Texto de João Mendes, Público on-line
Nas palavras do Presidente da Comissão, neste caso acertadas, Portugal vai receber uma “pipa de massa”: 26 mil milhões de euros
Discute-se o Acordo de Parceria 2014-2020, entre Portugal e a União Europeia. Nas palavras do Presidente da Comissão, neste caso acertadas, Portugal vai receber uma “pipa de massa”: 26 mil milhões de euros. O Primeiro Ministro já se apressou a dizer que o dinheiro iria ser investido com critério, de forma a promover o desenvolvimento sustentado da economia portuguesa. Mas todos os Primeiros Ministros têm vindo a prometer exactamente o mesmo, e não é certo que tenham cumprido.
A aplicação dos fundos europeus cria distorções na economia portuguesa. Afinal, as empresas que tenham acesso a dinheiros europeus estarão em vantagem face aos seus concorrentes, independentemente das escolhas dos clientes. Por outro lado, a aplicação dos fundos em projectos infraestruturais de duvidosa necessidade efectiva, por critério político e com estudos técnicos com credibilidade duvidosa, é uma fonte de custos, e não de desenvolvimento, para o país.
A este respeito, o atual Governo fez duas importantes promessas. Em primeiro lugar, prometeu que os fundos europeus investidos a título reembolsável teriam primazia substancial face aos fundos investidos a fundo perdido. Isto criaria incentivos para que o investimento fosse feito em projetos que se prevejam sustentáveis financeiramente. Em segundo lugar, prometeu que iria criar uma entidade independente para administrar os fundos reembolsáveis (que tem mediaticamente recebido o nome de banco de fomento, e sobre a qual tenho as minhas dúvidas). Caso implementada de forma eficaz, esta medida tenderia a diminuir o enviesamento eleitoralista nos estudos técnicos efetuados e aumentar o rigor na selecção dos projectos.
A conjungação destas duas medidas teria assim, em princípio, um impacto positivo na qualidade do investimento dos fundos europeus. Claro que, para que os seus efeitos se façam sentir, as promessas têm de ser, efetivamente, cumpridas. De pouco nos serve que os fundos europeus sejam investidos sob a forma de empréstimo se, na prática, as empresas falirem, levando com elas o investimento efetuado e destruindo qualquer possibilidade de reembolso. De pouco nos serve que haja uma Instituição Financeira de Desenvolvimento caso ela não seja verdadeiramente independente e caso os seus critérios de seleção de projetos sejam politicamente enviesadas.
O Governo deixaria um legado importante ao país caso implementasse corretamente estas duas promessas. Mas isso não bastaria. Seria importante que, ao aplicar os fundos europeus, se tentasse minimizar distorções, investindo-o em projetos verdadeiramente estruturais para a economia portuguesa. Esses projectos deveriam ser financeiramente sustentáveis e deveriam ser selecionados de forma independente, com base em critérios rigorosos. É um aspeto sobre o qual não tenho ouvido nada de bom do Governo, o que me parece preocupante.
26 mil milhões de euros são mesmo uma pipa de massa. Importa garantir que aproveitamos esta oportunidade para o país se desenvolver.