31.1.11

Crianças internadas esperam há 3 anos para serem adoptadas

por Rita Carvalho, in Diário de Notícias

Para levar para casa um bebé, há casais que esperam mais de cinco anos. Mas as crianças mais velhas, com problemas de saúde e irmãos têm o problema inverso. Há quem nunca seja adoptado.

Rui já tem quase seis anos. Mas desde os dois que está referenciado para adopção e há mais de três que consta da lista nacional onde se cruzam crianças candidatas e potenciais pais. Um problema grave de saúde tem-no impedido de encontrar uma família e parece condená-lo a crescer na instituição onde chegou ainda bebé.

Tal como Rui, há 235 crianças há mais de três anos à procura de uma família. Constam da lista de adopção criada em 2006, mas por terem problemas de saúde, idade mais avançada ou vários irmãos não há casais interessados em acolhê-los.

Nos bebés, o desencontro é no sentido inverso, pois há muitas pessoas a querer adoptar, mas o processo pode demorar mais de cinco anos, porque há poucos menores até aos três anos em situação de adaptabilidade.

A maioria das 9563 crianças e jovens que, em 2009, integravam a rede de acolhimento do Estado (lares, famílias de acolhimento ou instituições) tinham sido retiradas à família por estarem em risco e já ultrapassavam os 12 anos. Por isso, para 26%, o futuro não passava por uma nova família mas pela autonomia, trabalhada ao longo do tempo. Segundo o Instituto de Segurança Social, 24% dos menores tinham a expectativa de voltar para casa e aguardavam que a família conseguisse reorganizar-se para regressarem em segurança.

Só quando todas as possibilidades junto da família estão esgotadas, nomeadamente o acolhimento por uma tia ou avó, é que a adopção é considerada. Por isso, entre as crianças institucionalizadas, só 10% são encaminhadas para adopção. E à medida que a idade sobe agrava-se o desencontro.

"Quanto mais aumenta a idade e os problemas de saúde mais aumenta o tempo de espera", explica Isabel Pastor, coordenadora nacional do Serviço de Adopção. "Mas ninguém fica dez anos à espera de família. Se não for possível encontrá-la num tempo razoável, há que pensar noutro futuro", diz.

O projecto de vida é traçado com os técnicos da instituição onde a criança está e validado pelos tribunais e comissões de protecção de crianças e jovens. E há cada vez mais respostas legais para além da adopção plena, em que se cortam os laços com a família biológica. O apadrinhamento civil é uma delas (ver caixa ao lado).

Para Dulce Rocha, presidente do Instituto de Apoio à Criança, o importante é tirar a criança da instituição, aproveitando as alternativas que a lei prevê. "Os técnicos estão cada vez mais sensibilizados para encontrar soluções. Mas assim que a criança entra na instituição devia haver logo um projecto para sair. A estada devia ser temporária e não definitiva, como, infelizmente, ainda acontece."

Quando a saída não é possível, como acontece com crianças mais velhas, há que proporcionar-lhes um ambiente familiar, mesmo que não seja através de uma família adoptiva e definitiva, defende Dulce Rocha. "Durante a semana estão na escola mas ao fim-de-semana deviam passar momentos de lazer com uma família, alguém que lhes dê referências e seja um apoio para a vida. Estes contactos regulares são essenciais para diversificar as relações da criança."

Os dados desde 2006 revelam ainda outra conclusão preocupante: 158 crianças nunca chegaram a ser adoptadas. Algumas por terem atingido, entretanto, os 15 anos, outras porque a demora ditou a revisão do seu futuro.

Para os jovens, o treino para a autonomia de vida é cada vez mais uma saída. A Segurança Social e a Casa Pia dispõem até de programas em que estes partilham apartamentos, estudam ou trabalham, e são acompanhados pelos técnicos nesta transição para a vida activa. A adopção internacional tem sido também uma resposta para algumas crianças de 13 e 14 anos.