17.7.07

IDT cortou financiamento ao Porto Feliz

Ana Cristina Pereira, in Jornal Público

O Instituto da Droga e da Toxicodependência quer reformular o acordo, acabando com o regime especial estabelecido com a instituição portuense


Há um ano, o presidente do Instituto da Droga e da Toxicodependência (IDT), João Goulão, avisou: "Há aspectos [do Porto Feliz] que têm de ser revistos [para o enquadrar na legislação existente]. Não nos podemos dar ao luxo de ter um programa desenvolvido pela câmara e outro pelos serviços estatais que não se complementam, que estão de costas voltadas". Em Outubro, o IDT informou que, a partir de 15 de Novembro, deixava de suportar o Porto Feliz.

O braço-de-ferro dura há oito meses. Segundo Goulão, "foram apresentadas várias propostas de protocolo e de acordo de concessão de financiamento, que mereceram a anuência dos técnicos da Fundação Porto Social", a entidade que gere o programa lançado em Julho de 2002. Nenhuma colheu aprovação "da vereação ou do mentor do projecto", o psiquiatra Mota Cardoso.

Contactada pelo PÚBLICO, o Gabinete de Comunicação da autarquia escusou-se a facilitar o contacto com Mota Cardoso, ou com qualquer elemento do executivo, remetendo para um artigo publicado na revista municipal Porto Sempre.

A "verdade" municipal difere bastante da "verdade" estatal. "Durante os últimos oito meses, a Câmara do Porto e, em particular, a Fundação Porto Social mantiveram insistentes negociações com o Governo e com o IDT, mas não conseguiram, até à presente data, transpor a opção política de recusa de colaboração com a autarquia no âmbito do Porto Feliz", refere a revista, num artigo intitulado Negociações: oito meses a perder tempo.

O corte surpreendeu a oposição e o vereador comunista Rui Sá levará hoje o assunto à reunião de câmara. A 4 de Julho de 2006, na sequência de dúvidas de "eficácia" manifestadas por Goulão, o presidente da câmara, Rui Rio, afirmou na Comissão Parlamentar da Saúde: "O futuro é muito simples: ou há vontade de seguir nesta linha de partilha de problemas entre a administração local e a administração central ou o município do Porto sente-se muito feliz em continuar com o programa". Agora, a revista afiança que, com a denúncia do protocolo, o Porto Feliz ficou impossibilitado de "internar novos doentes" e que "conseguiu, até à data, manter cerca de 150 ex-arrumadores em recuperação, tentando evitar a crueldade de uma recaída que os volte a atirar para a desgraça".

O financiamento concedido pelo IDT "ultrapassa largamente a média atribuída a estruturas do mesmo tipo", sublinha Goulão. A polémica arrasta-se desde 2002. O presidente da então Direcção Regional do Norte do Serviço de Prevenção e Tratamento da Toxicodependência revelou "perplexidade" com o recurso a camas do Hospital do Conde de Ferreira (Santa Casa da Misericórdia) por 150 euros, quando havia camas convencionadas com clínicas privadas abaixo do 70 euros, mas a direcção nacional, então presidida por Fernando Negrão, aceitou comparticipar os custos dos tratamentos no Conde de Ferreira e financiar as equipas de rua e os centros de dia do programa da autarquia.

Goulão admite que este é um dos pontos em discussão. O IDT aceita que os tratamentos de desabituação sejam feitos no Hospital do Conde de Ferreira, mas "de acordo com as regras" e avisa que há nova legislação. O protocolo de colaboração pode ser assinado com a câmara, só que o acordo de financiamento tem de ser assinado com a Fundação Porto Social, enquanto entidade privada de interesse público. Na prática, o IDT quer acabar com o regime especial de que a projecto municipal tem beneficiado, sujeitando-o às regras que se aplicam às instituições que prestam serviço semelhante .