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10.9.21

Jovens homossexuais ou bissexuais têm probabilidade três vezes maior de suicídio

in Público on-line

A propósito do Dia Mundial da Prevenção do Suicídio, assinalado esta sexta-feira, a Ordem dos Psicólogos Portugueses explica que em Portugal o número de mortes por suicídio “é elevado”, com as estatísticas mais recentes a apontarem para três mortes por dia por esta causa.

Os jovens homossexuais ou bissexuais têm uma probabilidade três vezes maior de cometer suicídio nalguma altura da sua vida, uma possibilidade que aumenta quando a família não aceita a sua orientação sexual, segundo dados divulgados esta sexta-feira.

Os dados constam de um documento com 28 páginas da Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP), com o título "Vamos falar sobre o suicídio", lançado a propósito do Dia Mundial da Prevenção do Suicídio, assinalado esta sexta-feira.

“Um dos factores que pode espoletar estes comportamentos de suicídio são de facto este desajustamento que a pessoa sente relativamente à aceitação da família quando há questões de orientação sexual ou de identidade de género”, disse à agência Lusa Renata Benavente, da OPP.

A psicóloga explicou que, quando existem estas “dificuldades acrescidas, sobretudo nestas fases de desenvolvimento que são críticas, da estruturação da personalidade, de aceitação de si próprio”, a situação agrava-se.

“A adolescência por si só, e os números mostram isso, já é uma fase difícil em que há um número crescente de suicídios. Se essas dificuldades que são expectáveis da adolescência se associam a outros factores de risco, nomeadamente a identidade sexual, a não-aceitação por parte da família da sua orientação sexual, todas essas dificuldades naturalmente vão aumentar o risco de suicídio”, sublinhou.

No seu entender, é um grupo de jovens e de pessoas que deve merecer uma particular atenção.

Alertou também para “uma problemática muito preocupante” que é o suicídio entre a população mais jovem, a segunda causa de morte entre os jovens em todo o mundo entre os 15 e os 34 anos.

“A primeira {causa] são as mortes por acidente e a segunda é o suicídio, o que nos leva a reflectir sobre porque é que os jovens estão a tomar este tipo de decisão de retirar a própria vida”, sublinhou.

Em Portugal, o número de mortes por suicídio “é elevado”, com as estatísticas mais recentes a apontarem para três mortes por dia por esta causa. No mundo, morrem quase 800 mil pessoas por suicídio anualmente, o que corresponde a aproximadamente uma morte a cada 40 segundos.

“A maior parte das pessoas que morreu por suicídio sofria de problemas de saúde psicológica, nomeadamente depressão e consumo problemático de álcool”, refere o documento.

Por outro lado, apontou Renata Valente, a investigação internacional também mostra que o número de tentativas é 25 vezes superior ao número de suicídios consumados.

“As tentativas de suicídio e os suicídios são um grande desafio em termos da saúde pública e resultam normalmente de situações de grande sofrimento emocional e têm um impacto muito importante, quer pela perda de vidas humanas”, quer nos “sobreviventes”.

“Cada suicídio pode deixar entre seis a 10 pessoas sobreviventes”, como pais, irmãos, filhos, amigos, conhecidos, vizinhos, colegas da pessoa que morreu e profissionais de saúde, refere a publicação.

Sobre o documento, Renata Benavente explicou que o objectivo principal é abordar as temáticas do suicídio e promover a literacia em saúde, “ajudando a população em geral a identificar alguns sinais que possam remeter para alterações que indiciam um eventual comportamento desta natureza”.

“Para muitas é apenas um escape para uma situação transitória que não se consegue lidar de uma forma mais impulsiva e se estivermos atentos a este tipo de indicadores poderemos realmente actuar no sentido de ajudar esta pessoa a aliviar este sofrimento interno e não consumar um ato desta natureza”, salientou.

O documento debruça-se também sobre os motivos que podem conduzir ao suicídio, os factores de risco e protecção, faz recomendações sobre o que se pode fazer e tem uma secção dedicada aos mitos e factos e outra aos sinais de alerta.


29.4.15

Homossexuais só podem dar sangue se estiverem em abstinência sexual

in Diário de Notícias

Presidente do Instituto Português do Sangue e da Transplantação disse hoje no Parlamento que o "contacto sexual de homens com outros homens é definido como fator de risco".

O presidente do Instituto Português do Sangue e da Transplantação (IPST) afirmou hoje que é um fator de exclusão para a dádiva de sangue ser homem e ter tido sexo com outros homens.

Segundo Hélder Trindade, que foi ouvido hoje na Comissão Parlamentar de Saúde, o instituto não faz qualquer discriminação em função da orientação sexual, mas sim em função da prática sexual.

"O contacto sexual de homens com outros homens é definido como fator de risco", admitiu o presidente do IPST, sem contudo reconhecer tratar-se de preconceito como acusam os partidos da oposição.

O sangue doado é sempre testado antes de ser usado, mas o questionário realizado ao dador é considerado um passo crucial para a segurança da transfusão, na medida em que há uma "janela de tempo", que é variável, em que o VIH pode não ser detetado na análise ao sangue doado.

No final da comissão parlamentar e em declarações aos jornalistas, Hélder Trindade voltou a explicar que está definido como fator de exclusão para a dádiva de sangue "ser homem que tem sexo com homens".

Apesar de a pergunta ter saído dos questionários escritos feitos antes das dádivas de sangue, continua a haver indicações para que seja sempre formulada a quem se apresente para doar sangue.

Hélder Trindade entende que não se trata de um preconceito, uma vez que nada é perguntado sobre a orientação sexual, mas antes sobre o comportamento sexual.

"O que o instituto questiona é o comportamento de risco. Tanto faz se é homo ou heterossexual. Não há discriminação por grupos de risco, mas sim por comportamentos de risco", afirmou, adiantando que o dador não será excluído por se assumir homossexual, mas por praticar sexo com outros homens.

O presidente do IPST sublinhou que o mesmo se passa em vários outros países europeus e também nos Estados Unidos, apesar de na Europa a matéria não ser consensual.

Para justificar o que está estabelecido em Portugal, cita dados do Centro Europeu de Controlo de Doenças segundo os quais a prevalência do VIH/sida é "bastante mais elevada" nos homens que fazem sexo com homens.

"O contacto sexual de homens com homens é definido como um fator de risco. A homossexualidade não é assumida como fator de risco", indicou o responsável aos deputados durante a audição requerida pelo Bloco de Esquerda.

Perante as explicações, os partidos da oposição foram unânimes em considerar que o fator de exclusão assumido pelo IPST continua a ser discriminatório.

"A categoria 'homens que têm sexo com homens' é uma categoria preconceituosa e é absurda do ponto de vista da avaliação do risco. Primeiro presume que um homem que faz sexo com homens faz sempre sexo anal. Depois não considera o fator da desproteção. O fator de risco são as práticas sexuais desprotegidas", defendeu José Soeiro, deputado do Bloco de Esquerda.

Para a deputada do PS Elza Pais, "as garantias de segurança para quem recebe a dádiva devem ser feitas com base no rigor científico e não no preconceito".

"O sexo anal não é exclusivo de homens que têm sexo com homens. Se se entende que o sexo anal é fator de risco, como se garante a segurança quando os heterossexuais também têm sexo anal?", questionou Elza Pais.

Paula Santos (PCP) disse que os argumentos do IPST eram contraditórios e referiu-se ao critério de exclusão da dádiva de sangue como uma "discriminação".

O BE, que requereu esta audição, considerou ainda que a interpretação do instituto "viola a decisão e o espírito" de uma resolução do parlamento estabelecida em 2010 que recomendou ao Governo abolir qualquer discriminação dos homossexuais e bissexuais nos serviços de recolha de sangue.

Nessa resolução recomenda-se a reformulação de todos os questionários que contenham enunciados homofóbicos, nomeadamente em relação a questões relativas a relações sexuais entre homens.

A mesma resolução de 2010, aprovada sem votos contra, recomenda a elaboração de um documento por parte do governo que proíba expressamente a discriminação dos dadores com base na sua orientação sexual.

O governo decidiu a este propósito criar um grupo de trabalho no IPST, que até ao momento não apresentou conclusões, como admitiu Hélder Trindade, garantindo apenas que deverá haver conclusões "em breve".

Hélder Trindade frisou que o "IPST não tem preconceitos" e que debate estes assuntos com um olhar "técnico e científico".

1.8.14

Como lida a protecção de menores com jovens gays e lésbicas? Nem sempre bem

Andreia Sanches, in Público on-line

Há técnicos das comissões de protecção que dizem que tratam estas vítimas como todas as outras. Há quem assuma que se calhar não está a fazer tudo bem e há quem reclame mais recursos. Resultados de um diagnóstico inédito.

Tiraram a filha do futebol. Obrigaram-na a vestir-se de forma mais feminina. Quando ela tinha 16 anos, a mãe descobriu as cartas que ela trocava com uma namorada. Quis afastá-la da escola e mantê-la em casa. Dizia “que a sua filha não era doente e que eram uma família séria”. Outro pai, quando o filho lhe disse que era gay, deu-lhe uma tareia e proibiu-o de falar de novo no assunto. A mãe, que até parecia apoiar o filho, calou-se também. Muitos casos de jovens lésbicas, , bissexuais ou transgénero (LGBT), tantas vezes alvo de violência familiar, acabam por chegar às comissões de protecção de menores. Estão estas estruturas preparadas? O que acontece quando os jovens são expulsos de casa e têm que ir para uma instituição de acolhimento? Deve haver centros de emergência só para LGBT?

O Diagnóstico de Experiências, Competências e Respostas na Intervenção Institucional com Jovens LGBT em Situação de Violência Familiar e/ou Expulsão de Casa, feito pela Casa Qui, foi apresentado nesta quarta-feira em Lisboa. É o primeiro projecto da associação criada em 2012. Tem o financiamento do EEA Grants, regulado pela Fundação Calouste Gulbenkian ao abrigo do Programa Cidadania Activa.

Foi elaborado a partir de questionários e entrevistas a 19 dirigentes e 39 técnicos de Comissões de Protecção de Crianças e Jovens (CPCJ), na sua maioria, mas também de Instituições Particulares de Solidariedade Social que acolhem crianças e jovens. Abundam, na síntese tornada pública, citações das conversas mantidas. Algumas declarações chocam pela “falta de conhecimento” que revelam, admitiu ao PÚBLICO Rita Paulos, directora executiva da Casa Qui. “Mas não vamos esperar que as pessoas percebam as coisas se não têm formação, se não lidam com os casos, se não conhecem...”

Excerto de uma entrevista a uma técnica de uma CPCJ que esteve a acompanhar um menor transexual: “Sim, pronto, se calhar tenho de ter algum cuidado por causa da minha curiosidade. Por exemplo, perguntei aquilo das mamas. Ele mostrou logo as mamas, mas eu fiquei a pensar ‘Bem, agora se calhar já exagerámos, não é?’ Mas confesso, foi mesmo uma curiosidade minha pessoal porque eu só via aquilo na televisão e, ao vivo, o miúdo a dizer-me: ‘Então, estão-me a crescer as mamas e não sei quê’ ‘Mas tu tens?’ ‘Tenho’ ‘Então podes mostrar-me?’ E ele pronto. É verdade, ele tem, igual às minhas (risos). Depois agente pensou isso... Mas não aqueceu nem arrefeceu no processo, naquilo que agente ia trabalhar.”

Ou esta, de outra técnica de outra CPCJ, que a propósito do caso do rapaz que foi espancado pelo pai foi questionada pela equipa da Casa Qui sobre como é que achava que outros colegas de comissão iriam lidar com o processo se ele lhes fosse parar às mãos: “Eram capazes de o aconselhar a que se mantivesse... que se calhar não assumisse, que ficasse mais calado, hmm… ou que fosse procurar um técnico na área para ver se era mesmo a orientação que ele queria.”

“Conspiração do silêncio”
São os próprios técnicos questionados que, em muitos casos, admitem que sentem necessidade de formação, apoio, recursos: “Precisamos é de serviços para terapia familiar”, defende um. “Os recursos em termos de psicologia e saúde mental são escassos”, afirma outro.

Mas mostram-se abertos. Alguns números: desafiados a avaliar, numa escala de 1 (equivalente a “Nada”) e 5 (equivalente a “Muito”), em que medida as CPCJ e as IPSS estão familiarizadas com os conceitos de “orientação sexual e identidade/expressão de género”, 12 em 38 responde “4” ou “5” e 20 respondem “3” — sentem-se “mais ou menos” familiarizadas, resume Andreia Pereira, técnica superior da Casa Qui.

Há 26 que acham que a “sensibilidade” dos técnicos para esta temática e bastante boa. Isto, apesar de a maioria (34) relatarem não ter tido qualquer contacto com estes assuntos na sua formação.

A maioria conta que nunca lidou pessoalmente com casos de “crianças ou jovens encaminhados para a instituição onde trabalham por motivos relacionados com orientação sexual e identidade ou expressão de género”. Mas há 11 que dizem que sim, que isso aconteceu. E outros seis lidaram com menores que, apesar de terem sido sinalizados como estando em risco por outras razões, nalgum momento do processo revelaram ter uma orientação sexual ou identidade de género minoritária.

Henrique Pereira, professor e investigador de Psicologia na Universidade da Beira Interior, convidado a comentar o trabalho, na sessão que decorreu na Câmara Municipal de Lisboa, disse que existe uma “conspiração do silêncio” à volta deste tema das crianças e jovens LGBT e admitiu que isso explicará que sejam poucos os técnicos a dizer que já lidaram com estas situações.

Dulce Rocha, presidente executiva do Instituto de Apoio à Criança, também convidada a comentar os dados, lembrou os seus tempos de magistrada no tribunal de família e menores para dizer que lidou com casos em que as pessoas só contavam o que se estava a passar realmente com elas quando eram instigadas a fazê-lo. Se não se pergunta, elas não dizem.

Suicídio “3 a 4 vezes superior”
A taxa de suicídio entre os jovens LGBT é “três a quatro vezes superior” à dos restantes jovens, recordou ainda Henrique Pereira. Nos Estados Unidos estima-se que entre 12 mil e 24 mil crianças e jovens LGBT estejam a cargo de instituições, sendo que muitos fugiram de casa ou foram expulsos.

A Casa Qui é uma associação de solidariedade social criada em 2012 — só ela recebeu, em menos de um ano, nove pedidos de ajuda de jovens que precisavam de ser acolhidos por causa de conflitos com a família relacionados com a sua orientação sexual ou a identidade de género. A Casa não tem ainda um espaço próprio, a ideia é encaminhar as situações para as respostas mais adequadas, trabalhar em parceria com as instituições, prestar-lhes formação e serviços de consultoria, a qualquer hora em que surja um novo caso mais complexo.

O estudo apresentado nesta quarta-feira é o primeiro passo. Rita Paulos não defende para já a criação de instituições de protecção de crianças e jovens específicas para LGBT — tema sempre polémico (quer antes de mais continuar a estudar e a trabalhar com as instituições que existem). Mais urgente, admite, pode ser encontrar respostas para jovens com mais de 18 anos, que apesar de continuarem muitas vezes dependentes das famílias, já não são enquadrados pelo sistema de protecção se são expulsos de casa.

Sara Teixeira, da Comissão Nacional de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo, elogiou o diagnóstico da associação que, diz, ajudará a decidir políticas para que este tema ganhe mais visibilidade. Isto apesar de alguns técnicos parecerem defender que ele não é relevante: 14 entrevistados disseram que “a orientação sexual não é pertinente” na sua intervenção.

“Um jovem chegar ao [centro de] acolhimento e dizer que é gay já não ligam, vê-se nos filmes, nas novelas”, conta um. “O procedimento é o mesmo independentemente da orientação sexual”, diz outro. Será isto um sinal de uma sociedade avançada? Ou, como admite Henrique Pereira, sinal de que as pessoas “preferem enterrar a cabeça na areia” a enfrentar uma questão sobre a qual “impera uma brutal ignorância”?