13.12.10

Dança contra a exclusão social

Claudia Galhós, in Expresso
"

O Depois" é o novo espetáculo da Companhia Integrada Multidisciplinar contra a exclusão social que pode ser visto esta semana no Teatro São Luiz, Lisboa.

Uma das intérpretes da Companhia Integrada Multidisciplinar
A sala está cheia de sacos vulgares, retangulares, de padrão axadrezado. Há um rapaz em cadeira de rodas e uma rapariga de t-shirt amarela, meio desajeitada, que se destacam por entre a tralha. Ele aparentemente limitado nos movimentos. Ela solta, livre, deambula pelo espaço. O rapaz de cadeira de rodas é José Marques. A rapariga é Maria João Pereira. São dois dos intérpretes da nova peça da CiM, Companhia Integrada Multidisciplinar, "O Depois".

Na CiM, a arte é o elemento motor de um projeto mais vasto e que toca questões delicadas sobre a coexistência em sociedade, a relação que cada um tem com o outro e o respeito e admiração pela diferença.


À cabeça desta iniciativa está a Vo'Arte, da coreógrafa Ana Rita Barata e do realizador Pedro Sena Nunes. Mas é a parceria com a Associação de Paralisia Cerebral de Lisboa (APCL) e o Centro de Reabilitação de Paralisia Cerebral Calouste Gulbenkian (CRPCCG) que dá forma e consistência ao projeto e que salvaguarda toda uma ação que extravasa o objetivo artístico, sem o perder de vista.

A estreia no InArte


"O Depois", que sucede a "O Aqui", estreia esta semana no Teatro São Luiz, no contexto do InArte - Encontros Internacionais Inclusão pela Arte.

A duas semanas da estreia, os ensaios decorrem na Cruz Vermelha, no Lumiar. Os sacos rolam pelo chão. Dobram-se. Chocam. Começa a ver-se um braço, uma perna... Pouco depois, é uma paisagem de despojos de troncos humanos, cabeças e braços que rompem por entre os sacos.

Estamos mais habituados a vê-los cheios de coisas. Inutilidades várias. Desta vez guardam corpos. Pessoas que provisoriamente têm a sua mobilidade restringida naquele espaço fechado.

Será que temos de ser todos iguais?


Depois, os movimentos limitam-se por via de outras amputações provisórias: uma perna dobrada para trás e amarrada com fita-cola; menos um braço num outro corpo; menos uma perna. Será que temos de ser todos iguais?

Um comovente dueto entre dois bailarinos, um dito 'normal', Bruno Rodrigues, e o rapaz da cadeira de rodas, José Marques, diz-nos que não. Diz-nos que a diferença pode ser um poema ao vivo.

Um dueto em que se entregam a um gesto de confiança, em que as pernas de José tremem ao perder o apoio habitual e se erguem, amparadas por Bruno.

O projeto de Ana Rita Barata


Ana Rita Barata, a coreógrafa, fala de um entrelaçar dos corpos mais rápido nesta obra, que levou mais tempo em "O Aqui". Afinal, este projeto tem um tempo próprio de maturação, tanto para artistas como para o público.

Por isso fala de uma continuidade necessária, que três anos depois do seu começo permite levar cada vez mais longe a vertente artística. Cada um pode encontrar em "O Depois" o sentido daquela composição de corpos.

Ana Rita Barata esclarece a fonte de inspiração: o artista plástico Vik Moniz e o seu trabalho com materiais muito diversos, incluindo o lixo. E aqui surge a ideia de reciclagem.

"A ideia quase de possuir partes do outro, querer substituir partes do outro, construir partes, reciclar partes, reciclar gestos..."


O AQUI e O DEPOIS
InArte - Encontros Internacionais

Inclusão pela Arte

Teatro São Luiz , Lisboa, dias 12 a 19

Tel. 213 257 640