30.12.10

Os sacrifícios e a justiça social

in Diário de Notícias

A decisão de fazer pagar taxas moderadoras os desempregados e pensionistas com subsídios ou pensões acima do rendimento mínimo, infelizmente, não pode surpreender o País. É, de resto, a imagem perfeita do País que temos hoje, no fecho de 2010, por comparação com o que tínhamos em 2009. Então, via-se o Governo aos ziguezagues acerca das isenções que se podiam, ou não, atribuir ao tratamento de algumas doenças específicas no SNS. E via-se a oposição fazer tudo, até mesmo juntar votos na Assembleia contra o PS, para atribuir essas mesmas isenções.

De súbito, a discussão passou para outro patamar. E a decisão é que o SNS "universal e tendencialmente gratuito" só não será pago por quem não tenha mesmo dinheiro nem património. Ao mesmo tempo, reforçam-se as multas, para que quem fugir ao pagamento arrisque pagar muito mais.

Tem sido dito e escrito, e bem, que neste momento o Estado tem de fazer escolhas. E até se tem reconhecido, tarde mas bem, que algumas dessas escolhas são dramáticas para o modelo de Estado social em que nos habituámos a viver. Até aqui, sendo tudo discutível, tudo é racional.

O que já não será tão racional, depois de uma decisão destas não ter sido dita desde logo (portanto, escondida do público que pagará), é que um secretário de Estado venha dizer que estes novos pagamentos obrigatórios (para desempregados e pensionistas, mesmo que ligeiramente acima do rendimento mínimo) são "uma questão de justiça social". Se é mesmo uma questão de justiça, não se entende porque um Governo socialista, que está no poder há mais de cinco anos, não mudou as regras antes. Se o são, já agora, não se percebe como tanto criticaram uma proposta de revisão constitucional dita "liberal", que na pior das interpretações mudava o SNS para garantir a sua subsistência futura.

Avanços em Cuba

Com a queda do bloco socialista e a perda da ajuda soviética, no início dos anos 90, Cuba ficou isolada. Nem a ajuda petrolífera da vizinha Venezuela minorou os problemas. O regime enfrenta a estagnação económica, um embargo americano e a inesperada redução nas divisas provocada pelas quebras turísticas que resultam da crise financeira mundial. O Presidente Raúl Castro, oficialmente no poder há dois anos, introduziu reformas, numa tentativa de manter a economia a funcionar. Na política, as mudanças são mais lentas, mas ontem soube-se que o último condenado à morte viu a sua pena comutada para 30 anos de prisão. Não há mais nenhum cubano no corredor da morte, e isto é um avanço.

Em Abril, o Partido Comunista realiza um raro congresso (o último foi em 1997) e será preparada a transição para a próxima geração. Os velhos comunistas saem de cena e as próximas reformas serão centradas no reforço das empresas que os militares controlam com autonomia e num sector privado que o regime está a incentivar, para combater o desemprego. A defesa do auto-emprego está no coração da estratégia do Governo. Nos últimos dois meses, mais de 100 mil cubanos pediram licenças para se lançarem nos negócios. O número de empresários quase duplicou, mas os negócios são muito controlados pela burocracia, que desconfia destes "empresários".

A olhos ocidentais ainda não parece grande coisa, pode por exemplo lançar-se uma loja de reparação de mobiliário, não de fabrico de mobiliário. Mas é um avanço.