Mostrar mensagens com a etiqueta Hepatite C. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Hepatite C. Mostrar todas as mensagens

29.7.16

Mais de três mil doentes de hepatite C curados. É “a medicina da felicidade”

Alexandra Campos, in Público on-line

Portugal tem neste momento "duas das melhores coisas do mundo": o acesso generalizado aos fármacos inovadores para a hepatite C e os transplantes de fígado que chegam a 250 pessoas por ano, realça médico. Esta quinta-feira é Dia Mundial da Hepatite.

Num ano e meio, dos perto de oito mil doentes que iniciaram tratamento com medicamentos inovadores para a hepatite C em Portugal, mais de três mil estão oficialmente curados. “É a medicina da felicidade”, sintetiza Rui Tato Marinho, hepatologista e vice-presidente da Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia que, desde 1989, ano em que o vírus foi identificado e surgiu o teste de diagnóstico, tratou centenas de doentes, encaminhou vários para transplante de fígado, deu muitas más notícias mas agora já se habituou à sensação única de poder dizer: “Está curado”.

“Portugal tem neste momento duas das melhores coisas do mundo: toda a gente tem acesso ao tratamento, mesmo sem ter doença grave, e o transplante de fígado chega a cerca de 250 pessoas por ano”, enfatiza o médico. Entretanto, há mais medicamentos inovadores a chegar ao mercado, substâncias que prometem ser mais eficazes num período de tempo mais reduzido e que são mais baratas. Algumas poderão mesmo representar uma esperança para a estreita faixa de doentes que ainda não se cura.

Chegar a este novo paradigma não foi fácil, porém. O vocalista dos GNR, Rui Reininho, esperou quase três décadas pelos comprimidos que se revelaram “milagrosos” e esteve mesmo para desistir, depois de duas penosas tentativas para eliminar este vírus que vai destruindo o fígado e pode degenerar em cirrose e cancro. A poucos dias de fazer 60 anos, em Fevereiro do ano passado, o autor de Pronúncia do Norte começou a terapia com as substâncias inovadoras e negativou, como se diz na gíria médica. No final de 2015 foi declarado curado.

Tal como o vocalista dos GNR, são cada vez mais os doentes que em pouco tempo (12 semanas é o padrão) conseguem livrar-se do vírus. Os dados da Autoridade Nacional do Medicamento (Infarmed) são inequívocos: 7840 doentes tinham começado tratamento até ao início deste mês, e, dos que já o tinham finalizado, 3005 foram declarados "curados”. A taxa de cura é de 96%, sublinha o Infarmed, que se recusa a adiantar o montante da despesa com os novos fármacos.

7840 doentes estavam em tratamento em Portugal até 1 de Julho. Ao todo foram já curadas 3005 pessoas, sendo a taxa de cura de 96%

O acordo entre o Estado português e a biofarmacêutica Gilead Sciences — que comercializa o Solvadi (sofosbuvir) e o Harvoni (associação entre sofosbuvir e ledispavir) — “não contempla a divulgação dos preços praticados”, justifica. Estes dados incluem não só os tratamentos efectuados com os mediáticos comprimidos da Gilead mas também com moléculas de outros laboratórios que foram testadas em ensaios clínicos e que, por isso mesmo, não representaram despesa para o Estado.

Para a história ficam os tempos de incerteza, de espera e de ansiedade para os doentes e médicos. Em Portugal, foi necessário aguardar um ano (depois de o Infarmed aprovar o primeiro antivírico de acção directa a chegar ao mercado, o sofosbuvir, que se veio a provar curar a doença em mais de 90% dos casos) para que o Ministério da Saúde e o Infarmed assinassem um acordo então considerado revolucionário — o Estado português apenas paga pelos doentes curados. Este acordo vigora por dois anos, termina em Fevereiro de 2017 e aplica-se aos medicamentos da Gilead, mas já foi anunciado pelo actual ministro da Saúde que vai ser renegociado.

O preço inicialmente pedido, 48 mil euros por doente, foi classificado de “completamente imoral” pelo anterior ministro da Saúde, Paulo Macedo, e por isso as negociações foram-se arrastando. O acordo acabaria por ser assinado na semana em que um doente interpelou de forma emocionada o ministro no Parlamento, pedindo-lhe que não o deixasse morrer, e dias depois de ter sido noticiada a morte de uma mulher que aguardava pelo fármaco.

Os resultados alcançados provam uma taxa de sucesso que ultrapassa os sonhos mais optimistas de médicos e doentes — que antes do acesso a estes comprimidos eram sujeitos a tratamentos tão difíceis de aguentar que muitos desistiam a meio

Muitos doentes por diagnosticar

Agora, os resultados provam uma taxa de sucesso que ultrapassa os sonhos mais optimistas de médicos e de doentes — que antes do acesso a estes comprimidos eram tratados com injecções de interferão e outras substâncias, como a ribavirina, com muitos efeitos secundários, alguns tão difíceis de aguentar que faziam com que vários pacientes desistissem a meio.

Emília Rodrigues, cujo marido foi diagnosticado com hepatite C após uma peritonite complicada em 2002, não se esquece dos terríveis efeitos secundários dos fármacos usados no passado. Em 2005, em conjunto com um doente, Lourival Neto, criou uma associação, a SOS Hepatites, para apoio dos pacientes que enfrentavam as mesmas “dificuldades, dúvidas e solidão”, descreve.

Lourival morreu em Dezembro desse ano com um cancro de fígado e, desde essa altura e até aos finais de 2011, recorda Emília, o tratamento para a hepatite C consistia na conjugação de injecções de interferão com ribavirina. A média de cura oscilava então entre 50 a 60%, mas os efeitos secundários eram difíceis de aguentar para muitos doentes. A depressão era o mais grave.

130 Um total de 130 a 150 milhões de pessoas serão portadoras crónicas de hepatite C a nível mundial. Em Portugal, haverá entre 50 mil a 100 mil infectados

Até que, no final de 2011, surgiram os chamados inibidores de protéase, que, em conjunto com o tratamento anterior, já proporcionavam entre 80 a 85% de hipótese de cura, mas com efeitos secundários também difíceis de suportar. Mesmo assim, estes fármacos só eram disponibilizados em Portugal aos doentes mais graves e após autorizações de utilização especial dadas caso a caso pelo Infarmed, recorda a presidente da SOS Hepatites.

Foi justamente a dificuldade na disponibilização destes medicamentos que começou a criar “ansiedade” entre os doentes, lembra Tato Marinho, que, ainda antes do mediático acordo com a empresa norte-americana, conseguiu, tal como outros colegas, curar dezenas de pacientes tratados em ensaios clínicos com moléculas desenvolvidas por vários laboratórios. Actualmente, aliás, são várias as empresas farmacêuticas a competir com a Gilead Sciences, pelo menos mais quatro, como a Abbvie, a Bristol-Myers Squibb, a Janssen e a Merck, elenca.

Ainda recentemente, em Maio, os cerca de mil doentes renais com hepatite C e co-infectados com VIH — que não respondiam ao tratamento padrão — passaram a ter acesso facilitado a uma combinação de fármacos da Abbvie e o Infarmed assinou um contrato com este laboratório que envolve os medicamentos Exviera e Viekirax. O pagamento passou a ser feito então através de uma linha de financiamento própria, à semelhança do que acontece com os fármacos da Gilead.

“Portugal tem um acesso à terapêutica sem paralelo na Europa, com o custo integralmente suportado pelo Estado”
Armando Carvalho, médico

Se a taxa de cura dos doentes se mantiver a este ritmo, é de prever que no início do próximo ano já estejam livres da infecção mais de metade dos pacientes inicialmente inscritos nos hospitais públicos — cerca de 13 mil. O grande desafio, agora, é fazer com que pessoas que estão infectadas sem o saberem — é preciso notar que a hepatite C é uma doença silenciosa, sem sintomas ao longo de muitos anos — se submetam ao teste de diagnóstico.

De resto, ninguém consegue precisar quantas pessoas estarão infectadas em Portugal e as estimativas são muito díspares, oscilando entre 50 mil, 100 mil e mesmo 150 mil pessoas no país. "O esforço tem de continuar porque ainda existem muitos doentes por diagnosticar e tratar", assinala, a propósito, Armando Carvalho, do Núcleo de Estudo das Doenças do Fígado, da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna.

Satisfeita com os resultados que mostram que Portugal “caminha de forma sustentada em direcção ao objectivo de eliminar a hepatite C como problema de saúde pública”, Raquel Chantre, relações públicas da Gilead Sciences Portugal, não se pronuncia sobre a renegociação do acordo com o Estado português. Nem comenta o preço dos fármacos. Prefere recordar uma estimativa efectuada pelo Infarmed ainda em 2015 e que apontava para uma poupança em encargos para a saúde que "poderia chegar a 412,6 milhões de euros”, por se evitarem as complicações da hepatite C nos doentes curados, nomeadamente em transplantes hepáticos e cancro de fígado.
O problema do preço

O preço dos medicamentos da Gilead Sciences desencadeou uma enorme controvérsia. Nos EUA, o sofosbuvir até ficou conhecido como o “comprimido dos mil dólares” (era quanto custava então cada cápsula) e chegou a ser classificado por um economista como a terapêutica que estava “a levar a América à falência”.

20
mil euros será o preço acordado com a farmacêutica Gilead para tratar cada doente no país. O Infarmed continua a recusar-se a adiantar os valores do acordo

Sigiloso, o preço acordado variou de país para país, oscilando entre os mais de 80 mil dólares nos EUA e cerca de 800 euros no Egipto, o país com a maior prevalência de hepatite C em todo o mundo.

Em Portugal, o custo acordado terá sido da ordem dos 20 mil euros por doente, por um tratamento-padrão de 12 semanas (há pacientes que necessitam de mais tempo). Mas a Autoridade Nacional do Medicamento (Infarmed) continua a recusar-se a adiantar valores.

O preço já foi considerado elevado, quando se contabilizam os custos de produção, que investigadores ingleses calcularam oscilar entre 60 a 120 euros. Somando já os custos da investigação e os do marketing, deveria rondar os 300 euros, segundo outras contas de especialistas espanhóis.

O certo é que, apesar de não ter sido dos primeiros a aprovar o tratamento, Portugal é hoje um dos países em que o acesso aos fármacos inovadores é mais generalizado. “Portugal tem um acesso à terapêutica sem paralelo na Europa, com o custo integralmente suportado pelo Estado”, sublinha Armando Carvalho.

O que se sabe é que, em 2015, foram gastos 40 milhões de euros com o tratamento da hepatite C e, para este ano, está prevista uma despesa que ronda os 85 milhões de euros. Em Março, o actual ministro da Saúde adiantou que o acordo seria renegociado, mas nem a tutela nem a farmacêutica adiantam detalhes. O segredo é a alma do negócio.

“Tratamento salvou-me a vida, foi a minha prenda dos 60 anos”

Alexandra Campos, in Público on-line

Rui Reininho, 61 anos, vocalista dos GNR, conviveu 26 anos com o vírus da hepatite C.

Habituado a viver com o vírus da hepatite C ainda antes de a infecção ter sido baptizada com o nome definitivo (“chamava-se então hepatite não-A, não-B”, lembra), o vocalista dos GNR, Rui Reininho, assume que esteve bem perto de ser mais uma das vítimas mortais da doença. Ao longo de 26 anos, foi aprendendo a viver com o vírus, obrigou-se a uma vida mais cuidada, até ao momento em que os médicos o avisaram de que estava quase no limite, na fronteira entre a vida e a morte.

Em 2014, Rui Reininho nem sequer estava na lista de espera para transplante de fígado em Portugal, apesar de ter pensado nessa hipótese, seguindo o exemplo do que tinha feito anos antes Zé Pedro, dos Xutos & Pontapés, que se curou sem necessidade dos novos medicamentos. O autor de Pronúncia do Norte estava a aguardar, tal como os outros doentes, pela aprovação e disponibilização dos novos antivíricos e sublinha que o homem que, no Parlamento, pediu ao ex-ministro Paulo Macedo para não o deixar morrer “foi bastante corajoso”.

“Durante anos não tive manifestações da doença, daí o perigo. Um infectado é como uma bomba-relógio… Depois, tentei tratar-me. Negativizei por duas vezes, só que, passados meses, o vírus reapareceu”

As novas substâncias chegaram assim para Reininho, que viu amigos e conhecidos a não resistir ao vírus enquanto esperavam, precisamente “na altura certa”. Faltavam alguns dias para completar 60 anos. “Foi a minha prenda”, brinca.

Começou a tomar os comprimidos em 9 de Fevereiro de 2015 (ele faz anos a 28 desse mês) e, na primeira análise, em Março, já tinha “negativado”. Para quem tinha ponderado antes a hipótese de fazer um transplante de fígado e chegado a equacionar a possibilidade de ir à Índia comprar os medicamentos inovadores, ficar sem sinais do vírus em apenas de um mês representou “algo de extraordinário”. “Salvou-me a vida”, remata o vocalista dos GNR que, no final de 2015, foi dado como curado.

“Durante anos não tive manifestações da doença, daí o perigo. Um infectado é como uma bomba-relógio… Depois, tentei tratar-me. Negativizei por duas vezes, só que, passados meses, o vírus reapareceu.” Reininho experimentou na pele a dureza do tratamento com interferão. “Era violentíssimo”, com injecções três vezes por semana, associado à ribavirina e outras variantes, durante um processo que durava “um ano e três meses”. Sentia-se “permanentemente arrasado”.

Em 2014, admite, ficou “desmoralizado” e pensou em desistir. “Estava à espera há um ano…” Nessa altura via o futuro a desintegrar-se. Estava, sintomaticamente, a compor o álbum Caixa Negra — era essa a cor com que via o mundo. “Eu estava num limbo, reequacionei muita coisa. O disco sai numa altura em que me sentia ‘vai, não vai’”, descreve. “Mas também pensava: já vivi 60 anos, não me arrependo de quase nada a não ser da qualidade dos bagaços”, ironiza.

“Eu estava num limbo, reequacionei muita coisa. O disco [Caixa Negra] sai numa altura em que me sentia ‘vai, não vai’. Mas também pensava: já vivi 60 anos, não me arrependo de quase nada a não ser da qualidade dos bagaços”

Agora oficialmente curado, o lema do vocalista dos GNR é “nada de começar a estragar o fígado, de beber champanhe, acabou-se o bacalhau assado e os rojões”. Cortou completamente com o cloreto de sódio, com fritos, com carnes, tornou-se quase vegetariano. A dieta resultou. Se antes sentia “imensas dificuldades a nível orgânico”, agora consegue aguentar espectáculos “de hora e meia a duas horas com outra energia”. Os valores do fígado voltaram aos dos anos 1970. Ora, acontecer isto a alguém que tem 61 anos é fenomenal, até porque “os artistas não têm outras fontes de rendimento”, enfatiza.

A um ano de completar 40 anos de actividade, o vocalista afirma-se assim muito responsável e sabe que, apesar de considerado curado, tem que continuar com a vigilância e a cuidar de si. Até porque está a usufruir de uma espécie de segunda vida. “Agora tenho que ter muito cuidado a atravessar a rua…”

“Querida, faz as malas porque estás quase a partir”

Natália Faria, in Púbico on-line

Pouco depois de se ter descoberto portadora do vírus da Hepatite C, Mónica Oliveira, de 52 anos, recebeu um diagnóstico de morte certa. Andou dez anos a adiar essa sentença. No final do ano passado, foi dada como curada. Agora, o médico diz-lhe que vai morrer, sim, mas de velha.

Mónica Oliveira costumava dizer que não tinha tempo para estar doente até que, aos 42 anos, se sentiu empurrada de um precipício. “Tinha descoberto há pouco que era portadora de hepatite C e, ao fim de quatro meses de tratamento, a médica virou-se para mim e muito calmamente disse: ‘No seu caso não há nada a fazer, a senhora já sabia que o tratamento não funciona com toda a gente, vá a casa buscar os medicamentos que são muito caros e entregue-os na farmácia do hospital’. Assim, como quem diz: ‘Querida, faz as malas porque estás quase a partir’. Eu, que tenho medo de alturas, senti que me estavam a empurrar de um precipício e que só tinha algum tempo até chegar lá abaixo e morrer.”

Passaram-se dez anos. Mónica não só não morreu como está curada da doença. Graças ao sofosbuvir, mas também graças àquele que hoje aponta como “o homem da sua vida”, o hepatologista Fernando Ramalho, do Hospital de Santa Maria, em Lisboa. “Tinha-o ouvido numa entrevista na RTP1 e, quando entrei no consultório dele, a primeira coisa que me disse foi: ‘Ainda bem que está aqui porque podia ter morrido’. Percebi depois que o tratamento que tinha feito durante quatro meses no Hospital do Barreiro não tinha feito mais do que aumentar-me a carga viral, de 60 mil vírus por litro de sangue para 120 milhões. No fundo, foram quatro meses a ‘alimentar o bichinho’. E isto porque o tratamento tinha sido iniciado sem que me tivessem feito sequer uma biópsia para ver como estava o fígado.”

“O cansaço que sentia era tal que queria andar e já não conseguia. Os efeitos secundários eram idênticos aos da quimioterapia. Caiu-me o cabelo e tudo”

Estávamos em 2006. Numa altura, portanto, em que a terapêutica clássica para o vírus consistia numa injecção de interferão uma vez por semana e na toma diária de comprimidos de ribavirina, durante seis a 12 meses. “O cansaço que sentia era tal que queria andar e já não conseguia. Os efeitos secundários eram idênticos aos da quimioterapia. Caiu-me o cabelo e tudo”, recorda. Se a médica que a atendeu no Hospital do Barreiro lhe tivesse feito o estudo genético, teria percebido que Mónica tem uma mutação genética que torna o seu organismo resistente à quimioterapia.

No Hospital de Santa Maria, esse estudo foi das primeiras coisas a serem feitas. “O doutor Fernando Ramalho avisou-me logo que os tratamentos não iam curar-me. Mas a ideia era diminuir a carga viral para que o fígado aguentasse o maior número de meses e de anos, até que novos tratamentos fossem desenvolvidos. Ele era informado, tinha recebido formação nos Estados Unidos, sabia que isso era possível.”

Mónica andou assim vários anos a adiar a sua sentença de morte. “Não foi fácil. A minha filha tinha na altura 12 anos e passou a adolescência a ver a mãe doente, sempre deitada no sofá, o dinheiro a faltar…” O emprego como educadora de infância ficou em águas de bacalhau enquanto a doença fazia o seu caminho. O marido ficara entretanto desempregado. Para piorar o cenário, tinha ainda a cargo duas enteadas, uma das quais grávida de sete meses e que tinha sido abandonada pelo pai da criança.

“O homem da minha vida, que como disse não é o meu pai nem o meu marido, é o doutor Fernando Ramalho. Agora, quando me vê, diz-me: ‘Você vai morrer mas é de velha’”

“A minha sorte é que, como nunca tinha tido comportamentos de risco, ou seja, nunca gostei de fumar nem de beber, o fígado levou mais tempo a ser agredido pelo vírus. E houve outra coisa que me ajudou: nunca me senti discriminada, nunca vi um olhar de reprimenda, nem mesmo por trabalhar com crianças.”

O ponto de viragem aconteceu em Dezembro de 2015. “Foi quando me disseram: ‘Está curada’. Tinha iniciado o tratamento em Junho desse ano e fi-lo durante três meses, mas, ao fim de duas semanas, já tinha o vírus indetectável.”

O tratamento provocava-lhe cansaço, mas nada a que não estivesse habituada. “Comparativamente com os tratamentos anteriores, que foram mesmo maus, este quase não teve efeitos secundários, a não ser o cansaço. Houve uma altura em que me esquecia das coisas, até achei que estava com Alzheimer, mas já estava tão habituada a sentir-me mal que desvalorizava as coisas. Depois, descobri que estava com falta de zinco. E agora também estou a fazer ferro injectável.”

Nada que se compare com uma sentença de morte a prazo. “O homem da minha vida, que como disse não é o meu pai nem o meu marido, é o doutor Fernando Ramalho. Agora, quando me vê, diz-me: ‘Você vai morrer mas é de velha’”.

18.2.16

Bruxelas quer erradicar Hepatite C. Em Portugal, primeiro passo é identificar os doentes

in RR

Estima-se a de 50 mil portugueses com Hepatite C. Uma das dificuldades é fazer chegar o tratamento a reclusos com esta doença.

Representantes dos Estados-membros da União Europeia comprometeram-se a eliminar a hepatite C, um objectivo que, em Portugal, passa por descobrir e tratar os milhares de doentes que desconhecem ser portadores do vírus, segundo um activista.

Luís Mendão, presidente do Grupo Português de Activistas sobre Tratamentos de VIH/SIDA (GAT), presente na primeira cimeira política sobre hepatite C, que decorre em Bruxelas, sublinhou a importância deste encontro e as portas que o mesmo pode abrir.

No encontro, os participantes assinaram um manifesto, através do qual se comprometem com a eliminação da doença na Europa até 2030.

Os signatários "apelam a que todas as pessoas com a doença tenham acesso ao tratamento".

Luís Mendão acrescenta, contudo, que o fim da doença não acaba no tratamento, pois "é preciso traçar planos de prevenção e diagnóstico".

Isto porque "a maior parte das pessoas infectadas não sabe que é portadora do vírus e é preciso trazê-la aos centros de tratamento e dar-lhes a medicação".

Segundo o presidente do GAT, Portugal comprometeu-se a tratar 13 mil doentes até Fevereiro, embora se estime a existência de 50 mil doentes.

"Para tratar mais doentes, os preços dos medicamentos precisam de descer", defendeu, congratulando-se com o facto de existirem três companhias com medicamentos muito bons para a hepatite C.

Luís Mendão apontou ainda as dificuldades no tratamento dos infectados nas prisões, onde existe "um problema sério". "Temos mais de 2.000 infectados nas prisões e apenas 40 pessoas tiveram acesso ao tratamento".

Segundo dados oficiais, quase 6.000 doentes iniciaram tratamentos em Portugal, com pelo menos 1.200 utentes já considerados curados.

Os números, que reportam a 1 de Fevereiro, constam do site da Autoridade Nacional do Medicamento (Infarmed) e contabilizam 5.992 doentes com tratamento iniciado.
Dos doentes que já finalizaram o protocolo de tratamento, 1.202 estão curados e há 49 dados como doentes não curados.

O acordo entre o Estado e o laboratório que fornece os medicamentos inovadores para a hepatite C foi formalizado há um ano, tendo sido apresentado pelo então ministro da Saúde, Paulo Macedo, no dia 6 de Fevereiro de 2015.

28.7.15

Hepatite C "pode estar erradicada dentro de alguns anos"

in Diário de Notícias

No Dia Mundial da Luta Contra as Hepatites Víricas, o presidente da Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia está otimista face aos avanços da investigação médica na área.

A Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia considera que "podemos ser otimistas o suficiente para dizer que a hepatite C é uma doença que pode estar erradicada dentro de alguns anos", por ocasião do Dia Mundial da Luta Contra as Hepatites Víricas hoje assinalado.

José Cotter, presidente da Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia (SPG) admitiu que os pacientes dispõem de tratamentos "com elevadíssima taxa de eficácia, muito próxima dos 95%", mas revelou preocupação face a "uma pequena franja de doentes [que] não responde a estes tratamentos".

"[Esses pacientes] necessitarão de medicamentos alternativos que neste momento ainda não estão aprovados do ponto de vista negocial pela tutela", informou o também diretor do serviço de Gastrenterologia do Centro Hospitalar do Alto Ave, afirmando que, no entanto, esta é "uma doença que pode estar erradicada dentro de alguns anos" face ao avanço da investigação médica nesta área.

O especialista alertou, ainda, para o carácter "silencioso" desta doença, que deve ser combatido através de "uma simples análise sanguínea", "pelo menos uma vez, na idade adulta".

"Se a infeção evoluir de modo silencioso, o que vai acontecer é que, quando houver sinais, já vai estar numa fase muito avançada" e trazer complicações como a cirrose ou o cancro do fígado, que pressupõem "tratamentos muito complicados", nos quais, na maioria dos casos, o transplante é "o único recurso".

A hepatite C associa-se mesmo a 25 a 30% dos casos de cancro do fígado a nível mundial e é hoje a principal indicação para transplante do fígado nos Estados Unidos da América e na Europa, referiu a SPG em comunicado, sublinhando a importância do rastreio para todos os casos de doença hepática.

No que toca aos casos de hepatite B, o presidente da SPG afirmou que se verifica um decréscimo a partir do momento em que a vacina entrou no Programa Nacional de Vacinação, não descurando a realidade de que "ainda existe uma parte substancial de cidadãos infetados".

"Dispomos de tratamentos eficazes, no sentido de não deixar avançar a infeção, nem deteriorar o fígado", referiu o especialista, admitindo que, "numa elevada percentagem de casos", não são a cura, mas sim um modo de controlar a doença e impedir que esta avance.

Em Portugal, a infeção pelo vírus da hepatite B pode atingir, segundo a SPG, 40.000 a 100.000 cidadãos, e estar presente em 15 a 20% dos doentes com cirrose hepática, "estádio final das doenças do fígado cujo único tratamento curativo será o transplante".

As hepatites víricas, "segunda causa mais frequente de cirrose em Portugal, atrás da cirrose de etiologia alcoólica", são, na ótica da SPG, "um problema de saúde pública mundial" que deve ser combatido através da "informação e sensibilização geral das populações, dos médicos de família, e de uma coordenada e eficaz resposta dos médicos especialistas em gastrenterologia e hepatologia [...], contando com um imprescindível empenhamento das instâncias estatais e governamentais".

Na senda do apelo de rastreio feito pela SPG, a SOS Hepatites vai estar hoje, na Praia de Santo Amaro de Oeiras, em Lisboa, entre as 10:00 e as 17:00, a oferecer rastreios à hepatite C a toda a população, como forma de assinalar o Dia Mundial das Hepatites.

Com o slogan "Faça o Rastreio. Salve o seu fígado", esta associação pretender também alertar para a necessidade de avaliar a situação do fígado, especialmente o dos portugueses nascidos entre 1950 e 1980.

4.2.15

"Não me deixe morrer". Doente com hepatite C dirige-se a Paulo Macedo

in iOnline

No meio do debate, José Carlos Saldanha levantou-se e falou ao ministro da Saúde

Durante uma audição na Comissão Parlamentar da Saúde, José Carlos Saldanha, doente que aguarda tratamento contra a hepatite C , dirigiu-se a paulo Macedo pedindo-lhe que não o deixasse morrer.

"Não me deixe morrer, eu quero viver", gritou o doente.

No meio do debate, José Carlos Saldanha levantou-se e falou ao ministro da Saúde.

Saldanha terá oferecido metade do valor para pagar o seu tratamento e não terá recebido uma resposta por parte do Ministério.

Após a intervenção, o doente pediu desculpa aos deputados e voltou a referir-se a Paulo Macedo para dizer: " A si, eu vou encontrá-lo

29.7.14

Crise impede tratamento urgente de hepatite C

por Henrique Cunha, in RR

A denúncia parte do presidente da Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia (SPG), Leopoldo Matos, nesta segunda-feira em que se assinala o Dia Mundial da Hepatite.

Nem todos os doentes têm acesso ao medicamento mais eficaz no combate à hepatite C, por causa da situação económica do país. A denúncia parte do presidente da Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia (SPG), Leopoldo Matos, nesta segunda-feira em que se assinala o Dia Mundial da Hepatite.

Em entrevista à Renascença, Leopoldo Matos sublinha que a terapêutica em causa é eficaz a cerca de 97% dos casos. Em Portugal, há cerca de 150 mil casos de hepatite C, dos quais 700 muitos graves. A terapêutica mais eficaz tem custo elevado, da ordem dos 50 mil euros.

Contactado pela Renascença, o Ministério da Saúde remeteu para o Infarmed. Até ao momento, a autoridade do medicamento não respondeu à solicitação da Renascença.

Como caracteriza a evolução da hepatite C em Portugal?
A indústria colocou à disposição moléculas que conseguem erradicar o vírus em cerca de 97% dos doentes tratados. Simplesmente terão de ser as tutelas e a indústria a encontrar um modelo de financiamento e uma capacidade de tratamento que seja possível em mais doentes do que tem sido ultimamente.

A questão financeira tem sido um obstáculo ao combate à doença em Portugal?
Neste momento é. As situações muito graves têm sido possíveis de tentar resolver. Em relação às outras, que pretendíamos que não evoluíssem para situações graves ou muito graves e que deveriam ser tratadas para negativar o vírus que é o promotor da evolução da doença de fígado, não está a ser possível fazê-lo.

Pode indicar casos concretos?
Há situações graves e muitos graves e essas estão a ser estudadas e avaliadas caso a caso. Em determinadas situações, tem sido disponibilizada a terapêutica mais cara. Mas são casos pontuais. Agora, o que os médicos e os doentes pretendem é que as situações não cheguem a graves e muito graves e, por isso, defendem que se encontre um modelo de terapêutica mais precoce na evolução da doença e que se consiga, de facto, diminuir as situações graves e muito graves resultantes da infecção pelo vírus C do fígado.

O tratamento é muito caro?
O preço pode rondar 50 mil euros.

O modo como os responsáveis Estado olham para esta patologia é satisfatória?
Não. A nós, não nos satisfaz o modelo de solução que está a ser encontrado. Há uma proposta dos médicos para que, pelo menos os casos identificados a nível nacional como mais graves, possam ser imediatamente tratados. E pretende-se também, com a direcção geral de Saúde, fazer um plano de terapêutica da hepatite C. Esse plano poderia equacionar vários graus de gravidade dos doentes portugueses e encontrar um modelo de financiamento ao longo de dois, três quatro anos, até que fiquem todas essas questões financeiras resolvidas.

Quantos casos de hepatite C há em Portugal?
A ideia que se tem é de de existam cerca de 150 mil pessoas com a infecção. Nem todas as pessoas sabem que estão infectadas. Há um caminho de rastreio para ser feito.

É desse universo que podem surgir casos graves ou muito graves. Quantos?
Desses 150 mil, os doentes graves e importantes são muito poucos. Em Portugal, um levantamento recente aponta para 700 doentes que têm urgência de ser tratados com alguma brevidade.