Manuela Ferreira Leite, in Expresso 
       
O INE publicou números sobre o risco de pobreza e desigualdades, no exato dia do debate do Estado da Nação. 
Feliz coincidência. 
O primeiro-ministro dispôs assim da oportunidade para, numa situação complexa, anunciar que Portugal alcançou a mais baixa taxa de pobreza de sempre (dados de 2008). 
Divulgou-se ainda que as estatísticas oficiais de 2009 provam que as desigualdades de rendimentos se reduziram entre os mais ricos e os mais pobres. 
Com base nestes valores, afirmou-se que "Portugal pode orgulhar-se do caminho que está a fazer... na coesão social e na igualdade de oportunidades". 
O orgulho teria fundamento se a situação resultasse de um crescimento económico que tivesse potenciado a integração das pessoas na sociedade, ou se a distribuição do rendimento tivesse sido mais proporcional ao contributo de cada um para a criação da riqueza nacional. 
Mas sabe-se que estes valores resultam fundamentalmente do rendimento social de inserção. As pessoas continuam pobres, mas são ajudadas, o que, numa fase de restrições e de dúvidas sobre a sustentabilidade do Estado social, não é tranquilizador. 
Por isso, estas estatísticas não são para cantar vitória, mas para agravar a preocupação sobre o modo como manter esta ficção.


