por Ana Maia, in Diário de Notícias
Ministério não esclarece se descida de preço é só nos comparticipados
Há medicamentos, entre os mais vendidos, que vão duplicar de preço para utente depois da entrada em vigor no novo regime de comparticipação anunciado anteontem pela Ministra da Saúde. Nem a baixa de preço de 6% no valor da embalagem atenua a diferença que um doente vai ter de desembolsar quando comprar um dos muitos remédios que vão sofrer cortes nas comparticipações do Estado. Já no outro prato da balança, os cofres do Ministério da Saúde ficam bem mais recheados.
Os exemplos são oficiais e foram feitas ao DN pela Autoridade Nacional para o Medicamento (Infarmed). Uma caixa de omeprazol genérico, um medicamento para as úlceras de estômago que está entre os mais vendidos, custa hoje 31,89 euros. Com receita médica, o doente paga apenas 9,89 euros, enquanto que o Estado assume o pagamento de 22 euros, graças à comparticipação de 69%. Mas dentro em breve, os pratos da balança vão mudar. Com a diminuição de comparticipação para 37%, o Estado passa a pagar apenas 11,9 euros e o doente deixa na farmácia 18,89 euros. Ou seja, o dobro do que paga agora. Isto já com o desconto de 6% anunciado para o início de Outubro.
E este nem é dos remédios mais caros para este problema. Se for um medicamento de marca, como o Nexium, então a factura passa de 24,6 euros para 46,99 euros. Peso suportado pela carteira do doente, porque para o Estado a conta fica bem mais leve: em vez de pagar 54,74 euros passa a suportar 27,59 euros (ver caixa).
O omeprazol é uma das substâncias mais vendidas no País. O seu peso nas contas do Serviço Nacional de Saúde era de tal forma grande, que no primeiro pacote de medidas apresentado por Ana Jorge, em Abril, o Ministério lhe impôs regras quase exclusivas: o genérico tinha de custar menos 35% do que o equivalente de marca.
Do grupo de medicamentos que viu descer a comparticipação também fazem parte antiácidos e os anti-inflamatórios não esteróides, como o Brufen. De acordo com dados fornecidos ao DN pela consultora IMS Health, nos últimos 12 meses foram comercializadas 366 mil embalagens de antiácidos (802 mil euros), 6,1 milhões de antiulcerosos (145 milhões de euros) e 29,2 milhões de anti-inflamatórios não esteróides (115 milhões de euros). Todos eles comparticipados a 69% e que passarão a ser a 37%.
Ontem, Francisco Louçã , líder do BE, acusou o Governo de estar "a destruir o Serviço Nacional de Saúde" (SNS) com esta política de medicamentos. "O Governo mentiu ao país porque os preços dos medicamentos para as famílias mais idosas estão a aumentar. Precisamos de poupar em Portugal mas não é à conta dos preços dos medicamentos mais usados pelos idosos", defendeu.
Também o PSD criticou as opções tomadas pelo Ministério da Saúde. "É essencial saber quanto desta redução vai ser suportado pelos portugueses, porque aquilo que é apontado como uma poupança do Estado em grande parte mais não é do que um aumento de imposto encapotado", disse à Lusa Luís Menezes, vice-presidente dos sociais-democratas.
Mas sobre as novas regras há muitas outras dúvidas a esclarecer.
Nomeadamente se a descida de 6% no preço dos remédios é de facto em todos ou apenas nos comparticipados e que têm influência nas contas do Estado. É que as descidas registadas até agora dizem apenas respeito a estes últimos.
E se for esse o caso - apenas os comparticipados a descer de preço -, há cerca de 1000 medicamentos que não precisam de receita e que afinal não vão ficar mais baratos para os utentes.
Apesar das insistências do DN, quer junto do Ministério da Saúde e quer do Infarmed, a tutela não esclarece a totalidade do impacto da medida que anunciou anteontem. O documento apresentado pela ministra deverá ser discutido com a indústria farmacêutica e outros parceiros do sector. Depois terá ainda de ser aprovado pelo Presidente da República antes de entrar em vigor.