23.1.12

Programa inovador 'recuperou' 41 agressores

in Diário de Notícias

Um projeto inovador de reabilitação psicossocial de agressores em casos de violência doméstica lançado em Ponta Delgada, nos Açores, já envolveu 81 indivíduos, 41 dos quais terminaram e processo e não têm registo de reincidência.

"Desde 2009, foram sujeitos a avaliação 110 indivíduos, tendo 81 chegado a este projeto, dos quais 41 já acabaram o programa e ainda não há registo de reincidência", revelou Natércia Gaspar, diretora regional da Solidariedade e Segurança Social, em declarações à Lusa.

Natércia Gaspar salientou, no entanto, que nem todos os agressores reabilitados voltaram para casa, tendo alguns conseguido a reconciliação com as companheiras, enquanto outros estão a viver novas relações.

O programa CONTIGO consiste numa intervenção terapêutica junto do agressor, que frequenta sessões durante 18 semanas, onde "desmonta estereótipos e conceitos", como a posse e o ciúme, mas também analisa questões como a igualdade do género e a criminalidade da violência doméstica.

Este projeto, que envolve a Direcção Geral de Reinserção Social, o Ministério Público da Comarca Judicial de Ponta Delgada, a PSP e a equipa de Apoio Integrada à Mulher em Situação de Risco, decorre atualmente apenas na Comarca de Ponta Delgada, mas o executivo regional pretende alargá-lo a outras ilhas do arquipélago.

"É um programa inovador, conseguido por técnicos açorianos, que já mereceu referências de boas práticas de instituições europeias", frisou Natércia Gaspar, acrescentando que o CONTIGO também já "serviu de referência a nível nacional para experiências similares".

Apesar dos dados positivos deste projeto, a sua eficácia ao nível da reabilitação de agressores é questionada pela Associação para a Igualdade e Direitos das Mulheres (UMAR) nos Açores, que encara com "alguma relutância" aspetos deste programa.

"Em que medida um programa deste tipo pode estar a facilitar a manutenção destas situações e não a ir à raiz?. Até que ponto o facto de se estar a co-relacionar a vítima com o agressor, na recuperação deste, será benéfico?", questionou Clarisse Canha, da UMAR/Açores, em declarações à Lusa.

Para Clarisse Canha, a reabilitação deve centrar-se na "responsabilização do agressor", defendendo que deve "ser ele próprio a interiorizar-se disso e não apenas a mulher a perdoar".

Nesse sentido, considerou "importante haver intervenção com os agressores, mas no sentido de os responsabilizar pelos atos que cometem, trabalhar comportamentos, conceitos e práticas que os levam a praticar a violência contras mulheres, seja física, psicológica sexual".

No mesmo sentido, a psicóloga Raquel Fontes salientou que, "um programa onde a vítima é envolvida na recuperação do agressor está a fomentar o papel da mulher enquanto cuidadora em detrimento de si, acreditando que a relação pode resultar ou que o agressor irá mudar".

Nos gabinetes que tem abertos em Ponta Delgada e na Ribeira Grande, em S. Miguel, a UMAR realizou no ano passado 372 atendimentos psicossociais e jurídicos a 64 mulheres vítimas de violência doméstica.