21.2.18

As crianças estão a ser levadas pelo Al-Shabaab para combater e serem usadas como bombistas-suicidas

Cristina Pombo, in Expresso

Sem dó nem piedade, as milícias do Al-Shabaab expulsas da capital da Somália por forças governamentais há sete anos continuam a matar e a impor a sua lei islâmica sobre as populações rurais mais pobres. O “Guardian” investigou e contou as atrocidades terríveis que este grupo terrorista com ligações à Al-Qaeda continua a cometer naquele país do Corno de África

O grupo terrorista islâmico Al-Shabaab está a extorquir avultadas quantias de dinheiro a comunidades pobres nas zonas que controla na Somália. Das táticas criminosas desta milícia faz também parte o recrutamento forçado de milhares de crianças-soldado e bombistas suicidas, assim dá conta uma investigação levada a cabo por jornalistas do britânico “The Guardian”.

A informação foi conseguida a partir de documentos dos serviços secretos, transcrições de interrogatórios com desertores e entrevistas realizadas pelo jornal britânico a habitantes das áreas controladas pelo Al-Shabaab.
As populações queixam-se de ataques sistemáticos aos Direitos Humanos, o que passa ao lado das preocupações da maior parte dos analistas que não veem o grupo como uma ameaça à Europa, ao Reino Unido ou aos EUA, diz o “Guardian”.

O grupo é acusado de matar e maltratar homossexuais, de realizar casamentos forçados e usar civis como escudos humanos.

O “Guardian” descobriu vários exemplos do terror infligido a estas populações: em 2017, um homem foi apedrejado até à morte por adultério e outros cinco, entre os quais um jovem de 16 anos, foram fuzilados por alegadamente serem espiões ao serviço das autoridades somalis.

Noutro caso, ainda, um jovem de 20 anos e outro de 15 foram mortos em praça pública depois de serem considerados homossexuais por um tribunal religioso.

Sistema judicial próprio

No decurso de 2017, pelo menos mais cinco pessoas foram açoitadas por “comportamento imoral ou impróprio”. Representantes das Nações Unidas dizem ter sido alertados por várias vezes para apedrejamentos relacionados com adultério naquela região.

O Al-Shabaab chegou a controlar grande parte do centro e sul da Somália, incluindo a capital Mogadíscio, mas ataques das forças do governo obrigaram-no a retirar-se para as zonas rurais há sete anos.
Sanguinário e implacável, o Al-Shabaab tem-se debatido com constrangimentos financeiros, voltando-se agora para a extorsão de dinheiro às populações. Segundo vários relatos, “os muçulmanos são obrigados a pagar por quase tudo exceto pela entrada na mesquita”.

O grupo tem um sistema judicial próprio que muitas pessoas preferem “porque o juiz obedece à lei islâmica [sharia] e não existe nepotismo e corrupção”, disse ao “Guardian” o familiar de uma vítima de violação, cujo violador foi julgado e morto por apedrejamento. “Se tivéssemos recorrido a um tribunal do governo, não teria sido feita justiça porque o violador poderia ter pago algum dinheiro ao tribunal que o libertaria.”

Crianças-suicidas salvas do Al-Shabaab

Um membro arrependido do Al-Shabaab contou que as crianças são colocadas em internatos desde os oito anos, onde são treinadas para combater e integrar unidades de combate a meio da sua adolescência.

“Nessa altura já estão totalmente doutrinadas e fora da influência dos seus pais”, explicou Mohamed Mubarak, diretor de pesquisas do think tank Horn Institute for Security and Strategic Policy.

Segundo as autoridades do país, 32 crianças foram salvas das mãos do Al-Shabaab, em janeiro passado. Tinham sido recrutadas para serem usadas como bombistas suicidas. É também bastante comum usarem as populações como escudos humanos, relatou ao “Guardian” um membro do governo somali, responsável por fiscalizar a ajuda humanitária no centro-sul da Somália. Impedem-nas de se movimentarem porque temem os ataques aéreos se os civis saírem, mas também impõem restrições ao que podem ler ou escutar. A maior parte das pessoas só escutam as estações de rádio do Al-Shabaab e acedem a notícias através de palestras que duram várias horas, essencialmente sobre temas religiosos, nas quais todos são obrigados a participar.

“A vida é muito difícil nas áreas controladas pelo Al-Shabaab. Não há comida, não há ajuda e as crianças estão a ser levadas”, lamentou Mubarak, o diretor do Horn Institute for Security and Strategic Policy.