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13.7.22

Quando se falha na gestão chamamos-lhe "fogo"

Rosália Amorim, in DN

As temperaturas estão altas e não há como negar essa realidade. As alterações climáticas vão agudizando o modo como vivemos no planeta e exigem uma nova forma de gestão da floresta, dos meios, da água e da política também. O primeiro-ministro já apelou à responsabilidade de cada um e recorda que só há um fogo "com mão humana". Todos ouvimos ontem essas palavras de António Costa com a devida cautela e responsabilidade, mas todos sabemos também que, a cada ano que passa, é sempre a mesma coisa e o que parece - e por vezes o que parece é - é que o país nunca está devidamente preparado para combater os grandes incêndios.

O mecanismo europeu de Proteção Civil já foi ativado. Mais de 80 concelhos de dez distritos do continente já estavam ontem com risco máximo de incêndio e hoje a situação pode piorar face às previsões meteorológicas que indicam temperaturas recorde em todo o território. Ontem registavam-se já 30 incêndios, mas estavam controlados à hora de fecho desta edição.

Xavier Viegas, especialista em fogos florestais, está alarmado com um país que vive o maior perigo dos últimos 40 anos. As temperaturas vão ser cada vez mais altas, dizem os especialistas em clima. Podem chegar aos 48 graus, admitem alguns. Portanto, habituem-se! Esta semana vamos enfrentar uma sequência de dias adversos, ao nível daquele que fez atear os incêndios de Pedrógão. No terreno já estão 1500 profissionais de combate, mas podem não chegar. De futuro vai ser preciso mais do que contar homens e carros de combate, vai ser preciso fazer uma melhor gestão e é aí, precisamente, que temos falhado enquanto país.

Se aos bombeiros e Proteção Civil é exigida prontidão máxima, ao Serviço Nacional de Saúde também. Depois da pandemia, os incêndios voltam a ser uma preocupação para os hospitais nacionais. Apesar do corpo clínico estar sempre a postos para dar resposta a situações críticas, as equipas que trabalham nos Serviços de Saúde estão cansadas, depauperadas e os Serviços de Urgências vivem o caos. Se lidar com altas temperaturas é um desafio para os Soldados da Paz, também o é para os soldados de bata branca que, de estetoscópio ao peito, continuam tantas vezes a fazer milagres perante os efeitos da devastação das chamas. Mas, mais uma vez, sem boa gestão não há bons serviços.

23.8.21

Costa admite baixa de IRS e aumento “significativo” do abono de família no OE2022

in Ecoonline

Governo admite que está a trabalhar nas alterações aos abonos de família e IRS “numa prioridade clara que é o combate à pobreza infantil”.

António Costa admite rever os escalões de IRS, de forma a subir o rendimento da classe média, e pretende um aumento “significativo” do abono de família no próximo Orçamento de Estado para 2022.

Em entrevista ao Expresso, António Costa explica que o Governo está a trabalhar nas alterações aos abonos de família e IRS “numa prioridade clara que é o combate à pobreza infantil”.

Sobre a mexida no IRS, com a criação de mais escalões de forma a aumentar o rendimento da classe média, o governante apontou que essa medida “está inscrita no programa do Governo”.

“É uma matéria sobre a qual não só estamos a estudar, como estamos a conversar com os nossos parceiros e temos de medir se e como”, sublinhou.

Questionado se a medida é aplicada já em 2022, António Costa referiu que o Governo está “a medir”.

“Se me disser que vamos adotar uma única medida, posso escolher se vou mexer nos escalões, se vou aumentar as deduções para todas as crianças… Se me disser que ambas são necessárias, então tenho de compatibilizar o quadro orçamental”, apontou.

"É uma matéria [mexidas no IRS] sobre a qual não só estamos a estudar, como estamos a conversar com os nossos parceiros e temos de medir se e como.”

“Está consolidada que, com uma inflação prevista de 0,8%, todos os ministérios terão um aumento do seu orçamento em pelo menos 1,2% e depois há um conjunto de ministérios que têm um aumento superior a 1,2%: Ciência, Educação, Saúde, Administração Interna e Cultura”, acrescentou.

António Costa referiu ainda, questionado sobre a possibilidade de aumentar ou mudar o abono de família, que pretende que haja “aumento significativo relativamente às prestações para as famílias com crianças, em particular a partir do segundo filho”.

“Sabemos a grande dificuldade com que muitas das famílias têm passado do primeiro ao segundo filho e isso tem a ver com os seus rendimentos. Temos de continuar a investir no aumento do rendimento disponível que implica, por um lado, uma política salarial por parte das empresas, por outro, transferências não monetárias por parte do Estado, com bom investimento na educação, no pré-escolar, nas creches, na mobilidade acessível e na habitação a custos acessíveis. Mas também transferências monetárias, designadamente nos abonos de família”, frisou.

Na entrevista do Expresso, António Costa aborda ainda a manutenção em 2022 do lay-off simplificado e medidas de apoio urgente.

“O lay-off normal existe desde 1980. Quanto ao simplificado, não vamos retirar nenhuma medida extemporaneamente. Vamos manter as medidas e elas serão utilizadas ou não consoante as necessidades. Progressivamente, tem vindo a haver menos utilização dessas medidas”, vincou.

“A rede de segurança é fundamental que exista, porque a nossa ideia desde o início foi que esta crise [devida à pandemia de Covid-19] tem uma natureza conjuntural, só não sabemos quanto tempo dura”, explicou.

Costa realçou ainda que é necessário “manter os apoios às empresas, o apoio aos rendimentos dos que trabalham, aos que perderam o emprego e os que dependem de prestações sociais” admitindo que as medidas em vigor “podem ser modeladas”.

16.8.17

"Um primeiro-ministro que foi vendedor de chá deu voz a milhões de jovens indianos"

Leonídio Paulo Ferreira, in Diário de Notícias

O português Constantino Xavier é investigador no Carnegie Índia, parte do Carnegie Endowment for International Peace, um think tank global, presente em mais de 20 países e criado no início do século XX através da doação de um magnata americano. Doutorado pela Johns Hopkins University, nos Estados Unidos, Xavier tem estudado sobretudo a política externa indiana e a relação com os países vizinhos. Nesta entrevista por e-mail ao DN a partir de Nova Deli, mostra-se otimista com o futuro da Índia, que hoje celebra os 70 anos de independência.

Jawaharlal Nehru e o Mahatma Gandhi reconhecer-se-iam nesta Índia que tem a economia a crescer a 7% graças a reformas capitalistas, possui armas nucleares e é governada por Narendra Modi, líder de um partido nacionalista hindu?

Nehru e Gandhi não se reconheciam na Índia de 1947, nem Modi se reconhece na Índia de hoje. O país enfrenta imensos desafios e é a visão de uma Índia mais confiante, desenvolvida e poderosa que continua a guiar qualquer líder do país. Com Modi, aumentou a vontade de assumir riscos, de abraçar reformas cruciais no plano social, económico e militar, mas os objetivos são os mesmos: tornar a Índia um país desenvolvido, eliminando a pobreza.

O fracasso do Congresso nas últimas eleições significa uma derrota da ideia de Índia laica ou simplesmente o esgotamento da dinastia dos Nehru-Gandhi como líderes do partido que conduziu o país à independência faz agora 70 anos?

Representa, acima de tudo, a vontade do eleitorado jovem em ver um líder que representa uma nova Índia, jovem e confiante. Um primeiro-ministro que foi vendedor de chá, vindo de meios simples, deu voz aos milhões de jovens indianos que aspiram a ter uma oportunidade semelhante, de ascensão social e económica.

Com 1250 milhões de habitantes, a chamada maior democracia do mundo merece mesmo o título apesar do peso político das dinastias, dos partidos de casta ou regionais, do voto ordenado por caciques locais?

A Índia não só é a maior democracia do mundo, em dimensão, mas também o principal modelo para todos os países que procuram o desenvolvimento por via do pluralismo. O facto de, ao contrário da União Soviética, a Índia ter sobrevivido como projeto político apesar da sua imensa diversidade, reflete um imenso sucesso. A imensa maioria parlamentar do BJP acalmou a ansiedade do eleitorado em relação à instabilidade governamental que o país atravessava desde os anos 1990, com constantes mudanças de coligação. Por outro lado, há o perigo de a liderança carismática, a maioria esmagadora, e políticas centralizadoras se transformarem rapidamente em tendências autoritárias.

A grande diferença da Índia para o Paquistão, também nascido há 70 anos, é a ausência das forças armadas da política?

O cariz apolítico e apartidário das forças armadas indianas é um modelo para muitos países. Mas as diferenças para com o Paquistão também passam pela natureza laica do regime indiano, e pela capacidade agregadora do Estado. Ao contrário do Paquistão, em que as minorias têm emigrado em massa perante a rápida islamização do país, na Índia as minorias continuam a sentir-se seguras, pese embora ocasionais ameaças de grupos mais extremistas. Não é por acaso que a Índia continua a ser o único país da Ásia do Sul a atrair refugiados e minorias perseguidas de toda a vizinhança, com uma política de portas abertas, incluindo para os budistas tibetanos, os hindus do Bangladesh, e os rohingya muçulmanos do Myanmar.

Crê possível a paz entre indianos e paquistaneses ou a disputa sobre a soberania de Caxemira impossibilita-o?

A paz é já uma realidade porque tanto o Paquistão como a Índia sabem que será impossível alterar o status quo da fronteira provisória que separa a Caxemira. Ambos os países vão continuar oficialmente a reivindicar o território do outro, mas na prática assistiremos, mais cedo ou mais tarde, à partilha pacífica de Caxemira. A grande diferença é que, ao contrário da Índia, o Paquistão continua a apoiar grupos terroristas como instrumento de pressão sobre a Índia.

A Índia está a caminho de ser uma grande economia e grande potência. Acha possível que seja um dia parte de um triunvirato de superpotências junto com Estados Unidos e China?

O pensamento em Nova Deli hoje é menos como tornar a Índia numa superpotência mas como enfrentar um duplo desafio no horizonte imediato. Primeiro, como lidar com o declínio relativo dos EUA - acelerado com a eleição de Donald Trump - e dar continuidade a mais de quinze anos de aproximação estratégica indo-americana. Segundo, e de forma complementar, como lidar com uma China em ascensão, mais poderosa e agressiva para com os seus vizinhos, seja no mar do Sul da China ou ao longo da fronteira disputada com a Índia nos Himalaias. A questão fundamental estratégica indiana deixou de ser se a China é uma ameaça e passou a ser como lidar com a ameaça China.

Literatura, gastronomia, filosofia. Quanto vale o soft power indiano?

Vale o que o governo indiano for capaz de investir nele e assim transformar a imagem benigna da Índia em capital de influência no estrangeiro. Os chineses têm sido mais inteligentes nesse campo, e também com mais capacidade financeira. Se a Índia ficar simplesmente à espera que o mundo reconheça a sua extraordinária riqueza e diversidade cultural, pode ficar à espera sentada. De pouco vale a estrela de Bollywood Shah Rukh Khan se os europeus continuarem a aprender mandarim e a comprar produtos chineses.

O novo presidente indiano, Ram Nath Kovind, é um dalit, mas mesmo assim será prematuro dizer que as castas deixaram de importar na Índia?

As castas importam mais do que nunca na Índia, com um sistema político e educacional baseado nas quotas preferenciais para os grupos tradicionalmente mais discriminados. Isto leva a tensões entre os que defendem o interesse nacional, a longo termo, com critérios meritocráticos, e os que advogam maior intervenção estatal para estabelecer maior igualdade socioeconómica. Os empresários e empreendedores capitalistas tendem a defender a primeira abordagem, argumentando que o crescimento não pode estar preso a condições e critérios extra-económicos.

Qual o lugar de muçulmanos, cristãos e sikhs na Índia?

A Índia é o país com a segunda maior população muçulmana do mundo. Há quase três vezes mais cristãos na Índia do que em Portugal. Os sikhs são reconhecidos como um dos grupos mais empreendedores e dinâmicos. Mas há correntes ideológicas que defendem um lugar especial para o hinduísmo na Índia, e que nesse sentido advogam políticas discriminatórias para as minorias religiosas. Conter essa linha nacionalista hindu será um dos principais desafios para Modi que tem repetidamente sublinhado que a Índia é um país com uma constituição secular e que preza a não violência.

Como vê o futuro de Goa? Legado português sobrevive ou está condenado a desaparecer?

O desafio para Lisboa não é tanto preservar o legado português em Goa, e um pouco por toda a Índia, mas renová-lo. As relações luso-indianas são ciclicamente minadas por correntes extremistas, entre saudosistas nostálgicos do regime colonial, por um lado, e antiportugueses primários, do outro. Para além de Fátima, fado e futebol, há um outro Portugal que começa agora a emergir na Índia, com uma imagem moderna passada por via de empreendedores nas artes e restauração, ou por via do cinema Bollywood.

Narendra Modi e António Costa parecem ter boa química, até pela troca de visitas recente a Nova Deli e a Lisboa. Portugal poderá beneficiar com uma nova relação com a Índia sem os empecilhos das memórias coloniais?

Portugal já está a beneficiar da nova abordagem indiana. Para além de Goa, são agora Nova Deli, Bombaim e Lisboa os alicerces da nova relação entre os dois países. É uma relação que ultrapassa o plano estritamente bilateral e foca também a importância de parcerias estratégicas em países terceiros, especialmente no mundo lusófono. Do lado indiano, há grande interesse em ver Portugal como um parceiro em Moçambique ou no Brasil.

Posso lhe pedir que sugira um livro, mesmo que só exista em inglês, que permita perceber melhor o que é esta nação-civilização Índia, que historicamente inclui Paquistão, Bangladesh, Sri Lanka e Nepal?

The Idea of India, de Sunil Khilnani, capta bem a visão dos fundadores da Índia, em 1947, especialmente de Nehru. Serve de referência para perceber as linhas de continuidade e mudança com Modi.

Como imagina a Índia quando celebrar o centenário em 2047?

Teremos uma de duas Índias. Uma Índia com contínuas dificuldades económicas, subjugada perante uma China superpotência, e à procura de alianças pontuais com os EUA e outras potências para garantir alguma autonomia de Pequim. Ou uma Índia com níveis de desenvolvimento semelhantes aos do Portugal de hoje, um dos dois ou três centros de um sistema multipolar, ao nível da China e dos EUA e, acima de tudo, um modelo para outros países em África e na Ásia.