A crise climática está a despertar a atenção de autores portugueses. Mas até que ponto a literatura que problematiza ou espelha questões ambientais pode produzir mudanças comportamentais?
Territórios inóspitos, assolados por inundações repentinas, secas intermináveis e temperaturas desumanas. Há algumas décadas que autores anglófonos imaginam mundos assim, em que a crise climática tem um papel central na narrativa. Em Portugal, esta preocupação literária ainda parece ser modesta, mas já conta com representantes tanto no romance como na poesia. Pode a literatura “salvar” a humanidade de uma catástrofe ambiental?
“Acredito que a literatura pode ser pedagógica, mas mais por consequência do que por premissa. Eu vou para um texto com perguntas, não com intenções. E até pode ser que as respostas às minhas perguntas suscitem nas pessoas lógicas motivacionais diferentes. Se assim for, óptimo. Mas não me sento a escrever um conto para explicar às pessoas que a transição energética é urgente”, diz ao Ípsilon a escritora Joana Bértholo.
A autora publicou recentemente Natureza Urbana (Relógio D’Água), um conto que explora como a linguagem pode (ou deveria) encurtar a distância entre as espécies, reavaliando o intervalo entre os humanos e os demais seres vivos. Em cerca de 60 páginas, o livro retoma um conceito essencial para compreendermos o estado de degradação ambiental a que chegámos: a separação entre os humanos e a natureza é um binómio falso, um equívoco linguístico.


