Maria João Guimarães Sofia Branco, in Jornal Público
A realização da presidência da UE é, para Portugal, um fardo pesado. Mas conta com uma equipa experiente, que está apostada no pragmatismo
No Pavilhão Atlântico, centro nevrálgico da presidência portuguesa, fazem-se obras e discutem-se pormenores. Há solicitações para decidir quais são as cadeiras e o estrado para a foto de família. Há mil e uma coisas para decidir e a máquina é ainda mais pesada numa União a 27 - que é quase a 30, porque os três países candidatos assistem a quase todas as reuniões.
O PÚBLICO falou com o coordenador para a estrutura de missão da presidência portuguesa, Jaime Leitão, com o coordenador para a segurança, Ismael Jorge, e com o coordenador para os media, Francisco Azevedo e Silva, que deram uma ideia da logística que trará a Portugal figuras destacadas da política europeia e internacional, entre os quais os presidentes francês, Nicolas Sarkozy, brasileiro, Lula da Silva, e sul-africano, Thabo Mbeki.
Na Sala Tejo do Pavilhão Atlântico, agora ocupada apenas por operários e pelo barulho dos berbequins, vão estar cerca de 50 mil pessoas, entre delegados, participantes e staff da organização, num corrupio constante, para uma média de duas reuniões por dia.
O gigantesco espaço está a ser dividido por três andares, todos ladeados por um vidro: uma ala de transparência, que permite observar o decurso dos trabalhos. Porém, nalgumas ocasiões, as cortinas poderão ser corridas.
A realização de uma presidência da União Europeia (UE) é, para um país da dimensão de Portugal, um fardo pesado e exigente. "Tudo tem de ser elencado. Há sempre mil e uma coisinhas em cada reunião. São coisas tão picuinhas que parecem evidências mas que é preciso ver", explica Francisco Azevedo e Silva, coordenador para os media. "Tudo são pormenores", remata Jaime Leitão.
"Estaremos sob escrutínio"
Mas esta já é a terceira experiência e, tanto no Palácio das Necessidades, sede do Ministério dos Negócios Estrangeiros, como no Palácio da Cova da Moura, quartel-general da estrutura de missão e da Secretaria de Estado dos Assuntos Europeus, há uma equipa calejada, que "fez" - como se diz no jargão dos corredores - as anteriores presidências portuguesas.
Apesar da rodagem da equipa, há sempre o receio de imprevistos. A presidência de 1992 foi marcada pela guerra nos Balcãs e a de 2000 teve que lidar com as sanções da UE contra a Áustria de Joerg Haider.
Por isso, "há uma espécie de radar, para detectar imprevistos", descreve o secretário de Estado para os Assuntos Europeus.
"Às vezes, mais difícil do que cumprir a agenda é lidar com aquilo que não estava previsto. Isso aconteceu com a presidência finlandesa, quando eclodiu a situação no Líbano", acrescenta Manuel Lobo Antunes, que tem no seu gabinete do Palácio da Cova da Moura um cartoon que mostra dois peixes: um pequeno - simbolizando a agenda -, que está prestes a ser comido por um enorme - a hidden agenda (agenda escondida).
Os responsáveis pela presidência portuguesa estão não só preocupados com a projecção externa do país - do qual querem dar uma imagem de modernidade -, mas também com a avaliação interna. "Sei que estaremos sob escrutínio, que as pessoas vão olhar para o programa da presidência portuguesa e vão pôr cruzinhas no que conseguiu e no que não conseguiu. Os sucessos não serão tão exultados e os insucessos serão muito sublinhados", antevê Lobo Antunes. O secretário de Estado arrisca-se a ter a sua performance apreciada por setas a subir ou a descer na imprensa nacional, por factores que, na verdade, não dependem só da presidência portuguesa.
"A favor do pragmatismo"
Mesmo no plano logístico, o planeamento é muito, mas há a consciência de que pode ser preciso sacrificar o ideal a favor do pragmatismo. "O que eu quero é que tudo corra bem. E correr bem quer dizer não correr mal", atira Jaime Leitão. Faz uma pausa, para passar a explicar: "Quando digo isto, parece uma verdade de La Palisse, mas no fundo o que quero dizer é que temos de ceder para que tudo corra bem".
Jaime Leitão dá um exemplo. "Imagine que eu quero todos os delegados a ir de eléctrico para o Castelo [de São Jorge, em Lisboa], porque é mais giro, mas pergunto aqui ao meu colega da segurança e ele diz-me que não", arrisca, perante o levantar de sobrolho do subintendente Ismael Jorge, que está sentado ao seu lado. "Não posso fazer o ideal, que era o que eu queria, e vão todos de carro para o Castelo. Mas correu bem, porque assim nenhum apanha com um balde de água de um manifestante", conclui.
A presidência de 1992 foi marcada pela guerra nos Balcãs e a de 2000 teve de lidar com as sanções da UE contra a Áustria