26.7.10

Associação Protectora dos Pobres apoia em média 170 pessoas por dia

Ricardo Caldeira, in Jornal de Madeira

Dos cerca de 230 utentes assíduos da Associação Protectora dos Pobres (APP), passam por esta instituição, em média, 170 pessoas por dia, às quais são facultados diferentes serviços.

Segundo adiantou ao JORNAL da MADEIRA a directora da instituição, a estas pessoas são prestados cerca de 230 serviços diários, um dado que demonstra que há pessoas que procuram mais do que uma valência. Tal como explicou Luísa Pessanha, enquanto que há mais tempo as pessoas poderiam procurar apenas o almoço ou o lanche, «agora já procuram pequeno-almoço, almoço, lanche, jantar e banho».

Dividindo a procura por géneros, entre as mulheres, a maioria das solicitações surge da parte de idosas, maioritariamente viúvas, com reformas ou pensões muito baixas. Já entre os homens, a maior procura surge por parte da faixa etária entre os 35 e os 45 anos, sendo que grande parte das situações estão relacionadas com o alcoolismo, o desemprego e, nalguns casos, com a toxicodependência.

De acordo com a responsável, a procura pela APP tem aumentado, embora não seja preocupante. No entanto, futuramente, acredita que a questão poderá atingir esse patamar, devido à nova legislação que entra em vigor em Agosto, segundo um decreto-lei do Governo nacional que contém alterações mais rígidas ao nível da atribuição dos apoios sociais existentes. Estas maiores exigências, acredita, «irão se reflectir numa maior procura pelos nossos serviços». Segundo Luísa Pessanha, há casos de pessoas que por vezes têm meios e não melhoram a sua vida porque não querem, mas também há muitas pessoas que não têm capacidade e que vão ser afectadas.

Diversos serviços disponibilizados

A directora da APP refere que a instituição tem vindo ao longo dos anos a adaptar a sua oferta às dificuldades existentes na população, pelo que os serviços prestados foram sendo alargados. Assim, inicialmente era apenas colmatada a carência alimentar, mas, aos poucos e poucos, foram sendo dadas outras respostas, nomeadamente a nível da higiene (com os serviços de balneário, lavandaria e rouparia), mas também apoio social, para o qual existe um gabinete específico. Ali, é feita uma avaliação de toda a população recorrente à APP e que é merecedora de apoio.

A saúde é outra das valências da APP. Neste campo, a instituição tem uma enfermeira de saúde mental que apoia as pessoas e faz o encaminhamento para as áreas necessárias, seja a nível de internamentos (por exemplo para desabituação alcoólica ou de drogas) ou não. Nesta, e em todas as restantes valências, a nossa interlocutora lembra que nenhum utente é obrigado a nada. «Fazemos uma sensibilização, um acompanhamento ou um esclarecimento para que as pessoas se apercebam que podem viver melhor se tiverem uma atitude diferente perante a vida», afirmou. Exemplo disso são as sessões de educação para a saúde, onde há uma sensibilização dos utentes para prevenir determinadas doenças e para a adopção de hábitos saudáveis e de higiene. A higiene é, aliás, um requisito necessário para frequentar os serviços. Por exemplo, o banho é uma obrigatoriedade para que as pessoas possam frequentar o refeitório. Um pormenor interessante é que ao longo da instituição existem grandes espelhos, justamente para que as pessoas tenham uma percepção da sua imagem. O acolhimento nocturno (texto ao lado) é outro dos serviços disponibilizados.

Avaliação primária

Quando uma pessoa recorre pela primeira vez à APP, passa por uma avaliação primária, uma espécie de rastreio, de modo a fazer-se prova da sua real situação e saber se, de facto, necessita de ajuda. A partir daí, é traçado um plano de integração e é feita uma avaliação dos serviços que devem ser disponibilizados a essa pessoa, seguindo-se o acompanhamento. Para este efeito, a APP dispõe de uma equipa de trabalho composta por um sociólogo, um psicólogo, uma assistente social e dois educadores sociais que, juntamente com os utentes, trabalham as questões da integração social, seja a nível familiar, habitacional ou profissional, preparando-os para que voltem a ser autónomos.

Por esta razão é que há uma distinção entre utentes provisórios e efectivos. Os primeiros são aqueles que, após avaliada a sua situação de vida actual, por encontrarem-se em situação de marginalidade, pobreza ou exclusão social, podem frequentar os serviços num período máximo de três meses. No final desse período, se ainda não tiverem atingido essa capacidade, são-lhes dados mais três meses. No final dos seis meses, tornam-se efectivos. A situação de utente provisório existe para “obrigar” a que as pessoas sejam activas. Já o utente efectivo é aquele que, no termo dos três meses de boa utilização dos serviços, e após uma reavaliação da sua situação actual (caso esta coincida com o propósito institucional), fica a usufruir de todos os serviços, até ter capacidade para refazer a sua vida sem necessitar do apoio institucional.

No campo dos serviços prestados, além da alimentação, higiene e saúde, os frequentadores da APP podem igualmente ter acesso ao ensino recorrente (está destacada uma professora de ensino básico), bem como a um atelier ocupacional, que é acompanhado por um animador sócio-familiar. Esta é, aliás, uma valência que, segundo a directora da APP, dá alguma estabilidade emocional ao utente, pois ali este está a ser trabalhado ao nível das suas competências pessoais e sociais. Aqui, os técnicos tentam também incutir regras de civismo, respeito, assiduidade e pontualidade. O projecto torna-se, depois, também viável ao nível da integração profissional.
Por outro lado, o seguimento dos utentes é complementado com uma reunião semanal de acompanhamento e aconselhamento. Trata-se de uma espécie de grupos de auto-ajuda onde, na presença de um psicólogo e de um sociólogo, as pessoas têm a possibilidade de trocar experiências, de aprender com aquilo que ouvem e de evitar cair nos mesmos erros que as outras pessoas já cairam. «É uma reunião em que nós somos a família de todos aqueles que não a têm e criamos um suporte, um pilar, que vem dar alguma substância e algum equilíbrio a esta população», adiantou Luísa Pessanha, acrescentando que este é um espaço muito frequentado, por vezes até por utentes que já estão integrados ou já não dependem unicamente da instituição.
Sublinhe-se que, desde Maio, 11 pessoas foram integradas com sucesso.
Relativamente ao modo de subsistência, a APP recebe uma verba mensal da Segurança Social no valor de 48.148 euros, um donativo anual de uma fundação americana e outros donativos, alguns dos quais de empresas, através da lei do mecenato.

«É como uma família»

À saída de mais uma reunião de acompanhamento e aconselhamento, esta quinta-feira, o JM falou com alguns dos utentes da APP. Com diferentes percursos de vida, todos destacam o apoio que recebem ali. A definição foi unânime: «aqui é como uma família».
Elisabete Sousa, de 47 anos, está desempregada e, com a crise, deixou de conseguir pagar o aluguer. Pediu apoio à APP e ali, além do acolhimento nocturno que neste momento tem, da alimentação, dos serviços de higiene e lavandaria, diz que recebe carinho. Agradecida pela ajuda, não se dá por vencida e afirma, convicta, que está à procura de emprego e que vai conseguir encontrá-lo. Por seu turno, José Luís Abreu, de 37 anos, dorme em casa da sogra, mas frequenta a APP todos os dias. É ali que encontra afecto, alimentação e roupa lavada. Também grato pelo apoio, aponta igualmente um outro facto importante: ali, aprendeu a ler. Já Maria de Abreu, de 57 anos, é um exemplo de integração. Chegou a pernoitar no centro de acolhimento nocturno, mas agora vive num espaço alugado. Também ali encontrou o apoio que precisava, a ponto de, apesar de já não estar tão dependente, optar por ir às reuniões semanais e conviver.
A hora de jantar (das 19h30 às 20h30) é também um ponto de encontro. Pessoas de diferentes origens e com diferentes problemas convivem todas à mesa, numa espécie de ambiente familiar.

Centro de acolhimento até ao final do ano

O centro de acolhimento nocturno para pessoas sem-abrigo é outra das valências da Associação Protectora dos Pobres (APP).
Neste momento, o prédio que está a ser utilizado para este efeito é adaptado e não dispõe das condições necessárias, pelo que está a ser construído um novo espaço, contíguo às instalações da APP, o qual deverá ser inaugurado até ao final do ano.
A nova infra-estrutura, segundo Luísa Pessanha, irá ter o dobro da capacidade do espaço actual. Ou seja, enquanto que actualmente existem 13 camas, de futuro passarão a existir 26. Por outro lado, irão também duplicar (de duas para quatro) as camas para linha de emergência.

Ajudar e incutir sentido de responsabilidade

Também no que se refere ao acolhimento nocturno, os utentes têm de obedecer a determinados critérios. A directora da instituição afirma que, após a avaliação que é feita pelos técnicos e de ser traçado um projecto de vida para o utente, este «obrigatoriamente tem de mostrar vontade de mudança e que quer empenhar-se na sua integração». Isto porque, por vezes, «as pessoas acomodam-se e não fazem nada para a sua melhoria de vida no exterior da instituição».
Como tal, o centro de acolhimento permite pernoitar ao longo de 15 noites consecutivas, caso o utente cumpra com tudo o que está estipulado em regulamento. No final dessas 15 noites, há uma nova avaliação, sendo que se se constatar que este tem se empenhado em cumprir com o seu projecto, são-lhe dadas mais 15 noites, e assim sucessivamente, até à sua integração e à sua autonomização.