Cristina Pereira, in Jornal de Notícias
Associação Cais distribui dez mil pães por dia até quinta-feira no Martim Moniz.
No centro da praça do Martim Moniz, em Lisboa, está montada uma enorme tenda branca. É lá dentro que se confeccionam cerca de dez mil pães por dia, para serem oferecidos a todo aquele que lá for pedir.
Apresenta-se como um evento que reivindica direitos básicos. "Quando falamos de pão, também falamos de habitação, saúde ou educação, a que todos deviam ter acesso", defende Henrique Pinto, director da Associação Cais, promotora da iniciativa "Pão de todos, para todos". Trata-se de uma manifestação sociocultural e política, que se prolonga até à próxima quinta-feira.
"Isto não é um evento só para quem é pobre ou vive com fome", afirma Henrique Pinto ao JN, explicando que "é um evento aberto a toda a gente, às crianças, aos idosos e até aos turistas". "Não é só uma festa da Cais para os seus pobres, é uma festa para toda gente", reforça. O objectivo passa por "celebrar o pão e os seus valores intrínsecos, como a gratuidade, a partilha, a fraternidade e a união".
Qualquer transeunte pode ir lá pedir pão, um chocolate quente ou um sumo. Não paga rigorosamente nada. E tem muito por onde escolher. "Estamos a fazer pão com muitos produtos, como doces, chouriços, queijos, manteigas, sultanas ou miolo de noz", assevera Henrique Pinto, esclarecendo que a iniciativa "não pretende ser um jantar de Natal, porque nem sequer temos aqui bacalhau e batatas".
"O que entra aqui, entra oferecido e sai oferecido", frisa, sublinhado que "não fazemos cobrança e também não estamos a fazer uma angariação de fundos".
Para montar esta iniciativa, foi necessário conjugar vários esforços. "Temos aqui um volume de 300 voluntários", refere o responsável, tecendo elogios a todas as empresas que apoiam e enaltecendo, também, "o apoio generoso" da Câmara Municipal de Lisboa, que se encarregou dos aspectos logísticos.
A iniciativa não se limita apenas à oferta de pão ao povo. Todos os dias há uma programação cultural (ler caixa) pronta a ser igualmente degustada: concertos, workshops, peças de teatro, exposições e projecções de filmes.
Na sexta-feira passada, por exemplo, o afamado cantor Toy esteve lá a dar alegrias ao povo. Henrique Pinto elogia todos os artistas que se mostraram disponíveis para participar no "Pão de todos, para todos". "A participação dos artistas é toda ela generosa, porque eles vêm aqui cantar a custo zero", refere.
Entre muitos outros nomes, figura o de Mafalda Arnauth, cuja actuação estava marcada para ontem à noite. O director da Cais fez questão de destacar a presença da fadista, "que tem sido desde há uns anos para cá uma grande companhia e tem feito uma colaboração notória com a Cais".
Hoje, pelas 19 horas, espera-se a presença da Roda de Choro de Lisboa e, mais tarde, pelas 21 horas, haverá festa com os djs PP & Karaoke.
O dirigente da Cais revela ao JN que a sua associação pretende propor, já para 2010, a criação de um "Dia da não cobrança". "Seria um dia em que os portugueses e as portuguesas não cobrassem nada a ninguém", explica Henrique Pinto. Na sua óptica, a celebração desse dia visa combater um certo espírito individualista e egoísta que paira na sociedade. "Vivemos todos pelos interesses de cada um, vamos fazendo coisas porque nos interessam, vamos tendo amigos porque nos interessa tê-los e, muitas vezes, as amizades são ambíguas e pouco verdadeiras", comenta.
Para combater esta atitude, Henrique Pinto propõe "um dia mais verdadeiro, em que as pessoas dissessem: hoje não cobro nada a ninguém e dou e sou o que tenho". Trata-se, diz, de "um apelo à gratuidade de todos. É preciso que tenhamos esta generosidade uns com os outros".


