Sónia M. Lourenço Jornalista e Carlos Esteves Jornalista infográfico, in Expresso
Comparando com o final de 2019, antes da pandemia, os custos do trabalho aumentaram 19,2% em Portugal, ou seja, mais do dobro do aumento de 8% dos lucros das empresas, aponta o Employment Outlook da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico, publicado esta terça-feira
A evolução dos custos do trabalho e dos lucros das empresas, e a sua relação com o atual surto inflacionista, tem marcado a atualidade e a discussão económica e é um dos temas em análise no Employment Outlook 2023, da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE), publicado esta terça-feira.
Conclusões? Entre o final de 2019, antes da crise pandémica, e o primeiro trimestre deste ano, os lucros cresceram mais do que os custos do trabalho na grande maioria dos países da OCDE. Mas Portugal é uma das exceções.
“Ao longo dos últimos três anos, os custos do trabalho por unidade do produto real (custos unitários do trabalho) aumentaram na maioria dos países da OCDE, já que o crescimento dos salários nominais excedeu o crescimento da produtividade”, lê-se no relatório. E explica que este indicador obtém-se dividindo a compensação dos trabalhadores pelo Produto Interno Bruto (PIB) real.
Ao mesmo tempo, as margens de lucro, medidas pelos lucros por unidade do produto real (lucros unitários, obtidos pela divisão do excedente operacional bruto pelo PIB real), "também cresceram na maioria dos países, indicando que, em termos agregados, as empresas foram capazes de aumentar os preços para além do incremento no custo do trabalho e de outros inputs”, aponta a OCDE.
De facto, “na maioria dos países, os lucros unitários subiram mais do que os custos unitários do trabalho em 2021 e 2022”, salienta a organização. Em concreto, em 24 dos 29 países analisados, os lucros cresceram mais do que os custos do trabalho entre o final de 2019 e o primeiro trimestre deste ano.
“Como resultado, ao longo dos últimos dois anos, os lucros tiveram uma contribuição invulgarmente grande para as pressões internas sobre os preços”, escreve a OCDE.
Uma conclusão que ecoa os resultados obtidos pelo Banco Central Europeu (BCE) para a zona euro. Um estudo recente aponta que os lucros unitários representaram cerca de 60% das pressões internas sobre os preços no espaço do euro, nos últimos três trimestres (nos terceiro e quarto trimestres de 2022 e no primeiro de 2023).
Em Portugal, contudo, a par de outros quatro dos 29 países analisados, o aumento dos custos do trabalho suplantou o dos lucros neste período.
Os dados apresentados pela OCDE indicam uma subida de 19,2% nos custos unitários do trabalho, o que compara com um incremento de 8% nos lucros unitários.
A OCDE apura ainda as variações nos custos unitários do trabalho reais, que mede a diferença entre variações nos custos unitários do trabalho e variações nos preços na produção (por exemplo o deflator do Produto Interno Bruto).
Ora, “os custos unitários do trabalho reais recuaram em 18 dos 29 países com dados disponíveis”, aponta o estudo.
Não foi o caso de Portugal. “Entre os restantes países, os maiores aumentos nos custos unitários do trabalho reais ocorreram em Portugal, no Reino Unido e na Lituânia”, destaca a OCDE.
Olhando em concreto para as remunerações, a organização salienta que “apesar de uma subida no crescimento nominal dos salários, em termos reais estão a cair”. Isto por causa da inflação elevada.
Assim, no primeiro trimestre de 2023, o crescimento dos salários nominais por hora face ao mesmo período do ano anterior “excedeu o nível pré-crise em quase todos os países da OCDE, atingindo 5,6% em média nos 34 países com dados disponíveis”, aponta o documento. Contudo, os salários reais por hora - ou seja, considerando o impacto da inflação - “caíram em média 3,8%, com quedas observadas em 30 países”.
No caso de Portugal, a subida nominal foi de 4,5%, com uma queda real de 3,5% no salário médio por hora de trabalho.
Já na comparação com o final de 2019, antes da crise pandémica, no final de 2022 os salários reais tinham caído, em média, 2,2%, observando-se variações negativas em 24 dos 34 países da OCDE com dados disponíveis.
Mesmo nos restantes 10 países com variações positivas, “a inflação apagou a maioria do crescimento nominal dos salários”, aponta a OCDE.
É o caso de Portugal, com uma variação real positiva de 1,3%.