia, são os que registam um maior número assassinatos. Os relatórios não fazem referência ao número de pessoas que ali são abatidas, mas sabe-se que, por exemplo, na África do Sul, país que nem sequer surge entre os dez mais violentos a nível mundial, as autoridades registam uma média anual superior a 21 mil homicídios. O Brasil, onde as mortes violentas diárias são na ordem das dezenas, também não é citado. A luta pelo controlo do tráfico de drogas é, na maior parte dos casos, a causa primeira dos crimes.
Estudo da revista britânica incidiu sobre 121 países, concluindo que as mais de 391 mil participações criminais registadas em território nacional em 2006 são quase irrisórias
Portugal foi considerado, no ano passado, o nono país mais pacífico do mundo. Um estudo da revista britânica The Economist, denominado Global Peace Index, refere que a criminalidade registada em território nacional, mesmo tendo mais de 391 mil participações criminais num só ano, é das mais irrisórias num universo de 121 países alvo de análise.
A tendência registada em Portugal é seguida por diversos outros países europeus. De facto, o estudo, que compreende 24 factores de critérios de avaliação (crime organizado, verbas destinadas às Forças Armadas, rendimentos dos cidadãos ou nível de educação, entre outros), indica que entre os dez países mais seguros do mundo sete são da Europa.
O primeiro lugar da lista mundial é ocupado pela Noruega, numa tabela, ordenada classificativamente, onde também se incluem a Nova Zelândia, a Dinamarca, a Irlanda, o Japão, a Finlândia, a Suécia, o Canadá, Portugal e a Áustria.
Em Portugal, mais de 50 por cento da criminalidade que anualmente é participada às diversas entidades policiais e judiciais reporta-se, quase só, a delitos punidos com penas me-
nores. A ofensa à integridade física simples, a ameaça e coacção, os maus tratos do cônjuge, os furtos de e em veículos, os furtos em instalações comerciais e industriais, a condução sobre o efeito de álcool e
a condução sem habilitação (falta de carta) são dominantes no sistema judicial nacional.
Os números nacionais relativos a 2006 reflectem, ainda assim, um acréscimo da criminalidade participada na ordem dos dois por cento (mais 7832 casos do que em relação a 2005).
A criminalidade violenta grave em Portugal cifrou-se apenas em 5,5 por cento do total registado. E, desta, cerca de 80 por cento (5378 casos, segundo enuncia o Relatório de Segurança Interna de 2006), refere-se a roubos por esticão praticados na via pública. Este crime (juridicamente considerado como roubo, porque implica violência) é, de resto, o de maior incidência nacional. Diz respeito a pessoas que, transitando na via pública, acabam por ficar sem os seus pertences levados por ocupantes de veículos motorizados ou até por pessoas apeadas.
194 homicídios
Entre os crimes de violência grave contabilizaram-se, no ano transacto, em Portugal, 194 casos de homicídio voluntário consumado, 673 relativos à ofensa à integridade física de forma grave, 341 de violação e 556 relativos a raptos, sequestros e tomada de reféns.
Os grandes centros urbanos do litoral foram os locais onde a criminalidade grave teve maior incidência. Lisboa, Porto, Setúbal, Faro, Braga e Aveiro contabilizaram cerca de 70 por cento do total deste tipo de delitos.
O estudo da Economist, cuja elaboração contou com apoio de personalidades já distinguidas com o Prémio Nobel da Paz, como por exemplo Dalai Lama, Desmond Tutu ou Jimmy Carter, refere ainda as nações mais perigosas. No topo da lista negra encontra-se o Iraque, país que tem vindo a ser assolado por dezenas de mortes diárias em consequência de uma guerra externa e acções terroristas internas. O Sudão, onde grassam a fome e os conflitos armados internos, ocupa o segundo lugar. Seguem-se Israel, Rússia, Nigéria, Colômbia, Paquistão, Líbano e Costa do Marfim.
Angola, antiga colónia portuguesa, que para além de 13 anos de guerrilha contra o Estado português teve ainda que suportar uma guerra civil que só terminou em Fevereiro de 2002, com a morte do líder da UNITA, Jonas Savimbi, é considerado, no mesmo relatório, como o décimo país mais perigoso do mundo.
Nos dez países mais violentos, excluindo os que não se encontram em guerra, a Rússia, onde predominam as máfias, a Nigéria e a Colômbia, são os que registam um maior número assassinatos. Os relatórios não fazem referência ao número de pessoas que ali são abatidas, mas sabe-se que, por exemplo, na África do Sul, país que nem sequer surge entre os dez mais violentos a nível mundial, as autoridades registam uma média anual superior a 21 mil homicídios. O Brasil, onde as mortes violentas diárias são na ordem das dezenas, também não é citado. A luta pelo controlo do tráfico de drogas é, na maior parte dos casos, a causa primeira dos crimes.
Mais mil camas de cuidados continuados nas misericórdias
António Marujo, in Jornal Público
Meia centena de misericórdias irá investir na criação de mais um milhar de camas da Rede de Cuidados Continuados, disse ontem ao PÚBLICO o presidente da União das Misericórdias Portuguesas (UMP), Manuel de Lemos. Com este crescimento, a rede nacional passará a contar com cerca de 2500 camas. Do total, quase 1800 serão das misericórdias. Hoje, inicia-se em Braga o VIII Congresso Nacional das Misericórdias.
Manuel de Lemos insiste na ideia de que os cuidados continuados não são apenas as camas. "Inclui-se também o apoio domiciliário, que tem de ser pensado de outra forma, a alimentação e a saúde." A entrada de mais 50 misericórdias na rede - actualmente são 28, com cerca de 800 camas - significa que os serviços prestados terão de "manter a mesma capacidade e qualidade", diz o presidente da UMP.
"As misericórdias são instituições com 500 anos no sector social, mas têm capacidade de se modernizar", assegura Manuel de Lemos. "O que vamos fazer é dizer à sociedade e ao Estado que somos úteis ao país, não vamos exigir nada." Nem mesmo a actualização dos valores de comparticipação do Estado? Lemos diz que o congresso não é o lugar para tal. "Os valores são objecto de negociação, não são para falar no congresso."
Mesmo assim, o presidente da UMP diz que não há conflito, sobre a questão, entre as misericórdias e o executivo. "Temos tido um diálogo aberto com o Governo."
Na relação com as câmaras municipais, outro dos temas do congresso, o presidente da UMP diz que as misericórdias estão atentas à questão das transferências de competências para as autarquias. Conta que, recentemente, o ministro da Saúde deu o exemplo do hospital de Valongo como um dos que poderiam ser geridos pela autarquia.
"Porque não transferi-lo para a proprietária, que é a Misericórdia? As misericórdias já gerem 20 hospitais e há outros 30 propriedade das misericórdias e que ainda estão no Serviço Nacional de Saúde. E as autarquias nunca geriram hospitais", contesta Manuel de Lemos. Dá como exemplo o de Santo António, no Porto, e o de São Marcos, em Braga, que são das misericórdias locais mas estão integrados no SNS. "Antes que haja transferência, estamos a marcar terreno."
O congresso decorre até sábado e debaterá ainda a organização interna destas instituições sociais. As 400 misericórdias do país dão emprego directo a cerca de 50 mil pessoas.
Meia centena de misericórdias irá investir na criação de mais um milhar de camas da Rede de Cuidados Continuados, disse ontem ao PÚBLICO o presidente da União das Misericórdias Portuguesas (UMP), Manuel de Lemos. Com este crescimento, a rede nacional passará a contar com cerca de 2500 camas. Do total, quase 1800 serão das misericórdias. Hoje, inicia-se em Braga o VIII Congresso Nacional das Misericórdias.
Manuel de Lemos insiste na ideia de que os cuidados continuados não são apenas as camas. "Inclui-se também o apoio domiciliário, que tem de ser pensado de outra forma, a alimentação e a saúde." A entrada de mais 50 misericórdias na rede - actualmente são 28, com cerca de 800 camas - significa que os serviços prestados terão de "manter a mesma capacidade e qualidade", diz o presidente da UMP.
"As misericórdias são instituições com 500 anos no sector social, mas têm capacidade de se modernizar", assegura Manuel de Lemos. "O que vamos fazer é dizer à sociedade e ao Estado que somos úteis ao país, não vamos exigir nada." Nem mesmo a actualização dos valores de comparticipação do Estado? Lemos diz que o congresso não é o lugar para tal. "Os valores são objecto de negociação, não são para falar no congresso."
Mesmo assim, o presidente da UMP diz que não há conflito, sobre a questão, entre as misericórdias e o executivo. "Temos tido um diálogo aberto com o Governo."
Na relação com as câmaras municipais, outro dos temas do congresso, o presidente da UMP diz que as misericórdias estão atentas à questão das transferências de competências para as autarquias. Conta que, recentemente, o ministro da Saúde deu o exemplo do hospital de Valongo como um dos que poderiam ser geridos pela autarquia.
"Porque não transferi-lo para a proprietária, que é a Misericórdia? As misericórdias já gerem 20 hospitais e há outros 30 propriedade das misericórdias e que ainda estão no Serviço Nacional de Saúde. E as autarquias nunca geriram hospitais", contesta Manuel de Lemos. Dá como exemplo o de Santo António, no Porto, e o de São Marcos, em Braga, que são das misericórdias locais mas estão integrados no SNS. "Antes que haja transferência, estamos a marcar terreno."
O congresso decorre até sábado e debaterá ainda a organização interna destas instituições sociais. As 400 misericórdias do país dão emprego directo a cerca de 50 mil pessoas.
Plano nacional contra violência doméstica prevê que vítimas tenham apoios para arrendar casa
Andreia Sanches, in Jornal Público
O III Plano Nacional contra a Violência Doméstica, que esteve em discussão pública até ontem, prevê "a criação de um sistema de incentivo ao arrendamento apoiado" para as vítimas deste fenómeno.
Mais: "A lei que garante protecção às mulheres" que são alvo de agressões deve ser revista para, entre outros, integrar mecanismos que garantam que as que estão em situação económica precária são consideradas beneficiárias prioritárias de "apoio financeiro imediato".
São várias as acções previstas neste plano, que deverá vigorar entre 2007 e 2010. O preâmbulo começa por recordar o estudo feito em 1995 que revelava que uma em cada três mulheres tinha sido vítima de dois ou mais actos de violência e que 43 por cento das situações ocorriam no espaço doméstico.
Na estratégia agora traçada o objectivo prioritário é intervir no combate à violência "exercida directamente sobre as mulheres, no contexto das relações de intimidade, sejam elas conjugais ou equiparadas, presentes ou passadas".
Os apoios ao arrendamento destinam-se, explica-se, a "promover a autonomia residencial" das vítimas, devendo as que estão em casas de acolhimento ter acesso facilitado aos mesmos. As autarquias são também desafiadas a constituírem "uma bolsa de oferta de habitação social" à qual as vítimas devem ter acesso simplificado.
O emprego não é esquecido neste plano. "Definir um regime de mobilidade geográfica que assegure na administração pública e nas empresas", quando tal seja possível, "a deslocalização das vítimas de violência doméstica em segurança e sigilosamente", é outra das "medidas de discriminação positiva" contempladas.
Discriminação positiva que o Governo quer também no que diz respeito ao acesso à requalificação profissional quando existem "especiais problemas de inserção social".
Estão previstas campanhas nacionais contra a violência doméstica - e uma em especial "contra a violência no namoro" - bem como várias medidas de "prevenção da revitimação". A "experimentação de novas metodologias de controlo penal que permitam reduzir e alterar os comportamentos abusivos dos agressores" é uma delas. Quer-se, por exemplo, "implantar um programa experimental de aplicação de meios electrónicos de vigilância à distância" que sejam utilizados quando os agressores são alvo de medidas judiciais que os obrigam a permanecer afastados das vítimas.
O III Plano Nacional contra a Violência Doméstica, que esteve em discussão pública até ontem, prevê "a criação de um sistema de incentivo ao arrendamento apoiado" para as vítimas deste fenómeno.
Mais: "A lei que garante protecção às mulheres" que são alvo de agressões deve ser revista para, entre outros, integrar mecanismos que garantam que as que estão em situação económica precária são consideradas beneficiárias prioritárias de "apoio financeiro imediato".
São várias as acções previstas neste plano, que deverá vigorar entre 2007 e 2010. O preâmbulo começa por recordar o estudo feito em 1995 que revelava que uma em cada três mulheres tinha sido vítima de dois ou mais actos de violência e que 43 por cento das situações ocorriam no espaço doméstico.
Na estratégia agora traçada o objectivo prioritário é intervir no combate à violência "exercida directamente sobre as mulheres, no contexto das relações de intimidade, sejam elas conjugais ou equiparadas, presentes ou passadas".
Os apoios ao arrendamento destinam-se, explica-se, a "promover a autonomia residencial" das vítimas, devendo as que estão em casas de acolhimento ter acesso facilitado aos mesmos. As autarquias são também desafiadas a constituírem "uma bolsa de oferta de habitação social" à qual as vítimas devem ter acesso simplificado.
O emprego não é esquecido neste plano. "Definir um regime de mobilidade geográfica que assegure na administração pública e nas empresas", quando tal seja possível, "a deslocalização das vítimas de violência doméstica em segurança e sigilosamente", é outra das "medidas de discriminação positiva" contempladas.
Discriminação positiva que o Governo quer também no que diz respeito ao acesso à requalificação profissional quando existem "especiais problemas de inserção social".
Estão previstas campanhas nacionais contra a violência doméstica - e uma em especial "contra a violência no namoro" - bem como várias medidas de "prevenção da revitimação". A "experimentação de novas metodologias de controlo penal que permitam reduzir e alterar os comportamentos abusivos dos agressores" é uma delas. Quer-se, por exemplo, "implantar um programa experimental de aplicação de meios electrónicos de vigilância à distância" que sejam utilizados quando os agressores são alvo de medidas judiciais que os obrigam a permanecer afastados das vítimas.
Plano Nacional de Leitura pôs um milhão de crianças a ler na sala de aula
Kathleen Gomes, in Jornal Público
Escolas salientam a aquisição de mais livros e o reforço da relação com as bibliotecas escolares
O Plano Nacional de Leitura (PNL) faz hoje um ano e o Governo fez ontem o balanço: o programa pôs um milhão de crianças, do ensino pré-escolar ao 2.º ciclo, a ler diariamente na sala de aula. Balanço positivo, assinalou a comissária do PNL, a professora e escritora de literatura infanto-juvenil Isabel Alçada. "A participação mostra que as pessoas estão interessadas na leitura", concluiu, referindo-se também a parceiros como autarquias e à adesão da sociedade civil.
Na sessão realizada ontem de manhã no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, havia três ministros presentes - dos Assuntos Parlamentares, da Educação e da Cultura -, o que atesta que o PNL é, como o designou Isabel Alçada, "um projecto nacional".
O Plano é um pacote de estratégias que pretende "sensibilizar todos para a importância da leitura", com especial incidência sobre as crianças, lembrou ontem Augusto Santos Silva, ministro dos Assuntos Parlamentares. Uma das estratégias promovidas é o estabelecimento de períodos de leitura diários ou semanais na sala de aula.
O PNL tem uma meta objectiva: colocar os níveis de literacia da população portuguesa a par da média europeia (Bruxelas quer que, até 2010, a fasquia de leitores competentes seja de 84,5 por cento). Foi um balanço quantitativo o de ontem. Falou-se sobretudo de números, que comprovam a adesão ao PNL de escolas (quase nove mil), bibliotecas públicas e câmaras municipais, entre outros.
A ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, destacou o facto de o financiamento das câmaras municipais (49, no total) para a aquisição de livros em escolas ser o mesmo que o orçamento do seu ministério para o mesmo efeito - 1,5 milhões de euros em ambos os casos. Tendo em conta que o período em causa é de apenas um ano, o envolvimento de parceiros no PNL "excedeu largamente as expectativas", disse a ministra.
Para um balanço qualitativo, será preciso esperar até Setembro. É a data prevista para apresentar o estudo de avaliação do PNL que está a ser desenvolvido por uma equipa de sociólogos do ISCTE. Alguns dados preliminares deste estudo - que inclui inquéritos às escolas, study-cases, entrevistas aos públicos e agentes dos programas e um barómetro da opinião pública - foram ontem adiantados pelo seu coordenador, António Firmino da Costa.
A opinião geral sobre o PNL nas escolas é "bastante positiva", existindo a percepção de que permitiu a aquisição de mais livros, uma presença alargada dos mesmos na sala de aula e o reforço da relação com as bibliotecas escolares.
Como pontos negativos, alguns professores apontaram o "arranque tardio dos programas em relação ao início do ano lectivo, atrasos na entrega de verbas e as actividades serem sugeridas com pouca antecedência". Alguns consideraram ainda que as actividades propostas pelo plano "já eram desenvolvidas por eles, trazendo pouco de novo".
Escolas salientam a aquisição de mais livros e o reforço da relação com as bibliotecas escolares
O Plano Nacional de Leitura (PNL) faz hoje um ano e o Governo fez ontem o balanço: o programa pôs um milhão de crianças, do ensino pré-escolar ao 2.º ciclo, a ler diariamente na sala de aula. Balanço positivo, assinalou a comissária do PNL, a professora e escritora de literatura infanto-juvenil Isabel Alçada. "A participação mostra que as pessoas estão interessadas na leitura", concluiu, referindo-se também a parceiros como autarquias e à adesão da sociedade civil.
Na sessão realizada ontem de manhã no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, havia três ministros presentes - dos Assuntos Parlamentares, da Educação e da Cultura -, o que atesta que o PNL é, como o designou Isabel Alçada, "um projecto nacional".
O Plano é um pacote de estratégias que pretende "sensibilizar todos para a importância da leitura", com especial incidência sobre as crianças, lembrou ontem Augusto Santos Silva, ministro dos Assuntos Parlamentares. Uma das estratégias promovidas é o estabelecimento de períodos de leitura diários ou semanais na sala de aula.
O PNL tem uma meta objectiva: colocar os níveis de literacia da população portuguesa a par da média europeia (Bruxelas quer que, até 2010, a fasquia de leitores competentes seja de 84,5 por cento). Foi um balanço quantitativo o de ontem. Falou-se sobretudo de números, que comprovam a adesão ao PNL de escolas (quase nove mil), bibliotecas públicas e câmaras municipais, entre outros.
A ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, destacou o facto de o financiamento das câmaras municipais (49, no total) para a aquisição de livros em escolas ser o mesmo que o orçamento do seu ministério para o mesmo efeito - 1,5 milhões de euros em ambos os casos. Tendo em conta que o período em causa é de apenas um ano, o envolvimento de parceiros no PNL "excedeu largamente as expectativas", disse a ministra.
Para um balanço qualitativo, será preciso esperar até Setembro. É a data prevista para apresentar o estudo de avaliação do PNL que está a ser desenvolvido por uma equipa de sociólogos do ISCTE. Alguns dados preliminares deste estudo - que inclui inquéritos às escolas, study-cases, entrevistas aos públicos e agentes dos programas e um barómetro da opinião pública - foram ontem adiantados pelo seu coordenador, António Firmino da Costa.
A opinião geral sobre o PNL nas escolas é "bastante positiva", existindo a percepção de que permitiu a aquisição de mais livros, uma presença alargada dos mesmos na sala de aula e o reforço da relação com as bibliotecas escolares.
Como pontos negativos, alguns professores apontaram o "arranque tardio dos programas em relação ao início do ano lectivo, atrasos na entrega de verbas e as actividades serem sugeridas com pouca antecedência". Alguns consideraram ainda que as actividades propostas pelo plano "já eram desenvolvidas por eles, trazendo pouco de novo".
Deficientes não entram nos autocarros antigos
Augusto Correia, in Jornal de Notícias
O motorista foi o primeiro a constatar a dificuldade. "Não vai dar, tenho muita pena, mas não entra", disse o condutor da carreira 905 da STCP, numa das paragens na Urbanização de Vila d' Este, em Gaia. "Pois não, pois não", respondeu Alda Barbosa, há cerca de dois meses impossibilitada de levar o filho, Paulo, a entrar no autocarro.
Consequência do que a STCP diz ser "a redefinição das redes de acesso fácil", em curso desde Abril. "Agora, só há autocarros antigos, sem rampa de acesso e com degraus", disse Alda Barbosa, mãe do Paulo, 35 anos, que padece de paralisia cerebral. "É um cidadão normal, com direito a andar nos transportes públicos", acrescentou, "revoltada".
Nos modelos de autocarro a circular em Vila d' Este, um varão nas escadas de acesso ao interior impossibilita até o desenrascanso de meter a cadeira de rodas no veículo à força do músculo de amigos e vizinhos. "Até me custa estar na paragem, porque temos muitas pessoas amigas, dispostas até a impedir o autocarro de sair. Mas não queremos isso, porque o Paulo entende que os motoristas não têm culpa das acções da administração", acrescentou.
A alternativa à linha 905 passa a 800 metros, na estrada que liga Vilar de Andorinho a Santo Ovídio, frente ao Hospital Santos Silva. "A paragem anterior não tem condições para a cadeira", diz Alda Barbosa. Um filme repetido três vezes por semana, sempre que leva o filho à fisioterapia.
"Este é um caso de coragem, mas há mais pessoas com dificuldades de mobilidade, que não querem ou temem ser sinalizados", disse António Moreira, presidente da Associação dos Proprietários da Urbanização Vila d' Este (APUVE). "Depois disto, vai haver mais gente a sair do anonimato", acrescentou.
Segundo a STCP, o Paulo é a única pessoa com deficiência identificada, entre os 16700 habitantes de Vila d' Este. "Há pessoas idosas que já não saem de casa, temendo não ter quem as ajude a entrar para o autocarro, contribuindo, assim, para o aumento da exclusão social", argumentou António Moreira. Segundo os moradores, os autocarros das linhas 900 e 903 têm rampas ou acesso facilitados a deficientes. "É muita coincidências que só o 905 não tenha condições", dizem.
A STCP garante que não, que não há qualquer tipo de discriminação. A empresa disse ter conhecimento das queixas de Alda Barbosa, que estão já a ser analisadas, e prometeu ter em consideração as observações da APUVE, numa altura em que está a proceder "à redefinição da rede de acesso fácil".
"Até Março, havia uma rotação global", explicou a STCP. Todos os autocarros passavam por todas as linhas. A empresa garantiu que a ausência de autocarros modernos da linha 905 não é uma consequência da redefinição, a ser feita com base num levantamento das necessidades, em todas as linhas, e que assenta em dois pilares a identificação de pessoas com deficiência; e a existência de hospitais ou escolas. A STCP diz ser a " empresa rodoviária melhor equipada em termos de acessibilidade", revelando ter 88% dos autocarros com entrada facilitada e 54% com rampa de acesso.
O motorista foi o primeiro a constatar a dificuldade. "Não vai dar, tenho muita pena, mas não entra", disse o condutor da carreira 905 da STCP, numa das paragens na Urbanização de Vila d' Este, em Gaia. "Pois não, pois não", respondeu Alda Barbosa, há cerca de dois meses impossibilitada de levar o filho, Paulo, a entrar no autocarro.
Consequência do que a STCP diz ser "a redefinição das redes de acesso fácil", em curso desde Abril. "Agora, só há autocarros antigos, sem rampa de acesso e com degraus", disse Alda Barbosa, mãe do Paulo, 35 anos, que padece de paralisia cerebral. "É um cidadão normal, com direito a andar nos transportes públicos", acrescentou, "revoltada".
Nos modelos de autocarro a circular em Vila d' Este, um varão nas escadas de acesso ao interior impossibilita até o desenrascanso de meter a cadeira de rodas no veículo à força do músculo de amigos e vizinhos. "Até me custa estar na paragem, porque temos muitas pessoas amigas, dispostas até a impedir o autocarro de sair. Mas não queremos isso, porque o Paulo entende que os motoristas não têm culpa das acções da administração", acrescentou.
A alternativa à linha 905 passa a 800 metros, na estrada que liga Vilar de Andorinho a Santo Ovídio, frente ao Hospital Santos Silva. "A paragem anterior não tem condições para a cadeira", diz Alda Barbosa. Um filme repetido três vezes por semana, sempre que leva o filho à fisioterapia.
"Este é um caso de coragem, mas há mais pessoas com dificuldades de mobilidade, que não querem ou temem ser sinalizados", disse António Moreira, presidente da Associação dos Proprietários da Urbanização Vila d' Este (APUVE). "Depois disto, vai haver mais gente a sair do anonimato", acrescentou.
Segundo a STCP, o Paulo é a única pessoa com deficiência identificada, entre os 16700 habitantes de Vila d' Este. "Há pessoas idosas que já não saem de casa, temendo não ter quem as ajude a entrar para o autocarro, contribuindo, assim, para o aumento da exclusão social", argumentou António Moreira. Segundo os moradores, os autocarros das linhas 900 e 903 têm rampas ou acesso facilitados a deficientes. "É muita coincidências que só o 905 não tenha condições", dizem.
A STCP garante que não, que não há qualquer tipo de discriminação. A empresa disse ter conhecimento das queixas de Alda Barbosa, que estão já a ser analisadas, e prometeu ter em consideração as observações da APUVE, numa altura em que está a proceder "à redefinição da rede de acesso fácil".
"Até Março, havia uma rotação global", explicou a STCP. Todos os autocarros passavam por todas as linhas. A empresa garantiu que a ausência de autocarros modernos da linha 905 não é uma consequência da redefinição, a ser feita com base num levantamento das necessidades, em todas as linhas, e que assenta em dois pilares a identificação de pessoas com deficiência; e a existência de hospitais ou escolas. A STCP diz ser a " empresa rodoviária melhor equipada em termos de acessibilidade", revelando ter 88% dos autocarros com entrada facilitada e 54% com rampa de acesso.
A Pobreza tem de ser vencida
in Agência Ecclesia
Teve lugar nos passados dias 25 e 26 de Maio, em Lisboa, uma Conferência da responsabilidade da Comissão Nacional de Justiça e Paz, tendo por tema Por um desenvolvimento global e solidário – um compromisso de cidadania.
Num documento como este, torna-se impossível dar conta dos múltiplos temas ali abordados e da importância que eles revestem para nós, quer como simples cidadãos, quer como cristãos. Alguns números, porém, talvez nos façam sair, um pouco, desta letargia em que nos encontramos perante o que actualmente se está a passar em algumas zonas do globo. Assim:
- mais de cinquenta mil crianças morrem por dia, vítimas da fome, de doenças evitáveis, de falta de higiene e de cuidados básicos de saúde, incluindo a vacinação;
- 2,8 mil milhões de pessoas vivem com menos de 1 dólar por dia;
- mil milhões de pessoas habitam em bairros miseráveis urbanos;
- a esperança de vida na África subsaariana situa-se nos 46 anos (a dos países da OCDE é de 78 anos).
Por outro lado, a diferença entre os países ricos e os países pobres está a acentuar-se. Assim, os países ricos, a que corresponde 20% da população mundial, cresceram 2,2% ao ano nos últimos 23 anos; nesse mesmo período de tempo, os países pobres, com os restantes 80% da população, caíram 0,3% ao ano (0,5% no que se refere aos países subsaarianos). Além disso, para manter um estilo médio de vida americano precisaríamos de seis planetas Terra para o sustentar.
Estes são alguns dos dados que traduzem uma realidade que não pode tolerar-se: a par de um consumismo exacerbado por parte de alguns, de uma industrialização que, frequentemente, está ao serviço do supérfluo e de um estilo de vida que põe em risco a sobrevivência do planeta Terra (de que estamos já a sentir alguns dos seus efeitos, através das alterações climáticas), coexiste, em proporções desmesuradas, uma pobreza extrema, privada das condições materiais mínimas compatíveis com a dignidade humana.
Já João Paulo II, na carta apostólica Novo Millennio Ineunte, em 2001, dizia: “Como é possível que ainda haja, no nosso tempo, quem morra de fome, quem esteja condenado ao analfabetismo, quem viva privado dos cuidados médicos mais elementares, quem não tenha uma casa onde abrigar-se? (...) E como ficar indiferentes diante das perspectivas dum desequilíbrio ecológico, que torna inabitáveis e hostis ao homem vastas áreas do planeta? (...) Ou frente ao vilipêndio dos direitos humanos fundamentais de tantas pessoas, especialmente das crianças?”.
Ora, estas pessoas que vivem esta pobreza são como que excluídas da humanidade; foi-lhes retirada a dignidade e esta é inerente à família humana. Do que se está a tratar é, simplesmente, de violação grosseira da Declaração dos Direitos Humanos que, no seu artigo 1º, diz: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.”
A pobreza não pode ser evitada pela caridade. Aquela põe em questão os fundamentos da justiça. Ora este tipo de injustiça desumaniza. É preciso que se tome consciência dela para que seja combatida. Se, como afirmou na Conferência Pierre Sané, Sub-Director Geral da Unesco, o apartheid e a escravatura foram abolidos, também a pobreza, esta pobreza que retira a dignidade humana às pessoas, terá que o ser.
A sua abolição é uma prioridade e talvez implique uma nova ordem internacional. Talvez acarrete o estabelecimento de outras prioridades por parte dos governos dos Estados. Mas, principalmente, a sua abolição supõe um maior espírito de fraternidade quer por parte dos Governos, quer por parte dos cidadãos.
E que dizer da pobreza em Portugal? Ela não atinge as formas de extrema severidade como a que existe nos países subsaarianos. No entanto, cerca de 20% das pessoas (2 milhões) detinham, em 2005, segundo um estudo de Maria Eduarda Ribeiro, da Comissão Nacional de Justiça e Paz, um rendimento disponível familiar equivalente, depois das transferências sociais, abaixo dos 60% da mediana nacional. Esta taxa de risco de pobreza era apenas ultrapassada pela Polónia e pela Lituânia. Por outro lado, o estudo atrás referido indica que a elevada taxa de pobreza registada em Portugal está associada a uma acentuada desigualdade que se agravou nos últimos anos, isto é, o crescimento económico vem sendo apropriado por uma minoria e não tem servido para erradicar a pobreza, incluindo as suas manifestações extremas.
Como explicar, então, que o crescimento económico a que o País assistiu ao longo dos últimos 20 anos não tenha servido para melhorar as condições de vida dos cerca de dois milhões de pessoas cujos rendimentos ficam abaixo do limiar de pobreza?
Como explicar o funcionamento da nossa economia e da organização da sociedade portuguesa quando não se foi capaz de corrigir os mecanismos que conduziram à exclusão de 20% da nossa população?
E em que medida os cristãos fizeram da Doutrina Social da Igreja o instrumento para as suas decisões, tomadas de posição e comportamentos na comunidade, de modo a colaborarem na construção de um País menos pobre e com maior justiça social?
Teve lugar nos passados dias 25 e 26 de Maio, em Lisboa, uma Conferência da responsabilidade da Comissão Nacional de Justiça e Paz, tendo por tema Por um desenvolvimento global e solidário – um compromisso de cidadania.
Num documento como este, torna-se impossível dar conta dos múltiplos temas ali abordados e da importância que eles revestem para nós, quer como simples cidadãos, quer como cristãos. Alguns números, porém, talvez nos façam sair, um pouco, desta letargia em que nos encontramos perante o que actualmente se está a passar em algumas zonas do globo. Assim:
- mais de cinquenta mil crianças morrem por dia, vítimas da fome, de doenças evitáveis, de falta de higiene e de cuidados básicos de saúde, incluindo a vacinação;
- 2,8 mil milhões de pessoas vivem com menos de 1 dólar por dia;
- mil milhões de pessoas habitam em bairros miseráveis urbanos;
- a esperança de vida na África subsaariana situa-se nos 46 anos (a dos países da OCDE é de 78 anos).
Por outro lado, a diferença entre os países ricos e os países pobres está a acentuar-se. Assim, os países ricos, a que corresponde 20% da população mundial, cresceram 2,2% ao ano nos últimos 23 anos; nesse mesmo período de tempo, os países pobres, com os restantes 80% da população, caíram 0,3% ao ano (0,5% no que se refere aos países subsaarianos). Além disso, para manter um estilo médio de vida americano precisaríamos de seis planetas Terra para o sustentar.
Estes são alguns dos dados que traduzem uma realidade que não pode tolerar-se: a par de um consumismo exacerbado por parte de alguns, de uma industrialização que, frequentemente, está ao serviço do supérfluo e de um estilo de vida que põe em risco a sobrevivência do planeta Terra (de que estamos já a sentir alguns dos seus efeitos, através das alterações climáticas), coexiste, em proporções desmesuradas, uma pobreza extrema, privada das condições materiais mínimas compatíveis com a dignidade humana.
Já João Paulo II, na carta apostólica Novo Millennio Ineunte, em 2001, dizia: “Como é possível que ainda haja, no nosso tempo, quem morra de fome, quem esteja condenado ao analfabetismo, quem viva privado dos cuidados médicos mais elementares, quem não tenha uma casa onde abrigar-se? (...) E como ficar indiferentes diante das perspectivas dum desequilíbrio ecológico, que torna inabitáveis e hostis ao homem vastas áreas do planeta? (...) Ou frente ao vilipêndio dos direitos humanos fundamentais de tantas pessoas, especialmente das crianças?”.
Ora, estas pessoas que vivem esta pobreza são como que excluídas da humanidade; foi-lhes retirada a dignidade e esta é inerente à família humana. Do que se está a tratar é, simplesmente, de violação grosseira da Declaração dos Direitos Humanos que, no seu artigo 1º, diz: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.”
A pobreza não pode ser evitada pela caridade. Aquela põe em questão os fundamentos da justiça. Ora este tipo de injustiça desumaniza. É preciso que se tome consciência dela para que seja combatida. Se, como afirmou na Conferência Pierre Sané, Sub-Director Geral da Unesco, o apartheid e a escravatura foram abolidos, também a pobreza, esta pobreza que retira a dignidade humana às pessoas, terá que o ser.
A sua abolição é uma prioridade e talvez implique uma nova ordem internacional. Talvez acarrete o estabelecimento de outras prioridades por parte dos governos dos Estados. Mas, principalmente, a sua abolição supõe um maior espírito de fraternidade quer por parte dos Governos, quer por parte dos cidadãos.
E que dizer da pobreza em Portugal? Ela não atinge as formas de extrema severidade como a que existe nos países subsaarianos. No entanto, cerca de 20% das pessoas (2 milhões) detinham, em 2005, segundo um estudo de Maria Eduarda Ribeiro, da Comissão Nacional de Justiça e Paz, um rendimento disponível familiar equivalente, depois das transferências sociais, abaixo dos 60% da mediana nacional. Esta taxa de risco de pobreza era apenas ultrapassada pela Polónia e pela Lituânia. Por outro lado, o estudo atrás referido indica que a elevada taxa de pobreza registada em Portugal está associada a uma acentuada desigualdade que se agravou nos últimos anos, isto é, o crescimento económico vem sendo apropriado por uma minoria e não tem servido para erradicar a pobreza, incluindo as suas manifestações extremas.
Como explicar, então, que o crescimento económico a que o País assistiu ao longo dos últimos 20 anos não tenha servido para melhorar as condições de vida dos cerca de dois milhões de pessoas cujos rendimentos ficam abaixo do limiar de pobreza?
Como explicar o funcionamento da nossa economia e da organização da sociedade portuguesa quando não se foi capaz de corrigir os mecanismos que conduziram à exclusão de 20% da nossa população?
E em que medida os cristãos fizeram da Doutrina Social da Igreja o instrumento para as suas decisões, tomadas de posição e comportamentos na comunidade, de modo a colaborarem na construção de um País menos pobre e com maior justiça social?
30.5.07
Quatro mil cristãos presos na Índia por pedirem o fim da violência contra minorias
António Marujo, in Jornal Público
Manifestação em Nova Deli que protestava contra os ataques de grupos fundamentalistas hindus acabou com a detenção de quase todos os participantes durante uma hora
Alguns milhares de manifestantes - cristãos, na sua maior parte - foram ontem detidos em Nova Deli, numa manifestação que visava protestar contra a violência interconfessional e exigir o respeito pelos direitos humanos e das minorias religiosas do país. A detenção de cerca de quatro mil pessoas, que durou cerca de uma hora, foi confirmada pela polícia, de acordo com a agência Asia News (www.asianews.it), mas foi ignorada pelos principais meios de comunicação do país.
A manifestação tinha sido convocada na sequência de vários episódios de violência contra cristãos, registados desde o início do ano. Também a legislação anticonversão que tem sido adoptada, nos últimos anos, em vários estados da União Indiana, estava em causa. O lema escolhido para o protesto era precisamente Acabar com a violência contra os cristãos.
John Dayal, secretário-geral do Conselho Cristão da Índia e presidente da União Católica da Índia, afirmou: "É a primeira vez, desde Novembro de 1997, que um tão grande número de cristãos é preso. Foi incrível ver religiosas, pastores protestantes, activistas dos direitos humanos, cantar juntos hinos cristãos durante a permanência na prisão".
Segundo com o Asianews, os organizadores esperavam umas duas mil pessoas, apareceram cerca de cinco mil. No início, vários oradores pediram o respeito pela dignidade humana e pelos direitos constitucionais. Grupos fundamentalistas hindus e mesmo algumas autoridades locais têm violado essas garantias básicas em relação a cristãos e outras minorias, acusam os organizadores.
De acordo com uma outra notícia da mesma agência, uns cinco mil hindus participaram no fim-de-semana numa cerimónia colectiva de conversão ao budismo. Originários das castas mais baixas, estas pessoas esperavam deste modo escapar ao "rígido sistema hindu das castas e ser tratados como seres humanos".
Shravan Gaikwad, do grupo Dalit Samatha Sainik Dal, referiu à Asia News que havia pelo menos cinco mil convertidos. Os dalit - ou intocáveis - são cerca de um sexto da população indiana, que totaliza mil e cem milhões de pessoas. Apesar de haver quotas de emprego para as castas inferiores, estas continuam a ser vítimas de discriminação e de condições de vida muito degradadas.
Os grupos fundamentalistas hindus não se opõem à conversão ao budismo - ao contrário, não admitem conversões ao islão ou ao cristianismo, por exemplo -, porque o consideram um sucedâneo do hinduísmo.
Episódios de violência e ameaças sucedem-se. No sábado, um padre foi obrigado a abandonar uma aldeia do distrito de Udaipur, no estado do Rajastão (Centro-Leste do país). O padre foi atacado e ameaçado de morte. Dias antes, de acordo com informações da mesma agência, dois outros missionários foram torturados e forçados a imergir no rio Ganges como acto de conversão ao hinduísmo.
No início de Maio, dois protestantes foram espancados no estado de Maharashtra, noticiou entretanto o Conselho Mundial de Igrejas (CMI). Antes, a 24 de Fevereiro, um encontro de jovens cristãos sobre a Bíblia foi objecto de assalto por grupos fundamentalistas hindus.
Em finais de Março, o Rajastão aprovou uma lei anticonversão. Oswald Lewis, bispo católico da capital, Jaipur, receia que a lei seja usada contra as minorias. Já há leis semelhantes nos estados de Orissa, Madhya Pradesh, Gujarat e Tamil Nadu. O Conselho Nacional de Igrejas na Índia (NCCI, reúne 29 igrejas ortodoxas e protestantes) apelara, a 9 de Maio, a que as autoridades pusessem cobro aos ataques contra cristãos.
Na semana passada, a Comissão para as Minorias Linguísticas e Religiosas sublinhou também a importância de pôr fim à violência e discriminação contra cristãos e muçulmanos, no-meadamente os das castas inferiores, noticiou o CMI.
Manifestação em Nova Deli que protestava contra os ataques de grupos fundamentalistas hindus acabou com a detenção de quase todos os participantes durante uma hora
Alguns milhares de manifestantes - cristãos, na sua maior parte - foram ontem detidos em Nova Deli, numa manifestação que visava protestar contra a violência interconfessional e exigir o respeito pelos direitos humanos e das minorias religiosas do país. A detenção de cerca de quatro mil pessoas, que durou cerca de uma hora, foi confirmada pela polícia, de acordo com a agência Asia News (www.asianews.it), mas foi ignorada pelos principais meios de comunicação do país.
A manifestação tinha sido convocada na sequência de vários episódios de violência contra cristãos, registados desde o início do ano. Também a legislação anticonversão que tem sido adoptada, nos últimos anos, em vários estados da União Indiana, estava em causa. O lema escolhido para o protesto era precisamente Acabar com a violência contra os cristãos.
John Dayal, secretário-geral do Conselho Cristão da Índia e presidente da União Católica da Índia, afirmou: "É a primeira vez, desde Novembro de 1997, que um tão grande número de cristãos é preso. Foi incrível ver religiosas, pastores protestantes, activistas dos direitos humanos, cantar juntos hinos cristãos durante a permanência na prisão".
Segundo com o Asianews, os organizadores esperavam umas duas mil pessoas, apareceram cerca de cinco mil. No início, vários oradores pediram o respeito pela dignidade humana e pelos direitos constitucionais. Grupos fundamentalistas hindus e mesmo algumas autoridades locais têm violado essas garantias básicas em relação a cristãos e outras minorias, acusam os organizadores.
De acordo com uma outra notícia da mesma agência, uns cinco mil hindus participaram no fim-de-semana numa cerimónia colectiva de conversão ao budismo. Originários das castas mais baixas, estas pessoas esperavam deste modo escapar ao "rígido sistema hindu das castas e ser tratados como seres humanos".
Shravan Gaikwad, do grupo Dalit Samatha Sainik Dal, referiu à Asia News que havia pelo menos cinco mil convertidos. Os dalit - ou intocáveis - são cerca de um sexto da população indiana, que totaliza mil e cem milhões de pessoas. Apesar de haver quotas de emprego para as castas inferiores, estas continuam a ser vítimas de discriminação e de condições de vida muito degradadas.
Os grupos fundamentalistas hindus não se opõem à conversão ao budismo - ao contrário, não admitem conversões ao islão ou ao cristianismo, por exemplo -, porque o consideram um sucedâneo do hinduísmo.
Episódios de violência e ameaças sucedem-se. No sábado, um padre foi obrigado a abandonar uma aldeia do distrito de Udaipur, no estado do Rajastão (Centro-Leste do país). O padre foi atacado e ameaçado de morte. Dias antes, de acordo com informações da mesma agência, dois outros missionários foram torturados e forçados a imergir no rio Ganges como acto de conversão ao hinduísmo.
No início de Maio, dois protestantes foram espancados no estado de Maharashtra, noticiou entretanto o Conselho Mundial de Igrejas (CMI). Antes, a 24 de Fevereiro, um encontro de jovens cristãos sobre a Bíblia foi objecto de assalto por grupos fundamentalistas hindus.
Em finais de Março, o Rajastão aprovou uma lei anticonversão. Oswald Lewis, bispo católico da capital, Jaipur, receia que a lei seja usada contra as minorias. Já há leis semelhantes nos estados de Orissa, Madhya Pradesh, Gujarat e Tamil Nadu. O Conselho Nacional de Igrejas na Índia (NCCI, reúne 29 igrejas ortodoxas e protestantes) apelara, a 9 de Maio, a que as autoridades pusessem cobro aos ataques contra cristãos.
Na semana passada, a Comissão para as Minorias Linguísticas e Religiosas sublinhou também a importância de pôr fim à violência e discriminação contra cristãos e muçulmanos, no-meadamente os das castas inferiores, noticiou o CMI.
Embaixador em Oslo vai à Islândia e quer encontrar-se com trabalhadores portugueses
Andreia Sanches, in Jornal Público
As autoridades islandesas dizem que relatos de "escravatura" não correspondem à realidade
O embaixador de Portugal em Oslo, na Noruega, vai à Islândia, ainda antes do final desta semana, para avaliar as condições a que estão sujeitos os portugueses que se encontram a trabalhar no projecto hidráulico de Karahnjukar. Lima Pimentel quer falar com as autoridades islandesas mas também encontrar-se com trabalhadores portugueses.
A garantia foi dada ontem pela Secretaria de Estado das Comunidades, depois de a cônsul honorária na Islândia, Helga Lara, se ter reunido com as autoridades de Reiquejavique e ter comunicado ao embaixador em Oslo os resultados do encontro: as autoridades negaram que a alegada exploração laboral descrita sábado por um português que esteve a trabalhar em Karahnjukar corresponda à realidade, fez saber a Secretaria de Estado das Comunidades.
À cônsul foi dito que "a realidade da situação se apresentaria diferentemente do relatado na imprensa". E que "o teor das acusações não seria compartilhado por outros trabalhadores empregados no projecto", acrescenta a secretária de Estado.
José Santos, um pedreiro que regressou recentemente a Portugal, contou no sábado que assinou em Portugal um contrato com uma empresa do grupo Select que estabelece uma remuneração de 403 euros. "Esse é o salário que a Select põe para fazer os descontos. O ordenado [base] é 1500 euros. Com as horas extras, os domingos e os feriados dá para tirar três mil euros." Trabalhava todo o dia "com água gelada até aos joelhos", não podia parar para descansar e tinha 15 minutos para almoçar no túnel, descreveu.
O Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil do Norte fala de "escravatura". A Select nega, diz que a lei é cumprida e que tem actualmente 109 trabalhadores em Karahnjukar.
Contudo, "dada a sensibilidade da questão e o relevo da mesma", nas palavras usadas pela secretária de Estado, Lima Pimentel vai a Reiquejavique falar com as autoridades laborais, mas também a Egilsstadi, onde se situa o aeroporto mais próximo de Karahnjukar, para falar com trabalhadores portugueses. com Lusa
As autoridades islandesas dizem que relatos de "escravatura" não correspondem à realidade
O embaixador de Portugal em Oslo, na Noruega, vai à Islândia, ainda antes do final desta semana, para avaliar as condições a que estão sujeitos os portugueses que se encontram a trabalhar no projecto hidráulico de Karahnjukar. Lima Pimentel quer falar com as autoridades islandesas mas também encontrar-se com trabalhadores portugueses.
A garantia foi dada ontem pela Secretaria de Estado das Comunidades, depois de a cônsul honorária na Islândia, Helga Lara, se ter reunido com as autoridades de Reiquejavique e ter comunicado ao embaixador em Oslo os resultados do encontro: as autoridades negaram que a alegada exploração laboral descrita sábado por um português que esteve a trabalhar em Karahnjukar corresponda à realidade, fez saber a Secretaria de Estado das Comunidades.
À cônsul foi dito que "a realidade da situação se apresentaria diferentemente do relatado na imprensa". E que "o teor das acusações não seria compartilhado por outros trabalhadores empregados no projecto", acrescenta a secretária de Estado.
José Santos, um pedreiro que regressou recentemente a Portugal, contou no sábado que assinou em Portugal um contrato com uma empresa do grupo Select que estabelece uma remuneração de 403 euros. "Esse é o salário que a Select põe para fazer os descontos. O ordenado [base] é 1500 euros. Com as horas extras, os domingos e os feriados dá para tirar três mil euros." Trabalhava todo o dia "com água gelada até aos joelhos", não podia parar para descansar e tinha 15 minutos para almoçar no túnel, descreveu.
O Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil do Norte fala de "escravatura". A Select nega, diz que a lei é cumprida e que tem actualmente 109 trabalhadores em Karahnjukar.
Contudo, "dada a sensibilidade da questão e o relevo da mesma", nas palavras usadas pela secretária de Estado, Lima Pimentel vai a Reiquejavique falar com as autoridades laborais, mas também a Egilsstadi, onde se situa o aeroporto mais próximo de Karahnjukar, para falar com trabalhadores portugueses. com Lusa
Mais de um milhão com emprego em risco se aderirem à paralisação
Clara Viana, in Jornal Público
O contingente dos trabalhadores precários está em alta. Para eles, fazer greve pode equivaler a perder o trabalho. Os sindicatos também têm que mudar
Em Portugal existem hoje mais de um milhão de trabalhadores que não podem fazer greve sem correr o risco imediato de perder o trabalho. Já lhes chamaram os trabalhadores do século XXI: são os contratados a prazo, os falsos recibos verdes, os temporários, os subempregados. Um contingente que tem vindo a aumentar à medida que se consolidam duas das tendências do mundo do trabalho actual. Nas empresas, há cada vez menos efectivos e cada vez mais serviços externos, frequentemente disponilizados por firmas de trabalho temporário.
As últimas estatísticas disponibilizadas pelo INE só confirmam a tendência. Estão em curso dois movimentos inversos, mas que falam do mesmo. Duas faces da mesma moeda. Durante o primeiro trimestre de 2007, por comparação ao mesmo período do ano passado, o universo "mais feliz" dos trabalhadores por conta de outrem com contratos de trabalho sem termo, isto é, os que não estão a prazo, perdeu 75 mil efectivos (passou de 3122,8 milhões para 3047,7), enquanto o número dos que vivem com contratos com termo disparou 10,6 por cento (de 583,8 mil para 646,7 mil). Os chamados "trabalhadores por conta própria como isolados", de onde saem os falsos recibos verdes, contabilizavam 883,6 mil indivíduos, menos 0,2 por cento do que no primeiro trimestre de 2006.
Este efeito dos chamados downsizing e outsourcing tem sido ignorado pelas contratações colectivas. Resultado: mais de um quinto da população empregada (que era de 5135,7 milhões de indivíduos no primeiro trimestre de 2007) encontra-se hoje inibida de exercer um direito constitucional.
Sem direito, sem sindicatos
"Quem trabalha debaixo de um falso trabalho independente não pode fazer greve. Não pode ter uma gravidez de risco. Não pode fazer férias. Não pode necessitar de uma intervenção cirúrgica. Para usufruir de qualquer um destes direitos fundamentais, adquiridos ao longo de anos de luta, pelos quais milhares de pessoas lutaram e algumas feneceram, estas pessoas correm o risco de perder o trabalho", diz Cristina Andrade, uma jovem psicóloga, mas já veterana da prestação de serviços a recibos verdes.
Garcia Pereira, especialista em Direito do Trabalho, fala de uma "cultura empresarial que tornou a retaliação num dos instrumentos de gestão mais utilizados hoje em dia". Ele, que tem passado grande parte da sua vida nos tribunais, não tem dúvidas de que o perigo de perder o trabalho é bem real para quem se encontra em situação precária e decida, apesar disso, fazer greve.
O mundo do trabalho está mais desigual. Há os que têm cada vez mais trabalho, mas que são cada vez menos; e os que não têm trabalho, e são cada vez mais. Os que têm direitos e aqueles que não os têm. E os sindicatos, hoje, são parte do problema, acusa Garcia Pereira.
O advogado tem palavras duras: "Acantonaram-se a palavras de ordem e políticas que estão completamente deslocadas no tempo." Fazendo jus à sua "tradição corporativa", tornaram-se sobretudo em "estruturas de defesa dos interesses dos que têm a felicidade de ainda estar no mundo do trabalho, desinteressando-se dos que já lá não
estão e dos que ainda lá não chegaram".
Cristina Andrade e Tiago Gillot, licenciado em Agronomia, a fazer um estágio profissional e um dos organizadores da primeira parada Mayday - desfile de precários - em Portugal, não são tão acutilantes. A psicóloga lembra que há "profissões onde o precariado alastra, designadamente o trabalho a recibos verdes, mas que esta situação não se transformou ainda na luta principal dos sindicatos da função pública, dos professores, dos jornalistas". Tiago Gillot admite que "falta uma resposta" que permita fazer face às dificuldades de reivindicação sentidas pelos precários.
"São muito poucos os que vão poder aderir à greve, mas isso não quer dizer que não estejam com ela", acrescenta. Cristina Andrade: "Cerca de quatro milhões de trabalhadores em Portugal têm o direito e a possibilidade de fazer greve. A luta dos direitos laborais é uma luta de solidariedade. Seria muito recompensador para quem trabalha com falsos recibos verdes se, numa greve geral, os que optarem por exercer o seu direito à greve se lembrarem de todos os que a não podem fazer e fizessem a greve também por eles."
No novo mundo, a luta também se faz por procuração. Cristina Andrade e os outros membros do seu blogue/movimento FERVE (Fartos destes recibos verdes) vão estar nas ruas do Porto a lembrar que existem. Ela deixa uma sugestão aos sindicatos: "Informar quem vai a um museu, a um Centro Novas Oportunidades, a uma clínica veterinária, ao teatro, a um gabinete de arquitectura, a um centro de formação, a um projecto de intervenção comunitária ou a uma universidade sobre as condições de trabalho de quem está do outro lado". "O silenciamento a que esta população está votada apenas permite arrastar ad eternum o usurpar dos seus direitos", defende Cristina.
A verdade é que eles, os precários, estão por todo o lado. Garcia Pereira fala de uma "nova exigência". Defende que é "possível mobilizá-los", mas que para tal "os sindicatos terão de mudar completamente". De objecto, de tácticas, de meios, de mundo. Já não há mais "cinturas industriais, onde bastava um automóvel e um megafone para agitar as massas". Agora é o tempo das novas tecnologias e um sms, muitos sms, podem fazer a diferença, diz o advogado, apontando o exemplo da vizinha Espanha e da manifestação que foi a causa próxima da demissão de José Maria Aznar, na sequência dos atentados de Madrid.
O contingente dos trabalhadores precários está em alta. Para eles, fazer greve pode equivaler a perder o trabalho. Os sindicatos também têm que mudar
Em Portugal existem hoje mais de um milhão de trabalhadores que não podem fazer greve sem correr o risco imediato de perder o trabalho. Já lhes chamaram os trabalhadores do século XXI: são os contratados a prazo, os falsos recibos verdes, os temporários, os subempregados. Um contingente que tem vindo a aumentar à medida que se consolidam duas das tendências do mundo do trabalho actual. Nas empresas, há cada vez menos efectivos e cada vez mais serviços externos, frequentemente disponilizados por firmas de trabalho temporário.
As últimas estatísticas disponibilizadas pelo INE só confirmam a tendência. Estão em curso dois movimentos inversos, mas que falam do mesmo. Duas faces da mesma moeda. Durante o primeiro trimestre de 2007, por comparação ao mesmo período do ano passado, o universo "mais feliz" dos trabalhadores por conta de outrem com contratos de trabalho sem termo, isto é, os que não estão a prazo, perdeu 75 mil efectivos (passou de 3122,8 milhões para 3047,7), enquanto o número dos que vivem com contratos com termo disparou 10,6 por cento (de 583,8 mil para 646,7 mil). Os chamados "trabalhadores por conta própria como isolados", de onde saem os falsos recibos verdes, contabilizavam 883,6 mil indivíduos, menos 0,2 por cento do que no primeiro trimestre de 2006.
Este efeito dos chamados downsizing e outsourcing tem sido ignorado pelas contratações colectivas. Resultado: mais de um quinto da população empregada (que era de 5135,7 milhões de indivíduos no primeiro trimestre de 2007) encontra-se hoje inibida de exercer um direito constitucional.
Sem direito, sem sindicatos
"Quem trabalha debaixo de um falso trabalho independente não pode fazer greve. Não pode ter uma gravidez de risco. Não pode fazer férias. Não pode necessitar de uma intervenção cirúrgica. Para usufruir de qualquer um destes direitos fundamentais, adquiridos ao longo de anos de luta, pelos quais milhares de pessoas lutaram e algumas feneceram, estas pessoas correm o risco de perder o trabalho", diz Cristina Andrade, uma jovem psicóloga, mas já veterana da prestação de serviços a recibos verdes.
Garcia Pereira, especialista em Direito do Trabalho, fala de uma "cultura empresarial que tornou a retaliação num dos instrumentos de gestão mais utilizados hoje em dia". Ele, que tem passado grande parte da sua vida nos tribunais, não tem dúvidas de que o perigo de perder o trabalho é bem real para quem se encontra em situação precária e decida, apesar disso, fazer greve.
O mundo do trabalho está mais desigual. Há os que têm cada vez mais trabalho, mas que são cada vez menos; e os que não têm trabalho, e são cada vez mais. Os que têm direitos e aqueles que não os têm. E os sindicatos, hoje, são parte do problema, acusa Garcia Pereira.
O advogado tem palavras duras: "Acantonaram-se a palavras de ordem e políticas que estão completamente deslocadas no tempo." Fazendo jus à sua "tradição corporativa", tornaram-se sobretudo em "estruturas de defesa dos interesses dos que têm a felicidade de ainda estar no mundo do trabalho, desinteressando-se dos que já lá não
estão e dos que ainda lá não chegaram".
Cristina Andrade e Tiago Gillot, licenciado em Agronomia, a fazer um estágio profissional e um dos organizadores da primeira parada Mayday - desfile de precários - em Portugal, não são tão acutilantes. A psicóloga lembra que há "profissões onde o precariado alastra, designadamente o trabalho a recibos verdes, mas que esta situação não se transformou ainda na luta principal dos sindicatos da função pública, dos professores, dos jornalistas". Tiago Gillot admite que "falta uma resposta" que permita fazer face às dificuldades de reivindicação sentidas pelos precários.
"São muito poucos os que vão poder aderir à greve, mas isso não quer dizer que não estejam com ela", acrescenta. Cristina Andrade: "Cerca de quatro milhões de trabalhadores em Portugal têm o direito e a possibilidade de fazer greve. A luta dos direitos laborais é uma luta de solidariedade. Seria muito recompensador para quem trabalha com falsos recibos verdes se, numa greve geral, os que optarem por exercer o seu direito à greve se lembrarem de todos os que a não podem fazer e fizessem a greve também por eles."
No novo mundo, a luta também se faz por procuração. Cristina Andrade e os outros membros do seu blogue/movimento FERVE (Fartos destes recibos verdes) vão estar nas ruas do Porto a lembrar que existem. Ela deixa uma sugestão aos sindicatos: "Informar quem vai a um museu, a um Centro Novas Oportunidades, a uma clínica veterinária, ao teatro, a um gabinete de arquitectura, a um centro de formação, a um projecto de intervenção comunitária ou a uma universidade sobre as condições de trabalho de quem está do outro lado". "O silenciamento a que esta população está votada apenas permite arrastar ad eternum o usurpar dos seus direitos", defende Cristina.
A verdade é que eles, os precários, estão por todo o lado. Garcia Pereira fala de uma "nova exigência". Defende que é "possível mobilizá-los", mas que para tal "os sindicatos terão de mudar completamente". De objecto, de tácticas, de meios, de mundo. Já não há mais "cinturas industriais, onde bastava um automóvel e um megafone para agitar as massas". Agora é o tempo das novas tecnologias e um sms, muitos sms, podem fazer a diferença, diz o advogado, apontando o exemplo da vizinha Espanha e da manifestação que foi a causa próxima da demissão de José Maria Aznar, na sequência dos atentados de Madrid.
Aumentam os casos de maus-tratos a menores
Joaquim Forte, in Jornal de Notícias
Primeiros três meses do ano apontam números preocupantes de crianças vítimas de maus-tratos
A Comissão de Protecção de Crianças e Jovens (CPCJ) de Guimarães sinalizou, só no primeiro trimestre deste ano, 111 casos de menores vítimas de negligências. A maioria dos casos relaciona-se com aquilo que os técnicos designam por problemas de educação parental - crianças mal alimentadas, mal tratadas de saúde, que abandonam a escola -, mas também há situações de maus tratos físicos e de abusos sexuais.
Segundo Fernando Trigo, presidente da comissão, o número dos primeiros três meses indicia um aumento considerável em relação aos 336 processos abertos no ano passado.
Nos casos registados, a faixa etária predominante é a dos 6 aos 10 anos. Na maioria, os menores vivem na família nuclear, sendo o alcoolismo o principal problema de saúde do agregado familiar. Mais uma vez se confirma que a grande parte das situações chega ao conhecimento da CPCJ através dos estabelecimentos de saúde e de ensino, sendo considerável o número de casos que resultam de comunicações dos próprios pais.
A comissão dá resposta através de técnicos (gestores) destacados pelas várias entidades, públicas e privadas - Segurança Social, hospital, PSP, GNR, entre outras - que constituem aquele órgão. A principal medida aplicada tem sido o apoio junto dos pais, mas várias situações motivaram a colocação dos menores junto de outros familiares; o acolhimento institucional e o acolhimento familiar (embora, nota Fernando Trigo, sejam "muito poucas" as famílias de acolhimento no concelho de Guimarães).
Em muitas situações, salienta aquele responsável, "o problema maior prende-se com a educação parental". "As famílias não sabem coisas básicas como a forma de dar o leite aos bebés, de tratar da saúde das crianças, até mesmo como os vestir. Por isso vamos iniciar, brevemente, uma campanha de sensibilização junto da comunidade, com apoio da Universidade de Coimbra".
A campanha pretende sensibilizar a comunidade para a promoção e protecção de menores e quer envolver escolas, autarquias e centros de saúde. Visa, também, motivar o aparecimento de novas famílias de acolhimento. Um dos projectos é a criação de um sítio na Internet que poderá servir como novo meio para sinalização de menores em risco.
Caso de Portalegre motiva esclarecimento da comissão
Os números da comissão de Guimarães surgem na semana em que foi conhecido mais um caso de alegada tentativa de venda de um bebé, em Portalegre. A mãe, de nacionalidade romena, terá tentado vender criança. Ao ser interrogada pelas autoridades, deu como local de residência o concelho de Guimarães.
Fernando Trigo nega que a criança tenha sido sinalizada pela comissão. "A referência à residência em Guimarães decorre do facto de a criança ter nascido no hospital Senhora da Oliveira. As informações que temos apontam para uma família nómada, que viverá numa viatura, embora tenha ligações a elementos que residem em Guimarães", afirmou ao JN. Entretanto, a CPCJ vai mudar de instalações. As actuais, que partilha com os serviços de acção social da Câmara Municipal, não permitem a privacidade das famílias que recorrem aos serviços da comissão. O novo espaço é uma escola primária desactivada, na Costa, a dois quilómetros da cidade.
Primeiros três meses do ano apontam números preocupantes de crianças vítimas de maus-tratos
A Comissão de Protecção de Crianças e Jovens (CPCJ) de Guimarães sinalizou, só no primeiro trimestre deste ano, 111 casos de menores vítimas de negligências. A maioria dos casos relaciona-se com aquilo que os técnicos designam por problemas de educação parental - crianças mal alimentadas, mal tratadas de saúde, que abandonam a escola -, mas também há situações de maus tratos físicos e de abusos sexuais.
Segundo Fernando Trigo, presidente da comissão, o número dos primeiros três meses indicia um aumento considerável em relação aos 336 processos abertos no ano passado.
Nos casos registados, a faixa etária predominante é a dos 6 aos 10 anos. Na maioria, os menores vivem na família nuclear, sendo o alcoolismo o principal problema de saúde do agregado familiar. Mais uma vez se confirma que a grande parte das situações chega ao conhecimento da CPCJ através dos estabelecimentos de saúde e de ensino, sendo considerável o número de casos que resultam de comunicações dos próprios pais.
A comissão dá resposta através de técnicos (gestores) destacados pelas várias entidades, públicas e privadas - Segurança Social, hospital, PSP, GNR, entre outras - que constituem aquele órgão. A principal medida aplicada tem sido o apoio junto dos pais, mas várias situações motivaram a colocação dos menores junto de outros familiares; o acolhimento institucional e o acolhimento familiar (embora, nota Fernando Trigo, sejam "muito poucas" as famílias de acolhimento no concelho de Guimarães).
Em muitas situações, salienta aquele responsável, "o problema maior prende-se com a educação parental". "As famílias não sabem coisas básicas como a forma de dar o leite aos bebés, de tratar da saúde das crianças, até mesmo como os vestir. Por isso vamos iniciar, brevemente, uma campanha de sensibilização junto da comunidade, com apoio da Universidade de Coimbra".
A campanha pretende sensibilizar a comunidade para a promoção e protecção de menores e quer envolver escolas, autarquias e centros de saúde. Visa, também, motivar o aparecimento de novas famílias de acolhimento. Um dos projectos é a criação de um sítio na Internet que poderá servir como novo meio para sinalização de menores em risco.
Caso de Portalegre motiva esclarecimento da comissão
Os números da comissão de Guimarães surgem na semana em que foi conhecido mais um caso de alegada tentativa de venda de um bebé, em Portalegre. A mãe, de nacionalidade romena, terá tentado vender criança. Ao ser interrogada pelas autoridades, deu como local de residência o concelho de Guimarães.
Fernando Trigo nega que a criança tenha sido sinalizada pela comissão. "A referência à residência em Guimarães decorre do facto de a criança ter nascido no hospital Senhora da Oliveira. As informações que temos apontam para uma família nómada, que viverá numa viatura, embora tenha ligações a elementos que residem em Guimarães", afirmou ao JN. Entretanto, a CPCJ vai mudar de instalações. As actuais, que partilha com os serviços de acção social da Câmara Municipal, não permitem a privacidade das famílias que recorrem aos serviços da comissão. O novo espaço é uma escola primária desactivada, na Costa, a dois quilómetros da cidade.
"Fundos europeus são oportunidade de ouro"
in Jornal de Notícias
Desenvolvimento da região exige, segundo o reitor, que as empresas percam o medo de cooperar
Nos países desenvolvidos, os núcleos de investigação de empresas relacionam-se muito com as universidades. Na região, como são quase tudo pequenas e médias empresas (PME), não há essa capacidade. Como se resolve a questão, se a Universidade, como já disse, não tem dinheiro suficiente?
Uma das nossas preocupações é ver como podemos chegar às PME. Mas as empresas têm que se associar para fazer investigação. E cada uma, consoante o resultado que obtiver, vai depois usar a capacidade competitiva para ter sucesso. Cada uma por si nunca vai conseguir fazer investigação. Não somos nós que vamos juntar as empresas nem lhes dizer o que querem fazer. Elas é que sabem o negócio que pretendem e como o querem desenvolver. Podemos apoiá-las. Há exemplos concretos de grandes resultados de investigação entre universidades e grandes empresas. E as pequenas? Há que encontrar mecanismos para se juntarem.
A Universidade tem condições para inverter o empobrecimento da região?
Sozinhos não conseguimos. Quem cria directamente a riqueza são as empresas. Elas têm de perceber que devem evoluir. Esta pulverização de empresas que são incapazes de se juntar também tem de ser posta em causa. Estamos a fazer a nossa parte, mas têm de entender as limitações das universidades. As empresas têm de fazer a sua e as grandes olharem para as PME.
Tem defendido a criação de pólos de competitividade. Já participa no da saúde...
Somos um participante fundamental, mas há outros clusters em que o Norte devia apostar, como energia, mar e ambiente. E há outro pouco falado. Temos indústrias tradicionais que precisam de ser renovadas tecnologicamente. No calçado como no têxtil, temos um potencial interessante de renovação tecnológica. A área de novos produtos, o "manufacturing", seria um pólo interessante. Falamos de novos tecidos, de novos materiais.
Com empresas a fechar e o alto desemprego, como se diz às pessoas para renovar?
Tem a ver com a educação. Uma aposta fundamental da região é não deixar que as pessoas abandonem o ensino antes do 12º ano concluído. Quer na via de acesso à Universidade, quer na profissionalizante. Ficam com outras armas para, fechando uma empresa, poderem fazer algo diferente. Se tanta gente deixa a escola é porque não é feito um papel tão intenso, por parte das entidades, para que isso não aconteça.
O Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) é a última oportunidade para a região se desenvolver?
Não gosto de dizer que é a última. Pelo menos, é de ouro. Se se perder, serão precisos muito mais anos para recuperar.
Estímulo à boa gestão
Que reflexos tiveram os cortes orçamentais para as universidades?
Temos entidades com problemas graves de funcionamento. E os cortes surgem numa altura em que fazemos a adaptação a Bolonha e precisamos de mais meios. Têm o aspecto positivo de obrigar a uma gestão mais rigorosa. A Universidade do Porto está à vontade, porque tem sido a mais rigorosa no uso dos dinheiros. Nunca andámos de braço estendido, mas, na altura de distribuir verbas, somos tratados como os outros. O Governo não pode tratar de modo igual o que é diferente. Não há estímulo à boa gestão.
Desenvolvimento da região exige, segundo o reitor, que as empresas percam o medo de cooperar
Nos países desenvolvidos, os núcleos de investigação de empresas relacionam-se muito com as universidades. Na região, como são quase tudo pequenas e médias empresas (PME), não há essa capacidade. Como se resolve a questão, se a Universidade, como já disse, não tem dinheiro suficiente?
Uma das nossas preocupações é ver como podemos chegar às PME. Mas as empresas têm que se associar para fazer investigação. E cada uma, consoante o resultado que obtiver, vai depois usar a capacidade competitiva para ter sucesso. Cada uma por si nunca vai conseguir fazer investigação. Não somos nós que vamos juntar as empresas nem lhes dizer o que querem fazer. Elas é que sabem o negócio que pretendem e como o querem desenvolver. Podemos apoiá-las. Há exemplos concretos de grandes resultados de investigação entre universidades e grandes empresas. E as pequenas? Há que encontrar mecanismos para se juntarem.
A Universidade tem condições para inverter o empobrecimento da região?
Sozinhos não conseguimos. Quem cria directamente a riqueza são as empresas. Elas têm de perceber que devem evoluir. Esta pulverização de empresas que são incapazes de se juntar também tem de ser posta em causa. Estamos a fazer a nossa parte, mas têm de entender as limitações das universidades. As empresas têm de fazer a sua e as grandes olharem para as PME.
Tem defendido a criação de pólos de competitividade. Já participa no da saúde...
Somos um participante fundamental, mas há outros clusters em que o Norte devia apostar, como energia, mar e ambiente. E há outro pouco falado. Temos indústrias tradicionais que precisam de ser renovadas tecnologicamente. No calçado como no têxtil, temos um potencial interessante de renovação tecnológica. A área de novos produtos, o "manufacturing", seria um pólo interessante. Falamos de novos tecidos, de novos materiais.
Com empresas a fechar e o alto desemprego, como se diz às pessoas para renovar?
Tem a ver com a educação. Uma aposta fundamental da região é não deixar que as pessoas abandonem o ensino antes do 12º ano concluído. Quer na via de acesso à Universidade, quer na profissionalizante. Ficam com outras armas para, fechando uma empresa, poderem fazer algo diferente. Se tanta gente deixa a escola é porque não é feito um papel tão intenso, por parte das entidades, para que isso não aconteça.
O Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) é a última oportunidade para a região se desenvolver?
Não gosto de dizer que é a última. Pelo menos, é de ouro. Se se perder, serão precisos muito mais anos para recuperar.
Estímulo à boa gestão
Que reflexos tiveram os cortes orçamentais para as universidades?
Temos entidades com problemas graves de funcionamento. E os cortes surgem numa altura em que fazemos a adaptação a Bolonha e precisamos de mais meios. Têm o aspecto positivo de obrigar a uma gestão mais rigorosa. A Universidade do Porto está à vontade, porque tem sido a mais rigorosa no uso dos dinheiros. Nunca andámos de braço estendido, mas, na altura de distribuir verbas, somos tratados como os outros. O Governo não pode tratar de modo igual o que é diferente. Não há estímulo à boa gestão.
"Estão à espera que algum deus venha criar condições na região?"
Carla Soares, Artur Machado, in Jornal de Notícias
"Madeira e Algarve têm líderes, quer se goste ou não deles", diz Marques dos Santos, para explicar a má situação do Norte e do Centro
Com um discurso empolgado e optimista, o reitor da Universidade do Porto, José Marques dos Santos, tem apelado a uma união de forças, desde que tomou posse, em meados do ano passado. Objectivo?Criar uma dinâmica de região que tire o Norte do impasse em que vive. Tal, defende, só é possível se todos convergirem em torno de um mesmo líder e se quem está na região não fugir dela.
Cooperar em nome dos interesses do Norte e aceitar, com humildade, uma liderança política forte que promova uma verdadeira estratégia regional, sem ficar à espera de Lisboa. Este é o apelo de José Marques dos Santos que, no plano da administração, defende a regionalização sem recurso a referendo e considera que uma junta metropolitana não pode ser liderada por presidentes de Câmara. O reitor vai, assim, de encontro ao modelo proposto pelo Governo. Até lá, esqueçamos "este discurso de lamúria".
Jornal de Notícias | Tem assumido um discurso pró-região. Afinal, como chegou o Norte a este declínio? Como perdeu a sua força reivindicativa?
José Marques dos Santos | O que terá acontecido foi que o Norte não soube criar as condições para fixar emprego de grande qualidade nos vários sectores. Todo esse emprego foi para Lisboa, para outros locais ou para fora do país, o que significa que não conseguimos fixar pessoas de elevada qualidade, que contribuam para o progresso da região.
É uma culpa partilhada pela região e pelo Estado?
Claro que sim, é de toda a gente. Os empresários e os artistas vão todos para Lisboa. Às vezes, interrogo-me se estão à espera de algum deus que venha criar as condições na região. Cada um de nós tem de se sacrificar um pouco para criar as condições necessárias. Se quem é capaz e pode contribuir abalar daqui para fora, isto nunca crescerá. E seria interessante que os que daqui saíram, a diáspora da região, regressassem. Talvez seja ingenuidade? Se é, então desistimos, ficamos com um país macrocéfalo que tem apenas um grande centro em Lisboa e deixamos de nos queixar.
A atitude deve mudar?
Temos de ser nós próprios a resolver os problemas e não apontar os outros como causas. Temos de deixar este discurso de lamúria e ser mais positivos.
Os políticos também saem e esquecem a região?
Se calhar, também. Políticos, banqueiros, industriais e artistas... Todos desaparecem.
Não é preciso criar condições para que regressem?
Eles próprios também têm de regressar para criar condições. Se os mais capazes não contribuem, quem as criará? O poder central? O poder local delapidado dos seus melhores valores? Assim é difícil.
Tem insistido numa maior cooperação a todos os níveis.
Claro, é fundamental. Falemos de coopetição, o novo calão que associa competição e cooperação. As empresas e as instituições têm de saber competir e também cooperar naquilo onde apenas juntas conseguem criar massa crítica e valor acrescentado.
Por que é tão difícil essa cooperação?
Não sei. É intrínseco. Será por sermos demasiado individualistas ou divididos. Na freguesia onde moro, há três ou quatro clubes e cada um nasceu por cisão. Não há infra-estruturas desportivas na freguesia porque ninguém se entende. Cada um prefere ser o dono de uma coisa pequenina do que partilhar a capacidade de poder e liderança para algo melhor.
Cada um prefere mandar na quintinha em vez de se juntar em torno de uma quinta maior, como diz. Não há capacidade para aceitar com humildade uma liderança?
Obviamente. Não consigo perceber uma instituição ou uma região que vá para a frente sem uma liderança.
Por que falta liderança à região? É dividir para reinar?
Falta talvez uma estrutura política, uma região, algo que nos junte, que tenha poder interventivo e legitimidade para se impor. Se se construir uma equipa com cinco ou seis pessoas e não se nomear um líder, ela rapidamente se desmorona porque o primeiro que avançar é acusado pelos outros de querer protagonismo. Por isso ninguém faz nada, tem tudo receio de avançar.
Deve ter um líder ou mais?
Não acredito em lideranças duplas e triplas. Isso não conduz a bons resultados. E deve haver continuidade. O que acontece, quase sempre, é que quem está à frente dos órgãos está por tempos limitados. Quando as coisas estão a chegar a um ponto razoável, vão embora e volta tudo a zero.
Usando uma sua expressão, quando não há um maestro, cada um acaba por tocar para o seu lado?
E há muitos que tocam bem, mas não conseguem fazer tocar uma orquestra.
Quem poderia ser o maestro da região?
Tem de ser alguém com intervenção política forte. Um político. Alguém que esteja num órgão que seja depois reconhecido e aceite por todos. E que, pela sua capacidade, se imponha aos outros. Se for um medíocre não se impõe.
Há quem atribua esse papel à CCDRN, mas falta-lhe legitimidade democrática.
Pois, dizem que não tem legitimidade e não é eleita. Se calhar sou ingénuo politicamente, mas faz-me confusão, tendo nós uma certa organização administrativa, não ser possível ter uma capacidade de intervenção adequada e impor-se essa liderança. Isso dirá um pouco mal da democracia. Então estamos aqui todos não para construir algo mas cada um está no seu lugar para defender a sua dama. Cada líder local, numa universidade ou numa câmara, deve ter uma visão superior. Temos que pensar se estamos a contribuir para o progresso geral. Cada um tem que pensar para além de si próprio e, quer se queira quer não, tudo que é eleito preocupa-se consigo próprio na perspectiva de outra eleição.
Enquanto não há regionalização, a Junta Metropolitana do Porto pode fazer, parcialmente, esse papel?
Se calhar podia e devia. E penso que tem vindo a fazê-lo.
O que retira da polémica negociação em torno do metro?
Cada um defende só os seus interesses e preocupa-se pouco com interesses cruzados. O líder daquela estrutura devia ser alguém acima de cada entidade.
Concorda, então, com o regime proposto pelo Governo para as áreas metropolitanas, com um executivo sem presidentes de câmara?
Isso vem de encontro ao que estou a afirmar. Porque se for um dos presidentes de Câmara, é logo acusado de defender os seus interesses. É a tal independência que deve existir. Este país construíu-se muito à base da cunha, do pedido, com cada um a procurar resolver o seu problema, e sem saber se ao fazer esse pedido está a prejudicar um todo mais alargado. Se houvesse uma junta regional, ou algo do género, teria de ser alguém acima das câmaras.
Mostrou-se favorável à regionalização mas questionou a capacidade dos nortenhos de se entenderem para fazer tal reforma.
Esta é a minha visão.
A questão é mesmo de falta de liderança?
Penso que sim, por mais que me digam o contrário. A Madeira e o Algarve têm líderes, quer se goste ou não deles. E Lisboa tem o próprio Governo. O Norte e o Centro não têm e veja como estão. Falta capacidade de juntar as pessoas em torno de um projecto.
Não basta estar de mão estendida, é isso?
A liderança serve para definir estratégias que envolvam todos os agentes e pô-las em acção. Quando o dinheiro vem para a região, esta já poderia dizer "quero para isto e para aquilo". E não ter que estar a submeter projecto a projecto. Falamos já de uma estratégia da própria região.
Tal estratégia regional não tem que partir do Governo?
Penso que não é necessário. Se sabemos o que queremos e nos conseguimos entender, ninguém tem de decidir por nós. Claro que a estratégia da região tem de estar sempre em consonância com a do país.
Regiões sem referendo
Enquanto adepto da regionalização, defende um novo referendo?
Por natureza, sou contrário ao recurso à figura do referendo por tudo e por nada. Temos uma democracia participativa. Elegemos deputados para nos representarem e eles devem estar muito melhor informados. É verdade que, muitas vezes, estão sujeitos a disciplinas partidárias que influenciam as decisões. Tem que haver coragem dos partidos de se entenderem e encontrar uma solução constitucional.
Seria difícil, até pela resistência do líder do PSD?
Sim, mas houve tantas mudanças desde o último referendo. O presidente da Câmara do Porto, que não era regionalista, hoje defende a regionalização. Já tem a experiência que lhe permita ver as dificuldades.
"Madeira e Algarve têm líderes, quer se goste ou não deles", diz Marques dos Santos, para explicar a má situação do Norte e do Centro
Com um discurso empolgado e optimista, o reitor da Universidade do Porto, José Marques dos Santos, tem apelado a uma união de forças, desde que tomou posse, em meados do ano passado. Objectivo?Criar uma dinâmica de região que tire o Norte do impasse em que vive. Tal, defende, só é possível se todos convergirem em torno de um mesmo líder e se quem está na região não fugir dela.
Cooperar em nome dos interesses do Norte e aceitar, com humildade, uma liderança política forte que promova uma verdadeira estratégia regional, sem ficar à espera de Lisboa. Este é o apelo de José Marques dos Santos que, no plano da administração, defende a regionalização sem recurso a referendo e considera que uma junta metropolitana não pode ser liderada por presidentes de Câmara. O reitor vai, assim, de encontro ao modelo proposto pelo Governo. Até lá, esqueçamos "este discurso de lamúria".
Jornal de Notícias | Tem assumido um discurso pró-região. Afinal, como chegou o Norte a este declínio? Como perdeu a sua força reivindicativa?
José Marques dos Santos | O que terá acontecido foi que o Norte não soube criar as condições para fixar emprego de grande qualidade nos vários sectores. Todo esse emprego foi para Lisboa, para outros locais ou para fora do país, o que significa que não conseguimos fixar pessoas de elevada qualidade, que contribuam para o progresso da região.
É uma culpa partilhada pela região e pelo Estado?
Claro que sim, é de toda a gente. Os empresários e os artistas vão todos para Lisboa. Às vezes, interrogo-me se estão à espera de algum deus que venha criar as condições na região. Cada um de nós tem de se sacrificar um pouco para criar as condições necessárias. Se quem é capaz e pode contribuir abalar daqui para fora, isto nunca crescerá. E seria interessante que os que daqui saíram, a diáspora da região, regressassem. Talvez seja ingenuidade? Se é, então desistimos, ficamos com um país macrocéfalo que tem apenas um grande centro em Lisboa e deixamos de nos queixar.
A atitude deve mudar?
Temos de ser nós próprios a resolver os problemas e não apontar os outros como causas. Temos de deixar este discurso de lamúria e ser mais positivos.
Os políticos também saem e esquecem a região?
Se calhar, também. Políticos, banqueiros, industriais e artistas... Todos desaparecem.
Não é preciso criar condições para que regressem?
Eles próprios também têm de regressar para criar condições. Se os mais capazes não contribuem, quem as criará? O poder central? O poder local delapidado dos seus melhores valores? Assim é difícil.
Tem insistido numa maior cooperação a todos os níveis.
Claro, é fundamental. Falemos de coopetição, o novo calão que associa competição e cooperação. As empresas e as instituições têm de saber competir e também cooperar naquilo onde apenas juntas conseguem criar massa crítica e valor acrescentado.
Por que é tão difícil essa cooperação?
Não sei. É intrínseco. Será por sermos demasiado individualistas ou divididos. Na freguesia onde moro, há três ou quatro clubes e cada um nasceu por cisão. Não há infra-estruturas desportivas na freguesia porque ninguém se entende. Cada um prefere ser o dono de uma coisa pequenina do que partilhar a capacidade de poder e liderança para algo melhor.
Cada um prefere mandar na quintinha em vez de se juntar em torno de uma quinta maior, como diz. Não há capacidade para aceitar com humildade uma liderança?
Obviamente. Não consigo perceber uma instituição ou uma região que vá para a frente sem uma liderança.
Por que falta liderança à região? É dividir para reinar?
Falta talvez uma estrutura política, uma região, algo que nos junte, que tenha poder interventivo e legitimidade para se impor. Se se construir uma equipa com cinco ou seis pessoas e não se nomear um líder, ela rapidamente se desmorona porque o primeiro que avançar é acusado pelos outros de querer protagonismo. Por isso ninguém faz nada, tem tudo receio de avançar.
Deve ter um líder ou mais?
Não acredito em lideranças duplas e triplas. Isso não conduz a bons resultados. E deve haver continuidade. O que acontece, quase sempre, é que quem está à frente dos órgãos está por tempos limitados. Quando as coisas estão a chegar a um ponto razoável, vão embora e volta tudo a zero.
Usando uma sua expressão, quando não há um maestro, cada um acaba por tocar para o seu lado?
E há muitos que tocam bem, mas não conseguem fazer tocar uma orquestra.
Quem poderia ser o maestro da região?
Tem de ser alguém com intervenção política forte. Um político. Alguém que esteja num órgão que seja depois reconhecido e aceite por todos. E que, pela sua capacidade, se imponha aos outros. Se for um medíocre não se impõe.
Há quem atribua esse papel à CCDRN, mas falta-lhe legitimidade democrática.
Pois, dizem que não tem legitimidade e não é eleita. Se calhar sou ingénuo politicamente, mas faz-me confusão, tendo nós uma certa organização administrativa, não ser possível ter uma capacidade de intervenção adequada e impor-se essa liderança. Isso dirá um pouco mal da democracia. Então estamos aqui todos não para construir algo mas cada um está no seu lugar para defender a sua dama. Cada líder local, numa universidade ou numa câmara, deve ter uma visão superior. Temos que pensar se estamos a contribuir para o progresso geral. Cada um tem que pensar para além de si próprio e, quer se queira quer não, tudo que é eleito preocupa-se consigo próprio na perspectiva de outra eleição.
Enquanto não há regionalização, a Junta Metropolitana do Porto pode fazer, parcialmente, esse papel?
Se calhar podia e devia. E penso que tem vindo a fazê-lo.
O que retira da polémica negociação em torno do metro?
Cada um defende só os seus interesses e preocupa-se pouco com interesses cruzados. O líder daquela estrutura devia ser alguém acima de cada entidade.
Concorda, então, com o regime proposto pelo Governo para as áreas metropolitanas, com um executivo sem presidentes de câmara?
Isso vem de encontro ao que estou a afirmar. Porque se for um dos presidentes de Câmara, é logo acusado de defender os seus interesses. É a tal independência que deve existir. Este país construíu-se muito à base da cunha, do pedido, com cada um a procurar resolver o seu problema, e sem saber se ao fazer esse pedido está a prejudicar um todo mais alargado. Se houvesse uma junta regional, ou algo do género, teria de ser alguém acima das câmaras.
Mostrou-se favorável à regionalização mas questionou a capacidade dos nortenhos de se entenderem para fazer tal reforma.
Esta é a minha visão.
A questão é mesmo de falta de liderança?
Penso que sim, por mais que me digam o contrário. A Madeira e o Algarve têm líderes, quer se goste ou não deles. E Lisboa tem o próprio Governo. O Norte e o Centro não têm e veja como estão. Falta capacidade de juntar as pessoas em torno de um projecto.
Não basta estar de mão estendida, é isso?
A liderança serve para definir estratégias que envolvam todos os agentes e pô-las em acção. Quando o dinheiro vem para a região, esta já poderia dizer "quero para isto e para aquilo". E não ter que estar a submeter projecto a projecto. Falamos já de uma estratégia da própria região.
Tal estratégia regional não tem que partir do Governo?
Penso que não é necessário. Se sabemos o que queremos e nos conseguimos entender, ninguém tem de decidir por nós. Claro que a estratégia da região tem de estar sempre em consonância com a do país.
Regiões sem referendo
Enquanto adepto da regionalização, defende um novo referendo?
Por natureza, sou contrário ao recurso à figura do referendo por tudo e por nada. Temos uma democracia participativa. Elegemos deputados para nos representarem e eles devem estar muito melhor informados. É verdade que, muitas vezes, estão sujeitos a disciplinas partidárias que influenciam as decisões. Tem que haver coragem dos partidos de se entenderem e encontrar uma solução constitucional.
Seria difícil, até pela resistência do líder do PSD?
Sim, mas houve tantas mudanças desde o último referendo. O presidente da Câmara do Porto, que não era regionalista, hoje defende a regionalização. Já tem a experiência que lhe permita ver as dificuldades.
: dois milhões de crianças na pobreza
in Portugal Diário
Revela estudo divulgado por uma associação que trabalha com menores
Cerca de dois milhões de crianças e adolescentes italianas vivem em famílias em situação de pobreza, estima um estudo apresentado esta terça-feira pela associação «Save the Children» («Salvem as Crianças»), que pede mais recursos especificamente para a tutela de menores, escreve a Lusa.
Além disso, cerca de meio milhão de menores vê-se obrigado a trabalhar e cresce a difusão do mercado de pornografia infantil, entre outras razões apontadas, devido ao uso de telemóveis para a transmitir.
De acordo com o estudo, em Itália também cresce o número de crianças que perpetram actos violentos, sobretudo contra as mães e as irmãs.
O problema da pobreza concentra-se sobretudo no sul do país, onde vivem dois terços das crianças em situação de pobreza.
A pobreza infantil em Itália «continua a ser um fenómeno pouco conhecido mas não menos relevante pela gravidade e difusão no território nacional», indicou a coordenadora do grupo de trabalho que realizou o estudo, Arianna Saulini.
De igual modo, o trabalho infantil é pouco conhecido, estimando-se que seja levado a cabo por entre 450 mil a um milhão de crianças entre os 10 e os 14 anos.
Revela estudo divulgado por uma associação que trabalha com menores
Cerca de dois milhões de crianças e adolescentes italianas vivem em famílias em situação de pobreza, estima um estudo apresentado esta terça-feira pela associação «Save the Children» («Salvem as Crianças»), que pede mais recursos especificamente para a tutela de menores, escreve a Lusa.
Além disso, cerca de meio milhão de menores vê-se obrigado a trabalhar e cresce a difusão do mercado de pornografia infantil, entre outras razões apontadas, devido ao uso de telemóveis para a transmitir.
De acordo com o estudo, em Itália também cresce o número de crianças que perpetram actos violentos, sobretudo contra as mães e as irmãs.
O problema da pobreza concentra-se sobretudo no sul do país, onde vivem dois terços das crianças em situação de pobreza.
A pobreza infantil em Itália «continua a ser um fenómeno pouco conhecido mas não menos relevante pela gravidade e difusão no território nacional», indicou a coordenadora do grupo de trabalho que realizou o estudo, Arianna Saulini.
De igual modo, o trabalho infantil é pouco conhecido, estimando-se que seja levado a cabo por entre 450 mil a um milhão de crianças entre os 10 e os 14 anos.
28.5.07
É possível acabar com a pobreza e a exclusão
in Agência Ecclesia
Manifesto encerra conferência da CNJP sobre desenvolvimento global e solidário com mensagem de esperança
1. Por ocasião da Conferência Nacional 2007 «Por um desenvolvimento global e solidário – um compromisso de cidadania», os signatários desejam convidar todos os concidadãos e concidadãs a uma tomada de posição pública acerca do grave problema da pobreza e da exclusão no país e no mundo.
2. Desejam, antes do mais, expressar a sua admiração e respeito profundos por todos quantos, de uma forma ou outra, vêm dedicando o melhor das suas vidas em favor dos mais desfavorecidos, quer entre nós, quer em tantos outros países, sobretudo nos que se debatem com situações massivas de pobreza e fome, que levam à morte. Em muitos casos, é uma dedicação total aos pobres e excluídos, por vezes com risco da própria vida.
3. Do mesmo passo, verificam que o notável esforço de quantos, pessoas e instituições, se dedicam à causa dos pobres e dos excluídos - apesar dos benefícios concretos que traz a inúmeras pessoas e sociedades e do seu valor intrínseco enquanto expressão de amor e busca da justiça - é, infelizmente, insuficiente face à dimensão que o problema assume, no mundo e entre nós. Isto revela, de modo flagrante, o défice de empenhamento que existe em confronto com aquilo que urge realizar perante tanto sofrimento e tantas mortes que a pobreza está gerando cada dia.
4. Os signatários acreditam que a pobreza e a exclusão não existem por acaso, nem se resolvem apenas com sobras ou gestos de generosidade esporádica. Reconhecem que muito tem de ser feito numa base interpessoal e directa, junto do pobre e do excluído. Mas verificam, também, que enxugar o chão, se bem que necessário, não basta para estancar uma torneira aberta. Dito por outras palavras, entendem a pobreza como um problema que reclama apoio pessoal para ocorrer às carências, mas, cujas causas só podem ser removidas modificando os factores económicos, sociais e culturais que geram os mecanismos societais que perpetuam a pobreza. São, aliás, estes mesmos factores que se opõem às indispensáveis mudanças.
5. Importa afirmar que, globalmente considerado, o mundo em que vivemos é um mundo de abundância e nunca como hoje foi tão possível erradicar a pobreza. Deve também reconhecer-se que a pobreza em Portugal não é devida à falta de recursos nacionais. O problema central reside no facto de a pobreza continuar a ser vista como um problema periférico, pretensamente resolúvel por políticas e medidas periféricas e residuais.
6. Há cerca de vinte anos que existem no País programas mais ou menos compreensivos de luta contra a pobreza, desde 1986 integrados nos programas correspondentes de âmbito europeu. Muito se aprendeu e se fez no decurso desse tempo. Ocorre, no entanto, perguntar a razão por que, não obstante esse esforço rodeado de grandes expectativas, persistem situações como as seguintes:
• a taxa de pobreza no País tem-se mantido quase constante, à volta dos 20%, taxa que corresponde a cerca de 2 milhões de portugueses;
• durante o período de 1995-2000, passaram pela pobreza (em pelo menos um ano) 47% das famílias portuguesas, dentre as quais 72% foram pobres durante 2 ou mais anos;
• 40% dos representantes desses agregados familiares eram pessoas empregadas por conta d’outrem ou por conta própria e a percentagem de reformados era superior a 30%;
• é anormalmente elevada, no contexto europeu, a transmissão geracional da pobreza.
7. Perante esta realidade, parece incontornável a conclusão de que a maior parte de quanto se vem fazendo, cujos benefícios se não devem subestimar, não só evidencia ineficiência na aplicação dos recursos como permite deduzir que passa ao lado das reais causas da pobreza em Portugal, no pressuposto, porventura inconsciente, de que a pobreza é erradicável mantendo inalterados os modelos económico, cultural e de poder da sociedade portuguesa.
8. Os signatários não ignoram os problemas económicos e financeiros que o País atravessa, nem subestimam a relevância das dimensões supranacionais (europeia e mundial) de algumas alavancas em que é necessário intervir. O que rejeitam é o dogmatismo do «pensamento único». Reconhecem que as condicionantes existentes não determinam soluções únicas. Existem espaços de liberdade onde a intervenção humana, individual e colectiva, é possível e necessária.
9. Entendem que, numa sociedade com pobreza persistente e de longa duração, como é a portuguesa, é necessário intervir, simultaneamente, em três frentes:
a) - Em relação aos empobrecidos, há que ocorrer às carências mais graves, relacionadas com a não satisfação de necessidades humanas básicas, vencer os bloqueios culturais e comportamentais que a pobreza persistente gera nos pobres, comprometendo a sua capacidade de vencer a situação e de utilizar os meios postos ao seu dispor e, ainda, ajudar o pobre a (re)conquistar a sua autonomia em matéria de recursos, o que implica que esteja apto a ganhar a sua vida de uma das formas consideradas normais na sociedade em que vive.
b) – Integrar, nas diferentes políticas públicas, objectivos, estratégias e instrumentos que visem a remoção das causas estruturais da pobreza e da exclusão.
c) - Promover a mudança de mentalidade dos não-pobres, superando preconceitos acerca da pobreza e suas causas e estimulando comportamentos mais solidários.
10. Os signatários consideram que a pobreza constitui uma grave negação dos direitos humanos fundamentais e das condições necessárias ao exercício da cidadania, situação que reputam eticamente condenável, politicamente inaceitável e cientificamente injustificável.
11. Por isso, convidam todos os portugueses e portuguesas, para um compromisso colectivo que vise:
• Influenciar os órgãos de soberania no sentido de aqueles incluírem nas suas agendas o objectivo da erradicação da pobreza no mais curto período de tempo;
• Pressionar o governo para a adopção de níveis de salários, pensões mínimas e prestações sociais que não fiquem aquém do limiar da pobreza e bem assim para que sejam feitos esforços no sentido de uma maior eficácia e eficiência das transferências sociais e demais políticas sociais.
• Incentivar a sociedade civil para que se multipliquem as acções de proximidade em favor dos mais pobres e se desenvolvam atitudes e comportamentos de maior justiça social e solidariedade
12. Em particular, das Igrejas cristãs, suas organizações e comunidades, assim como de outras confissões religiosas, os signatários esperam um empenhamento particularmente activo e responsável que seja expressão de autenticidade do amor e da busca de justiça que os anima.
Manifesto encerra conferência da CNJP sobre desenvolvimento global e solidário com mensagem de esperança
1. Por ocasião da Conferência Nacional 2007 «Por um desenvolvimento global e solidário – um compromisso de cidadania», os signatários desejam convidar todos os concidadãos e concidadãs a uma tomada de posição pública acerca do grave problema da pobreza e da exclusão no país e no mundo.
2. Desejam, antes do mais, expressar a sua admiração e respeito profundos por todos quantos, de uma forma ou outra, vêm dedicando o melhor das suas vidas em favor dos mais desfavorecidos, quer entre nós, quer em tantos outros países, sobretudo nos que se debatem com situações massivas de pobreza e fome, que levam à morte. Em muitos casos, é uma dedicação total aos pobres e excluídos, por vezes com risco da própria vida.
3. Do mesmo passo, verificam que o notável esforço de quantos, pessoas e instituições, se dedicam à causa dos pobres e dos excluídos - apesar dos benefícios concretos que traz a inúmeras pessoas e sociedades e do seu valor intrínseco enquanto expressão de amor e busca da justiça - é, infelizmente, insuficiente face à dimensão que o problema assume, no mundo e entre nós. Isto revela, de modo flagrante, o défice de empenhamento que existe em confronto com aquilo que urge realizar perante tanto sofrimento e tantas mortes que a pobreza está gerando cada dia.
4. Os signatários acreditam que a pobreza e a exclusão não existem por acaso, nem se resolvem apenas com sobras ou gestos de generosidade esporádica. Reconhecem que muito tem de ser feito numa base interpessoal e directa, junto do pobre e do excluído. Mas verificam, também, que enxugar o chão, se bem que necessário, não basta para estancar uma torneira aberta. Dito por outras palavras, entendem a pobreza como um problema que reclama apoio pessoal para ocorrer às carências, mas, cujas causas só podem ser removidas modificando os factores económicos, sociais e culturais que geram os mecanismos societais que perpetuam a pobreza. São, aliás, estes mesmos factores que se opõem às indispensáveis mudanças.
5. Importa afirmar que, globalmente considerado, o mundo em que vivemos é um mundo de abundância e nunca como hoje foi tão possível erradicar a pobreza. Deve também reconhecer-se que a pobreza em Portugal não é devida à falta de recursos nacionais. O problema central reside no facto de a pobreza continuar a ser vista como um problema periférico, pretensamente resolúvel por políticas e medidas periféricas e residuais.
6. Há cerca de vinte anos que existem no País programas mais ou menos compreensivos de luta contra a pobreza, desde 1986 integrados nos programas correspondentes de âmbito europeu. Muito se aprendeu e se fez no decurso desse tempo. Ocorre, no entanto, perguntar a razão por que, não obstante esse esforço rodeado de grandes expectativas, persistem situações como as seguintes:
• a taxa de pobreza no País tem-se mantido quase constante, à volta dos 20%, taxa que corresponde a cerca de 2 milhões de portugueses;
• durante o período de 1995-2000, passaram pela pobreza (em pelo menos um ano) 47% das famílias portuguesas, dentre as quais 72% foram pobres durante 2 ou mais anos;
• 40% dos representantes desses agregados familiares eram pessoas empregadas por conta d’outrem ou por conta própria e a percentagem de reformados era superior a 30%;
• é anormalmente elevada, no contexto europeu, a transmissão geracional da pobreza.
7. Perante esta realidade, parece incontornável a conclusão de que a maior parte de quanto se vem fazendo, cujos benefícios se não devem subestimar, não só evidencia ineficiência na aplicação dos recursos como permite deduzir que passa ao lado das reais causas da pobreza em Portugal, no pressuposto, porventura inconsciente, de que a pobreza é erradicável mantendo inalterados os modelos económico, cultural e de poder da sociedade portuguesa.
8. Os signatários não ignoram os problemas económicos e financeiros que o País atravessa, nem subestimam a relevância das dimensões supranacionais (europeia e mundial) de algumas alavancas em que é necessário intervir. O que rejeitam é o dogmatismo do «pensamento único». Reconhecem que as condicionantes existentes não determinam soluções únicas. Existem espaços de liberdade onde a intervenção humana, individual e colectiva, é possível e necessária.
9. Entendem que, numa sociedade com pobreza persistente e de longa duração, como é a portuguesa, é necessário intervir, simultaneamente, em três frentes:
a) - Em relação aos empobrecidos, há que ocorrer às carências mais graves, relacionadas com a não satisfação de necessidades humanas básicas, vencer os bloqueios culturais e comportamentais que a pobreza persistente gera nos pobres, comprometendo a sua capacidade de vencer a situação e de utilizar os meios postos ao seu dispor e, ainda, ajudar o pobre a (re)conquistar a sua autonomia em matéria de recursos, o que implica que esteja apto a ganhar a sua vida de uma das formas consideradas normais na sociedade em que vive.
b) – Integrar, nas diferentes políticas públicas, objectivos, estratégias e instrumentos que visem a remoção das causas estruturais da pobreza e da exclusão.
c) - Promover a mudança de mentalidade dos não-pobres, superando preconceitos acerca da pobreza e suas causas e estimulando comportamentos mais solidários.
10. Os signatários consideram que a pobreza constitui uma grave negação dos direitos humanos fundamentais e das condições necessárias ao exercício da cidadania, situação que reputam eticamente condenável, politicamente inaceitável e cientificamente injustificável.
11. Por isso, convidam todos os portugueses e portuguesas, para um compromisso colectivo que vise:
• Influenciar os órgãos de soberania no sentido de aqueles incluírem nas suas agendas o objectivo da erradicação da pobreza no mais curto período de tempo;
• Pressionar o governo para a adopção de níveis de salários, pensões mínimas e prestações sociais que não fiquem aquém do limiar da pobreza e bem assim para que sejam feitos esforços no sentido de uma maior eficácia e eficiência das transferências sociais e demais políticas sociais.
• Incentivar a sociedade civil para que se multipliquem as acções de proximidade em favor dos mais pobres e se desenvolvam atitudes e comportamentos de maior justiça social e solidariedade
12. Em particular, das Igrejas cristãs, suas organizações e comunidades, assim como de outras confissões religiosas, os signatários esperam um empenhamento particularmente activo e responsável que seja expressão de autenticidade do amor e da busca de justiça que os anima.
UE tenta acordo político sobre Constituição já em Junho
Isabel Arriaga e Cunha, Bruxelas, in Jornal Público
Calendário para resolução do impasse institucional acelerou-se, o que deixará à presidência portuguesa quase só a redacção.
José Sócrates assume a presidência a 1 de Julho e deverá presidir à CIG, talvez reservada às arbitragens finais
a Depois de dois anos de desorientação total, o processo de recuperação da Constituição Europeia acelerou-se subitamente, de tal forma que um acordo político sobre o conteúdo de um novo tratado capaz de a substituir poderá ser concluído já na cimeira de líderes da União Europeia (UE) de 21 e 22 de Junho.
Se assim for, a presidência portuguesa da UE, que arranca a 1 de Julho, ficará praticamente apenas com a missão de traduzir juridicamente os termos do acordo, em vez de ter de arbitrar uma difícil e desgastante negociação política entre países com concepções diferentes sobre a integração europeia.
Se o acordo será possível em Junho, é uma questão que ainda está em aberto, mas que está a suscitar um corrupio entre líderes europeus um pouco por toda a Europa, procurando soluções para os problemas que persistem.
O consenso crescente entre os Vinte e Sete é que o essencial das disposições da Constituição - rejeitada nos referendos francês e holandês de 2005 - deverá ser recuperado e traduzido num novo tratado "simplificado". Ou seja, escrito em linguagem tradicional de tratado, sem os símbolos da Constituição, e concentrado nos aspectos capazes de reforçar a eficácia da acção comunitária.
Só que, enquanto há um ano os Governos decidiram que este processo se desenrolaria em dois anos - entre a actual presidência alemã e a francesa, no segundo semestre de 2008 - actualmente a ambição da maioria é conseguir concluí-lo num mês.
Esta aceleração do calendário resulta de uma conjugação de factores que criaram um sentimento de urgência na maior parte das capitais. "A impaciência face a uma solução cresceu, em conjunto com a constatação de que é simultaneamente possível e urgente", reconheceu um negociador.
A primeira razão resulta da clarificação da situação política em França com a eleição do novo Presidente, Nicolas Sarkozy, que se considera investido de um mandato claro do eleitorado para negociar um tratado simplificado a ratificar pelo Parlamento, e não por referendo. A sua decisão desanuviou por completo o horizonte, levando os parceiros a acreditar pela primeira vez em dois anos na possibilidade de uma solução.
Sarkozy iniciou funções com pressa de encerrar rapidamente o impasse institucional, desdobrando-se, aliás, em contactos para esse fim, a pedido, nomeadamente, de Angela Merkel, chanceler federal da Alemanha, que preside actualmente à UE.
A pressa de Blair
Igual decisão por parte do Governo britânico quanto ao método de ratificação eliminou a última espada de Dâmocles que poderia pairar sobre o novo tratado, embora neste caso a decisão possa constituir um presente envenenado: o Reino Unido condiciona o abandono do referendo à elaboração de um texto absolutamente minimalista (ver caixa).
Tony Blair, primeiro-ministro britânico, quer deixar a totalidade do conteúdo do futuro tratado decidida na cimeira de Junho, que decorre cinco dias antes da sua saída em favor do seu ministro das Finanças Gordon Brow, que recusa ter de se debater durante muito tempo com as discussões institucionais.
A acrescentar a todos estes factores está o facto de Merkel estar absolutamente determinada a conseguir um acordo já em Junho, de forma a poder controlar de perto o conteúdo do novo tratado. Quanto mais não seja por ser a Alemanha que mais tem a ganhar com a sua mecânica institucional.
Finalmente, os 18 países que já ratificaram a Constituição, e que querem preservar o essencial das suas disposições, já perceberam que o tempo não jogará necessariamente a seu favor, no sentido de que não conseguirão mais tarde o que não obtiverem em Junho. Sobretudo quando as coisas tenderão a ser ainda mais difíceis com Gordon Brown, tido como eurocéptico, à frente do Governo britânico.
"O novo calendário que se impôs nas últimas semanas é que é preciso resolver tudo em Junho", resumiu um embaixador europeu. O que significa, precisou, que "as verdadeiras negociações decorrem agora".
Portugal, que assume a presidência da UE a 1 de Julho, aplaude muito particularmente este cenário, que afasta o risco de se ver a braços com um mero "roteiro" sobre os procedimentos a seguir, como estava previsto ainda há pouco, e que o obrigaria a pilotar um longo e difícil processo negocial (que decorre obrigatoriamente numa conferência intergovernamental, CIG).
Se tudo correr como previsto, a presidência portuguesa terá apenas de vigiar o processo de tradução jurídica dos termos do acordo em alterações aos actuais tratados, e de presidir a uma CIG muito rápida para as arbitragens finais.
Calendário para resolução do impasse institucional acelerou-se, o que deixará à presidência portuguesa quase só a redacção.
José Sócrates assume a presidência a 1 de Julho e deverá presidir à CIG, talvez reservada às arbitragens finais
a Depois de dois anos de desorientação total, o processo de recuperação da Constituição Europeia acelerou-se subitamente, de tal forma que um acordo político sobre o conteúdo de um novo tratado capaz de a substituir poderá ser concluído já na cimeira de líderes da União Europeia (UE) de 21 e 22 de Junho.
Se assim for, a presidência portuguesa da UE, que arranca a 1 de Julho, ficará praticamente apenas com a missão de traduzir juridicamente os termos do acordo, em vez de ter de arbitrar uma difícil e desgastante negociação política entre países com concepções diferentes sobre a integração europeia.
Se o acordo será possível em Junho, é uma questão que ainda está em aberto, mas que está a suscitar um corrupio entre líderes europeus um pouco por toda a Europa, procurando soluções para os problemas que persistem.
O consenso crescente entre os Vinte e Sete é que o essencial das disposições da Constituição - rejeitada nos referendos francês e holandês de 2005 - deverá ser recuperado e traduzido num novo tratado "simplificado". Ou seja, escrito em linguagem tradicional de tratado, sem os símbolos da Constituição, e concentrado nos aspectos capazes de reforçar a eficácia da acção comunitária.
Só que, enquanto há um ano os Governos decidiram que este processo se desenrolaria em dois anos - entre a actual presidência alemã e a francesa, no segundo semestre de 2008 - actualmente a ambição da maioria é conseguir concluí-lo num mês.
Esta aceleração do calendário resulta de uma conjugação de factores que criaram um sentimento de urgência na maior parte das capitais. "A impaciência face a uma solução cresceu, em conjunto com a constatação de que é simultaneamente possível e urgente", reconheceu um negociador.
A primeira razão resulta da clarificação da situação política em França com a eleição do novo Presidente, Nicolas Sarkozy, que se considera investido de um mandato claro do eleitorado para negociar um tratado simplificado a ratificar pelo Parlamento, e não por referendo. A sua decisão desanuviou por completo o horizonte, levando os parceiros a acreditar pela primeira vez em dois anos na possibilidade de uma solução.
Sarkozy iniciou funções com pressa de encerrar rapidamente o impasse institucional, desdobrando-se, aliás, em contactos para esse fim, a pedido, nomeadamente, de Angela Merkel, chanceler federal da Alemanha, que preside actualmente à UE.
A pressa de Blair
Igual decisão por parte do Governo britânico quanto ao método de ratificação eliminou a última espada de Dâmocles que poderia pairar sobre o novo tratado, embora neste caso a decisão possa constituir um presente envenenado: o Reino Unido condiciona o abandono do referendo à elaboração de um texto absolutamente minimalista (ver caixa).
Tony Blair, primeiro-ministro britânico, quer deixar a totalidade do conteúdo do futuro tratado decidida na cimeira de Junho, que decorre cinco dias antes da sua saída em favor do seu ministro das Finanças Gordon Brow, que recusa ter de se debater durante muito tempo com as discussões institucionais.
A acrescentar a todos estes factores está o facto de Merkel estar absolutamente determinada a conseguir um acordo já em Junho, de forma a poder controlar de perto o conteúdo do novo tratado. Quanto mais não seja por ser a Alemanha que mais tem a ganhar com a sua mecânica institucional.
Finalmente, os 18 países que já ratificaram a Constituição, e que querem preservar o essencial das suas disposições, já perceberam que o tempo não jogará necessariamente a seu favor, no sentido de que não conseguirão mais tarde o que não obtiverem em Junho. Sobretudo quando as coisas tenderão a ser ainda mais difíceis com Gordon Brown, tido como eurocéptico, à frente do Governo britânico.
"O novo calendário que se impôs nas últimas semanas é que é preciso resolver tudo em Junho", resumiu um embaixador europeu. O que significa, precisou, que "as verdadeiras negociações decorrem agora".
Portugal, que assume a presidência da UE a 1 de Julho, aplaude muito particularmente este cenário, que afasta o risco de se ver a braços com um mero "roteiro" sobre os procedimentos a seguir, como estava previsto ainda há pouco, e que o obrigaria a pilotar um longo e difícil processo negocial (que decorre obrigatoriamente numa conferência intergovernamental, CIG).
Se tudo correr como previsto, a presidência portuguesa terá apenas de vigiar o processo de tradução jurídica dos termos do acordo em alterações aos actuais tratados, e de presidir a uma CIG muito rápida para as arbitragens finais.
"O graffiti é mais uma cena de homens, é arriscado de mais para as raparigas"
Andreia Sanches, in Jornal Público
Estudo mostra que mesmo numa comunidade cujas práticas são de "ruptura em relação ao contexto social envolvente" imperam os estereótipos mais tradicionais
A "comunidade do graffiti" contesta os valores vigentes, recusa "o conformismo, a regulação e as restrições sociais". Para pintar e para se afirmar, o pintor de graffiti arrisca-se fisicamente, trabalha em locais de acesso quase impossível, em linhas de comboios, túneis do metro, paredes altas... e sujeita-se a ser apanhado pela polícia, porque o que faz é, muitas vezes, ilegal.
E, no entanto, este grupo que rompe com "o socialmente aprovado" acaba por reproduzir "os estereótipos de género mais comuns na sociedade". De tal forma que a afirmação da mulher no meio "parece ser uma "missão quase impossível"".
As conclusões são de Dalila Cerejo, investigadora do Gabinete de Investigação em Sociologia Aplicada da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (SociNova). A socióloga entrevistou 16 writers (pintores de graffiti), passou em revista a literatura sobre o tema e estudou uma comunidade cujas "práticas e princípios são socialmente entendidos como marginais". O seu estudo Risco e identidade de género no universo do graffiti acaba de ser publicado pela SociNova.
Dalila Cerejo evita usar a palavra machismo para descrever o que encontrou (ver caixa). Mas um dos writers com quem falou resume da seguinte forma o que pensa do papel das mulheres: "A rapariga gosta de andar maquilhada e a mão não pode andar suja." Não é que esta comunidade questione a capacidade das mulheres para a pintura. "Acho que o graffiti é mais uma cena de homens, é arriscado de mais para as raparigas e elas não gostam de tanta acção e de correr riscos", explica um dos entrevistados.
Manuel Lisboa, que coordena a equipa de investigação do SociNova e que lançou a Dalila Cerejo o desafio de estudar o tema, entende que o aspecto mais interessante deste trabalho é ele revelar que mesmo em "grupos cuja prática de risco pretende ser de ruptura em relação ao contexto social envolvente os modelos seguidos em relação ao que é próprio para homens e mulheres ainda continuam a reproduzir os estereótipos de género tradicionais".
Isto é "um sinal", diz Manuel Lisboa, que revela que há valores que estão de tal forma enraizados na sociedade - mesmo "num dos segmentos onde poderíamos encontrar comportamentos mais desfazados dessas normas" - que quem quiser combater as desigualdades de género, em geral, tem que entender que não chegam "medidas conjunturais", afirma. "É preciso articularmo-nos com outras medidas que vão ao encontro dessa dimensão estrutural que não é visível, mas que está lá", defende.
Perseguição, fuga e risco
Ao longo do seu estudo, Dalila Cerejo - que admite que chega a conclusões que podem ser polémicas no meio sobre o qual se debruçou - descreve esta comunidade onde os seus jovens membros se avaliam entre si e procuram subir numa "estrutura hierárquica" como se fossem um "qualquer trabalhador numa grande empresa".
"A fama, o status e o reconhecimento são os únicos objectivos dos writers", descreve. Isto passa por cumprir uma série de etapas. A um writer não basta saber pintar. E nenhum obterá reconhecimento na comunidade, "se apenas se dedicar à vertente legal", ou seja, a pintar em paredes autorizadas. Afinal, "as raizes do graffiti são a arte de rua ilegal", explica.
É certo que a "sensibilidade estética" é, à luz do "estereótipo da identidade feminina", mais associada às mulheres do que aos homens. Mas a socióloga nota que no universo do graffiti a "performance estética pouco contribuirá para a valorização do writer, se não for conciliada com as demonstrações de valentia ou coragem" - e esses são atributos que o estereótipo atribui ao "domínio masculino".
Acontece que neste meio em especial a demonstração de "atributos e características masculinas assume uma enorme importância simbólica" - de resto, o jogo da perseguição/fuga, do risco, é altamente valorizado, sobretudo pelos mais jovens; para um writer em início de "carreira" fazer pinturas ilegais e arriscadas é a forma mais eficaz de obter reconhecimento pelos pares.
Conta um dos jovens: "Ela queria começar a pintar como muitos outros". E lembra a história de uma rapariga que pintava bem e que se aproximou do grupo dele. "Os primeiros seis meses dela foram do pior, toda a gente a discriminava. Diziam que era a gente que lhe fazia as cenas, que era eu que lhe fazia os desenhos, tudo. Mas ela tinha muito jeito para hall of fame" - parede onde alguns writers se juntam para pintar em conjunto e que, muitas vezes, é legal, o que lhes permite trabalhar com mais tempo e apurar a sua técnica. "O pessoal dizia: "Não é uma miúda que faz isto.""
A socióloga nota que a aceitação da presença da mulher no universo do graffiti só é possível se ela assimilar "valores e atributos tipicamente masculinos". Não há uma segunda via? "Não parece existir espaço de manobra para a mulher writer construir, dentro do graffiti, um percurso diferente ou mesmo paralelo àquele que o homem writer criou e hoje recria", diz.
Mais: a mulher que queira ser reconhecida deve masculinizar-se. Isto significa vestir de forma diferente, estar disposta a usar o seu corpo "como uma arma", seja para fugir da polícia ou de um vigilante, seja "para saltar muros ou arriscar algum tipo de lesão". O maior sinal "da sua aceitação no meio será, porventura, o ser tratada como "um dos rapazes"". Ainda assim, conclui, "não é certa a sua aceitação e reconhecimento".
Estudo mostra que mesmo numa comunidade cujas práticas são de "ruptura em relação ao contexto social envolvente" imperam os estereótipos mais tradicionais
A "comunidade do graffiti" contesta os valores vigentes, recusa "o conformismo, a regulação e as restrições sociais". Para pintar e para se afirmar, o pintor de graffiti arrisca-se fisicamente, trabalha em locais de acesso quase impossível, em linhas de comboios, túneis do metro, paredes altas... e sujeita-se a ser apanhado pela polícia, porque o que faz é, muitas vezes, ilegal.
E, no entanto, este grupo que rompe com "o socialmente aprovado" acaba por reproduzir "os estereótipos de género mais comuns na sociedade". De tal forma que a afirmação da mulher no meio "parece ser uma "missão quase impossível"".
As conclusões são de Dalila Cerejo, investigadora do Gabinete de Investigação em Sociologia Aplicada da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (SociNova). A socióloga entrevistou 16 writers (pintores de graffiti), passou em revista a literatura sobre o tema e estudou uma comunidade cujas "práticas e princípios são socialmente entendidos como marginais". O seu estudo Risco e identidade de género no universo do graffiti acaba de ser publicado pela SociNova.
Dalila Cerejo evita usar a palavra machismo para descrever o que encontrou (ver caixa). Mas um dos writers com quem falou resume da seguinte forma o que pensa do papel das mulheres: "A rapariga gosta de andar maquilhada e a mão não pode andar suja." Não é que esta comunidade questione a capacidade das mulheres para a pintura. "Acho que o graffiti é mais uma cena de homens, é arriscado de mais para as raparigas e elas não gostam de tanta acção e de correr riscos", explica um dos entrevistados.
Manuel Lisboa, que coordena a equipa de investigação do SociNova e que lançou a Dalila Cerejo o desafio de estudar o tema, entende que o aspecto mais interessante deste trabalho é ele revelar que mesmo em "grupos cuja prática de risco pretende ser de ruptura em relação ao contexto social envolvente os modelos seguidos em relação ao que é próprio para homens e mulheres ainda continuam a reproduzir os estereótipos de género tradicionais".
Isto é "um sinal", diz Manuel Lisboa, que revela que há valores que estão de tal forma enraizados na sociedade - mesmo "num dos segmentos onde poderíamos encontrar comportamentos mais desfazados dessas normas" - que quem quiser combater as desigualdades de género, em geral, tem que entender que não chegam "medidas conjunturais", afirma. "É preciso articularmo-nos com outras medidas que vão ao encontro dessa dimensão estrutural que não é visível, mas que está lá", defende.
Perseguição, fuga e risco
Ao longo do seu estudo, Dalila Cerejo - que admite que chega a conclusões que podem ser polémicas no meio sobre o qual se debruçou - descreve esta comunidade onde os seus jovens membros se avaliam entre si e procuram subir numa "estrutura hierárquica" como se fossem um "qualquer trabalhador numa grande empresa".
"A fama, o status e o reconhecimento são os únicos objectivos dos writers", descreve. Isto passa por cumprir uma série de etapas. A um writer não basta saber pintar. E nenhum obterá reconhecimento na comunidade, "se apenas se dedicar à vertente legal", ou seja, a pintar em paredes autorizadas. Afinal, "as raizes do graffiti são a arte de rua ilegal", explica.
É certo que a "sensibilidade estética" é, à luz do "estereótipo da identidade feminina", mais associada às mulheres do que aos homens. Mas a socióloga nota que no universo do graffiti a "performance estética pouco contribuirá para a valorização do writer, se não for conciliada com as demonstrações de valentia ou coragem" - e esses são atributos que o estereótipo atribui ao "domínio masculino".
Acontece que neste meio em especial a demonstração de "atributos e características masculinas assume uma enorme importância simbólica" - de resto, o jogo da perseguição/fuga, do risco, é altamente valorizado, sobretudo pelos mais jovens; para um writer em início de "carreira" fazer pinturas ilegais e arriscadas é a forma mais eficaz de obter reconhecimento pelos pares.
Conta um dos jovens: "Ela queria começar a pintar como muitos outros". E lembra a história de uma rapariga que pintava bem e que se aproximou do grupo dele. "Os primeiros seis meses dela foram do pior, toda a gente a discriminava. Diziam que era a gente que lhe fazia as cenas, que era eu que lhe fazia os desenhos, tudo. Mas ela tinha muito jeito para hall of fame" - parede onde alguns writers se juntam para pintar em conjunto e que, muitas vezes, é legal, o que lhes permite trabalhar com mais tempo e apurar a sua técnica. "O pessoal dizia: "Não é uma miúda que faz isto.""
A socióloga nota que a aceitação da presença da mulher no universo do graffiti só é possível se ela assimilar "valores e atributos tipicamente masculinos". Não há uma segunda via? "Não parece existir espaço de manobra para a mulher writer construir, dentro do graffiti, um percurso diferente ou mesmo paralelo àquele que o homem writer criou e hoje recria", diz.
Mais: a mulher que queira ser reconhecida deve masculinizar-se. Isto significa vestir de forma diferente, estar disposta a usar o seu corpo "como uma arma", seja para fugir da polícia ou de um vigilante, seja "para saltar muros ou arriscar algum tipo de lesão". O maior sinal "da sua aceitação no meio será, porventura, o ser tratada como "um dos rapazes"". Ainda assim, conclui, "não é certa a sua aceitação e reconhecimento".
27.5.07
Associações pedem legislação que leve em conta a existência de "formas atípicas de emprego"
Natália Faria, in Jornal Público
Os contratos de curta duração são uma das reivindicações de um sector que emprega 200 mil trabalhadores
É indesmentível: a realidade do emprego em Portugal está a mudar. Entre os que folheiam os anúncios dos jornais em busca de emprego, poucos serão os que não esbarraram já com designações como trabalho temporário, merchandising e contact centers. E as associações representativas destes sectores, que somam mais de 200 mil trabalhadores, começam agora a reclamar, a uma só voz, uma legislação desenhada à medida. Objectivo: ver consagrado na lei o direito de estabelecerem contratos de trabalho mais flexíveis e de curta e curtíssima duração.
O próprio Observatório de Emprego e Formação Profissional (OEFP) divulgou, em Fevereiro, um relatório em que aponta o dedo à incapacidade de a legislação laboral enquadrar "as novas formas jurídicas e factuais de emprego que se afastam dos modelos tradicionais e configuram práticas relativamente recentes". "É imprescindível estabelecerem-se regras de articulação com o serviço público de emprego, enquadrando na sua órbita empresas como as de trabalho temporário, recrutamento, selecção e executive search e outplacement", lê-se no documento.
A consequência da actual falta de enquadramento legal - dizem as associações e corrobora o OEFP - é a proliferação de empresas ilegais, cujo denominador comum é a fuga ao fisco e outras obrigações. Do lado dos trabalhadores, somam-se os exemplos de trabalho a troco de pouco dinheiro e sem direito a recibo, horas extras não retribuídas, ausência de direito a férias e ameaça de despedimento.
Mas, em nome da moralização do sector, o Estado deve ou não responder a essas reivindicações de flexibilização das relações laborais? "A legislação tem que conter a dupla perspectiva da flexibilidade, mas também da segurança do trabalhador", reequaciona Fátima Suleman, professora auxiliar do Departamento de Economia do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE). A docente admite a pertinência de uma legislação que permita o emprego de duração determinada desde que ao trabalhador "seja garantida a formação que lhe garanta empregabilidade". "Se o indivíduo que passa por contratos atípicos de emprego não puder mudar o portfólio de competências para poder transitar de emprego para emprego, deixamos essa parte do mercado completamente desprotegida", insiste.
Por outro lado, para a investigadora, as empresas devem usar com parcimónia os contratos com termo e de curta duração, porque também aqui há uma factura a pagar. "A aquisição para as organizações de competências específicas leva tempo e uma relação de curta duração não permite ao trabalhador o envolvimento na organização", alerta, defendendo que, "tirando as situações em que a actividade assim o exige, o recurso a contratos flexíveis não é tão benéfico quanto possa parecer, porque uma pessoa que tenha com contrato precário ad aeternum numa organização também não vai permitir que esta crie o seu portfolio de competências".
Considerando que "as formas atípicas de emprego estão a normalizar-se", a investigadora diz que o mercado português tem caminhado no sentido da "remercantilização", isto é, "a permitir que a mão-de-obra seja gerida numa lógica de mercado". Dito de outro modo, passou-se de um cenário em que o normal era o trabalhador entrar numa empresa, fazer carreira e sair no momento da reforma, para outro em que as empresas reivindicam o direito a recrutar e despedir trabalhadores sem custos.
E, longe de fazer coro com os que decretaram a morte definitiva do emprego único para a vida, Fátima Suleman prefere acreditar que a longevidade do emprego passou a depender do trabalhador. "Há uma componente de responsabilidade individual que saiu muito reforçada: se o indivíduo se empenhar na sua formação e se mantiver actualizado, não acredito que a organização o deixe ir embora; portanto, passa a depender do próprio indivíduo manter-se ou não no emprego".
Os contratos de curta duração são uma das reivindicações de um sector que emprega 200 mil trabalhadores
É indesmentível: a realidade do emprego em Portugal está a mudar. Entre os que folheiam os anúncios dos jornais em busca de emprego, poucos serão os que não esbarraram já com designações como trabalho temporário, merchandising e contact centers. E as associações representativas destes sectores, que somam mais de 200 mil trabalhadores, começam agora a reclamar, a uma só voz, uma legislação desenhada à medida. Objectivo: ver consagrado na lei o direito de estabelecerem contratos de trabalho mais flexíveis e de curta e curtíssima duração.
O próprio Observatório de Emprego e Formação Profissional (OEFP) divulgou, em Fevereiro, um relatório em que aponta o dedo à incapacidade de a legislação laboral enquadrar "as novas formas jurídicas e factuais de emprego que se afastam dos modelos tradicionais e configuram práticas relativamente recentes". "É imprescindível estabelecerem-se regras de articulação com o serviço público de emprego, enquadrando na sua órbita empresas como as de trabalho temporário, recrutamento, selecção e executive search e outplacement", lê-se no documento.
A consequência da actual falta de enquadramento legal - dizem as associações e corrobora o OEFP - é a proliferação de empresas ilegais, cujo denominador comum é a fuga ao fisco e outras obrigações. Do lado dos trabalhadores, somam-se os exemplos de trabalho a troco de pouco dinheiro e sem direito a recibo, horas extras não retribuídas, ausência de direito a férias e ameaça de despedimento.
Mas, em nome da moralização do sector, o Estado deve ou não responder a essas reivindicações de flexibilização das relações laborais? "A legislação tem que conter a dupla perspectiva da flexibilidade, mas também da segurança do trabalhador", reequaciona Fátima Suleman, professora auxiliar do Departamento de Economia do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE). A docente admite a pertinência de uma legislação que permita o emprego de duração determinada desde que ao trabalhador "seja garantida a formação que lhe garanta empregabilidade". "Se o indivíduo que passa por contratos atípicos de emprego não puder mudar o portfólio de competências para poder transitar de emprego para emprego, deixamos essa parte do mercado completamente desprotegida", insiste.
Por outro lado, para a investigadora, as empresas devem usar com parcimónia os contratos com termo e de curta duração, porque também aqui há uma factura a pagar. "A aquisição para as organizações de competências específicas leva tempo e uma relação de curta duração não permite ao trabalhador o envolvimento na organização", alerta, defendendo que, "tirando as situações em que a actividade assim o exige, o recurso a contratos flexíveis não é tão benéfico quanto possa parecer, porque uma pessoa que tenha com contrato precário ad aeternum numa organização também não vai permitir que esta crie o seu portfolio de competências".
Considerando que "as formas atípicas de emprego estão a normalizar-se", a investigadora diz que o mercado português tem caminhado no sentido da "remercantilização", isto é, "a permitir que a mão-de-obra seja gerida numa lógica de mercado". Dito de outro modo, passou-se de um cenário em que o normal era o trabalhador entrar numa empresa, fazer carreira e sair no momento da reforma, para outro em que as empresas reivindicam o direito a recrutar e despedir trabalhadores sem custos.
E, longe de fazer coro com os que decretaram a morte definitiva do emprego único para a vida, Fátima Suleman prefere acreditar que a longevidade do emprego passou a depender do trabalhador. "Há uma componente de responsabilidade individual que saiu muito reforçada: se o indivíduo se empenhar na sua formação e se mantiver actualizado, não acredito que a organização o deixe ir embora; portanto, passa a depender do próprio indivíduo manter-se ou não no emprego".
Metade das famílias portuguesas esteve em situação de pobreza pelo menos um ano entre 1995 e 2000
António Marujo, in Jornal Público
Primeiros resultados de estudo inédito apresentados ontem confirmam persistência da pobreza
Quase metade das famílias portuguesas - exactamente 47 por cento - passou por uma situação de pobreza pelo menos durante um ano. Esta conclusão faz parte de um novo estudo nacional sobre a pobreza em Portugal, cujos resultados deverão ser divulgados em Julho. A conclusão principal foi ontem antecipada pelo coordenador, Alfredo Bruto da Costa, durante a conferência da Comissão Nacional Justiça e Paz (CNJP), da Igreja Católica, em Lisboa: "Esta é a verdadeira dimensão da pobreza em Portugal."
O inquérito, realizado pelo Centro de Estudos para a Intervenção Social (Cesis), investigou a situação de carência das famílias portuguesas nos seis anos compreendidos entre 1995 e 2000. Em vez de se limitar a medir a incidência da taxa de pobreza num dado momento - o número já conhecido dos dois milhões de pobres -, o estudo procura ir mais fundo na percepção das causas da pobreza persistente em Portugal. Daí o ter recorrido a um período alargado de seis anos. Há mais alguns dados complementares do estudo igualmente preocupantes: das famílias que estiveram em situação de pobreza, 72 por cento acharam-se nessa condição durante dois ou mais anos. No mesmo universo, 40 por cento tinham os seus membros empregados - ou por conta própria ou por conta de outrem - enquanto outros 30 por cento dessas famílias eram de pensionistas. Estes últimos números significam, na opinião do coordenador do estudo e actual presidente do Conselho Económico e Social (CES), que o fenómeno da pobreza em Portugal "não é apenas uma questão redistributiva".
A propósito, Bruto da Costa citou um texto de Agostinho Fortes, de 1925: "Muito se tem tentado, entre nós, em favor das classes privadas dos dons da fortuna. (...) Infelizmente, o que [se tem] conseguido neste ramo do problema social é tão pouco eficaz que deixa a impressão de que a miséria é cultivada com ternura, amor e dedicação."
São números como os citados que levam o presidente do CES a afirmar que, em Portugal, a pobreza é um fenómeno persistente e de larga escala. A sociedade portuguesa "não está preparada para apoiar as medidas necessárias de combate à pobreza". E "o combate à fraude dos pobres" parece preocupar mais que o combate "à fraude dos ricos" e o próprio combate à pobreza, criticou.
Há um "problema de políticas económicas", acrescenta Alfredo Bruto da Costa, que considera "erradas as estratégias económicas" que colocam em primeiro lugar o crescimento e só depois a repartição da riqueza.
A pobreza só pode acabar "modificando os factores económicos, sociais e culturais que geram os mecanismos" que a perpetuam, diz entretanto o manifesto proposto pela CNJP no final da sua conferência nacional. A comissão católica - que depende directamente da Conferência Episcopal, embora funcione com autonomia - aponta a pobreza como "uma grave violação dos direitos humanos". Por isso, a presidente da comissão, Manuela Silva, propôs no início da conferência que "o direito a não ser pobre" deve ser incluído "no conjunto dos direitos humanos universais".
Tal exigência esbarra no modelo económico vigente, que a investigadora Isabel Guerra põe em causa: "Os anos 70 mostraram a desigualdade do crescimento, os anos 80, com a ecologia, mostraram os limites do crescimento." Luís Moita, vice-reitor da Universidade Autónoma, também apontou para o necessário estilo de vida mais modesto. E admitiu que erradicar a pobreza é tarefa "inadiável", que teme não ser "hoje possível: estamos a remar contra a maré", disse.
O manifesto fala das "tantas mortes" que a pobreza "está gerando cada dia" e diz que o fenómeno continua a ser "um problema periférico pretensamente resolúvel por políticas e medidas periféricas e residuais". Exemplo, dado por Isabel Baptista, do Cesis: o primeiro Plano Nacional de Acção para a Inclusão estabelecia como prioridade "erradicar" a pobreza infantil. O segundo mudou o verbo para "diminuir". O terceiro limita-se a propor "atenuar"...
No manifesto, a CNJP propõe ao Governo que adopte salários, pensões mínimas e prestações sociais "que em caso algum fiquem aquém do limiar da pobreza" - pouco mais de 300 euros. O documento destina-se a receber o apoio das pessoas e instituições que o queiram subscrever, para mobilizar a sociedade civil e ser enviado às instâncias governamentais.
Primeiros resultados de estudo inédito apresentados ontem confirmam persistência da pobreza
Quase metade das famílias portuguesas - exactamente 47 por cento - passou por uma situação de pobreza pelo menos durante um ano. Esta conclusão faz parte de um novo estudo nacional sobre a pobreza em Portugal, cujos resultados deverão ser divulgados em Julho. A conclusão principal foi ontem antecipada pelo coordenador, Alfredo Bruto da Costa, durante a conferência da Comissão Nacional Justiça e Paz (CNJP), da Igreja Católica, em Lisboa: "Esta é a verdadeira dimensão da pobreza em Portugal."
O inquérito, realizado pelo Centro de Estudos para a Intervenção Social (Cesis), investigou a situação de carência das famílias portuguesas nos seis anos compreendidos entre 1995 e 2000. Em vez de se limitar a medir a incidência da taxa de pobreza num dado momento - o número já conhecido dos dois milhões de pobres -, o estudo procura ir mais fundo na percepção das causas da pobreza persistente em Portugal. Daí o ter recorrido a um período alargado de seis anos. Há mais alguns dados complementares do estudo igualmente preocupantes: das famílias que estiveram em situação de pobreza, 72 por cento acharam-se nessa condição durante dois ou mais anos. No mesmo universo, 40 por cento tinham os seus membros empregados - ou por conta própria ou por conta de outrem - enquanto outros 30 por cento dessas famílias eram de pensionistas. Estes últimos números significam, na opinião do coordenador do estudo e actual presidente do Conselho Económico e Social (CES), que o fenómeno da pobreza em Portugal "não é apenas uma questão redistributiva".
A propósito, Bruto da Costa citou um texto de Agostinho Fortes, de 1925: "Muito se tem tentado, entre nós, em favor das classes privadas dos dons da fortuna. (...) Infelizmente, o que [se tem] conseguido neste ramo do problema social é tão pouco eficaz que deixa a impressão de que a miséria é cultivada com ternura, amor e dedicação."
São números como os citados que levam o presidente do CES a afirmar que, em Portugal, a pobreza é um fenómeno persistente e de larga escala. A sociedade portuguesa "não está preparada para apoiar as medidas necessárias de combate à pobreza". E "o combate à fraude dos pobres" parece preocupar mais que o combate "à fraude dos ricos" e o próprio combate à pobreza, criticou.
Há um "problema de políticas económicas", acrescenta Alfredo Bruto da Costa, que considera "erradas as estratégias económicas" que colocam em primeiro lugar o crescimento e só depois a repartição da riqueza.
A pobreza só pode acabar "modificando os factores económicos, sociais e culturais que geram os mecanismos" que a perpetuam, diz entretanto o manifesto proposto pela CNJP no final da sua conferência nacional. A comissão católica - que depende directamente da Conferência Episcopal, embora funcione com autonomia - aponta a pobreza como "uma grave violação dos direitos humanos". Por isso, a presidente da comissão, Manuela Silva, propôs no início da conferência que "o direito a não ser pobre" deve ser incluído "no conjunto dos direitos humanos universais".
Tal exigência esbarra no modelo económico vigente, que a investigadora Isabel Guerra põe em causa: "Os anos 70 mostraram a desigualdade do crescimento, os anos 80, com a ecologia, mostraram os limites do crescimento." Luís Moita, vice-reitor da Universidade Autónoma, também apontou para o necessário estilo de vida mais modesto. E admitiu que erradicar a pobreza é tarefa "inadiável", que teme não ser "hoje possível: estamos a remar contra a maré", disse.
O manifesto fala das "tantas mortes" que a pobreza "está gerando cada dia" e diz que o fenómeno continua a ser "um problema periférico pretensamente resolúvel por políticas e medidas periféricas e residuais". Exemplo, dado por Isabel Baptista, do Cesis: o primeiro Plano Nacional de Acção para a Inclusão estabelecia como prioridade "erradicar" a pobreza infantil. O segundo mudou o verbo para "diminuir". O terceiro limita-se a propor "atenuar"...
No manifesto, a CNJP propõe ao Governo que adopte salários, pensões mínimas e prestações sociais "que em caso algum fiquem aquém do limiar da pobreza" - pouco mais de 300 euros. O documento destina-se a receber o apoio das pessoas e instituições que o queiram subscrever, para mobilizar a sociedade civil e ser enviado às instâncias governamentais.
Trabalhar num túnel com "a água pelos joelhos" e um "falso" contrato de 403 euros
Ana Cristina Pereira, in Jornal Público
Haverá 300 portugueses a trabalhar na construção dos túneis e da Barragem de Karahnjukar. Como os polacos e os paquistaneses, ganham em média três mil euros, "metade dos italianos"
Ainda lhe dói o estômago. José Santos é pedreiro, profissão dura. Mas não estava preparado para "condições tão más" como as que encontrou naquele projecto islandês de estruturas industriais hidroeléctricas. "Eram muitas horas a trabalhar com água até aos joelhos; não podia descansar um bocadinho senão era despedido. Chovia em cima do comer. Queria pôr o pão na mesa e não podia, ficava todo molhado."
Assinou um contrato com a Select - I Serviços Lda, uma das maiores agências de trabalho temporário a operar em Portugal, para prestar serviço à Impregilo, SA - uma empresa italiana que garantiu uma das empreitadas da Metro do Porto - no projecto hidráulico Karahnjukar.
Avisaram-no de que iria trabalhar numa "zona de montanha com muita neve" - no exterior, 20 graus negativos e ventos que podem atingir 200 quilómetros por hora. Durante o Inverno, a noite dura 23 horas; durante o Verão, o quadro inverte-se. Avisaram-no da inexistência de "qualquer população perto da obra" - a cidade mais próxima fica a 120 quilómetros e a televisão seria o seu único entretenimento. Não sabia que "teria de trabalhar 14 horas por dia". Não imaginava que lhe serviriam o almoço condimentado ("cozinheiros paquistaneses e chineses") ali mesmo, dentro dos longuíssimos túneis destinados a recolher água proveniente do degelo e a transportá-la para a barragem. Nem que só lhe dariam "dez a 15 minutos para comer".
Na obra trabalharão uns "300 portugueses - 150 a 200 nos túneis, o resto na barragem". Os dos túneis afligem-se com a água gélida, com a poluição ("muitas vezes não se consegue ver um colega que está a dez metros, por causa do fumo"), os outros com a neve, com o vento cortante. "Todas as semanas, vão dez portugueses para lá [a maior parte recrutados por outra agência de trabalho temporário na zona de Setúbal] e voltam outros dez", diz o pedreiro gaiense de 47 anos. "E só não vêm mais embora porque têm de pagar a viagem do bolso deles."
O contrato, a que o PÚBLICO teve acesso, estabelece uma remuneração- -base de 403 euros por mês, com alimentação, alojamento, viagem a cada três meses de trabalho consecutivo incluídos. "Fazer um contrato para ir trabalhar para a Islândia a 403 euros [de salário-base] é aberrante! Isto até devia ser investigado pela Polícia Judiciária!", indigna-se Albano Ribeiro, presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil no Norte, que deu uma conferência a denunciar "a escravatura" na Islândia.
Correspondessem aqueles 403 euros ao salário real e José nem teria arrancado. "Esse é o salário que a Select põe para fazer os descontos. O ordenado [base] é 1500 euros. Com as horas extras, os domingos e feriados, dá para tirar três mil euros", assevera.
Conforme o contrato, o que excede as 40 horas semanais é considerado trabalho suplementar e remunerado como tal. Um outro documento da Select - 1 Serviços Lda, que o trabalhador teve de assinar, informa que: "Por semana são feitas 60 horas, a partir daí as horas são pagas, nos dias úteis, a partir da 10h/dia a 50 por cento, a partir da 12h/dia a 75 por cento; nos sábados, a partir da 10h/dia a cem por cento; nos domingos e feriados a 150 por cento."
"É uma violação", acusa Ribeiro. "Em Portugal, o trabalhador da construção não se pode negar a fazer duas horas extras por dia, mas isso tem de vir acautelado no contrato", explica. A primeira hora extra é paga a 50 por cento, a segunda e terceira a 75. A legislação islandesa é ainda mais favorável. E ali "nem sequer têm folgas".
José acordava às 5h45 para apanhar o autocarro às 6h15. Entrava nos túneis às 7h00 e só saía às 18h00. Nem saía para almoçar. "Montam uma mesa lá dentro e as pessoas têm de comer em dez a 15 minutos". Eram 11 horas por dia "com a água gelada até aos joelhos, a chuva a cair". Usava fato térmico e galochas, mas saía de lá "todo molhado".
"Sentia-me escravizado"
Não mudava logo de roupa. "Há um acampamento ali perto, jantávamos lá." Às 20h30, ainda húmido, apanhava o transporte. Cumpria uma viagem de 60 quilómetros até entrar no quarto individual. Tomado um valente banho, vestia uma roupa seca, olhava para relógio a marcar 22h00. Não tardava a deitar-se numa cama de madeira (com "um colchão fininho, de oito ou nove centímetros") e tratava de dormir o melhor que podia até às 5h45. Valia-lhe que as duas horas gastas em deslocações contavam como trabalho.
Não era só a exaustão. "Sou pedreiro e fui para lá como servente - eles querem que a gente vá como servente e faça o trabalho qualificado, faça o trabalho de um trolha de primeira", queixa-se José. "Os italianos que lá estão, a fazer o mesmo, ganham quase seis mil euros." Mais três mil do que os polacos, os portugueses e os paquistaneses da mesma categoria profissional. Sentia-se "escravizado". E enjoado. "Não me dei com a comida; comia, vomitava, e eles não queriam saber disso. Acho que tenho uma gastroenterite." Nos últimos dias já nem olhava para as refeições que ali serviam; comprava umas sandes, "mas também não podia estar sempre a sandes".
Chegou a 4 de Maio e partiu a 17. A agência tem um colaborador em Karahnjukar, "para resolver os problemas do pessoal", como o adiantamento de vales ou a aquisição de cartões de telemóvel. José foi ter com ele e disse-lhe que queria voltar para casa. "Marcaram-me a passagem para regressar o mais depressa possível", lembra. "Vão-me descontar esse valor dos 14 dias que trabalhei lá. Acho mal." Não foi ontem possível contactar a Select, a agência funciona de segunda a sexta-feira depois das 9h00. Albano Ribeiro afiança que irá denunciar o caso ao Ministério do Trabalho e à Inspecção-Geral do Trabalho e não exclui a hipótese de se deslocar à Islândia.
Sindicato da Construção Civil do Norte vai levar o caso à Inspecção-Geral do Trabalho e ao ministério da tutela
Haverá 300 portugueses a trabalhar na construção dos túneis e da Barragem de Karahnjukar. Como os polacos e os paquistaneses, ganham em média três mil euros, "metade dos italianos"
Ainda lhe dói o estômago. José Santos é pedreiro, profissão dura. Mas não estava preparado para "condições tão más" como as que encontrou naquele projecto islandês de estruturas industriais hidroeléctricas. "Eram muitas horas a trabalhar com água até aos joelhos; não podia descansar um bocadinho senão era despedido. Chovia em cima do comer. Queria pôr o pão na mesa e não podia, ficava todo molhado."
Assinou um contrato com a Select - I Serviços Lda, uma das maiores agências de trabalho temporário a operar em Portugal, para prestar serviço à Impregilo, SA - uma empresa italiana que garantiu uma das empreitadas da Metro do Porto - no projecto hidráulico Karahnjukar.
Avisaram-no de que iria trabalhar numa "zona de montanha com muita neve" - no exterior, 20 graus negativos e ventos que podem atingir 200 quilómetros por hora. Durante o Inverno, a noite dura 23 horas; durante o Verão, o quadro inverte-se. Avisaram-no da inexistência de "qualquer população perto da obra" - a cidade mais próxima fica a 120 quilómetros e a televisão seria o seu único entretenimento. Não sabia que "teria de trabalhar 14 horas por dia". Não imaginava que lhe serviriam o almoço condimentado ("cozinheiros paquistaneses e chineses") ali mesmo, dentro dos longuíssimos túneis destinados a recolher água proveniente do degelo e a transportá-la para a barragem. Nem que só lhe dariam "dez a 15 minutos para comer".
Na obra trabalharão uns "300 portugueses - 150 a 200 nos túneis, o resto na barragem". Os dos túneis afligem-se com a água gélida, com a poluição ("muitas vezes não se consegue ver um colega que está a dez metros, por causa do fumo"), os outros com a neve, com o vento cortante. "Todas as semanas, vão dez portugueses para lá [a maior parte recrutados por outra agência de trabalho temporário na zona de Setúbal] e voltam outros dez", diz o pedreiro gaiense de 47 anos. "E só não vêm mais embora porque têm de pagar a viagem do bolso deles."
O contrato, a que o PÚBLICO teve acesso, estabelece uma remuneração- -base de 403 euros por mês, com alimentação, alojamento, viagem a cada três meses de trabalho consecutivo incluídos. "Fazer um contrato para ir trabalhar para a Islândia a 403 euros [de salário-base] é aberrante! Isto até devia ser investigado pela Polícia Judiciária!", indigna-se Albano Ribeiro, presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil no Norte, que deu uma conferência a denunciar "a escravatura" na Islândia.
Correspondessem aqueles 403 euros ao salário real e José nem teria arrancado. "Esse é o salário que a Select põe para fazer os descontos. O ordenado [base] é 1500 euros. Com as horas extras, os domingos e feriados, dá para tirar três mil euros", assevera.
Conforme o contrato, o que excede as 40 horas semanais é considerado trabalho suplementar e remunerado como tal. Um outro documento da Select - 1 Serviços Lda, que o trabalhador teve de assinar, informa que: "Por semana são feitas 60 horas, a partir daí as horas são pagas, nos dias úteis, a partir da 10h/dia a 50 por cento, a partir da 12h/dia a 75 por cento; nos sábados, a partir da 10h/dia a cem por cento; nos domingos e feriados a 150 por cento."
"É uma violação", acusa Ribeiro. "Em Portugal, o trabalhador da construção não se pode negar a fazer duas horas extras por dia, mas isso tem de vir acautelado no contrato", explica. A primeira hora extra é paga a 50 por cento, a segunda e terceira a 75. A legislação islandesa é ainda mais favorável. E ali "nem sequer têm folgas".
José acordava às 5h45 para apanhar o autocarro às 6h15. Entrava nos túneis às 7h00 e só saía às 18h00. Nem saía para almoçar. "Montam uma mesa lá dentro e as pessoas têm de comer em dez a 15 minutos". Eram 11 horas por dia "com a água gelada até aos joelhos, a chuva a cair". Usava fato térmico e galochas, mas saía de lá "todo molhado".
"Sentia-me escravizado"
Não mudava logo de roupa. "Há um acampamento ali perto, jantávamos lá." Às 20h30, ainda húmido, apanhava o transporte. Cumpria uma viagem de 60 quilómetros até entrar no quarto individual. Tomado um valente banho, vestia uma roupa seca, olhava para relógio a marcar 22h00. Não tardava a deitar-se numa cama de madeira (com "um colchão fininho, de oito ou nove centímetros") e tratava de dormir o melhor que podia até às 5h45. Valia-lhe que as duas horas gastas em deslocações contavam como trabalho.
Não era só a exaustão. "Sou pedreiro e fui para lá como servente - eles querem que a gente vá como servente e faça o trabalho qualificado, faça o trabalho de um trolha de primeira", queixa-se José. "Os italianos que lá estão, a fazer o mesmo, ganham quase seis mil euros." Mais três mil do que os polacos, os portugueses e os paquistaneses da mesma categoria profissional. Sentia-se "escravizado". E enjoado. "Não me dei com a comida; comia, vomitava, e eles não queriam saber disso. Acho que tenho uma gastroenterite." Nos últimos dias já nem olhava para as refeições que ali serviam; comprava umas sandes, "mas também não podia estar sempre a sandes".
Chegou a 4 de Maio e partiu a 17. A agência tem um colaborador em Karahnjukar, "para resolver os problemas do pessoal", como o adiantamento de vales ou a aquisição de cartões de telemóvel. José foi ter com ele e disse-lhe que queria voltar para casa. "Marcaram-me a passagem para regressar o mais depressa possível", lembra. "Vão-me descontar esse valor dos 14 dias que trabalhei lá. Acho mal." Não foi ontem possível contactar a Select, a agência funciona de segunda a sexta-feira depois das 9h00. Albano Ribeiro afiança que irá denunciar o caso ao Ministério do Trabalho e à Inspecção-Geral do Trabalho e não exclui a hipótese de se deslocar à Islândia.
Sindicato da Construção Civil do Norte vai levar o caso à Inspecção-Geral do Trabalho e ao ministério da tutela
Metade das famílias viveu em pobreza entre 1995 e 2000
in TVI
A pobreza deve ser abolida e declarada ilegal, tal como aconteceu com a escravatura, o apartheid ou a violência doméstica, refere o «Público».
Quase metade das famílias portuguesas passou por uma situação de pobreza, pelo menos durante um ano, entre 1995 e 2000, revela o «Público», na edição de domingo.
Um inquérito realizado pelo Centro de Estudos para a Intervenção Social investigou a situação de carência das famílias portuguesas durante seis anos. Das famílias que estiveram em situação de pobreza (47%), 72% estiveram nessa condição durante dois ou mais anos. 40% das famílias tinham membros empregados, enquanto outras 30% eram pensionistas.
O jornal diário refere ainda, num outro artigo, que a pobreza deve ser abolida e declarada ilegal, tal como aconteceu com a escravatura, o apartheid ou a violência doméstica. A ideia foi defendida pelo actual Subdirector-Geral da UNESCO, Pierre Sané.
A pobreza deve ser abolida e declarada ilegal, tal como aconteceu com a escravatura, o apartheid ou a violência doméstica, refere o «Público».
Quase metade das famílias portuguesas passou por uma situação de pobreza, pelo menos durante um ano, entre 1995 e 2000, revela o «Público», na edição de domingo.
Um inquérito realizado pelo Centro de Estudos para a Intervenção Social investigou a situação de carência das famílias portuguesas durante seis anos. Das famílias que estiveram em situação de pobreza (47%), 72% estiveram nessa condição durante dois ou mais anos. 40% das famílias tinham membros empregados, enquanto outras 30% eram pensionistas.
O jornal diário refere ainda, num outro artigo, que a pobreza deve ser abolida e declarada ilegal, tal como aconteceu com a escravatura, o apartheid ou a violência doméstica. A ideia foi defendida pelo actual Subdirector-Geral da UNESCO, Pierre Sané.
Colóquio sobre “Exclusão Social”
in Jornal Oeste
O projecto Maré-Alta II e a Escola Secundária de Peniche realizaram no passado dia 11 de Maio um colóquio sobre Exclusão Social, no auditório do Edifício Cultural da Câmara Municipal de Peniche, uma actividade promovida no âmbito das comemorações da Semana da Europa.
A sessão teve início com a apresentação dos trabalhos sobre exclusão social realizados pelos alunos do 12º ano, na disciplina de Área de Projecto, abarcando diferentes temas como Exclusão Social, o Insucesso escolar, a Delinquência juvenil – um testemunho e a Imigração que incluíam uma questão para os oradores responderem.
No final os oradores convidados para a sessão, nomeadamente Abrão Gomes, técnico do projecto “Poder(es)colher”- Vila Franca de Xira no âmbito do Programa Escolhas, Pedro Cunha, representante da Fundação Aga Khan, José Carlos Barros, representante do ACIME (Alto Comissariado para a Integração e Minorias Étnicas) e Isabel Vargas, representante do Instituto de Reinserção Social, expuseram os seus pontos de vista sobre as questões apresentadas e a forma, como nos seus diferentes contextos laborais, tentavam minimizar este problema da Exclusão Social.
A participação no colóquio foi elevada, principalmente por parte da comunidade escolar e familiares, que praticamente lotaram o auditório municipal.
O projecto Maré Alta II é financiado pela Programa Escolhas e tem como elementos do consórcio a Adepe (Associação Para o Desenvolvimento de Peniche), a Associação Comercial, Industrial e de Serviços de Peniche, a Câmara Municipal de Peniche, a CerciPeniche e o Centro de Saúde de Peniche.
O projecto Maré-Alta II e a Escola Secundária de Peniche realizaram no passado dia 11 de Maio um colóquio sobre Exclusão Social, no auditório do Edifício Cultural da Câmara Municipal de Peniche, uma actividade promovida no âmbito das comemorações da Semana da Europa.
A sessão teve início com a apresentação dos trabalhos sobre exclusão social realizados pelos alunos do 12º ano, na disciplina de Área de Projecto, abarcando diferentes temas como Exclusão Social, o Insucesso escolar, a Delinquência juvenil – um testemunho e a Imigração que incluíam uma questão para os oradores responderem.
No final os oradores convidados para a sessão, nomeadamente Abrão Gomes, técnico do projecto “Poder(es)colher”- Vila Franca de Xira no âmbito do Programa Escolhas, Pedro Cunha, representante da Fundação Aga Khan, José Carlos Barros, representante do ACIME (Alto Comissariado para a Integração e Minorias Étnicas) e Isabel Vargas, representante do Instituto de Reinserção Social, expuseram os seus pontos de vista sobre as questões apresentadas e a forma, como nos seus diferentes contextos laborais, tentavam minimizar este problema da Exclusão Social.
A participação no colóquio foi elevada, principalmente por parte da comunidade escolar e familiares, que praticamente lotaram o auditório municipal.
O projecto Maré Alta II é financiado pela Programa Escolhas e tem como elementos do consórcio a Adepe (Associação Para o Desenvolvimento de Peniche), a Associação Comercial, Industrial e de Serviços de Peniche, a Câmara Municipal de Peniche, a CerciPeniche e o Centro de Saúde de Peniche.
26.5.07
Famílias portuguesas ameaçadas pela pobreza
Lígia Silveira, in Agência Ecclesia
«Por um desenvolvimento global e solidário - um compromisso de cidadania» traçou quadro português
Uma situação que não é nova, onde os dados são mais que conhecidos. A pobreza não dá destaques na comunicação social porque sempre houve pobres. Sobre isto se debruçou Alfredo Bruto da Costa na participação que manteve na Conferência Nacional “Por um desenvolvimento global e solidário - um compromisso de cidadania”, uma iniciativa de dois dias da Comissão Nacional Justiça e Paz.
O Presidente do Conselho Económico e Social sublinhou a importância que ao longo da história Portugal foi demonstrando de atenção e de assistência aos pobres. “Através de muitos gestos individuais, de instituições de solidariedade e de políticas sociais, a sociedade sempre exibiu a sua preocupação com os pobres”. Mas se esta análise é justa “como se explica que apesar de um contexto de longevidade, a pobreza exista e continue a existir em larga escala?”.
A sociedade desenvolveu uma cultura básica de “bem-estar, remetendo para o Estado a solução de todos os problemas”, explica Alfredo Bruto da Costa, como sendo uma das razões do afastamento do compromisso e do sentido de dever dos cidadãos. Ao enfraquecimento da responsabilidade individual acresce-se “a persistência desta situação constante de pobreza criou uma habituação, e passou a ser vista como normal”. Segundo o conferencista, um estudo junto da opinião pública sobre as razões da pobreza, “um terço dos inquiridos atribui aos pobres a pouca sorte, ou seja, assumem uma postura fatalista, enquanto que equivalente percentagem acredita que a situação de pobreza se deve à preguiça”.
Comparando com os números de pobreza em Portugal, “temos dois milhões de preguiçosos no nosso país”, ironizou Alfredo Bruto da Costa.
O Presidente do Conselho Económico e Social acrescenta ainda que a população portuguesa manifesta “uma reserva generalizada sobre a autenticidade da pobreza - é encarada como fraudulenta”. A emergência da cultura consumista “altera a noção de políticas e de justiça moral”.
“Não existe uma verdadeira noção de pobreza em Portugal” sublinha Alfredo Bruto da Costa, acrescentando que 47 % das famílias portuguesas passaram por uma situação de pobreza. “Metade das famílias estiveram um ano em estado de pobreza”, enfatizou.
“Todos compreendemos os geradores de pobreza, mas o que de facto fazemos para atingir esses mecanismos? Há uma dúvida nas acções e nas políticas”. Nunca as pessoas estiveram tão próximas umas das outras e “na era da globalização e da abundância, a justiça e a solidariedade nunca foram tão possíveis”. Por isso a “persistência da pobreza é uma acusação moral dos nossos tempos”.
A percentagem citada pelo conferencista referem-se a dados de famílias empregadas. “Esta situação torna claro que a pobreza não é um problema de redistribuição de políticas sociais, mas acima de tudo uma repartição do rendimento. O princípio de «vamos crescer primeiro para distribuir depois» não é válido”, sublinha porque o crescimento económico é importante mas “a redistribuição não elimina as desigualdades”.
Alfredo Bruto da Costa enfatiza o muito que se faz “é bom e indispensável, não para eliminar a pobreza, mas para reduzir a carência e atenuar o sofrimento” e lembra que “se actuarmos juntos e com coragem, todos serão mais seguros, prósperos e capazes de gozar os seus direitos fundamentais”.
Isabel Baptista apontou que proliferam políticas de intervenção mas que “não são passíveis de ser avaliadas”. A conferencista referiu, no painel “Erradicar a pobreza em Portugal - um compromisso nacional”, que o Plano Estratégico para a Inclusão “é pouco conhecido”. A investigadora no CESIS - Centro de Estudos para a Intervenção Social, relembrou ainda que uma das medidas entre 2006 e 2008 seria “eliminar a pobreza entre os idosos e as crianças, esquecendo o facto de que as crianças vivem em famílias”. O Rendimento Social de Inserção, por exemplo, “e importante, mas o seu valor de 80 euros por pessoa, não elimina a pobreza ao nível que conhecemos”, sublinhando no entanto o benefício da sua “regularidade”.
“Participação não é só dar a conhecer o que se passa, é envolver as pessoas desde o diagnóstico até à efectivação de medidas concretas”, sublinha, acrescentando ainda que “só indo ao encontro das pessoas é possível perceber se de facto mudou alguma coisa, se determinada medida teve ou não impacto efectivo na sua vida”.
Portugal precisa de motivar mais os debates e as reflexões para reverter a sua situação de “estar constantemente na cauda da Europa”, afirmou Maria Barroso, a participar na reflexão sobre a situação portuguesa. “Esta Conferência é um bom exemplo de como se deve procurar as raízes dos problemas para ganhar em entusiasmo para combater”. Com entusiasmo afirma que “todos gostamos do nosso país, por isso é preciso estarmos na primeira fila prontos para actuar”.
Maria Barroso destaca ainda a importância da comunicação social em veicular notícias que “introduzam estas questões e não tanto em mostrar escândalos ou malefícios”.
«Por um desenvolvimento global e solidário - um compromisso de cidadania» traçou quadro português
Uma situação que não é nova, onde os dados são mais que conhecidos. A pobreza não dá destaques na comunicação social porque sempre houve pobres. Sobre isto se debruçou Alfredo Bruto da Costa na participação que manteve na Conferência Nacional “Por um desenvolvimento global e solidário - um compromisso de cidadania”, uma iniciativa de dois dias da Comissão Nacional Justiça e Paz.
O Presidente do Conselho Económico e Social sublinhou a importância que ao longo da história Portugal foi demonstrando de atenção e de assistência aos pobres. “Através de muitos gestos individuais, de instituições de solidariedade e de políticas sociais, a sociedade sempre exibiu a sua preocupação com os pobres”. Mas se esta análise é justa “como se explica que apesar de um contexto de longevidade, a pobreza exista e continue a existir em larga escala?”.
A sociedade desenvolveu uma cultura básica de “bem-estar, remetendo para o Estado a solução de todos os problemas”, explica Alfredo Bruto da Costa, como sendo uma das razões do afastamento do compromisso e do sentido de dever dos cidadãos. Ao enfraquecimento da responsabilidade individual acresce-se “a persistência desta situação constante de pobreza criou uma habituação, e passou a ser vista como normal”. Segundo o conferencista, um estudo junto da opinião pública sobre as razões da pobreza, “um terço dos inquiridos atribui aos pobres a pouca sorte, ou seja, assumem uma postura fatalista, enquanto que equivalente percentagem acredita que a situação de pobreza se deve à preguiça”.
Comparando com os números de pobreza em Portugal, “temos dois milhões de preguiçosos no nosso país”, ironizou Alfredo Bruto da Costa.
O Presidente do Conselho Económico e Social acrescenta ainda que a população portuguesa manifesta “uma reserva generalizada sobre a autenticidade da pobreza - é encarada como fraudulenta”. A emergência da cultura consumista “altera a noção de políticas e de justiça moral”.
“Não existe uma verdadeira noção de pobreza em Portugal” sublinha Alfredo Bruto da Costa, acrescentando que 47 % das famílias portuguesas passaram por uma situação de pobreza. “Metade das famílias estiveram um ano em estado de pobreza”, enfatizou.
“Todos compreendemos os geradores de pobreza, mas o que de facto fazemos para atingir esses mecanismos? Há uma dúvida nas acções e nas políticas”. Nunca as pessoas estiveram tão próximas umas das outras e “na era da globalização e da abundância, a justiça e a solidariedade nunca foram tão possíveis”. Por isso a “persistência da pobreza é uma acusação moral dos nossos tempos”.
A percentagem citada pelo conferencista referem-se a dados de famílias empregadas. “Esta situação torna claro que a pobreza não é um problema de redistribuição de políticas sociais, mas acima de tudo uma repartição do rendimento. O princípio de «vamos crescer primeiro para distribuir depois» não é válido”, sublinha porque o crescimento económico é importante mas “a redistribuição não elimina as desigualdades”.
Alfredo Bruto da Costa enfatiza o muito que se faz “é bom e indispensável, não para eliminar a pobreza, mas para reduzir a carência e atenuar o sofrimento” e lembra que “se actuarmos juntos e com coragem, todos serão mais seguros, prósperos e capazes de gozar os seus direitos fundamentais”.
Isabel Baptista apontou que proliferam políticas de intervenção mas que “não são passíveis de ser avaliadas”. A conferencista referiu, no painel “Erradicar a pobreza em Portugal - um compromisso nacional”, que o Plano Estratégico para a Inclusão “é pouco conhecido”. A investigadora no CESIS - Centro de Estudos para a Intervenção Social, relembrou ainda que uma das medidas entre 2006 e 2008 seria “eliminar a pobreza entre os idosos e as crianças, esquecendo o facto de que as crianças vivem em famílias”. O Rendimento Social de Inserção, por exemplo, “e importante, mas o seu valor de 80 euros por pessoa, não elimina a pobreza ao nível que conhecemos”, sublinhando no entanto o benefício da sua “regularidade”.
“Participação não é só dar a conhecer o que se passa, é envolver as pessoas desde o diagnóstico até à efectivação de medidas concretas”, sublinha, acrescentando ainda que “só indo ao encontro das pessoas é possível perceber se de facto mudou alguma coisa, se determinada medida teve ou não impacto efectivo na sua vida”.
Portugal precisa de motivar mais os debates e as reflexões para reverter a sua situação de “estar constantemente na cauda da Europa”, afirmou Maria Barroso, a participar na reflexão sobre a situação portuguesa. “Esta Conferência é um bom exemplo de como se deve procurar as raízes dos problemas para ganhar em entusiasmo para combater”. Com entusiasmo afirma que “todos gostamos do nosso país, por isso é preciso estarmos na primeira fila prontos para actuar”.
Maria Barroso destaca ainda a importância da comunicação social em veicular notícias que “introduzam estas questões e não tanto em mostrar escândalos ou malefícios”.
25.5.07
Economia Social e Empresas de Inserção
Lígia Silveira, in Agência Ecclesia
Modelos de desenvolvimento e de inclusão em debate no Porto, com vista ao combate à pobreza e exclusão social
A Rede Europeia Anti-Pobreza / Portugal (REAPN), no âmbito do protocolo de cooperação assinado com o Instituto de Emprego e Formação Profissional - IEFP, pretender juntar ONG, peritos na área da pobreza e da exclusão social e entidades públicas e privadas para discutir a importância da Economia Social na inserção de públicos desfavorecidos no mercado de trabalho.
“Não ter trabalho é nitidamente uma forma de exclusão social”, adianta à Agência ECCLESIA, Júlio Paiva, da Rede Europeia Anti Pobreza/Portugal e organizador do encontro. O que não quer dizer também “que muitas pessoas que têm trabalho não sejam igualmente excluídas socialmente”, acrescenta. Até porque o trabalho “não é a única forma de exclusão”.
A economia social “por si só”, já é uma economia feita “para e com as pessoas”. A sua filosofia tem como grande objectivo “a inclusão das pessoas, feita a pensar não no lucro mas nas pessoas”, mas não rejeita à priori os benefícios, apenas “são re investidos na própria pessoa”.
As ONG, ou as empresas do Terceiro Sector, contribuem muito para este mercado, seja através dos serviços prestados e das respostas dadas, seja como entidade empregadora, e geradora de crescimento económico. Por isso, é fundamental entender e compreender o seu papel, não só a nível nacional, mas também europeu, e dar-lhe a importância devida.
Embora a economia social seja um parente pobre dentro do mercado nacional e europeu, o certo é que esta tem dado respostas e avançado com soluções na área da luta contra a pobreza e exclusão social, e consequentemente na inserção de públicos desfavorecidos através, por exemplo, das Empresas de Inserção (medida que surge no âmbito do Mercado Social de Emprego - MSE). Mas com um novo quadro comunitário, 2007 - 2013, “quisemos perceber qual o papel da economia social”.
O Mercado Social de Emprego, “extremamente ligado à economia social”, em Portugal denominado de Empresas de Inserção, visam “a integração de pessoas com dificuldade de inserção no mercado normal de trabalho”, explica Júlio Paiva. Estas empresas funcionam a partir de uma entidade promotora, Misericórdias por exemplo, “que emprega determinados públicos”.
O protocolo que a REAPN mantém com o Estado, através do IEFP prevê precisamente a divulgação dos benefícios da economia social. O Estado “está interessado em fazer escoar esta mensagem”, sublinha Júlio Paiva. Outros institutos são parceiros neste trabalho, por isso “apesar de secundarizado, a economia social está presente e vivo”, admite.
A Rede Europeia Anti- Pobreza/ Portugal (REAPN) é uma Organização Não Governamental que tem como missão combater os fenómenos da pobreza e da exclusão social a nível nacional, utilizando como meios a informação, a formação e a investigação.
As actividades desenvolvidas no âmbito do Protocolo de Cooperação assinado entre o IEFP e a REAPN estão disponíveis em www.iefp.reapn.org
Modelos de desenvolvimento e de inclusão em debate no Porto, com vista ao combate à pobreza e exclusão social
A Rede Europeia Anti-Pobreza / Portugal (REAPN), no âmbito do protocolo de cooperação assinado com o Instituto de Emprego e Formação Profissional - IEFP, pretender juntar ONG, peritos na área da pobreza e da exclusão social e entidades públicas e privadas para discutir a importância da Economia Social na inserção de públicos desfavorecidos no mercado de trabalho.
“Não ter trabalho é nitidamente uma forma de exclusão social”, adianta à Agência ECCLESIA, Júlio Paiva, da Rede Europeia Anti Pobreza/Portugal e organizador do encontro. O que não quer dizer também “que muitas pessoas que têm trabalho não sejam igualmente excluídas socialmente”, acrescenta. Até porque o trabalho “não é a única forma de exclusão”.
A economia social “por si só”, já é uma economia feita “para e com as pessoas”. A sua filosofia tem como grande objectivo “a inclusão das pessoas, feita a pensar não no lucro mas nas pessoas”, mas não rejeita à priori os benefícios, apenas “são re investidos na própria pessoa”.
As ONG, ou as empresas do Terceiro Sector, contribuem muito para este mercado, seja através dos serviços prestados e das respostas dadas, seja como entidade empregadora, e geradora de crescimento económico. Por isso, é fundamental entender e compreender o seu papel, não só a nível nacional, mas também europeu, e dar-lhe a importância devida.
Embora a economia social seja um parente pobre dentro do mercado nacional e europeu, o certo é que esta tem dado respostas e avançado com soluções na área da luta contra a pobreza e exclusão social, e consequentemente na inserção de públicos desfavorecidos através, por exemplo, das Empresas de Inserção (medida que surge no âmbito do Mercado Social de Emprego - MSE). Mas com um novo quadro comunitário, 2007 - 2013, “quisemos perceber qual o papel da economia social”.
O Mercado Social de Emprego, “extremamente ligado à economia social”, em Portugal denominado de Empresas de Inserção, visam “a integração de pessoas com dificuldade de inserção no mercado normal de trabalho”, explica Júlio Paiva. Estas empresas funcionam a partir de uma entidade promotora, Misericórdias por exemplo, “que emprega determinados públicos”.
O protocolo que a REAPN mantém com o Estado, através do IEFP prevê precisamente a divulgação dos benefícios da economia social. O Estado “está interessado em fazer escoar esta mensagem”, sublinha Júlio Paiva. Outros institutos são parceiros neste trabalho, por isso “apesar de secundarizado, a economia social está presente e vivo”, admite.
A Rede Europeia Anti- Pobreza/ Portugal (REAPN) é uma Organização Não Governamental que tem como missão combater os fenómenos da pobreza e da exclusão social a nível nacional, utilizando como meios a informação, a formação e a investigação.
As actividades desenvolvidas no âmbito do Protocolo de Cooperação assinado entre o IEFP e a REAPN estão disponíveis em www.iefp.reapn.org
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