10.5.23

Menina vendida duas vezes pela mãe forçada a roubar e mendigar

Roberto Bessa Moreira, in JN

Com apenas 10 anos, uma menina romena foi vendida duas vezes pela própria mãe. Primeiro, para a Irlanda e depois para Portugal. Por cá, foi obrigada a casar, violada, espancada e transformada em escrava doméstica. Sempre sob ameaça de mais e mais agressões, também era forçada a roubar e a mendigar à porta de supermercados e chegou a ser detida. Mesmo assim, só ao fim de cinco anos foi resgatada à família que a maltratava, passando a ser oficialmente mais uma vítima de mendicidade forçada, crime dominado por cifras negras e ao qual quase todos fecham os olhos.

Entre 2019 e 2021, contabilizou o Observatório de Tráfico de Seres Humanos, foram "sinalizadas 12 presumíveis vítimas de mendicidade forçada". Valor que a coordenadora nacional das respostas de assistência às vítimas de tráfico de seres humanos, Marta Pereira, "considera muito reduzido". "É um número que que não retrata, nem de perto nem de longe, a realidade. É muito difícil identificarmos vítimas de mendicidade forçada. Passamos por estas pessoas diariamente, mas não conseguimos ver o problema. Muitas vezes até não queremos ver. Mas estas situações não fazem parte da tradição ou da cultura de um povo. São crime", frisa.

Já na Diretoria do Porto da Polícia Judiciária (PJ) foram abertos, entre 2014 e 2021, nove inquéritos sobre mendicidade forçada e o inspetor-chefe Sebastião Sousa admite que estes não exemplificam uma realidade que o preocupa. "Há muitas cifras negras, porque a mendicidade forçada é um crime muito difícil de investigar. As vítimas não têm consciência que são vítimas e não colaboram com as autoridades. Por outro lado, como são forçadas a casar e a engravidar, vão reforçando os laços familiares com os criminosos, o que que dificulta a denúncia", refere. O inspetor-chefe da PJ avança que até há casos de jovens resgatadas que, nas semanas seguintes, voltam para junto de quem as maltrata só para estarem próximas dos filhos.

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