Por Clara Viana e Graça Barbosa Ribeiro, in Jornal Público
Melhorar resultados na educação é a meta traçada por ex-governantes, mas para as associações de professores o futuro para lá do PISA é, por enquanto, nebuloso
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PartilharImprimirComentarEnviarDiminuirAumentarO Ministério da Educação confirmou ontem que, a partir do próximo ano lectivo, a disciplina de Estudo Acompanhado que, desde há quatro anos tem sido aproveitada para reforçar o ensino de matemática, passará a ser apenas para os "alunos que revelem necessidades de apoio e não para toda a turma como actualmente". Também ontem, o primeiro-ministro, José Sócrates, anunciou no Parlamento que, do horário semanal atribuído aquela disciplina, que só existe no 2.º e 3.º ciclo do ensino básico, "um tempo lectivo será obrigatoriamente alocado ao estudo da matemática".
Esta é uma das três medidas que o primeiro-ministro apresentou com o objectivo de melhorar aprendizagens e prosseguir o avanço registado pelos alunos portugueses de 15 anos no último estudo do PISA, o programa da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico que mede as capacidades dos estudantes daquela idade. Os resultados foram divulgados terça-feira. No rescaldo os professores apelaram a que não se voltasse atrás no reforço do ensino de matemática e língua portuguesa.
Segundo o Ministério da Educação prevê-se que o Estudo Acompanhado passe a ter dois tempos semanais. "Neste momento, a única coisa que existe por escrito é que o Estudo Acompanhado vai acabar. Afinal não vai? E, se continua a existir, é para todos ou apenas para os alunos com dificuldades?", pergunta Elsa Barbosa, presidente da Associação de Professores de Matemática, horas depois do anúncio de Sócrates.
Cortes e vontade política
O fim de Estudo Acompanhado e de Área de Projecto, com 90 minutos semanais que, em muitas escolas, estão também a ser ocupados por aulas de matemática e de língua portuguesa, encontrava-se previsto nas medidas que acompanham o orçamento de Estado para 2011. O Ministério confirmou que a área de projecto deixará de ter um tempo curricular próprio.
"Se as declarações do primeiro-ministro significam que o Estudo Acompanhado é reposto nos moldes em que existia, é positivo, mas não é novidade; e se é reposto mas se destina apenas aos alunos com dificuldades é muito negativo para os que ficam de fora", realça Paulo Feytor Pinto, presidente da Associação de Professores de Português.
Elsa Barbosa insiste que "tudo o que for retirar tempo à matemática será profundamente negativo". A professora lembra também que o tempo suplementar conseguido nos últimos anos "era utilizado para trabalhar a disciplina todos os alunos da turma e não apenas como alguns". Também Miguel Abreu, presidente da Sociedade Portuguesa de Matemática, considera-se "insuficientemente esclarecido" e espera, por isso, que do Governo chegue algo escrito. As horas dedicadas à matemática "terão de aumentar. Continuamos abaixo da média dos países da OCDE e ambicionamos mais do que isso", defende.
"É evidente que se se alterarem as condições em que as escolas apoiam os alunos com piores desempenhos, podemos estar a comprometer o pequeno salto verificado nos resultados do PISA", argumenta o investigador e ex-secretário de Estado da Educação, Joaquim Azevedo. Lembrando que estão previstos cortes de mais de 800 milhões de euros no orçamento do ME para 2001, adverte: " Ou compensamos com muita inteligência política e organizacional a redução da despesa ou não devemos esperar milagres lá onde eles não se semeiam".
Os três responsáveis das associações de professores escusaram-se a comentar outra das medidas anunciadas ontem por Sócrates: a criação de uma tutoria digital nas áreas do português, da matemática e das ciências, aproveitando "o potencial tecnológico ao dispor das escolas". Porque, esclarece Miguel Abreu, do projecto conhece-se "pouco mais ou nada que a designação". "Pode ser fantástico, pode ser péssimo e pode não ser uma coisa nem outra". A criação de um tutor virtual da matemática já se encontrava prevista no âmbito da chamada agenda digital, apresentada pelo Governo em Setembro passado.
Próximo teste em 2012
Para Joaquim Azevedo, a aposta no futuro passa claramente por "manter o rumo de melhoria da qualidade dos percursos escolares de todos os alunos, sem excepção. Esse é o único esforço que vale a pena manter firmemente". Outras medidas necessárias: "Temos de dar real autonomia curricular às escolas (a autonomia já foi decretada quatro vezes e ainda não passou do papel, 1989, 1992, 1998, 2007) e temos de responsabilizar e comprometer mais os professores, os alunos, os pais, as instituições sociais e as comunidades na melhoria da educação de todos os portugueses".
Olhando para o futuro, a ex-ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, a quem Sócrates atribuiu o mérito do salto de Portugal no PISA, considera "que o principal problema é a melhoria dos resultados", defende que "é preciso um conjunto muito mais vasto de medidas, com todos sintonizados", mas a ex-governante acredita que "é possível continuar [a subir na tabela da OCDE]". Frisa que é "nas escolas onde os resultados são piores que é preciso continuar a trabalhar".
David Justino, ex-ministro do PSD, adverte que "se não houver continuidade podemos voltar para trás".
Os próximos testes do PISA estão marcados para daqui a dois anos. Joaquim Azevedo deixa um aviso: "É preciso não esquecer que, daqui até 2012, os países que pioraram a sua situação relativa não vão ficar parados e que, por isso, podemos ter surpresas." com Bárbara Wong


