24.4.15

Migrantes. Só um em cada 30 refugiados fica na União Europeia

António Ribeiro Ferreira, in iOnline



Líderes europeus limitam a 5 mil o número de refugiados por ano. Os outros são expulsos rapidamente.

Em 2014 entraram 150 mil refugiados.

A Europa tinha dois caminhos a seguir depois das sucessivas tragédias no Mediterrâneo e da cimeira extraordinária de ontem à tarde em Bruxelas: fechar-se como uma fortaleza ou mostrar que é um continente em que a solidariedade e a humanidade são princípios fundamentais a defender. Seguiu o primeiro com a imposição de uma quota de 5 mil felizardos por ano que podem ganhar o estatuto de refugiados e viver longe da guerra e da morte. Cinco mil refugiados num continente que o ano passado recebeu 150 mil. Sem esquecer que o número dos que querem entrar na Europa por mar e terra está a aumentar todos os anos; feitas as contas, a quota agora estabelecida significa que só um em 30 refugiados ficará na Europa. Os outros serão rapidamente expulsos para os seus países de origem, sejam eles quais forem, com o Frontex, aparelho europeu responsável pela segurança das fronteiras, a ser dotado de meios humanos e financeiros para desempenhar rapidamente a sua tarefa.

Nesta matéria de refugiados, a questão das quotas divide naturalmente os líderes europeus, que querem ao máximo empurrar os refugiados para os seus vizinhos. O ano passado, por exemplo, Itália, Malta, Chipre e Espanha, as portas da Europa, foram os que receberam os muitos milhares de migrantes. No entanto, quatro estados-membros receberam quase dois terços de todos os pedidos de asilo: Alemanha, Suécia, Itália e França e, destes, a Alemanha foi o principal país de acolhimento. É por isso que agora, na discussão sobre quem fica com o quê, os países que recebem mais refugiados querem ver reduzido esse número em troca do envio de mais forças navais para o mar Egeu e o mar Mediterrâneo para controlar a sua chegada à Europa. Foi isso que disse ontem à tarde David Cameron, primeiro-ministro inglês: Londres vai disponibilizar navios e helicópteros para o Mediterrâneo, na condição de os imigrantes resgatados não terem automaticamente direito a pedir asilo no Reino Unido. Precisando melhor a proposta, Cameron adiantou que, como o país da Europa com maior orçamento de Defesa, podemos dar um contributo de vulto. “O que vou oferecer é o navio da marinha real HMS Bulwark, e ainda três helicópteros e dois outros navios de patrulhamento”, disse. Mas como não há bela sem senão, Cameron acrescentou que a oferta britânica está “naturalmente sujeita a condições”, entre as quais que os imigrantes resgatados “sejam levados para o país seguro mais próximo, que será muito provavelmente Itália”, e não tenham automaticamente direito a pedir asilo ao Reino Unido.

Além de discutir a quota de refugiados e a sua distribuição pelos estados-membros da União Europeia, a cimeira decidiu duplicar os financiamentos para 2015 e 2016 das operações de resgate e salvamento de migrantes, mantendo a vigilância numa aérea que vai até às 30 milhas das costas italiana e maltesa.

Por outro lado, muito embora não se saiba nem como nem com que forças, os líderes europeus estão decididos a atacar os traficantes de seres humanos e a destruir as suas embarcações nas praias líbias. Ainda ontem o procurador de Palermo, que investiga o naufrágio de domingo, revelou que os migrantes pagaram entre 700 e 7 mil dólares cada um pela viagem para a morte e estiveram um mês retidos numa quinta perto de Tripoli antes de embarcarem na traineira pilotada por um tunisino. Mas atacar os traficantes e as suas embarcações em território líbio ou de outros países não será com certeza uma tarefa fácil e implica correr riscos que podem levar a novas tragédias. Com os líderes reunidos de emergência, a marinha italiana resgatou ontem mais 220 migrantes no Mediterrâneo e espera-se que nos próximos meses o fluxo diário aumente com o bom tempo no mar nesta Primavera e no Verão.

Mas para além dos pontos que a cimeira de ontem abordou durante a tarde em Bruxelas há muitas decisões que a pesada máquina da União Europeia vai pôr em prática. O presidente do Conselho Europeu, o polaco Donald Tusk, foi pondo alguma água na fervura. Além de descartar uma posição definitiva para ontem, Tusk afirmou que um dos temas mais difíceis na agenda é o do “reforço da solidariedade europeia e da responsabilidade comum”. Por isso mesmo, adiantou, a cimeira não chegou a nenhuma solução. “Temos de debater assuntos complicados, como a instalação, o acolhimento e as políticas de asilo, o sacrifício de interesses nacionais em nome de um bem comum”, disse, acrescentando que “é uma questão europeia e não apenas um problema dos países do Sul da Europa.” “Salvar pessoas é a prioridade, mas não passa só por resgatá-las do mar, mas também pelo combate aos contrabandistas e pela prevenção de fluxos de imigração ilegal”, nomeadamente “desmantelando as redes de contrabando de pessoas e destruindo os seus modelos de negócio”, salientou Tusk. Tudo questões que a Europa conhece há muitos anos e pouco fez para ultrapassar.

Com Lusa