18.7.09

Intelectuais lançam manifesto com "questões prementes" destinadas aos partidos políticos

Maria José Oliveira, in Jornal Público

Um grupo de 14 intelectuais, que se assumem como independentes, desafiam partidos a credibilizar debate de ideias nas campanhas eleitorais


Um grupo de 14 cidadãos, "insatisfeitos com os conteúdos e a qualidade do debate político partidário", pretende lançar para a discussão partidária que antecede as eleições legislativas e autárquicas uma "agenda de prioridades" que vão desde o processo de integração europeia às Forças Armadas, passando pelas políticas sociais, justiça, educação, cultura e ambiente.

As propostas estão reunidas no manifesto O nosso presente e o nosso futuro: algumas questões prementes, um documento de 27 páginas em que é feito um diagnóstico da situação actual de cada área, acompanhado por propostas e perguntas dirigidas aos partidos com assento parlamentar. Durante esta semana, esta "agenda de prioridades para a política pública" será entregue a todos os partidos políticos, avançou ao PÚBLICO Viriato Soromenho Marques, conselheiro de Durão Barroso para a Energia e alterações climáticas e um dos autores do documento. Um dos propósitos do manifesto reside precisamente na tentativa de ampliar a temática em discussão nas campanhas, procurando ultrapassar as "receitas já conhecidas" e permitindo uma abertura ampla à participação da sociedade civil. Soromenho Marques afirma ainda que "seria muito positivo" que as propostas elencadas no manifesto contribuíssem para a elaboração dos programas eleitorais de cada partido.

"Excessiva fulanização"


Os 14 redactores do documento provêem de diversas áreas (economia, universidade e cultura) e assumem-se como independentes. São eles: Ana Luísa Amaral, Ana Maria Pereirinha, António Pinto Ribeiro, Clara Macedo Cabral, Isabel Allegro de Magalhães, Isabel Hub Faria, Jean Barrocas, Joana Rigatto, João Ferreira do Amaral, João Sedas Nunes, Laura Ferreira dos Santos, Luís Filipe Rocha, Luís Moita, Luís Mourão, Margarida Gil, Maria do Céu Tostão, Maria Eduarda Gonçalves, Maria Helena Mira Mateus, Maria Manuela Silva, Mário Murteira, Mário Ruivo, Miguel Caetano, Philipp Barnstorf, Teresa Pizarro Beleza e Soromenho Marques.

A ideia do manifesto (acessível no site cidadaosdebatempolitica.net) partiu de duas constatações: a cidadania não se esgota nos partidos; e a "excessiva fulanização" da política nacional. Que, explica Soromenho Marques, é já verificável neste período de pré-campanha, em que "não parecem estar em causa as eleições para o Parlamento, mas a escolha de um primeiro-ministro a partir de duas figuras [José Sócrates e Manuela Ferreira Leite]".

O debate (ou a falta dele) na campanha para as eleições europeias foi determinante para a elaboração do documento, afirma o professor universitário, notando ainda que "nos últimos anos assistiu-se a um esbatimento ideológico". Esta "corrida para o centro" do PS e do PSD foi tanto mais grave, sustenta, porquanto subsiste no "discurso oficial dos dois principais partidos a ideia falsa de que o esbatimento ideológico dispensa o debate de ideias".

Um dos propósitos do texto consiste, por isso, na tentativa de interpelar os partidos com quatro dezenas de questões concretas que pressupõem escolhas "distintas e até antagónicas". "Esta não é uma iniciativa que pretenda subestimar o papel e a relevância dos partidos políticos na vida democrática", pode ler-se no manifesto.
A menos de dois meses para o arranque da campanha para as legislativas, os promotores acreditam que a receptividade dos partidos poderá ser "sistémica": "Se um ou dois [partidos] adoptarem uma atitude construtiva e suscitarem o debate com alguns dos autores do manifesto, isso já vai ser positivo e provocar alguma reacção", diz Soromenho Marques.

O manifesto inclui críticas às políticas do Governo socialista, embora Soromenho Marques aponte que a intenção não foi "destacar" a acção do executivo. Mas há apreciações negativas implícitas às reacções do Governo perante as manifestações. O académico admite que "na educação atingiu-se um ponto muito baixo" e que a contestação dos professores foi lida pelo Governo como "uma reacção corporativa", o que "não deve ser feito".