13.9.18

Juncker: "A Europa nunca será uma fortaleza que se fecha aos que mais sofrem"

Ricardo Alexandre, em Estrasburgo, TSF

No último discurso do estado da União antes de terminar o mandato como presidente da Comissão Europeia, Juncker percorreu os grandes temas e desafios europeus num discurso de mais de 50 minutos, antes de responder às questões do plenário do Parlamento Europeu.

Juncker diz que esta não é altura de balanço mas de mostrar modéstia e trabalho. "A União Europeia garante a paz, o continente vive em paz graças à União Europeia", por isso, afirma o antigo primeiro-ministro luxemburguês, "devemos defender a União, a nossa forma de viver mas sem o nacionalismo que exclui os outros".

A Europa, garante Juncker, virou a página da crise económica e financeira: depois de muitos trimestres consecutivos de crescimento económico, o investimento voltou (335 mil milhões de investimento público e privado, no âmbito do chamado 'Plano Juncker'). O presidente da Comissão Europeia admite que o desemprego jovem é ainda elevado - 14% -, mas recorda que nos últimos anos nunca foi tão baixo.

Juncker fez também um elogio à Grécia pelo que conseguiu fazer nos últimos anos. O presidente da Comissão enalteceu o papel de potência comercial da Europa, com 40% do PIB mundial, com papel relevante na exportação de medidas como a segurança alimentar, os direitos dos trabalhadores e normas ambientais.

No discurso do Estado da União, destacou o papel da Europa na resposta aos desafios climáticos e os desafios de política externa que se multiplicam no dia-a-dia: "a Europa deve exportar a sua estabilidade".

Para Juncker, é preciso definir de forma irrevogável o apoio da União Europeia à adesão dos países dos Balcãs ocidentais, senão serão outros a ocupar esse espaço. O presidente da Comissão falou ainda do desastre humanitário anunciado na Síria, admitindo que as alianças de ontem podem não vir a ser as alianças do futuro, mas que "a Europa vai continuar a trabalhar pela paz e pelos acordos comerciais mesmo que outros prefiram as guerras comerciais".

Depois da bicada a Donald Trump, assumiu-se como multilateralista convicto, mas também advogou a União Europeia de Defesa que, prometeu, vai conhecer avanços nos próximos meses, apesar de garantir que isso não significa militarizar a Europa.

O presidente da Comissão defende ainda um continente forte e unido para proteger os direitos e a individualidade dos cidadãos, mas também os seus direitos no espaço digital.

Juncker diz que chegou a hora da soberania europeia, a hora da Europa assumir o seu destino, de ser cada vez mais um ator soberano nas relações internacionais, mas sem retirar peso às soberanias nacionais. E depois, garantiu: "a Europa nunca será uma ilha nem uma fortaleza que fecha a porta aos que mais sofrem".

Num discurso de quase uma hora, o antigo primeiro-ministro luxemburguês lembrou que hoje em dia há menos refugiados e menos gente a morrer e a sofrer no Mediterrâneo: há agora um maior equilíbrio entre responsabilidade e solidariedade. Para além disso, defendeu um maior investimento em África e com África, sem abordagens de caridade, mas sim através de parcerias equilibradas ao abrigo de uma nova aliança estratégica. 36% do comércio africano já se faz com a UE.

Contra as fronteiras internas, Juncker diz que "acabar com Schengen seria um passo atrás no projeto europeu". Mas admite que soluções ad hoc não funcionam e que é preciso uma solidariedade de futuro.

Aumentar até dez mil guardas de fronteira em 2020 e acelerar o repatriamento de imigrantes ilegais para assegurar a migração legal que é necessária, foram outros dos pontos defendidos por Juncker. Até porque, garante, a Europa precisa de migrantes qualificados.

Até às eleições, diz Juncker, "a Europa deve demonstrar que é capaz de não se dividir entre Norte e Sul, entre Este e Oeste. A Europa é demasiado pequena para se dividir".

Juncker defendeu que os gigantes tecnológicos devem pagar impostos pelos lucros que conseguem e lembrou que é preciso lutar contra a propaganda e o terrorismo na internet. Se o terrorismo não conhece fronteiras, a UE não pode falhar por falta de cooperação nessa luta.

Falou do mercado energético, disse que "é aberrante que as empresas europeias comprem aviões europeus em dólares" e prometeu medidas para tornar o euro mais forte e um verdadeiro instrumento da soberania europeia.
Juncker anunciou ainda que a Comissão vai avançar com propostas de decisões por maioria qualificada em matérias de relações externas, bem como em algumas matérias de fiscalidade.

Houve ainda espaço para elogios. O presidente da Comissão enalteceu o trabalho do vice-presidente Frans Timmermans na defesa do estado de direito e o respeito que é necessário pelas decisões judiciais. Também elogiou a outra sua vice-presidente, Federica Mogherini, que fez "avançar a coerência diplomática da UE como nunca antes". Defendeu que é preciso pôr cobro a um triste espetáculo de divisão intraeuropeia e "dizer não aos nacionalismos que não são saudáveis - são um veneno pernicioso - mas sim aos patriotismos esclarecidos".

Defendeu também o fim da mudança de hora. Abordou, ao de leve, o tema do Brexit, mas sem entrar em grandes detalhes. Não era o momento para isso.

Quase no fim, Juncker lembrou que não há Democracia sem uma imprensa livre, e recordou que há demasiados jornalistas a serem mortos e/ou atacados.

Agradeceu os aplausos que lhe permitiram beber água... já tinham passado mais de 53 minutos. Foi aplaudido de pé por quase todo o plenário do Parlamento Europeu em Estrasburgo.