Com 18 anos, tinha apenas o 9º ano de escolaridade e uma família que a dissuadia de ir à escola. Não desistiu. Fez uma licenciatura, um feito ainda raro entre ciganos, e criou uma associação para a integração da comunidade.
Na escola, ainda menina, os professores iam alimentando o seu gosto pelos estudos e pela aprendizagem. Em casa, a família perguntava-lhe porque é que não era como as outras, da mesma idade e da mesma comunidade, que sonhavam casar-se e ir a festas. “A questão ‘O que queres ser quando fores grande?’ não existia”, recorda Vanessa Lopes, em entrevista ao podcast “Bolsa de Futuro. “Não havia espaço para que a imaginação pudesse ir mais além e eu sonhasse com aquilo que queria ser”, recorda a jovem cigana.
Com 18 anos, tinha concluído, com dificuldade, o 9º ano de escolaridade, porque faltava muito às aulas. “Foi por causa do RSI, por ter assistentes sociais que iam a minha casa, que [ainda assim] consegui continuar a estudar [até à maioridade]”, diz, recordando que cresceu sem acesso a computadores e telemóveis e que os livros eram uma presença rara. Já adulta, e contrariando o ambiente protegido em que tinha sido criada e as tentativas da família para que se casasse cedo, acabou por conseguir um emprego em televisão. “Tinha aprendido as bases da parte técnica na igreja que frequentava com a minha mãe. Faltava-me saber muita coisa, mas vontade não me faltava.”
Quem são os ciganos e o que fazem?
Atualmente, com 28 anos, e depois de uma licenciatura em ciências da comunicação, Vanessa Lopes está a fazer um mestrado em ciência política. Dá palestras e worshops sobre os ciganos “Tive de aprender sobre a nossa história”, assume, esclarecendo que, ao contrário do que ainda se pensa, os ciganos não vêm da Roménia, mas sim da Índia.
"Em Portugal, existe um problema de isolamento da própria comunidade que, durante muito tempo, foi nómada, não porque quis, mas porque existiam leis que assim o ditavam. A primeira é do tempo de D. João I e dizia que o cigano não se podia fixar num local por mais de 72 horas", afirma, acrescentando que, foi assim que, se foi dedicando cada vez mais a desconstruir, junto da população em geral, ideias erradas sobre quem são os ciganos e o que fazem. Ao mesmo tempo, foi também fazendo um trabalho de sensibilização, nas escolas e junto da comunidade, para a importância da educação.
Criou a associação Rizoma, que visa a integração dos ciganos na sociedade. “Estamos há mais de 500 anos em Portugal e somos considerados estrangeiros na própria terra”, afirma, explicando que um dos objetivos da organização é criar pontes com o mundo empresarial. “Não quero que me contratem porque sou cigana, mas se tivermos de começar por aí, para haver inclusão, porque não?”