15.6.23

Um chaço em contramão na autoestrada do futuro

Joana Petiz, opinião, in Dinheiro Vivo

As empresas são, e bem, as primeiras responsáveis pela criação de riqueza e de emprego no país. Dos 4,6 milhões de portugueses a trabalhar, apenas 741 mil são funcionários públicos - e vale a pena registar que entre estes a idade média está quatro anos acima da que se regista no privado, roçando já os 48 anos; idade média, repito. O Estado tem pouco lugar para jovens. E se o envelhecimento justifica um nível salarial superior no setor público (dados do INE), é no privado que se regista uma maior evolução nas remunerações, com o crescimento dos gastos com pessoal a subir perto de 9% em 2021 (últimos dados) e a força de trabalho das empresas a conseguir, apesar de tudo, um aumento de rendimento de 0,3% no ano da inflação galopante, enquanto os funcionários do Estado perderam poder de compra (-2,5%).

É também ao setor privado que se atribui quase todo o bolo do investimento feito num país em que os gastos públicos servem cada vez mais apenas para apagar os fogos provocados precisamente pela falta de investimento público (cujo peso caiu para metade do que era há uma década).

É ainda com as empresas que está a bandeira das correntes transformações profundas em que as economias europeias embarcaram, puxando pelo país quer na descarbonização quer no que respeita à transformação digital. E são elas que têm liderado os processos de inovação e os impulsos de formação profissional para que se adapte a crescentemente minguada força de trabalho portuguesa às exigências e desafios destes tempos.

Apesar de terem de mover montanhas burocráticas e constantemente integrar nas suas atividades os requisitos de leis pop up, as empresas portuguesas mantêm-se animadas e focadas no crescimento. E mesmo sabendo que isso significa sobrealimentar a voracidade de um Estado obeso, vão-se sujeitando ao assalto fiscal porque sabem que é fundamental subir salários, conseguir melhores negócios e resultados e percorrer mais quilómetros, mais depressa, na autoestrada da internacionalização. Mesmo partindo de trás na competitividade e sobrecarregadas de custos de contexto, as nossas empresas conseguem chegar muito longe. E pelo caminho vão lutando por manter a funcionar o elevador social cujas engrenagens estão cada vez mais enferrujadas pelo desgaste da falta de atenção pública.

Mesmo na educação e na saúde, à custa de sacrifícios e de seguros a população vai-se transferindo para soluções alternativas a um serviço público doente, contagiado pelo vírus ideológico. Em vez de empurrar quem quer chegar mais longe, na última década o Estado fez-se um imenso elefante branco, caro e bastante inútil.

Num país em que as políticas públicas são uma miragem esculpida a demagogia e incompetência, o Estado Social tem-se vindo a despir de responsabilidades, assumindo hoje quase nada mais do que o pagamento de pensões - a maioria delas miseráveis - e prestações sociais a quem não sobreviveria sem elas. O papel do próprio Estado, vem-se centrando na recolha de impostos que lhe permitam manter as suas funções - na Educação, na Saúde, na Previdência - ligadas às máquinas e atirar dinheiro para cima dos problemas que cria ou não resolve.

Não há projetos de fundo para mudar a realidade do país. Não há planeamento de reformas que retirem obstáculos do caminho das empresas e aliviem a vida das famílias. Não há medidas que promovam uma inversão da desgraça demográfica e do incentivo à fuga de talentos. Não há simplificação ou desoneração legal e fiscal. Não há capacidade de escutar para construir sobre bases firmes. Não há vontade de ser vento que encha as velas da livre iniciativa, da ambição, da criação de riqueza, da melhoria da produtividade, da garantia de condições capazes de levar Portugal ao caminho do sucesso. Não há investimento, não há aeroporto em Lisboa, não há ligação ferroviária competente à Europa, não há agilização de licenciamentos, não há atração de investimento.

E a culpa é de quem vai ao volante, um governo esvaziado de responsabilidade e de ímpeto reformista, sem capacidade (ou vontade) de negociar soluções para além dos ciclos eleitorais, que resultem num país melhor e mais preparado para o futuro que enfrenta. E que nos vai ceifando como um velho chaço em contramão na autoestrada em que devíamos estar a ganhar velocidade.