Nuno Couceiro da Costa, in Notícias de Aveiro
Quantos de nós já pensámos no que vai acontecer quando ficarmos gastos pelo tempo e tivermos necessidade de ir para um lar? Já fizeram esse exercício? Provavelmente até aos 20-30 anos, não pensamos muito nisso, mas à medida que começamos a trabalhar e a ter a noção do custo de vida, da nossa remuneração e a comparamos com preços praticados nos lares, damos por nós a fazer a pergunta, “como vai ser quando eu lá chegar?”
À medida que os anos passam, os portugueses têm vindo a aumentar a sua longevidade, graças à melhoria das condições de vida, de uma forma geral. Isto é factual e fruto de um maior desenvolvimento da sociedade, com progressos a nível da medicina, alimentação, condições de higiene e salubridade que fizeram com que, neste contexto, Portugal seja um dos países do mundo com motivos de contentamento.
Mas no que concerne ao progressivo envelhecimento populacional sabemos que também somos um dos piores exemplos do mundo, com um incremento da população idosa, inversamente proporcional à redução da taxa de natalidade, que nos empurra cada vez mais para o fim da fila a nível mundial. Desta forma, políticas centradas na saúde devem ser adaptadas à realidade, não só com medidas que melhorem e levem a um incremento da natalidade, com políticas fortes de apoio aos jovens que planeiam ser pais, mas não podemos esquecer o tratamento que deve ser dado aos nossos idosos.
Hoje em dia, quem tem muito dinheiro, ou contrata alguém, ao domicílio, para cuidar de si ou do seu familiar idoso dependente a necessitar de cuidados permanentes, ou o coloca num lar. O problema reside na grande maioria dos portugueses, que não têm, ou não vão ter, rendimentos suficientes para o poder fazer e no qual o lar se assume como a última, mas difícil, alternativa, quando nos deparamos com os custos envolvidos.
E se este já constitui um sério problema, que nos preocupa, quando refletimos sobre a fórmula mágica para o resolver, empurrando essa decisão para um futuro que achamos ser distante, outros mais se afloram, não menos importantes, como a DIGNIDADE.
Qual será a dignidade que iremos ter na nossa última etapa? Quantos de nós já visitaram familiares em lares, percebendo a forma infantilizada com que estes são tratados? Quantas vezes nos pomos a refletir sobre a pessoa que ali está, os gostos que ela tem, as atividades que prefere, os livros que aprecia ler, as pinturas que gostaria de continuar a fazer, os projetos que ainda idealiza…
Pensando um pouco sobre isto, todos sabemos que este tipo de instituições trabalha de uma determinada forma. Mas não por culpa dos profissionais que as constituem e desempenham as suas funções com zelo e esforço, tantas vezes em número insuficiente para fazerem mais por quem está à sua guarda.
Pelos motivos que referi, mas também por a formação da grande maioria dos funcionários de lares ser insuficiente para cuidar com o necessário humanismo, torna-se normal colocar todos os dias a Maria e o Manuel sentados numa cadeira de rodas a olhar a paisagem, quando gostavam de ver um filme. Ou o Joaquim e a Luísa, outrora pessoas com interesses comuns em jardinagem, mas a jogar o balão, que foi planeado para aquele dia, apenas porque sim!
Com isto, o que pretendo dizer é que existe uma forma de fazer mais e melhor pelos nossos idosos. A começar nas direções técnicas de lares que obrigatoriamente deveriam ter profissionais de enfermagem nas suas equipas, porque a sua formação nesta área já é elevada.
Dever-se-iam personalizar os cuidados prestados à pessoa que entra, atendendo aos seus gostos, especificidades, formação, vontade… Este caminho só é possível ser feito, existindo verdadeiras políticas integrativas da parte do Estado no apoio às famílias e/ou utentes carenciados, que pretendam aceder a um lar.
Devemos garantir a existência, nas instituições, de dotações adequadas de profissionais de saúde, com elevada formação técnica, científica, ética e humana, com todos os agentes de saúde envolvidos num processo de análise individual e dedicado ao utente.
Aqui chegados, considero que os enfermeiros devem ser uma classe incontornável no estabelecimento de planos adaptados e individualizados para que esta mudança, necessária e emergente, ocorra e nos permita sonhar com um fim de vida condigno, a fazer aquilo que mais gostamos.
* Mestre em enfermagem Médico-Cirúrgica. Artigo publicado originalmente no site Healtnews.pt.