A aprovação na especialidade do programa Mais Habitação vai trazer alterações para o sector que vão desde limites e benefícios ao arrendamento até aos registos de Alojamento Local
O programa Mais Habitação foi aprovado esta quinta-feira na especialidade na Assembleia da República. As principais propostas do Governo no pacote que visa contrariar a crise na habitação foram mantidas pelos deputados socialistas.
Com a votação em plenário marcada até 19 de julho, data do início das férias parlamentares, naquilo que pode ser considerado um pró-forma, há um conjunto de medidas que vão alterar o estado das coisas no sector da habitação e do Alojamento Local.
Antes de começar a votação, o grupo parlamentar socialista retirou da discussão a norma interpretativa do apoio à renda feita pelo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, que diminuiu a elegibilidade dos agregados que beneficiavam desse apoio. Compete agora ao Ministério das Finanças revogar essa norma e criar novo enquadramento.
Saiba aqui algumas das principais mudanças trazidas pela aprovação do programa Mais Habitação.
POR QUE É QUE HÁ CONTROVÉRSIA NO APOIO ÀS RENDAS?
A lei, segundo a interpretação de fiscalistas, definia que os rendimentos a ter em conta para o cálculo da taxa de esforço eram a matéria coletável. O despacho veio dizer que afinal não, que não era bem assim, e atirou mais rendimentos para o rol - o que diminuiu o universo de agregados que se qualificariam para o apoio. O despacho impede também os agregados com taxas de esforço acima dos 100% de aceder a este subsídio.
Com esta mudança das regras a meio do jogo começaram a chover críticas da oposição, de associações do setor como a Deco, e de inquilinos excluídos do apoio ao arrendamento.
O grupo parlamentar do Partido Socialista avançou inicialmente com uma adenda ao decreto, uma norma interpretativa que clarificaria o universo de rendimentos a ter em conta para o cálculo da taxa de esforço dos agregados.
Essa proposta acabaria por ser retirada antes da votação na especialidade no Parlamento, esta quinta-feira, atirando para o Governo a responsabilidade de rever a lei de forma a adequar o decreto às novas regras - algo que deverá fazer nas próximas semanas através de nova lei.
O QUE PODEM ESPERAR OS INQUILINOS DE ORA EM DIANTE?
Este apoio, calculado automaticamente pela Autoridade Tributária, atribuído oficiosamente pelo Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU), e pago pela Segurança Social, já começou a ser transferido em junho.
No fim do mês, quem não recebeu o apoio percebeu porquê com a divulgação do despacho, que impedia também os agregados com taxas de esforço superiores a 100% - isto é, com rendimentos abaixo do valor total das rendas - de aceder ao apoio. Muitos ficaram excluídos pelo facto dos cálculos terem sido feitos com base nas declarações de IRS de 2021, ano em que a pandemia ainda obrigava à paragem de milhares de trabalhadores.
A ministra da Habitação assegurou esta semana numa audição no Parlamento que ainda há agregados que se poderão qualificar para o apoio. Dependerá do recálculo da taxa de esforço que a AT fará, desta feita com base nos rendimentos de 2022 e não nos de 2021 - ano em que a pandemia tirou milhares do mercado de trabalho.
“Há um conjunto de famílias que estão a aguardar o fim da campanha do IRS para saberem se são elegíveis”, disse Marina Gonçalves, a ministra da Habitação, esta semana no Parlamento. Só depois do prazo para a liquidação das declarações de IRS pelas Finanças, 31 de julho, é que se procederá a este novo cálculo.
O QUE MUDA NO ARRENDAMENTO FORÇADO?
O texto da lei foi suavizado em relação à figura do arrendamento forçado de imóveis considerados devolutos há mais de dois anos – situação comprovada com a aplicação de IMI agravado. A lei prevê que se trata de um instrumento de último recurso que será aplicado pelo município de forma “excecional” e “supletiva”. Isto é, sempre que esteja em causa garantir a função social da habitação. Caberá à Autoridade Tributária em articulação com o município identificar as situações em que se aplica. Esta disposição legal não se aplica nas regiões autónoma dos Açores e da Madeira.
O QUE MUDA NO ARRENDAMENTO?
Além da imposição de um teto de 2% para os novos contratos de arrendamento, o Mais Habitação prevê que o aumento da duração do contrato seja “compensada” com uma quebra na tributação em sede de IRS ou de IRC, consoante o senhorio seja uma pessoa individual ou coletiva. A taxa que se aplica aos rendimento prediais passa de 28% para 25% e, por exemplo, os contratos entre cinco e 10 anos, serão tributados à taxa de 23%, em vez dos 28%, e os de 10 a 20 anos a 14%. Em matéria de benefícios ficais, vai existir “uma redução de cinco pontos percentuais da respetiva taxa de IRS, sempre que a renda seja inferior em pelo menos cinco pontos percentuais à renda do contrato de arrendamento anterior”. Na prática, o Estado vai acomodar a perda de receita do senhorio com a descida de rendas. Por outro lado, e para não alimentar rendas especulativas, ficam excluídos os contratos de arrendamento cujo valor seja 50% superior à média dos contratos para a mesma tipologia na mesma localização e concelho, valor que é definido por cada autarquia.
O QUE MUDA NO ALOJAMENTO LOCAL?
Passa a existir uma Contribuição Extraordinária para Alojamento Local (CEAL) de 15%, depois de inicialmente ter sido anunciada uma tributação de 35% e, em seguida, de 20%. A CEAL recai apenas sobre frações autónomas (apartamentos e estabelecimentos de hospedagem em frações autónomas) e exclui as moradias e os prédios inteiros dedicados a AL. Ficam isentos os particulares que utilizem a sua habitação própria permanente para efeitos de alojamento local até 120 dias por ano.
O QUE ACONTECE AOS NOVOS REGISTOS DE AL?
A emissão de novos registos de Alojamento Local (AL) está suspensa nas zonas do litoral, mas mantém-se nos territórios de baixa densidade, que incluem 165 municípios e cerca de 70 freguesias.
Em relação ainda aos novos registos, passa a ser obrigatório a aprovação por unanimidade do condomínio a instalação de um novo AL. Em matéria de quórum para pedir a suspensão de uma licença, foi fixado em dois terços, quando inicialmente estava previsto ser por maioria.
A receita da CEAL reverte não só para o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU), para financiar políticas de habitação, mas também para os organismos semelhantes das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, como IHM- Investimentos Habitacionais da Madeira, EPERAM e Departamento do Governo Regional dos Açores. Uma extensão pedida pelo PSD e decidida esta quinta-feira durante a votação do programa Mais Habitação.
QUAL O BENEFÍCIO PARA CASAS QUE SAIAM DO AL?
Para os proprietários que retirem as casas do alojamento local até ao final de 2024 e as coloquem em arrendamento tradicional, o diploma aprovado prevê a isenção de IRS ou IRC sobre o valor das rendas cobradas até ao fim de 2029. Só são abrangidos pela medidas, as unidades de AL cujo registo seja anterior a 31 de dezembro de 2022 e, cumulativamente, o contrato de arrendamento seja celebrado até ao fim de 2024.
O QUE ACONTECE AOS VISTOS GOLD ?
As Autorizações de Residência por Investimento (ARI), acabam em relação às compras de habitação ou de reabilitação e de imóveis, bem como em todos os aspetos relacionados com o imobiliário como fundos de investimento ou compra de unidades em fundos. No entanto, o Governo criou um novo regime ligado a investimento de carácter económico, cultural ou científico, semelhante ao anterior regime, mas que expurga qualquer relação com o imobiliário. A entrada em vigor da nova lei não afeta a possibilidade de renovação dos vistos gold já concedidos nem os pedidos de autorização que estão a ser tratados até à data da entrada em vigor da lei.
O QUE ACONTECE AOS APOIOS EXTRAORDINÁRIOS NA HABITAÇÃO?
O apoio à renda, cujo valor mensal pode chegar aos 200 euros, ou a bonificação de juros do crédito à habitação não podem ser penhorados. Durante a votação desta quinta-feira, o PS sugeriu uma alteração à redação e retirou a referência a rendas, substituindo por apoios extraordinários, para estender o âmbito da decisão à generalidade dos apoios extraordinários. Como o que também vai ser concedido a quem tem crédito à habitação e taxa de esforço mais elevada, seja também abrangido.
O QUE ACONTECE AOS BENEFÍCIOS FISCAIS PARA OS FUNDOS DE INVESTIMENTO?
O regime de benefícios fiscais aprovado no Parlamento prevê a substituição do sistema em vigor ligado à reabilitação urbana, por um novo dedicado à habitação acessível. O novo regime prevê que no caso de fundos e sociedades de investimento imobiliário em que pelo menos 75% dos ativos sejam bens imóveis afeto a arrendamento habitacional acessível, as mais-valias obtidas com a venda de unidades de participação desta entidades sejam tributadas a 10%.