25.7.23

FMI está mais otimista e reviu em alta o crescimento mundial para 3%

Jorge Nascimento Rodrigues Jornalista e  Carlos Esteve Jornalista infográfico, in Expresso


O FMI reviu esta terça-feira em alta as previsões para a economia mundial e antecipa que a China cumprirá a meta de crescer mais de 5% este ano. Revela também que, apesar da guerra, a economia russa está a recuperar. Zona euro terá um dos crescimentos mais fracos, com a Alemanha em recessão

O Fundo Monetário Internacional (FMI), dirigido por Kristalina Georgieva, dá esta terça-feira boas e más notícias ao divulgar as novas previsões macroeconómicas para 2023 e 2024 em relação às grandes economias.

A mais importante boa notícia que vem de Washington é que a economia mundial vai crescer este ano mais do que previsto no World Economic Outlook publicado em abril. O FMI está agora mais otimista. Em vez de 2,8%, a economia global deverá crescer 3% este ano, devido à resolução rápida da crise financeira de março, ao acordo em Washington para evitar um default pelo Tesouro dos Estados Unidos da América (EUA) e à dinâmica do sector dos serviços.

A pior notícia é que a Alemanha, o motor da zona euro, registará em 2023 uma recessão, sendo o único caso de contração entre as grandes economias. O Reino Unido escapa à recessão que o FMI previa em abril. O desempenho do conjunto dos 20 países da moeda única europeia vai ser metade do dos EUA.

ECONOMIA MUNDIAL NO “CAMINHO CERTO”, MAS “É CEDO PARA CELEBRAR”

A revisão do crescimento global para 3% em 2023 veio dar uma lufada de otimismo na apresentação das previsões do FMI. “A economia global está no caminho certo”, disse esta terça-feira Pierre-Olivier Gourinchas, economista-chefe do Fundo e responsável pela equipa de previsões e por esta atualização intercalar do World Economic Outlook (WEO). O anterior WEO, apresentado em abril, apontava para um crescimento mundial de 2,8%. Mesmo 3% fica muito abaixo da média anual para o período de 2000 a 2019, que inclui uma recessão global em 2009.

As novas previsões antecipam que a China vai cumprir a meta política de Pequim de crescer em 2023 acima de 5% e que a Índia vai ser a grande economia que mais cresce (quase mais um ponto percentual que a China). Os economistas do Fundo fizeram revisões em alta em 16 casos, com destaque para o Brasil (revisão em alta de 1,2 pontos percentuais) e Espanha (subida de um ponto).

Uma das revisões que tiveram um impacto decisivo foi a melhoria da previsão para o Reino Unido, uma economia que, em abril, era considerada como suscetível de entrar em recessão, e para a qual, agora, se aponta para crescimento, ainda que muito fraco, menos de metade do previsto para a zona euro.

Fruto das revisões em alta, a Rússia afasta-se do horizonte de recessão, em que mergulhou em 2022 (queda de 2,1%), no ano do início da invasão da Ucrânia, e deverá crescer 1,5% em 2023, em vez da previsão inicial de 0,7%. O ritmo de crescimento deverá continuar no próximo ano, ainda que mais moderadamente.

“No entanto, [a economia global] ainda não está fora de perigo" e "é cedo para celebrar”, acrescentou o economista-chefe. O FMI antecipa que em 2024 a economia global não acelera (o crescimento será igual ao do ano anterior) e que cinco das grandes economias vão mesmo desacelerar significativamente no próximo ano: China (que desce do patamar dos 5%), México e Brasil (que deixam de crescer acima de 2%), e EUA e Japão (que baixam para 1%).

O FMI cortou as previsões para 2023 nos casos da Alemanha (que registará recessão) e da Arábia Saudita (a economia líder do petróleo).

ZONA EURO MARCADA POR RECESSÃO NA ALEMANHA

Entre as grandes economias, o espaço da moeda única europeia regista dos crescimentos mais baixos globalmente em 2023. A previsão foi melhorada ligeiramente em relação a abril, mas o PIB crescerá apenas 0,9%. Mesmo assim a desaceleração em relação ao ano passado é “acentuada”: de 3,5% para quase um quarto da dinâmica. Reino Unido (que escapa a uma recessão) e África do Sul crescem menos do que a zona euro e também desaceleram significativamente.

A situação da zona euro fica marcada, este ano, pela recessão na Alemanha, a sua maior economia, e por uma diversidade de ritmos de crescimento bem diferentes, que vão de 2,5% em Espanha (que registou uma das maiores revisões em alta) a 0,8% em França.

Esta atualização intercalar de previsões só abrangeu as quatro maiores economias do euro e não incluiu, por isso, Portugal. A previsão para o crescimento da economia portuguesa avançada em junho (na análise anual feita pelo FMI) é otimista: 2,6%, apenas uma décima abaixo da do Banco de Portugal.

As previsões divulgadas esta terça-feira antecipam, no entanto, que o ritmo de crescimento da zona euro vai acelerar para 1,5% em 2024, com a Alemanha a sair da recessão e a crescer 1,3%. A confirmar-se esta projeção, a zona euro vai crescer no próximo ano mais do que os EUA, Japão, Reino Unido e Canadá. No quadro do euro, entre as grandes economias, Espanha continuará a liderar o crescimento, projetando-se 2%.



OS RISCOS QUE ENSOMBRAM A ECONOMIA MUNDIAL

Gourinchas chamou a atenção esta terça-feira que a economia mundial “ainda não está fora de perigo”. Os riscos são diversos.

O processo de desinflaçao (de redução do aumento dos preços no consumidor) continua a não dar mostras de ser sustentado, o que se aborda noutro artigo. Essa persistência do surto inflacionista está a implicar um aperto monetário prolongado por parte dos bancos centrais que o FMI já considera “ter trazido os juros para território contracionista”. O que, sendo necessário, no entender do Fundo, implica uma fatura: começam a ver-se “sinais crescentes de que a atividade económica global está a perder impulso”.

A China enfrenta vários desafios que poderão levar a uma maior desaceleração em 2024 e que podem envolver uma contração do muito sensível sector imobiliário. A fragmentação geopolítica do mundo alimenta uma crescente “fragmentação geoeconómica” com o risco de que a economia mundial se divida em “blocos separados”. Essa fragmentação pode ser intensificada por um agravamento da guerra de agressão russa em curso (com implicações económicas, militares e geopolíticas mais extensas) e por “outras tensões geopolíticas”, que o FMI não especifica. O que se pode esperar, caso se concretize esse agravamento, é mais protecionismo, mais restrições ao comércio internacional sobretudo em exportações consideradas estratégicas (como na tecnologia e nos minérios críticos) e aos fluxos de investimento. E mais volatilidade nos preços das matérias-primas.

Acrescem os impactos da mudança climática, agravando fenómenos extremos, exacerbando a seca e a fome e pressionando os preços das matérias-primas, refere o FMI. “Um progresso insuficiente na transição climática deixará os países pobres ainda mais expostos a choques climáticos cada vez mais severos e a temperaturas cada vez mais altas, apesar [desse grupo de países] representar uma pequena fração das emissões globais”, acentua o documento do Fundo.

Há que somar ainda o risco de uma crise de dívidas nas economias pobres e mesmo em mercados emergentes. “A parcela de economias emergentes e em desenvolvimento com spreads de dívida acima de 1000 pontos-base (10 pontos percentuais) mantém-se em 25%, comparando com 6,8% há dois anos [2022]”, refere-se no documento divulgado pelo FMI. Um estudo do Fundo indica que há 18 economias sobreendividadas que requerem uma solução global, que, ainda, não viu a luz do dia na recente reunião de ministros das Finanças e banqueiros centrais na Índia.

Apesar dos riscos para a estabilidade financeira mundial terem sido apaziguados depois da crise de março, o FMI continua a sinalizar a possibilidade de pressão sobre os bancos e o sector financeiro não bancário, em particular os mais expostos ao imobiliário. O FMI não coloca de lado a possibilidade de contágio.