29.8.23

Endividamento total das famílias para compra de casa cai, mas novas avaliações sobem

Rosa Soares, in Público


Amortizações antecipadas e redução de novos contratos explicam primeira variação negativa do stock em perto de cinco anos. Pedidos de avaliação de casas para efeitos de novo crédito sobem.


Em Julho, o stock do crédito à habitação registou a primeira variação anual negativa desde Outubro de 2018, ao cair para 99,3 mil milhões de euros. O recuo face ao período homólogo é ligeiro, de apenas 0,1%, sendo um pouco mais expressivo face ao máximo da série, fixado em Dezembro de 2022, quando atingiu os 100,3 mil milhões de euros.

Estes dados, divulgados esta segunda-feira pelo Banco de Portugal (BdP), são explicados essencialmente pelo aumento das amortizações totais ou parciais de capital, mas também por uma diminuição dos novos empréstimos. Estas duas variáveis começam, no entanto, a dar sinais de estabilização, tendo em conta que o volume de crédito amortizado foi significativo nos primeiros meses do corrente ano – 3,7 mil milhões de euros de Janeiro a Maio –, e há sinais de alguma recuperação de novos pedidos de empréstimos, tendo em conta o crescimento dos pedidos de avaliação de casas para essa finalidade.


A justificar o aumento das amortizações de crédito e o ligeiro decréscimo dos empréstimos está um denominador comum, a forte subida das taxas Euribor, que estão em máximos de 2008, mas que têm dado sinais de estabilização. Os três prazos das taxas de juro, ainda utilizadas na maioria dos novos empréstimos – apesar de um considerável aumento dos contratos a taxas mistas e fixas –, estão abaixo dos valores atingidos em Julho.

A Euribor a 12 meses fixou-se esta segunda-feira em 4,070%, mais 0,025 pontos percentuais do que na sexta-feira, mas abaixo dos 4,193% em 7 de Julho. Também o prazo a seis meses subiu 0,009 pontos, para 3,944%, contra o máximo de 3,972%, verificado em 21 de Julho, e a três meses desceu para 3,771%, menos 0,017 pontos do que na sexta-feira, contra um máximo de 4,193% em 7 de Julho deste ano.


A rápida subida destas taxas agravou o custo dos novos empréstimos, mas também dos antigos, que se encontram praticamente todos revistos para o nível actual das taxas variáveis.


Para além da subida das taxas de juro, o aumento das amortizações tem sido “incentivado” pela suspensão temporária da comissão de resgate (0,5% sobre o capital amortizado), e ainda pela facilidade de mobilização de montantes aplicados em planos de poupança reforma e educação (PRR e PRR/E) para pagamento das prestações e de capital em dívida. Estas duas medidas, criadas pelo Governo, e destinadas apenas aos empréstimos associados às taxas Euribor, estão em vigor até 31 de Dezembro, a menos que sejam estendidas para 2024.

Ainda relativamente à evolução do stock do crédito à habitação, registou-se uma ligeira diminuição face a Junho, em 100 milhões de euros.


Já em sentido contrário evoluiu o crédito ao consumo, com o endividamento das famílias a continuar a crescer, em que o montante acumulado atingiu 20,9 mil milhões de euros em finais de Julho, uma progressão de 4% em relação ao mesmo mês de 2022, mas praticamente idêntico ao anterior mês de Junho.


Aumentam as avaliações de casas

Um dos indicadores que ajuda a avaliar a evolução do novo crédito à habitação é o número de avaliações de casas realizadas para essa finalidade. E neste domínio, depois de 10 meses de quedas consecutivas (de Junho de 2022 a Março de 2023), há sinais de alguma recuperação, embora ainda longe do máximo da verificado em Maio de 2022, quando atingiram 33.130 avaliações.


Os dados divulgados esta segunda-feira pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) revelam um aumento de 8,1% nas avaliações realizada no mês passado, para perto de 25 mil, na comparação em cadeia, mas 13,1% abaixo face ao mesmo período do ano passado. Já no corrente ano, o número mais baixo deste tipo de avaliações, realizadas por peritos independentes, foi registado em Março, quando se ficaram por 20 mil.

Para além da subida das taxas de juro, a travar a compra de casa com recurso a financiamento bancário tem estado a forte subida dos preços das habitações.


Apesar de alguma desaceleração, o valor dos imóveis não têm parado de subir, como mostram os dados relativos à avaliação bancária das casas em Julho, com um aumento do valor mediano de sete euros, para 1525 euros por metro quadrado.

Em termos homólogos, face a igual período de 2022, a taxa de variação do valor mediano é de 7,6%, em ligeira desaceleração face aos 7,9% de Junho.


De acordo com o INE, o Algarve, a Área Metropolitana de Lisboa, a Região Autónoma da Madeira e o Alentejo Litoral apresentaram valores de avaliação 42,7%, 33,9%, 8,3% e 3,7%, respectivamente, superiores à mediana do país.

Já os valores mais baixos foram registados onde há menos pressão urbanística, nomeadamente na Beira Baixa, no Alto Alentejo e no Alto Tâmega (-47,5%, -47,3% e -46,6% respectivamente)”.

Dados recentes do INE relativamente ao preço das habitações transaccionadas – já não apenas com as feitas com recurso a crédito –, relativos ao primeiro trimestre de 2023, revelam que o índice de preços da habitação registou um aumento de 8,7% face a igual período do ano passado. Apesar de expressiva, esta taxa de variação representa uma desaceleração em relação ao aumento de 11,3% que tinha sido registado no trimestre anterior, bem como face à subida de 12,9% que se verificava no primeiro trimestre de 2022. Ao mesmo tempo, esta é a taxa de crescimento homóloga mais baixa desde o segundo trimestre de 2021.


A procura de casas para compra continua elevada, por nacionais e estrangeiros, em parte porque o valor das rendas é muito elevado, e, também por isso, tem-se verificado um aumento de compras de imóveis para os colocar no mercado de arrendamento.

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