4.8.23

ADSE para todos

Óscar Gaspar, opinião, in Expresso


No debate público há anos que se fala da abertura do modelo da ADSE à generalidade dos cidadãos. Vale a pena colocar o assunto em perspetiva. Porque é que a ideia do modelo ADSE é atrativa, ainda que vivamos num país com um “SNS geral, universal e tendencialmente gratuito”?
A questão também é colocada sobre os seguros de saúde e a verdade é que há 3,4 milhões de apólices de saúde em Portugal. Há número crescente de pes­soas que valorizam os seguros de saúde e estão disponíveis para pagar essa segunda cobertura. Quando questionadas as pessoas pela sua adesão aos seguros de saúde, a primeira resposta é: acesso. Os cidadãos querem ter a garantia de uma consulta quando dela precisam e da realização de uma cirurgia necessária o mais rápido possível. Uma segunda razão é a liberdade de escolha e a possibilidade de marcar para o médico e hospital que entenderem.

Se os seguros de saúde têm estas vantagens, o modelo ADSE tem 2+1 componentes distintivas. Primeiro, em termos genéricos, as coberturas não têm limite, pelo que a discussão sobre plafonds não se coloca da mesma forma que nos seguros. Em segundo, a cobertura tem caráter vitalício, o que dá tranquilidade para a velhice. Há depois a questão do financiamento, que decorre de uma mutualização na base: cada beneficiário paga 3,5% da sua remuneração, independentemente da idade, da utilização, etc. Há que clarificar pela enésima vez que o modelo ADSE é pago pelos seus beneficiários. O Estado — enquanto tal ou entidade patronal — não financia a ADSE e os beneficiários do sistema pagam tudo do seu bolso.

Se o modelo ADSE é apetecível, porque não se generalizou? A resposta mais direta poderia ser: porque os seus beneficiários não aceitam essa abertura — e estão no seu direito. Sabemos, no entanto, que as suas estruturas jurídica, orgânica e funcional dependem de orientação política e, neste aspeto, temos também que respeitar a estratégia de quem governa e que entende que o modelo ADSE não deve ser alargado de forma generalizada.

Um argumento que não colhe é o de que o modelo ADSE fragiliza o SNS. A verdade é a inversa: a ADSE tem contribuído de forma efetiva para aliviar o SNS, quer em termos de pressão assistencial como financeiramente. Note-se que o problema do SNS não é o de falta de procura.

O SNS consegue calcular o nível de poupanças. Em Portugal não temos dados sobre as poupanças geradas pelos seguros de saúde, mas em Espanha a Fundação IDIS faz esse estudo e os dados relativos a 2022 permitem concluir que um cidadão coberto por um seguro de saúde poupa, em média, €599 aos sistema de saúde quando faz uma utilização mista do sistema e até €1674 se recorre apenas aos prestadores privados.

Em conclusão, se o modelo ADSE tem virtudes — que podem ser otimizadas com uma gestão mais autónoma, maior foco nas necessidades de saúde e uma relação mais transparente e racional com os prestadores —, se os trabalhadores valorizam a cobertura em saú­de e se cada vez há mais entidades patronais sensíveis ao acesso dos seus trabalhadores aos cuidados de saúde, não fará sentido uma espécie de ADSE para todos, desligada do Estado e da vontade de terceiros?

Vice-presidente da CIP