Por Patrícia Carvalho, in Jornal Público
Estudo da Universidade Católica identifica quatro grupos distintos entre as mulheres estrangeiras que se encontram nas cadeias nacionais
A maioria das reclusas estrangeiras em Portugal não residia no país antes do momento em que foram presas. Das 175 estrangeiras que estavam detidas, no final do primeiro semestre deste ano, 56,3 por cento (98) não viviam no país. Grande parte delas é proveniente da Europa (36,2), seguindo-se a África lusófona (27,7) e a América do Sul (23,6), e o motivo para se encontrarem nas prisões nacionais é, de forma esmagadora, o tráfico de droga. Neste último aspecto não diferem das reclusas portuguesas nem da tendência dos últimos anos, mas Raquel Matos, da Universidade Católica, que está a coordenar o estudo Trajectórias de Vida de Reclusas Estrangeiras nas Prisões Portuguesas, acredita que a próxima fase deste trabalho permitirá explicar melhor quem são estas mulheres.
É que o projecto de investigação, cujas primeiras conclusões deverão ser hoje apresentadas, no Porto, no âmbito do I Encontro sobre Género, Nacionalidade e Reclusão, ainda vai a meio. Literalmente. Pensado para dois anos, o estudo tem ainda doze meses de trabalho pela frente. "E a parte mais interessante vai começar agora", admite Raquel Matos.
Será ao longo deste ano que a equipa que coordena vai analisar as trajectórias de vida das reclusas estrangeiras no país - 31,9 por cento da totalidade da população prisional feminina -, na tentativa de perceber como chegaram ao momento de crime pelo qual foram condenadas (ou que as mantém em prisão preventiva) e como percepcionam esse mesmo crime. O ponto de partida será, precisamente, o conjunto de dados a que o grupo de quatro investigadoras já chegou, e que aponta para "tendências, com alguma consistência", que permitem identificar quatro grandes grupos de mulheres estrangeiras detidas nas cadeias.
A unir três destes grupos está "o crime principal" pelo qual foram detidas: o tráfico de droga. Mas, em tudo o resto, são diferentes, e Raquel Matos espera que a continuação do projecto de investigação permita chegar a conclusões que já começam a tornar-se evidentes para a investigadora. "Apesar de o tráfico ser predominante, há diferentes padrões de tráfico", diz.
O primeiro grupo identificado pelo estudo da UC é constituído por sul-americanas, não residentes em Portugal, detidas no aeroporto por tráfico de droga. O segundo é muito idêntico ao primeiro, mas o continente de origem destas mulheres passa a ser a Europa. Ambos estarão ligados ao tráfico internacional de estupefacientes - o que os distingue de um outro grupo também identificado pelo trabalho desenvolvido no último ano, o de africanas residentes em Portugal e com ligação ao tráfico de droga "doméstico". O último grupo, bastante mais residual, é o de europeias residentes em Portugal e com crimes contra as pessoas e o património.
O trabalho, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia e pela Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género, permitiu ainda perceber que entre as reclusas estrangeiras residentes no país, 29 por cento delas moram em Portugal há mais de cinco anos, 24,2 por cento há mais de dez e 12,9 por cento há mais de vinte. "E neste último grupo são todas africanas", diz Raquel Matos. Por nacionalidade, as cidadãs de Cabo Verde (38) continuam a ser a maioria, seguindo-se as oriundas do Brasil (28), Espanha (17), Venezuela (8) e Roménia (8).