14.7.09

Nova lei dos estrangeiros tirou 53 mil brasileiros e ucranianos da clandestinidade

Ana Cristina Pereira, in Jornal Público

Muitos saíram da clandestinidade, mas a população estrangeira só cresceu um por cento. O ano passado, havia 440.277 indivíduos com permanência regular em Portugal - mais 4541 do que em 2007, de acordo com o relatório ontem divulgado pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF).

Não é ilusória a sensação de que o sotaque brasileiro alastrou. Os brasileiros com permanência regular passaram de 66.354 em 2007 para 106.961 em 2008: "O fenómeno vinha a desenhar-se desde o início do presente século, através de um crescimento forte e contínuo desta comunidade."

A Ucrânia ascendeu ao segundo lugar, com 52.495 residentes (no ano anterior somava 39.480). Cabo Verde, que em 2007 fora ultrapassado pelo Brasil, recuou para o terceiro lugar, com 51.352 (no ano anterior contava 63.925). Outra subida "expressiva" é a protagonizada pela Roménia, que passou de 19.155 para 63.925 e se tornou o país da União Europeia com mais cidadãos residentes em Portugal (lugar tradicional do Reino Unido).

O que aconteceu? O relatório olha 2007 como "um ano de transição" e 2008 como o "ano zero de uma nova etapa nos ciclos migratórios em Portugal" - por força das mudanças impulsionadas pela alteração da metodologia estatística (agora mais fiável) e pela plena aplicação da nova lei de estrangeiros (23/2007).

O que pesou mais? As disposições legais que convertem "todos os tipos de vistos de longa duração e autorização de permanência em autorização de residência". E, claro, "a emissão de autorizações de residência ao abrigo do regime excepcional previsto no artigo 88". Com a nova redacção do artigo relativo a autorização de residência para exercício de actividade profissional subordinada, deixou de ser obrigatório ter um contrato registado na Inspecção-Geral de Trabalho. Basta ter uma relação laboral comprovada por sindicato, por associação com assento no Conselho Consultivo ou pela Inspecção-Geral do Trabalho.

Nacionalidades subavaliadas
Os brasileiros, os ucranianos, os moldavos (eram 14.053 e são 21.141) e outros estrangeiros estão a sair da clandestinidade. Cabe perguntar o que está a acontecer aos cabo-verdianos, aos angolanos (que em 2007 eram 32.728 e o ano passado eram 27.619) e a outros estrangeiros que parecem ter-se esfumado. O documento admite que havia subavaliação das nacionalidades de fluxo recente (como Brasil, Ucrânia, Roménia, Moldávia) e sobrestimativa de comunidades consolidadas (como Cabo Verde, Angola, Guiné-Bissau, Reino Unido, Espanha). Há, porém, pelo menos mais duas explicações para este rearranjo: as saídas do território nacional motivadas pela crise económica e financeira e a nova lei da nacionalidade, que fez disparar as candidaturas.

O ano passado, o SEF emitiu 39.652 pareceres favoráveis à aquisição de nacionalidade. No ano anterior, emitira 8958. Subiram os pedidos de estrangeiros já nascidos em Portugal. E os de estrangeiros residentes em Portugal há pelo menos seis anos, que conhecem a língua e não foram condenados por crime punível com pena de prisão de três ou mais anos.

A tabela de pedidos é esclarecedora: Cabo Verde (9926), Brasil (8391), Guiné-Bissau (4589), Angola (4463), República Moldava (4449), São Tomé e Príncipe (2193), Ucrânia (1567), Guiné-Conacri (838), Índia (1412), Federação Russa (836), Bangladesh (562), Moçambique (483), Roménia (480), Marrocos (374), China (351), Paquistão (288) e Senegal (180).

Os estrangeiros vivem em todo o território. Todavia, tal como os portugueses, preferem a zona litoral. Olhando o mapa nacional, destacam-se Lisboa (182.319), Faro (72.165) e Setúbal (48.529), "áreas onde se concentra parte significativa da actividade económica nacional".