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10.5.23

Menina vendida duas vezes pela mãe forçada a roubar e mendigar

Roberto Bessa Moreira, in JN

Com apenas 10 anos, uma menina romena foi vendida duas vezes pela própria mãe. Primeiro, para a Irlanda e depois para Portugal. Por cá, foi obrigada a casar, violada, espancada e transformada em escrava doméstica. Sempre sob ameaça de mais e mais agressões, também era forçada a roubar e a mendigar à porta de supermercados e chegou a ser detida. Mesmo assim, só ao fim de cinco anos foi resgatada à família que a maltratava, passando a ser oficialmente mais uma vítima de mendicidade forçada, crime dominado por cifras negras e ao qual quase todos fecham os olhos.

Entre 2019 e 2021, contabilizou o Observatório de Tráfico de Seres Humanos, foram "sinalizadas 12 presumíveis vítimas de mendicidade forçada". Valor que a coordenadora nacional das respostas de assistência às vítimas de tráfico de seres humanos, Marta Pereira, "considera muito reduzido". "É um número que que não retrata, nem de perto nem de longe, a realidade. É muito difícil identificarmos vítimas de mendicidade forçada. Passamos por estas pessoas diariamente, mas não conseguimos ver o problema. Muitas vezes até não queremos ver. Mas estas situações não fazem parte da tradição ou da cultura de um povo. São crime", frisa.

Já na Diretoria do Porto da Polícia Judiciária (PJ) foram abertos, entre 2014 e 2021, nove inquéritos sobre mendicidade forçada e o inspetor-chefe Sebastião Sousa admite que estes não exemplificam uma realidade que o preocupa. "Há muitas cifras negras, porque a mendicidade forçada é um crime muito difícil de investigar. As vítimas não têm consciência que são vítimas e não colaboram com as autoridades. Por outro lado, como são forçadas a casar e a engravidar, vão reforçando os laços familiares com os criminosos, o que que dificulta a denúncia", refere. O inspetor-chefe da PJ avança que até há casos de jovens resgatadas que, nas semanas seguintes, voltam para junto de quem as maltrata só para estarem próximas dos filhos.

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28.4.20

Ruas despidas expõem “esqueleto” do Porto

André Borges Vieira e Ana Marques Maia, in Público on-line

Uma viagem pela Baixa, onde agora, com as ruas sem gente, droga, mendicidade e indigência tornaram-se mais visíveis, embora sempre tenham existido, mas camufladas pelo ruído visual.

Na rua Mouzinho da Silveira, a meio da tarde, prepara-se às claras uma dose injectável numa espécie de acampamento improvisado na fonte Monumental, numa das artérias onde se concentram restaurantes que fazem parte do roteiro gourmet de topo da cidade do Porto. Mais acima, frente a estação de São Bento, zona turística por excelência, na entrada de um posto de turismo de portas encerradas, esticam-se umas pratas que servirão de suporte para matar a ressaca. No mercado da Sé, há um grupo que faz o mesmo, não muito longe da catedral, que é visita obrigatória para quem vem de fora.

Tudo isto faz-se à luz do dia, à vista de todos, numa espécie de loop diário de um calendário que mais parece um disco riscado, em que os dias parecem repetir-se e facilmente confundem-se uns com os outros.

Na rua de Sá da Bandeira concentram-se pequenos grupos de garrafa na mão, talvez acabadas de comprar, frente a dois supermercados. Perto dali há quem remexa os contentores do lixo e revire uma mala deixada para trás – uma parecida com as muitas que até há dois meses compunham uma banda sonora de ruído ao trilhar a calçada dos passeios. Catam-se os despojos dos que ainda há bem pouco tempo enchiam as esplanadas a beber vinho do Porto e a provar tapas, que na verdade são petiscos, e outros pratos very typical que alguns portuenses nunca provaram.

Dentro de um carro, faz-se uma viagem pela Baixa - da Ribeira até à zona mais alta, já quase na Praça da República, com uns desvios até à marginal do rio, já em Massarelos, onde se ouviam os fados na tasca da Piedade, antes de ter encerrado temporariamente até que a covid-19 decida devolver-nos a normalidade. Perto da varanda onde a proprietária do estabelecimento montava a esplanada que facilmente enchia, mas agora está arrumada, a uns dois minutos de carro, há quem ande de viatura em viatura estacionada, com gente lá dentro, em transacções obscuras, mas, mais uma vez, possível de assistir às claras.

De volta ao centro da cidade, passamos por alguém que deambula com uma garrafa na mão. Ainda há umas horas a mesma pessoa estava na entrada da rua do Almada. Na rua José Falcão há um casal de idosos que tenta escapar a alguém que se aproxima para pedir uma moeda, que, sem máscara e sem cumprir o distanciamento social, não descola.

Na Baixa circulam também os poucos que saem para fazer compras ou nas deslocações trabalho-casa. Há os que olham com desconfiança para quem se aproxima. Não respondem quando são chamados. Aceleram o passo. Fazem de conta que não é com eles. Perto da Cordoaria, voltamos a ver quem peça uma moeda a quem passa. Olha-se para trás só para garantir que ainda está longe. Volta-se a olhar para a frente e acelera-se o passo. Mas há uns meses atrás seria só algo normal.

Parar nos semáforos torna possível ser abordado por quem tente conseguir uma moeda. Noutras zonas há semanas que deixou de passar gente em número suficiente. Deposita-se agora a esperança num carro que pára.

Tudo isto acontece todos os dias, nas mesmas ruas, onde se vêem as mesmas caras, nas mesmas rotinas. Só que estas pessoas sempre estiveram nos mesmos sítios, com as mesmas rotinas e com as mesmas necessidades e problemas. Mas agora, como noutras cidades, o “esqueleto” do Porto está exposto.

Porto: a mendicidade e o vício pelas ruas da amargura

André Borges Vieira e Ana Marques Maia, in Público

Sem carros para arrumar ou sem gente a quem pedir, quem depende do dinheiro de quem costumava encher as ruas não consegue garantir o suficiente para comer ou para sustentar dependências.

Ainda há dois meses Cristina não precisava de muito tempo para que o copo que pousava à sua frente numa rua da Baixa do Porto se enchesse com 20 euros. Estava numa zona das mais frequentadas por turistas e, durante uma tarde inteira, por força da boa vontade de quem passava, conseguia angariar, em média, cerca de 100 euros. Sem que alguma vez imaginasse, de um momento para o outro, as ruas onde pede para alimentar o vício da droga ficaram vazias. Para combater a covid-19 o mundo fechou-se em casa.

Mas, para Cristina e para muitos outros que vivem do que a rua lhes dá o combate continua a ser o mesmo – juntar o dinheiro suficiente para aguentar mais um dia. Sem gente a quem pedir ou carros para arrumar, quem depende dos que passa, para garantir a alimentação ou sustentar um vício vive hoje com a carteira vazia e os bolsos cheios de nada sem saber se vai conseguir comer ou curar a ressaca.

Perto de um dos ex-libris da cidade - a torre dos Clérigos -, com máscara que serve para a proteger do novo coronavírus, Cristina segura um cartão com uma frase de ajuda: “Por favor ajuda com comida e dinheiro”. Das repetidas vezes que passamos por lá encontrámo-la todos os dias no mesmo sítio, umas vezes sentada e noutras de pé. Quase sempre, era a única pessoa que ali estava. Passasse-se ali há dois meses e provavelmente nem se daria pela sua presença – o movimento de pessoas ajudaria a camuflá-la. Raras vezes sai dali e quando o faz ausenta-se por poucos minutos. Sempre que consegue o suficiente para consumir, deixa o lugar vago para acalmar o vício e voltar mais tarde.

Não são muitas as vezes que agora o faz e cada vez menos tem conseguido acalmá-lo. Pouco depois de nos termos aproximado e trocado algumas palavras dizia-nos que o que a leva a estar naquela posição há cerca de 12 anos é a dependência que tem. Há pouco tempo não era um problema conseguir dinheiro para cocaína. Agora está num ponto mais visível, mas dantes ficava mais perto da livraria Lello, um pouco mais acima, onde conseguia estar mais perto dos turistas, que lhe garantiam em média 100 euros. “Em 5 minutos fazia 20 euros”, atira. Do dinheiro que angariava não sobrava um euro ao final do dia. Consumia o correspondente ao mesmo valor que ganhava diariamente.

Hoje não consegue “mais de dez euros” e, para isso, precisa de ficar lá “o dia todo”. O preço das doses diz manter-se no mesmo valor. Sendo o dinheiro que consegue manifestamente insuficiente para continuar com os níveis de consumo anteriores, só consome “umas quatro vezes por dia”. Mas para isso conta com alguns “amigos” que partilham consigo. Dantes perdia a conta ao número de vezes que consumia.

“A vida tem sido cada vez mais difícil. Nem para comer. Não há ninguém na rua”, diz em tom de desespero. Não fosse a metadona que lhe é garantida pelas equipas de rua e estaria um pouco pior. Ainda assim, diz que o corpo dela está a ressentir a falta da substância que consome há vários anos.

A sentir o mesmo efeito está António, também viciado em cocaína. Ao final da tarde de um dia da semana, como tem feito todos os dias, está deitado frente a praça da República, debaixo do mesmo prédio onde costuma dormir, em cima de uns cobertores que usa para fazer um colchão improvisado e para se proteger do frio.

Sem consumir há quase dois meses
Usa a beira da montra de uma loja para pousar tabaco, um isqueiro, uma garrafa de água, umas bolachas, uma malga vazia de plástico para a sopa e um iogurte. Tinha acabado de jantar a comida que foi buscar à secção dos Albergues do Porto da rua Mártires da Liberdade, ali perto. Antes de falar com o PÚBLICO acende um cigarro. Aqueles que tem para fumar conseguiu-os coleccionando os poucos trocos que ainda consegue fazer. Não são muitas as moedas que consegue juntar.

Noutras circunstâncias estaria na praça em frente a estacionar carros. “Não há carros” e “não há gente”. Também não há droga para consumir. Desde que as ruas ficaram vazias nunca mais consumiu nada além da metadona. “Consumo branca”, diz. Mas sem dinheiro foi obrigado a deixar de o fazer. Porém, não sem sacrifício: “O meu corpo está a ressentir. Há dois meses que não toco em nada. Estou à rasca para arranjar. Mas agora não dá nada. Ninguém pára aqui. Isto está morto”.

O mesmo problema tem Paulo, que arruma carros na Cordoaria para garantir o suficiente para se alimentar. “Não tenho problemas com drogas ou com álcool. O dinheiro que ganho é para comer”, esclarece. Mas também não tem carros para arrumar. Passa pouco tempo das 17h30 quando falamos. Vai ao bolso e tira cerca de 70 cêntimos. Já tinha gasto algum do que ganhou durante o dia a comer “qualquer coisa”. Foi o que sobrou dessa despesa.

Habitualmente, antes do início da pandemia, fazia entre 30 a 40 euros por dia. Isto porque quando atingia o objectivo - garantir as refeições – saía dali. No dia anterior, até às 19h, “tinha feito” 60 cêntimos. Só depois dessa hora é que conseguiu fazer quase cinco euros, mas mesmo assim faltava-lhe 40 cêntimos para o menu que costuma pedir ao jantar. Quando não consegue levar para a casa abandonada que ocupou o suficiente para jantar espera pelas carrinhas de distribuição de refeições que andam pela cidade. “Isto está muito complicado. A seguir vamos a andar a roubar uns aos outros”, atira.

Enquanto falamos passa um carro que abranda para quem está lá dentro lhe dar dois cigarros. “É um senhor que tem um estabelecimento”, explica. Paulo costumava ajudá-lo a arrumar a esplanada. Em troca recebia uns cigarros e alguns trocos. Agora não há esplanada para desmontar, mas continua a conseguir “dois ou três cigarros”.

Atrás dos carros também anda Victor, mas não é para os arrumar. Junto aos semáforos espera que passe para o vermelho para tentar a sua sorte. Assim que o sinal verde passa a amarelo ouve-se o bater no chão das duas muletas que o ajudam a deslocar-se. Encosta-se aos poucos carros que ficam à espera retomar a marcha, mas na maior parte das vezes não consegue mais do que uma janela fechada.

“As pessoas fogem de mim na rua”
Também pede para comer: “Só o faço até conseguir o mínimo para comer uma sopa e duas sandes”. Dantes amealhava 15 euros em menos de uma hora. Agora mal consegue fazer quatro euros. “Para fazer 1 ou 2 euros preciso de três ou quatro horas. Ainda assim, diz ser o suficiente para fazer uma refeição. Depois disso encosta-se no seu canto “a ler”. Demoraria ainda umas horas para o poder fazer. No bolso tinha apenas 1,7 euros que juntou desde as 16h. Já tinham passado mais de duas horas. Normalmente pedia pelas ruas. Por necessidade passou a fazê-lo junto aos semáforos. É a única forma que tem de chegar a alguém. “As pessoas fogem de mim na rua”, explica.

No dia em que conversa connosco o seu “canto” que ocupa na rua para dormir tinha sido assaltado: “Levaram-me tudo. Fiquei sem cobertores e sem roupa. Vou ter de arranjar tudo outra vez”. Diz que não é a primeira vez que acontece. Ainda assim naquela noite teria de voltar a dormir na rua sem saber se conseguiria àquela hora garantir dinheiro suficiente para uma refeição: “Agora nem albergue nem nada consigo. Ando a comer pão ressesso da rua”.

15.6.15

Rede Anti-Pobreza quer respostas para crianças vítimas de tráfico

in Notícas ao Minuto

O presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza (EAPN), Sérgio Aires, defendeu hoje a necessidade de encontrar respostas para as crianças vítimas de tráfico para a mendicidade e "trabalhar o seu futuro", para evitar que caiam na mesma situação.

Para Sérgio Aires, há várias questões que têm de ser analisadas, como o retorno destas crianças aos seus países. "Há um grande problema no acompanhamento dessa criança, porque muitas vezes ela regressa ao país de origem e estamos a 'entregar o ouro ao bandido' outra vez".

Outro problema é o acolhimento destes menores em lares portugueses de infância e juventude, que não estão preparados para "receber uma criança que não fala português, que está com medo".

Não estão também preparados para lidar com uma situação, às vezes, "muito perigosa", manobrada por "redes criminosas, gente que recorre a coisas muito violentas", disse o presidente da EAPN Europa à agência Lusa.

"Há casos de lares de infância e juventude que têm pessoas à porta à espera do melhor momento para entrar e levar os miúdos embora", revelou.

"Isto não é dos melhores cenários", lamentou o responsável, que falava à Lusa a propósito do "Colóquio sobre mendicidade e tráfico de seres humanos", que vai decorrer na quarta-feira, no Porto, inserido num projeto financiado pela Comissão Europeia, desenvolvido em Portugal, Roménia, Bulgária, Polónia e Itália, que visa prevenir e combater o tráfico de seres humanos para exploração da mendicidade forçada.

No âmbito deste projeto, a EAPN Portugal realizou um estudo, que verificou que existem vítimas do tráfico de pessoas para a mendicidade em Portugal, mas desconhece-se a dimensão do fenómeno.

O colóquio pretende responder a uma das recomendações do estudo: "Sensibilizar os vários atores para este fenómeno, em particular os juízes e todos que têm nas mãos decisões do ponto de vista jurídico para a prevenção e combate" deste crime.

Trata-se de "fenómenos muito complexos do ponto de vista jurídico e social" e, às vezes, há "alguma dificuldade de comunicação e até de entendimento" entre as duas áreas.

Também não é fácil comprovar este crime em tribunal, porque são cometidos por "redes muito organizadas", que têm o trabalho relativamente bem controlado e "as crianças nunca admitem que estão nesta circunstância", afirmando que são "familiares daquelas pessoas e que os pais deram autorização".

Mesmo quando os tribunais o conseguem fazer e prender os criminosos surge outro problema: "o que é que acontece com as crianças", questionou, considerando que este é "um grande problema".

"Os juízes fazem cumprir a lei", mas às vezes o seu cumprimento "não é suficiente para proteger as pessoas e para que a sua situação seja atendida de forma mais integrada", lamentou, defendendo uma maior colaboração entre os vários intervenientes, no sentido de "trabalharem o futuro" destas crianças e impedir que entrem no mesmo circuito.

Sérgio Aires disse que "são muito poucas" as crianças que ficam em Portugal, apesar de não haver registo destes casos, que estão "sob segredo de justiça e muita proteção, como deve ser".

"Não é um fenómeno explosivo, não vale a pena criar um alarme social, mas, na nossa ótica, basta haver três, quatro casos para estarmos preocupados" e tentar resolver a situação.

Rede Anti-Pobreza quer respostas para crianças vítimas de tráfico para a mendicidade

in RTP

O presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza (EAPN), Sérgio Aires, defendeu hoje a necessidade de encontrar respostas para as crianças vítimas de tráfico para a mendicidade e "trabalhar o seu futuro", para evitar que caiam na mesma situação.

Para Sérgio Aires, há várias questões que têm de ser analisadas, como o retorno destas crianças aos seus países. "Há um grande problema no acompanhamento dessa criança, porque muitas vezes ela regressa ao país de origem e estamos a `entregar o ouro ao bandido` outra vez".

Outro problema é o acolhimento destes menores em lares portugueses de infância e juventude, que não estão preparados para "receber uma criança que não fala português, que está com medo".

Não estão também preparados para lidar com uma situação, às vezes, "muito perigosa", manobrada por "redes criminosas, gente que recorre a coisas muito violentas", disse o presidente da EAPN Europa à agência Lusa.

"Há casos de lares de infância e juventude que têm pessoas à porta à espera do melhor momento para entrar e levar os miúdos embora", revelou.

"Isto não é dos melhores cenários", lamentou o responsável, que falava à Lusa a propósito do "Colóquio sobre mendicidade e tráfico de seres humanos", que vai decorrer na quarta-feira, no Porto, inserido num projeto financiado pela Comissão Europeia, desenvolvido em Portugal, Roménia, Bulgária, Polónia e Itália, que visa prevenir e combater o tráfico de seres humanos para exploração da mendicidade forçada.

No âmbito deste projeto, a EAPN Portugal realizou um estudo, que verificou que existem vítimas do tráfico de pessoas para a mendicidade em Portugal, mas desconhece-se a dimensão do fenómeno.

O colóquio pretende responder a uma das recomendações do estudo: "Sensibilizar os vários atores para este fenómeno, em particular os juízes e todos que têm nas mãos decisões do ponto de vista jurídico para a prevenção e combate" deste crime.

Trata-se de "fenómenos muito complexos do ponto de vista jurídico e social" e, às vezes, há "alguma dificuldade de comunicação e até de entendimento" entre as duas áreas.

Também não é fácil comprovar este crime em tribunal, porque são cometidos por "redes muito organizadas", que têm o trabalho relativamente bem controlado e "as crianças nunca admitem que estão nesta circunstância", afirmando que são "familiares daquelas pessoas e que os pais deram autorização".

Mesmo quando os tribunais o conseguem fazer e prender os criminosos surge outro problema: "o que é que acontece com as crianças", questionou, considerando que este é "um grande problema".

"Os juízes fazem cumprir a lei", mas às vezes o seu cumprimento "não é suficiente para proteger as pessoas e para que a sua situação seja atendida de forma mais integrada", lamentou, defendendo uma maior colaboração entre os vários intervenientes, no sentido de "trabalharem o futuro" destas crianças e impedir que entrem no mesmo circuito.

Sérgio Aires disse que "são muito poucas" as crianças que ficam em Portugal, apesar de não haver registo destes casos, que estão "sob segredo de justiça e muita proteção, como deve ser".

"Não é um fenómeno explosivo, não vale a pena criar um alarme social, mas, na nossa ótica, basta haver três, quatro casos para estarmos preocupados" e tentar resolver a situação.

28.1.15

Governo da Noruega ganha apoio para proibir mendicidade

in Jornal de Notícias

O Governo norueguês que avançar com a proibição da mendicidade no país e o seu projeto, que prevê multas e penas de prisão, recebeu o apoio do Partido Centrista, da oposição.

O Partido Centrista, da oposição, comprometeu-se com o seu apoio à proposta do Governo norueguês para proibir a mendicidade no país, com multas e penas de prisão, o que poderá entrar em vigor em alguns meses.

Assim, o Governo - composto pelos conservadores e ultranacionalistas do Partido do Progresso - tem assegurado a maioria no parlamento (Storting) para a aprovação deste projeto.

Os defensores da reforma afirmam que a mendicidade tornou-se mais agressiva nos últimos anos, o que levou a um aumento da criminalidade e de outros crimes, como o tráfico de seres humanos.

"É importante observar mais profundamente. Trata-se do vínculo com a criminalidade organizada e não porque não suportamos ver gente a pedir ou a passar mal", declarou a primeira-ministra conservadora, Erna Solberg, há meses, quando se colocou a possibilidade da proibição da mendicidade.

Diante das pressões da direita, o anterior Governo - de centro-esquerda - aprovou, em 2013, uma proposta em que os municípios poderiam fixar condições para se pedir dinheiro em locais públicos e que a polícia deveria elaborar registos com as pessoas que se dedicam à mendicidade.

Depois da sua vitória eleitoral, alguns meses depois (em setembro de 2013), os conservadores e a direita xenófoba intensificaram os esforços para restaurar a proibição a nível nacional, abolida em 2005.

O objetivo é criminalizar a mendicidade organizada, ainda que as autoridades tenham admitido a dificuldade em definir este termo, como sublinhou a associação de advogados da Noruega.

A iniciativa recebeu críticas variadas, como a da provedora de justiça contra a discriminação, Sunniva Orstavik, que teme que a lei possa provocar uma discriminação contra a população cigana, grupo a que corresponde uma parte dos mendigos.

A comissão nacional dos direitos humanos também alertou sobre a possibilidade de possíveis efeitos discriminatórios e violações da liberdade de expressão, enquanto associações jurídicas criticam o curto prazo de análise a que o projeto de lei será submetido, apenas três semanas.

"A proposta é muito problemática. Eu disse abertamente às autoridades que espero que não sigam com este processo. Parece tentador usar métodos penais para tratar um problema social. A mendicância é uma questão de pobreza", disse há dias, aos media noruegueses, o comissário do Conselho da Europa para os Direitos Humanos, Nils Muiznieks.

A reforma poderia ter consequência para a estabilidade do Governo norueguês, que goza de uma maioria parlamentar graças ao apoio de duas formações de centro, o Partido Liberal e o Partido democrata-cristão, que se opõe à nova medida.

27.10.14

Não se sabe quantas vítimas há de tráfico para mendicidade

in Notícias ao Minuto

Em Portugal existem vítimas do tráfico de pessoas para a mendicidade, mas desconhece-se a dimensão do fenómeno, conclui um relatório da Rede Europeia Anti-Pobreza, que alerta para a falta de respostas para estas pessoas, principalmente no caso das crianças.

O trabalho da Rede Europeia Anti-Pobreza Portugal (EAPN) insere-se num projeto promovido por uma organização não-governamental (ONG) italiana, financiado pela Comissão Europeia, e que envolveu, para além de Portugal, Itália, Bulgária e Roménia.

Em declarações à agência Lusa, o presidente da EAPN para a Europa explicou que este trabalho parte de um primeiro diagnóstico feito em Itália, onde o problema tem contornos preocupantes e onde se quis fazer o ponto da situação para perceber o percurso de quem se dedica à mendicidade.

A cada país envolvido no estudo coube escolher uma zona do território para fazer o seu trabalho de campo, tendo em Portugal a escolha recaído sobre a cidade do Porto, segundo Sérgio Aires porque nesta cidade o fenómeno do tráfico para a mendicidade é ainda menos conhecido do que na capital, Lisboa.

Do trabalho de campo feito durante cerca de dois meses, com entrevistas a cerca de 40 pessoas, saiu a certeza de que existem em Portugal vítimas de tráfico para a mendicidade forçada, no entanto, não foi possível perceber se se está perante um fenómeno com uma dimensão de alarme ou se é residual.

"Não tenho nenhuma dúvida que existe tráfico para via da mendicidade forçada em Portugal, ninguém pode é apresentar uma perspetiva sobre a sua dimensão, mas como eu digo muitas vezes, a partir do momento em que há uma criança traficada para a mendicidade e havendo situações muito perigosas e lamentáveis em termos de dignidade humana, já temos um problema", defendeu o responsável.

Sérgio Aires não tem dúvidas de que as pessoas que estão na mendicidade não vieram para Portugal pedir esmola porque quiseram, mas sublinha que, mesmo que assim fosse, existe a obrigação de fazer tudo para que eles façam outra coisa na vida.

Nesse sentido, alertou que existem poucas respostas adaptadas que possam constituir uma alternativa a quem está na mendicidade, nomeadamente em relação à mendicidade infantil.

"Se alguma daquelas crianças ou jovens quiser delatar a situação e quiser ser protegida, existem centros de proteção, mas estão vinculados a outro tipo de problema (...). Por isso, às vezes os espaços para onde seria possível mandar as pessoas não estão muito adaptados e as respostas também não", denunciou.

De acordo com Sérgio Aires, existem tanto nacionais como estrangeiros a pedir esmola, adiantando que, aparentemente, tem havido uma diminuição da mendicidade das pessoas dos países de leste, como a Bulgária ou a Roménia.

Sublinhou que é "muito difícil" fazer a distinção entre as pessoas que praticam mendicidade por vontade própria e as que foram traficadas e alertou que este é um fenómeno que vive da vulnerabilidade dos mais fracos e que, por isso, anda de mãos dadas com a pobreza e a exclusão social.

Do trabalho feito, Sérgio Aires disse não ter encontrado nenhum caso de um português na mendicidade onde houvesse suspeitas de tráfico, mas disse ter ficado a conhecer histórias variadas, desde pessoas que já estão na rua há 40 anos até à pessoa que acabou de chegar e nunca pensou encontrar-se naquela situação.

"Espero que esta investigação sirva para, pelo menos, construir protótipos de intervenção social um bocadinho diferentes e baseado num trabalho em rede entre os diferentes organismos", apontou o responsável.

Estas e outras conclusões são apresentadas hoje num seminário na cidade do Porto.

8.7.14

Noruega quer proibir mendicidade e multar quem pede esmola

in Sicnotícias

O Governo norueguês quer proibir a mendicidade, juntando-se assim a outros países europeus como a Hungria, que criminalizam quem pede esmola. Pelo contrário, Portugal faz parte dos países que preferem apostar na integracão dos sem-abrigo.

Criminalização de sem-abrigo avança pela Europa

Ana Cristina Pereira, in Público on-line

A penalização da mendicidade na Noruega é o derradeiro exemplo de uma tendência para aprovar leis, regulamentos ou medidas que dificultam a vida de quem dorme nas ruas da Europa. Ao mesmo tempo, há tentativas de integrar os sem-abrigo. Diversos países delinearam estratégias, como Portugal.

Com a crise a semear pobreza, há cada vez mais gente sem casa pela Europa. Alguns descobrem que as acções mais corriqueiras na rua podem resultar numa sanção penal. O último exemplo vem da Noruega. Este Verão os seus municípios voltam a poder banir a mendicidade.
A Federação Europeia de Organizações Nacionais que Trabalham com Sem-abrigo (FEANTSA) tem manifestado "preocupação" o modo como, em diversos pontos da Europa, se tem optado por "medidas repressivas". No ano passado, aliou-se à Housing Rights Watch e à Fondation Abbé Pierre para produzir o primeiro relatório sobre "a criminalização dos sem-abrigo na Europa".

No Sul e no Norte, no Ocidente e no Oriente, regiões e municípios têm avançado com regulamentos e medidas que dificultam o dia-a-dia de quem sobrevive nas ruas, diz Freek Spinnewijn, director da FEANTSA, ao PÚBLICO. Proíbem coisas como deitar-se, dormir, comer ou guardar pertences pessoais no espaço público, mendigar, distribuir comida ou recolher lixo dos contentores.

A tendência vem dos Estados Unidos, com tradição de "lei e ordem" baseada em políticas como a "tolerância zero". Antes os sem-abrigo não faziam parte da chamada "população perigosa". Esse lugar pertencia aos ciganos e, na Irlanda e no Reino Unido, aos travellers. Com o aumento de estrangeiros entre os sem-abrigo, alguns tornaram-se "vítimas" de leis e regulamentos que punem o suposto risco de crime.

A Freek Spinnewijn, a Noruega parece um caso "interessante". Tem um estado social forte e um conjunto de leis progressistas. Os noruegueses não serão tão afectados pela proibição de mendigar. A medida, anunciada com a promessa de mais apoio à reinserção de toxicodependentes e expansão da habitação social, recairá mais sobre os estrangeiros indocumentados, em particular sobre os de etnia cigana saídos da Roménia, da Bulgária e da Hungria.

Escalada na Hungria
Nenhum lugar preocupa tanto Freek Spinnewijn como a Hungria. Desde meados dos anos 2000 que as autoridades locais criminalizam a chamada "mendicidade silenciosa". E já então era proibido mendigar na companhia de crianças ou de forma "agressiva". A partir de 2010, com a subida da extrema-direita ao poder, o país começou a escalada para a criminalização dos sem-abrigo.

Primeiro, o Parlamento húngaro aprovou a lei que permite atribuir funções específicas ao espaço público e proibir quaisquer outras. Depois, Budapeste proibiu o uso do espaço público para morar. Volvidos uns meses, o Parlamento decidiu punir com 60 dias de prisão ou 530 euros de multa quem, durante seis meses, por duas vezes violasse qualquer proibição de dormir no espaço público. Mais um mês e estava a proibir dormir no espaço público em todo o país.

"A criminalização dos sem-abrigo pode ter o perigoso efeito secundário de forçar as pessoas a procurarem lugares mais escondidos, onde é mais difícil receber a ajuda — amiúde vital — de cidadãos preocupados ou o acompanhamento de técnicos que se deslocam ao terreno", sustentou Balint Misetics, professor no Colégio de Estudos Avançados em Teoria Social, no referido relatório.

"A Hungria choca mais porque não teve o cuidado de esconder o que está a fazer e fá-lo a um nível nacional;", considera Freek Spinnewijn. "Noutros países europeus, isso tem estado a acontecer de uma forma mais subtil, por vezes quase invisível, e a um nível das regiões ou dos municípios."

Cory Potts, criminologista da FEANTSA, e Lucie Martin, socióloga da Diagénes, pegam no caso da Bélgica para mostrar como tudo pode começar com sanções administrativas e acabar em prisão. Veja-se o caso de Liége. De acordo com o regulamento aprovado em 2011, mendigar é permitido entre as 8h e as 17h de segunda a sexta e das 7h às 12h de domingo; não podem estar mais de quatro mendigos numa rua; não se pode mendigar em cruzamentos nem em entradas de edifícios públicos, empresas, casas. Desde 2012, quem desrespeita as regras cai na alçada da polícia. Na primeira vez, um aviso; na segunda, uma intervenção do serviço social; na terceira, detenção.

Os sem-abrigo não desapareceram da cidade. Há zonas de tolerância. Cory Potts e a Lucie Martin temem que essa tolerância esteja ameaçada. Proliferam os locais "semi-públicos", o que abre caminho a novas restrições. E a requalificação que se vai fazendo vai tornando os sítios mais "defensivos". Basta colocar barreiras nos bancos públicos para impedir as pessoas de se deitarem neles, por exemplo.

Punir comportamentos
Há exemplos anteriores à crise que começou nos EUA em 2008 e se estendeu à Europa. A Câmara de Barcelona é emblemática: em 2005, optou por punir comportamentos que considera anti-cívicos, como vomitar, urinar, defecar, cuspir, pintar graffiti, mendigar na rua, exercer a prostituição ou fazer venda ambulante, com multas que oscilam entre 120 e os três mil euros.

No ano passado, a Câmara de Madrid decidiu ir mais longe: punir com multa de 750 a três mil euros quem pedir esmola à porta de um centro comercial, acampe, faça malabarismo ou solicite serviços sexuais no espaço públicos, cuspa ou atire papéis para o chão, ofereça folhetos nos semáforos; perturbe os vizinhos enquanto rega as plantas; alimente ou dê banho a cães na rua.

Em Itália, os exemplos multiplicam-se. Logo em 2008, a Câmara de Roma decidiu castigar com multas de 50 a 150 euros quem se pusesse a comer ou a beber, a cantar, a fazer barulho ou a dormir no centro histórico ou mesmo fora dele se junto a monumentos. Também decretou que não se pode mendigar, nem vender flores ou outros pequenos objectos a menos que se tenha licença.

Verona foi mais longe. Câmara de Verona resolveu multar com multas de 25 a 500 euros quem alimentar sem-abrigo. O presidente, Flavio Tosi, eleito pelo partido de extrema direita anti-imigração Liga do Norte, diz que o objectivo é promover "a higiene" e "a imagem pública da cidade".

Tudo isto, na opinião de Freek Spinnewijn, reflecte ignorância e sensação de impotência. "Ser sem abrigo não é uma escolha individual, é o resultado de uma série de desvantagens", sublinha. "Tornar a vida destas pessoas mais difícil não resolve o problema. As pessoas podem ficar menos visíveis, mas continuam lá."

Havia uma complacência, corrobora Sérgio Aires, presidente da Rede Europeia Antipobreza. Pensava-se os sem-abrigo como pessoas com problemas de saúde mental, dependência de bebidas alcoólicas ou drogas ilícitas. Essa ideia é mais redutora do que nunca. Muita gente tem perdido a casa com a crise.

Sérgio Aires lê nas leis, regulamentos e medidas que dificultam a vida dos sem-abrigo uma "intolerância para com os pobres" que lhe parece "estranha". As pessoas que estão a chegar às ruas são "mais parecidas com o cidadão comum". Muitas vezes tinham vidas integradas até perderem o emprego.

O fenómeno está na agenda europeia. Há meia dúzia de anos que a União instiga os Estados-membros a investirem na integração das pessoas sem-abrigo.

Diferentes países adoptaram estratégias para reduzir o número de pessoas a dormir nas ruas. Alguns optaram por abordagens mais baseadas na lógica "casa primeiro", como a Suécia, a Finlândia e a Dinamarca. Outros, apesar de considerarem isso importante, falam em aumentar a qualidade da rede de albergues e de serviços de apoio à habitação, como os Países Baixos, a França e Portugal.

Regras portuguesas
"Portugal não tem orçamento", comenta Freek Spinnewijn. Apesar disso, o país cabe no rol de exemplos positivos. "Tem uma estratégia nacional. Ainda está no papel, mas tê-la já é um princípio."

Pela Estratégia Nacional para a Integração de Pessoas Sem Abrigo, aprovada em Portugal em 2009, ninguém deve permanecer na rua mais de 24 horas a menos que seja essa a sua vontade. Existiriam centros de emergência — estruturas de resposta imediata, das quais se sairia, com um diagnóstico feito, para alojamento temporário ou permanente. Em lado algum foram criados.

A estratégia aponta para a organização local. Sempre que o número de sem-abrigo justifique, deve constituir-se um Núcleo de Planeamento, Intervenção a Sem-Abrigo e delinear-se um conjunto de respostas integradas. "Vai funcionando no Porto", afiança Sérgio Aires. Em Lisboa não tanto. Tenta-se agora reactivá-la. "Há muita coisa a acontecer e essa não é uma das prioridades". Congratula-se por não haver em Portugal a intolerância de outros países. Nem o seu clima rigoroso.

No ano passado, pelo menos 4.420 pessoas viviam em jardins, estações de metro ou camionagem, paragens de autocarro, estacionamentos, passeios, viadutos, pontes e abrigos de emergência de Portugal. O número peca por defeito. Corresponde às pessoas acompanhadas no âmbito da Estratégia.

Os técnicos encontram resistência entre alguns sem-abrigo. Os albergues não permitem animais. Nem deixam entrar quem emite sinais de estar de consciência alterada. Têm rigorosos horários de entrada e saída. As pessoas têm de sair e de voltar cedo. São forçadas a passar o dia na rua. E, na maior parte das vezes, não tem privacidade no albergue. Mesmo assim não dão para as encomendas. A Segurança Social recorre então a pensões, amiúde, de baixíssima qualidade.

"Aquelas pessoas querem viver numa casa, como as outras, mas precisam de algum apoio para isso", diz Freek Spinnewijn. Alargar o mercado social de arrendamento parece-lhe a melhor hipótese. "Em muitos países, o Estado e a Igreja e outras organizações têm inúmeras casas vazias."
Há uns meses, o diário britânico The Guardian fez as contas: na Europa existem umas 11 milhões de casas vazias e uns 4,1 milhões de sem-abrigo. Em Portugal a desproporção também é grande 4.420 sem abrigo e, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), 735 mil casas vazias.

O exemplo de Portugal pode ajudar a perceber o quão inalcançável pode ser uma casa. O preço das rendas permanece alto para quem recebe 179 euros de Rendimento Social de Inserção ou 235 euros de pensão social, como já explicou ao PÚBLICO Henrique Pinto, director da Cais.
Sérgio Aires também faz a defesa das bolsas de habitação. Não a construção de bairros, modelo que criou não lugares por toda a Europa, mas a recuperação de casas situadas em ruas comuns, "com dignidade, a custos controlados". Na certeza de que tal não será solução para todos.

19.6.14

Governo norueguês quer proibir os mendigos

in Público on-line

Legislação vai ter ciganos romenos como principal alvo.

Quem pedir esmola em lugares públicos terá de enfrentar multas e uma pena de prisão Nuno Ferreira Santos/PÚBLICO/arquivo

O Governo norueguês prepara-se para aprovar uma lei para proibir a mendicidade em todo o país. Os votos da coligação de direita no poder serão suficientes para aprovar esta lei.

Quem pedir esmola em lugares públicos terá de enfrentar multas e uma pena de prisão de até três meses, diz a lei que deverá ser aprovada a 20 de Junho.

A coligação governamental, formada pelo Partido Conservador e pelo Partido do Progresso, terá maioria para fazer passar a lei com o apoio do Partido Liberal e do Partido Democrata, que, embora estejam fora do executivo, apoiam a governação.

Anders Anundsen, ministro da Justiça, que pertence ao Partido do Progresso, anti-imigração, afirma haver um “elo de ligação” entre os que mendigam e os criminosos, especialmente os carteiristas. Segundo as autoridades norueguesas, apesar de Oslo ter uma população sete vezes inferior a Berlim, o número de roubos praticado por carteiristas é idêntico.

“Se os mendigos forem proibidos de mendigar, isso sim fará com que a criminalidade aumente”, contra-argumentou Arild Knutsen, da associação nacional de toxicodependentes.

A oposição está a criticar severamente esta lei que o Governo da primeira-ministra Erna Solberg quer aplicar, já que serão os imigrantes ciganos provenientes da Roménia os mais visados. Dos 194 mendigos que o Ministério da Justiça identificou em Oslo, em 2012, sete eram de nacionalidade norueguesa, os restantes eram maioritariamente romenos.

A oposição compara mesmo esta lei com a antiga legislação antijudaica, já revogada. “Como é que não se pode comparar esta lei à lei que existia há 200 anos contra os judeus!?”, declarou Bård Vegar Solhjell, do Partido de Esquerda Socialista, referindo-se a um artigo da Constituição norueguesa que impedia os judeus de entrar no país. “Isto não passa de uma tentativa inadmissível de impedir os ciganos de entrar no reino”, afirmou.

Até 2005, quando os socialistas assumiram o Governo, existia uma lei contra a mendicidade na Noruega. Outros países europeus têm leis semelhantes, ou que tentam proibir os sem-abrigo de ocupar a via pública.

24.5.13

Crise pode estar a levar mais jovens a mendigar e a prostituirem-se

in Jornal de Notícias

A crise pode estar a levar mais adolescentes a mendigar, a traficar droga ou a prostituirem-se em Lisboa, alerta o Instituto de Apoio à Criança, que promove esta sexta-feira a VII Conferência "Crianças Desaparecidas e Exploradas Sexualmente".

Em declarações à agência Lusa, a coordenadora do Projeto Rua do IAC, Matilde Sirgado, revelou que as equipas têm detetado, desde 2012, um "maior movimento" de jovens na rua, adolescentes entre os 14 e os 16 anos que "não estão propriamente a dormir na rua, mas que utilizam ou são explorados na rua, estão em risco, alguns em perigo mesmo".

Segundo Matilde Sirgado, podem estar a "praticar a mendicidade, a prostituição e o tráfico de estupefacientes".

Jovens, apontou, com "vínculos" familiares "frágeis" ou que fugiram de instituições de acolhimento, ou em que "as condições" de vida das suas famílias "se deterioraram", com "o acentuar da pobreza económica", fruto da crise.

Os casos, sobre os quais o IAC não dispõe ainda de números concretos, têm sido diagnosticados, pelas equipas de rua ou por meio de denúncias, sobretudo na Baixa lisboeta e perto de grandes superfícies comerciais.

Trata-se de adolescentes que, de acordo com Matilde Sirgado, abandonaram precocemente a escola e que, estando "entregues a si próprios", normalmente "passam rapidamente de vítimas a infratores".

O Projeto Rua, explicou, aborda os jovens e promove a mudança de comportamentos, a sua reinserção na sociedade, incentivando o seu regresso à escola, a frequência de cursos profissionais, "treinando as suas competências para que arranjem outra forma de ganharem dinheiro".

O IAC teme que a crise possa aumentar o fenómeno, até porque, para Matilde Sirgado, "a carência generalizada de meios de várias instituições" sociais "diminui a vigilância e o apoio que poderiam dar na prevenção" de situações na comunidade.

Na VII Conferência "Crianças Desaparecidas e Exploradas Sexualmente", que se realiza em Lisboa, será lançada uma brochura de sensibilização para a mendicidade forçada, uma problemática "com tendência para aumentar, de forma ligeira", assumiu a coordenadora do Projeto Rua, associando a prática não só à "pobreza de valores", mas também à "pobreza económica".

As denúncias de mendicidade feitas diretamente ao IAC, através da linha telefónica SOS Criança, apontam para uma diminuição de casos, de 557 em 2005 para 21 em 2012. Números que, ressalvou Matilde Sirgado, não traduzem a real dimensão do problema, tanto mais que, assinalou, muitas denúncias reportam-se aos mesmos menores.

A coordenadora do Projeto Rua atribuiu a redução do número de casos denunciados ao trabalho de prevenção e vigilância das instituições sociais, da comissão de proteção de menores e das autoridades policiais, bem como à possível alteração do perfil das crianças que pedem dinheiro na rua.

Em 2005, os menores eram maioritariamente do Leste Europeu, nomeadamente da Roménia. Atualmente, são portugueses, tocados pela pobreza, que praticam a mendicidade "como estratégia de sobrevivência".

A mendicidade infantil atinge crianças de colo, acompanhadas por familiares ou "adultos explorados, obrigados" a pedir na rua, e menores entre os 7 e os 10 anos, que mendigam sozinhos. Os casos ocorrem, predominantemente, em Lisboa, segundo o IAC.

No Projeto Rua trabalham vários técnicos, entre psicólogos, pedagogos, educadores e animadores.



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