22.3.16

As ambiguidades e reticências da Declaração dos Direitos Humanos

In "Diário de Viseu"

Em muitos pontos importantes a Declaração limita-se a remeter para a “leis” que cada Estado emanará para pôr disciplina em assuntos que não foram devidamente tratados no texto internacional.

Deste ponto de vista, o Artigo 29 (artigo de extrema importância porque indica quais são as limitações dos Direitos Humanos), é o que mais deixa transparecer dúvidas quanto ao seu conteúdo. Ao referir quais as limitações afirma que estas devem estar “determinadas pela lei” e logo a seguir fala da “moral”, e da “ordem pública”, “do bem-estar geral da sociedade democrática”, etc. É evidente que se trata de conceitos muito vagos, que só poderão ser definidos concretamente pelas leis nacionais: desta forma será a legislação de cada Estado a tomar a última decisão.
Mas mais perigosas do que as ambiguidades são as frases genéricas existentes na Declaração.

No Artigo 28º, por exemplo, é enunciado um direito de forma bastante obscura, «toda a pessoa tem direito a que reine, no plano social e no plano internacional, uma ordem capaz de tornar plenamente efetivos os direitos e as liberdades enunciadas na presente Declaração». Mas, como deverá ser a “ordem social” propícia ao cumprimento dos Direitos Humanos? O que se entende por “ordem internacional”? E sobretudo, em que condições poderá favorecer a referida ”ordem” na observância dos Direitos Humanos? Como estas existem muitas outras perguntas em relação às dúvidas suscitadas pelo vocabulário utilizado, que para além das dúvidas permite que muitos Estados continuem a exercer violações dos Direitos mais essenciais do ser humano sem que nada possa desenvolvido contra eles.

A Declaração é um documento cada vez mais imprescindível na nossa sociedade, contudo muitos são aqueles que lutam pelo “reajuste” de certos pormenores que podem ter uma influência vital na vida de milhões de pessoas.

A proteção dos Direitos Humanos não se consegue num único dia, nem num ano: requer um lapso de tempo alargado. Os Direitos Humanos atuam lentamente e mediante a contribuição de milhares de pessoas, de organizações não-governamentais e dos Estados. Trata-se de um processo que não é linear, e que é constantemente interrompido por recaída, regresso à barbárie, regressões e largos silêncios.
Esta necessidade de tempo prolongado não deve, no entanto, surpreender-nos. Porque tal como a religião, os Direitos Humanos necessitam de muitos anos para se expandirem, ”tropeçam” em obstáculos, mas acabam sempre por dominar a mente e condicionar o comportamento dos homens e até mesmo os Estados. É uma luta que necessita de um grande exército. Um exército constituído por povos, pessoas que intervenham de inúmeras maneiras, em diversos níveis, com uma paciente ação quotidiana. Todos devemos querer fazer parte desse exército...
| Vítor Santos Técnico Superior do Instituto Politécnico de Viseu As ambiguidades e reticências da Declaração dos Direitos Humanos