Margarida Cardoso, Pedro Lima, Carlos Esteves, in Expresso
O Expresso atualizou a tabela publicada a 18 de abril. As oscilações continuam, a CAP admite que seca pode ditar novos aumentos no futuro próximo e a DECO incentiva a vigilância dos consumidores
Duas semanas depois da entrada em vigor do IVA zero num cabaz de 46 categorias de produtos consideradas essenciais, o Expresso voltou a ir às compras de norte a sul do país, atualizou a tabela publicada a 18 de abril e comparou preços atuais com o registo anterior. Confirmou que na maioria dos casos os valores se mantêm, entre algumas subidas e descidas, independentemente do respeito quase absoluto pelo IVA zero.
“Nada de surpreendente”, comenta Eduardo Oliveira e Sousa, presidente da CAP – Confederação dos Agricultores de Portugal que já tinha antecipado a possibilidade de os aumentos de preços continuarem devido “ao livre funcionamento do mercado”, admitindo que “oscilações noutras componentes do preço, além do IVA, trazem necessariamente variações no valor a pagar pelo consumidor, para cima ou para baixo”.
O “cabaz” que o Expresso criou a 18 de abril, dia em que entrou em vigor o IVA zero para travar a escalada de preços em 46 categorias de produtos, teve de encolher de uma centena de bens para 84 de forma a anular distorções motivadas por “poupanças”, mas também para contornar o facto de alguns produtos estarem, agora, indisponíveis. A comparação dos valores revela 16 descidas de preços, o que corresponde exatamente ao dobro das subidas.
PREÇOS NO MODELO DO ELETROCARDIOGRAMA
E o que subiu? Depende do local de compra e até há categorias que subiram numa superfície comercial e desceram noutra, mas a lista dos preços em alta abrange produtos como leite, bebida de aveia, manteiga, azeite, massa, carne (frango) e peixe (dourada). Nos poucos casos detetados pelo Expresso em que não houve reflexo da descida do IVA no primeiro dia da vigência da nova lei, a 18 de abril, há a registar, em Cascais, na loja Meu Super (associadas do Continente), a subida de preço de um litro de leite magro Matinal Seleção: o produto manteve o preço apesar da redução do IVA e duas semanas depois está até mais caro.
Noutra situação, numa mercearia de Barcarena (Oeiras), onde não tinha sido possível refletir o IVA zero nos produtos logo a 18 de abril, por motivos técnicos, foi aplicado um desconto no ato do pagamento. Agora, uma nova visita, o Expresso verificou que a redução do IVA já estava refletida em três produtos, mas o preço continuava inalterado para outros dois (alho francês e curgete).
Pedro Pimentel, diretor-geral da CentroMarca, admite que “as oscilações são inevitáveis, em especial nos frescos, onde as compras diárias seguem um modelo idêntico ao de um eletrocardiograma”, mas considera que “a tendência geral nesta fase é de baixa de preços”. Do que conhece do mercado, acredita que “a política da grande distribuição neste momento é evitar mexidas para não surpreender o consumidor o que significa, no limite, resistir a propostas de atualização de algumas marcas/fabricantes ou até não repercutir no imediato algumas dessas atualizações”.
A HORA DE FISCALIZAR
A verdade, diz Eduardo Oliveira e Sousa, é que “é provável continuarmos a ser surpreendidos por subidas de preços nos próximos tempos, em especial nas frutas, legumes e carnes, devido ao impacto da seca no aumento dos custos de produção”.
No que respeita à fiscalização, a ASAE começou por monitorizar apenas o comportamento do retalho e só agora vai começar a inspecionar eventuais incumprimento do IVA zero no cabaz, tendo dado “algum prazo para absorção da medida”, de acordo com a explicação do inspetor-geral Pedro Portugal Gaspar à Rádio Renascença.
Já a Deco acaba de lançar nas redes sociais a iniciativa #ivawahsing em que convida os consumidores a partilharem fotografias de práticas ilegais. Ao mesmo tempo, a plataforma Cabaz Controlado, da Deco Proteste, permite ao consumidor criar um cabaz virtual com os bens alimentares essenciais que compra habitualmente e acompanhar a evolução dos preços com isenção de IVA.
E OS CONSUMIDORES?
Quando são ouvidos, os consumidores dão sinais de continuar a achar os preços "demasiado caros" e procurar promoções, como aconteceu em Viseu, na passada terça-feira, dia de feira semanal, a oportunidade para abastecer a despensa da casa, sobretudo para as populações que vivem fora da área urbana e aproveitam a ida à feira para passarem, também, pelo supermercado.
Com a carne com desconto de 5%, Ana Marques, de 58 anos, reconhece que “é de aproveitar”. Residente em Bodiosa, aproveita as “promoções para ver a conta baixar, que está tudo muito caro”, reclama. Nem com a descida do IVA? “Não, isso foi um engodo, que as coisas já estão a começar a subir”, responde ao Expresso. Com o carro cheio de compras, pagou €110 e “tem que dar até à próxima semana”, exclama.
Na maior loja que o Pingo Doce tem na cidade de Viseu, na rua Mendonça os clientes passeiam pelos corredores e espreitam os preços. “Temos que aproveitar as promoções e ver onde é mais barato”, assume Rogério Antunes, de 74 anos para quem “a leitura dos folhetos dos supermercados é obrigatória. “Leite e iogurtes compro na Mercadona, frutas e legumes no Lidl e só para a carne e detergentes é que venho a esta loja”, explica.
A comparação de preços, “ver onde é mais barato, que promoções existem e que saldo podemos acumular no cartão” são as preocupações de Luísa Tavares, de 67 anos.
“Venho a feira, compro roupa e sementes para a horta, que é o que me vale e depois venho aqui, comprar o essencial”, assegura. E os preços, estão mais baratos? “Temos que ter muita atenção no que está na prateleira, no que pagamos e nas promoções”, adianta. “Às vezes a promoção chega depois de aumentar o preço, é preciso olho vivo”, exclama sexagenária.
Trabalho com Amadeu Araújo, Rita Robalo Rosa, João Mira Godinho, Margarida Mota, Salomé Fernandes, Isabel Vicente, Teresa Amaro Ribeiro, Elisabete Miranda e Vítor Andrade