Zulay Costa, in Jornal de Notícias
Sofia, Liliana e Tânia são três das 10 jovens que vivem no Astrolábio, o Lar de Infância e Juventude da Misericórdia em Vagos
Sofia, 14 meses; Liliana, 16 meses; Tânia, nove meses. A contagem refere-se ao tempo passado no Astrolábio, Lar de Infância e Juventude dirigido pela Misericórdia e instalado, desde Dezembro de 2003, em Vagos. A valência nasceu para "orientar" jovens (dez actualmente) entre os 12 e os 18 anos, que viveram experiências problemáticas. Não é uma sentença, mas aos olhos destas adolescentes parece e, por isso, todas levam conta dos dias.
Sofia, 15 anos, sonha ser cabeleireira enquanto frequenta o curso de Cozinha numa escola local. Deixou para trás um passado de tentativas de abuso sexual por um familiar, um pai ausente, uma mãe na noite e um irmão noutra instituição. A história não é mais trágica que a das outras nove jovens que estão no Astrolábio.
Tânia, 13 anos, foi retirada à família depois de anos de maus-tratos por familiares, numa mistura de violência, álcool e negligência. "Sinto-me protegida. Fiz amigos e tenho liberdade. Dantes batiam-me e tinha vergonha de ir para a escola pisada; gosto mais de estar aqui".
Liliana, 14 anos, partilha o mesmo tecto e histórias parecidas de álcool e violência. Para além da mãe, deixou para trás um irmão de quatro anos, entretanto adoptado. "Agora estou melhor, mais protegida. Há muita gente que gostava de estar aqui; sabemos com quem contar", garante.
"Cada caso é um caso, mas em geral, quando chegam, vêm assustadas, desconfiadas e sem auto-estima. Pensam que as instituições são más. Umas tentam esconder que estão cá, outras sentem-se orgulhosas. No início estão revoltadas, não compreendem por que estão aqui, por que lhes aconteceu tudo isto", conta Sónia Ribeiro, assistente social e coordenadora do Astrolábio.
Todas são acompanhadas por uma psicóloga. Duas assistentes sociais e três funcionárias revezam- -se para não deixar as raparigas sozinhas. Fazem tudo para que o Astrolábio seja quase uma "casa normal". Os laços com a família não são totalmente cortados. Muitas recebem visitas ao fim-de-semana, telefonam e vão a casa nas férias. A instituição tem regras, tarefas, telefone, espaços de lazer e estudo. É quase normal, mas não chega a ser. "Uma mãe não vai embora às 19 horas para dar lugar a outra, como aqui
", lembra Sónia Ribeiro.
Nova casa em Setembro
As jovens chegam encaminhadas pela Segurança Social ou por técnicos das Comissões de Protecção de Crianças e Jovens, depois de estas mesmas comissões ou o Tribunal de Menores tomarem a decisão de as institucionalizar. "O objectivo é permanecerem aqui o menor tempo possível, mas às vezes só saem quando fazem 18 anos. Quando são institucionalizadas é já em último recurso; senão, iam para um Centro de Acolhimento Temporário (CAT)", explica a coordenadora do Astrolábio. A partir de Setembro, altura em que ficará concluído o novo edifício, o lar passará a funcionar como CAT. As jovens poderão ficar no máximo seis meses e apenas estas 10 raparigas ficam até aos 18 anos, porque "a Misericórdia já se comprometeu".