Por Clara Barata, em Budapeste, in Público on-line
Os húngaros procuram formas de se fazerem ouvir. As movimentações partem dos sindicatos, da Internet, de onde surgir uma ideia.
A embaixada da China fica nesta rua, Benczúr utca, a mesma onde as tropas soviéticas prenderam, no fim da II Guerra, o diplomata sueco Raoul Wallenberg, que ajudou a salvar milhares de judeus húngaros. Ainda nem são 8h da manhã, está a chover e caem uns farrapinhos de neve triste em Budapeste, mas o telemóvel de Tamás Székely não pára de tocar. Szekély lidera o Movimento Solidariedade húngaro, o Solidaritas, que pretende ser o grande chapéu-de-chuva para reunir a dividida oposição húngara.
Dirigente sindical - presidente da União dos Trabalhadores da Indústria Química -, Szekély faz questão de frisar que o Solidaritás "não é um sindicato", embora trabalhe com os sindicatos. Só aceitam membros individuais, mas trabalham com sindicatos. Em dois meses de existência, já estão em 200 locais, por todo o país, fora da capital onde tudo costuma concentrar-se: "Fizemos uma flashmob a 17 de Dezembro, para ver quantos somos e onde estamos", explicou.
"As pessoas perderam o interesse nos partidos. O movimento apareceu numa boa altura", diz Szekély. Este sindicalista poderá não ter o carisma de Lech Walesa, saído dos estaleiros de Gdansk para derrubar o regime comunista na Polónia à frente do Solidariedade. Mas é um dos líderes de um movimento que capitalizou a insatisfação os trabalhadores que viram o Governo de Viktor Orbán apropriar-se dos descontos que tinham feito para as suas reformas no sistema privado. "Soldados, polícia e bombeiros ganham muito mal. A única compensação é que se podiam reformar cedo. Mas agora nem isso lhes vale a pena", explica Szekély.
A arrogância do primeiro-ministro face a uma manifestação dos bombeiros - "Vou mandar o meu secretário de Estado dos palhaços" recebê-los, disse ele", recorda Skelély - foi um dos acontecimentos que ajudou a lançar as movimentações da sociedade civil. Muitos bombeiros compareceram mesmo vestidos de palhaços, e com narizes vermelhos.
A manifestação de 2 de Janeiro, frente à Ópera, onde o Governo comemorava a nova Constituição, foi o momento em que o mundo reparou nos protestos contra Viktor Orbán. Mas eles já existiam antes. "Os primeiros foram em 2010, por causa da lei dos media. Mas pensámos que não bastava fazer uma manifestação simpática de vez em quando", conta Janos Boris, um porta-voz do grupo Um Milhão de Húngaros pela Democracia, que tem uma página no Facebook.
Não são ainda um milhão, andam pelos 500, colaboram com o Solidariedade e preferem manter distância em relação aos partidos políticos. Gostam de usar o humor - promovem a eleição de qualquer um para Presidente da República - e co-organizaram a manifestação de 2 de Janeiro. Defendem a liberdade de expressão: "Foi-nos retirado o sentimento de segurança. É verdade que o Governo não nos pressiona - mas vemos como os media são manipulados."
"Estamos a promover debates sobre vários temas, saúde, educação, política social, para fazer um programa consistente, em que as pessoas possam votar. Para ir além da negatividade dos protestos", explica Boris, um tradutor, escritor e editor, fazendo referência aos 60% de húngaros que não conseguem votar em ninguém.
Querem tornar-se um partido político, então? "Alguns membros do grupo podem querer formar um partido mais tarde. Mas por agora o objectivo é unir os partidos da oposição." A ponte ideal, defende, é o Solidariedade, a que também pertence.
E o Solidaridade, quer ser um partido? "Nós não somos um partido", assegura Skelély. "Os partidos democráticos não estão a conseguir contactar bem uns com os outros e o Solidariedade pode ser uma boa ponte entre eles."


