26.1.18

Eslováquia anuncia lei para combater criminalidade em localidades com ciganos

in Diário de Notícias

O Governo eslovaco anunciou hoje um regime legislativo para combater a criminalidade em localidades com alta presença de ciganos e que pretende, entre outras medidas polémicas, criar uma base de dados em função da origem étnica dos infratores.

O projeto de lei, intitulado "Lei para a repressão da criminalidade nas localidades ciganas", foi revelado pelo ministro do Interior, o social-democrata Robert Kalinak, em Krompachy, em comunicação ao ar livre, numa comunidade cigana.

Robert Kalinak adiantou que a iniciativa legislativa modificará leis já existentes, para introduzir medidas como o registo de delinquentes por critérios étnicos, criar patrulhas civis de vigilância, atribuir mais competências à Polícia e proibir a certas pessoas a residência em determinadas áreas.

"Não se pode aceitar nenhuma lei que diferencia os delinquentes pela sua origem étnica", assinalou o responsável do Governo eslovaco pela comunidade cigana, Abel Ravasz, membro do Most-Hid, o partido da minoria húngara que integra a coligação tripartida governamental.

Ravasz denunciou que o projeto pode suscitar uma violação dos direitos humanos fundamentais e ser discriminatório, pelo que advertiu que a recolha de elementos estatísticos por etnia não acrescenta nada à ordem pública.
O responsável pela comunidade cigana no Executivo da Eslováquia revelou ainda que o departamento que superintende não foi contactado pelo Ministério do Interior para a redação do novo dispositivo legal.

Também o Centro Europeu de Direitos para os Ciganos, com sede em Budapeste, capital da Hungria, considerou que o novo regime legal pode "ser inconstitucional".

"É uma questão de proteção de dados e do direito à privacidade", explicou à agência Efe o advogado Michel Zalesak, acrescentando que "não se vai resolver nada compilando dados étnicos de criminosos".

Zalesak sustentou que "não há uma necessidade desses dados, porque a prática de crimes não está relacionada com a etnia", podendo "estar relacionado a certas situações sociais que devem ser abordadas.

"O ministro (do Interior) disse que 70% dos crimes são cometidos pelos ciganos. Não tenho ideia de como chegou a esta percentagem. É uma alegação ridícula", disse, afirmando que o projeto de lei incluirá emendas à Lei do Corpo de Polícia, à Lei das Infrações, ao Código Penal e à legislação social e sanitária.

O Centro Europeu de Direitos para os Ciganos anunciou que há anos que reúne provas para apresentar Kalinak perante a Justiça pelo que considera de "políticas discriminatórias levadas a cabo pela Polícia contra os ciganos, nos últimos anos".

Como refere a Efe, o ministro não descartou também uma emenda constitucional que condiciona a atribuição de subsídios sociais para que os pais enviem os filhos para a escola ou para velarem pela sua saúde.
A ministra da Justiça, Lucia Zitnanskam, disse que as leis devem aplicar-se a todos os cidadãos e não a "comunidades ou grupos étnicos específicos".

"É muito fácil incitar à tensão na sociedade mediante distintas leis populistas e atalhos, porém é muito difícil acalmar a sociedade" disse a governante, igualmente do Most-Hid.

Vários políticos e analistas opinaram que, com esta medida, Kalinak só está a desviar a atenção e a pressão política que existe sobre o ministro, que, em dezembro, superou uma moção de censura.

A vice-presidente do parlamento eslovaco, Lucie Duris Nicholsonová, acusou o ministro do Interior de jogar "a carta dos ciganos" para salvar a carreira política.


O ministro do Interior disse hoje aos jornalistas que espera levar a lei a debate no parlamento em meados deste ano.

Estima-se que a população cigana na Eslováquia ascenda a 400.000 pessoas, quase 7% da população no país.

Os ciganos estão concentrados no leste do país, em comunidades isoladas do resto da população e frequentemente sem condições de salubridade.